Legionário, N.º 238, 4 de abril de 1937

Que Jesus?  Que Cristianismo?

A depressão moral em que a humanidade caiu, a vaga de crueldade que desabou sobre o universo, todo esse imenso fervilhar de torpezas em que nos debatemos tudo que ora põe em perigo a civilização, que é senão uma conseqüência da animalização geral determinado pelo abandono da senda moral que Jesus traçou para a humanidade?

Assim se exprimia a “Nota” de Sexta-Feira Santa do “O Estado de São Paulo”. Assinalemos bem esse fato. O “Estado”, jornal de famosas tradições laicas, que tantas vezes afetou desconhecer a Igreja e sua influência na vida social e política do Brasil, reconhece agora que a causa do mal que vai pelo mundo está precisamente no “abandono da senda moral que Jesus traçou para a humanidade”.

Este fato é um indício da reação salutar que se opera em todos os espíritos que não se conformam com o formidável eclipse da civilização de que o mundo está ameaçado. Homens de todos os matizes ideológicos, políticos do centro e políticos da direita, apontam hoje o Cristo como a pedra angular da civilização.

Para nós católicos, essa reação é causa do mais intenso júbilo. E esse júbilo é duplamente justificado no que concerne à nota em apreço, porque traduz o pensamento de um dos mais brilhantes jornalistas brasileiros, que é o Sr. Plinio Barreto.

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Até aí, muito bem. A causa das lutas sociais está descoberta pelos políticos. Há dezenas de anos que a Igreja a apontara, prevendo a Revolução que se aproximava e procurando dar-lhe o preventivo que a evitaria. Governos e particulares zombaram da voz eterna de S. Pedro e não lhe deram atenção. Agora que a luta chegou, que a desordem arromba as portas de todas as nações, começa muita gente a reconhecer a justeza das palavras da Igreja. Reconhecem-na. E é só. Quantas vezes não temos visto, nestes últimos tempos, os políticos liberais reconhecer e proclamar a necessidade de defender a “civilização cristã”? Mas, no terreno dos fatos, o que têm eles feito para defendê-la? Que meios de ação deram eles agora à Igreja Católica sua única e legítima depositária dos princípios fundamentais da civilização? Em que sentido facilitaram os liberais a difusão da doutrina católica? Qual a providência concreta que eles tomaram em prol desses princípios que eles reconhecem como verdadeiros? Não vemos defraudarem-se sistematicamente as conquistas católicas da Constituição de 34? Do que nos adianta 1/2 hora de ensino religioso? Onde estão os sindicatos católicos que a Constituição permite? O que se fez do casamento religioso? E a assistência religiosa às forças armadas? Quem, entre os liberais, pensa em promovê-la?

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“Aproveitemos a data da comemoração de seu sacrifício para um exame de consciência. A Igreja que se formou para guarda e propaganda do seu evangelho é estreita? São detestáveis os seus sacerdotes? A divindade do Evangelista não pode ser aceita pela razão dos doutores e dos céticos? Não seja essa a dúvida. Ponha-se tudo isso à margem. Mas por que repelir a doutrina? Por que combater o evangelho?...

“Não é preciso ser crente para chegar à conclusão de que quanto mais afeiçoarmos a nossa vida à doutrina cristã, mais a espiritualizamos e quanto mais a dissociarmos dessa doutrina, mais a materializamos...”

“A secular comemoração do seu martírio não tem, apenas, um sentido religioso. Não é uma solenidade de caráter sectário”.

É a clássica manobra dos liberais, imitados neste particular por altos elementos anti-liberais. É a criação de um Cristianismo geral, super-confessional, colocado por eles acima de todas as “seitas”. Não querem reconhecer nem a Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, nem sua Igreja que é a Igreja Católica Apostólica Romana. Igualam-se a todas a “seitas” por aí existentes, colocam-na no mesmo plano de qualquer ramúsculo protestante. Para eles o Cristianismo é um gênero contendo numerosas espécies entre as quais uma, não mais importante que as outras, é a “Católica Romana”.

Ora, com isto nós não concordamos e desta maneira, com este “Cristianismo” que não é do Vaticano, o mundo não se salvará. Não é pregando “amor” e “fraternidade cristãs” como eles entendem que desaparecerão do mundo as lutas sociais. É pregando o Cristo, o Cristo Crucificado, o Cristo Ressuscitado, o Cristo da Eucaristia, do qual a Igreja Católica Apostólica Romana é amiga e amantíssima Esposa, que o mundo encontrará o verdadeiro caminho de sua salvação.