Para qualquer cidadão brasileiro dotado de uma
pequena grama de bom senso, é evidente que o Sr. Pedro Ernesto Baptista,
ex-prefeito do Distrito Federal, é comunista. Bastaria a designação do Sr. Anysio Teixeira para seu Diretor de
Instrução Pública, bastariam as sabidíssimas conivências do ex-prefeito com elementos comunistas,
bastariam as opiniões de S.Sa. geralmente conhecidas
nos meios políticos do Rio de Janeiro, para comprová-lo exuberantemente. Mas
essa comprovação não é necessária. Em São Paulo, está profundamente vincada no
espírito público a persuasão de que o Sr. Pedro Ernesto é comunista. E, no
momento, isto nos basta como ponto de partida para algumas considerações sobre
nossa situação político-religiosa.
Não ignoramos que a participação do Sr. Pedro
Ernesto na revolução de 35 não é a única nem a principal causa de suas recentes
desventuras políticas. Altas causas, relacionadas com a vida política do
Distrito Federal e do País, contribuíram eficientemente para isto. Estas causas
continuam em jogo no atual momento, quando se trata de intervir no Distrito
Federal.
Entretanto, por mais prementes que sejam as causas
da desgraça política do Sr. Pedro Ernesto, para qualquer brasileiro
sinceramente católico, essa desgraça está amplamente justificada pelos pendores
comunistas de S. Sa. Realmente, o Distrito Federal,
como grande cidade que é, constitui ponto de infeção particularmente exposto à propaganda
comunista. Colocado à testa do Distrito um comunista qualquer, está
virtualmente colocado o fogo junto à palha. E o incêndio não se fará esperar.
Na sua linguagem ardente, repassada de uma santa
violência, São Paulo se refere a uma
espécie de gente “cujus
Deus venter est”, isto
é, que fazem um Deus, de seu próprio ventre.
Não apenas os católicos, que reconhecem a
Santíssima Trindade como único Deus verdadeiro, mas também certos burgueses
adoradores do próprio ventre, teriam razão para não desejar a reintegração do
Sr. Pedro Ernesto na direção do Distrito Federal. Há muitos burgueses que vivem
exclusivamente do dinheiro, pelo dinheiro, e com o dinheiro. Para ganhar
dinheiro, expõem-se aos maiores sacrifícios. Viver com dinheiro é para eles a
suprema ventura. Praticar as maiores torpezas por
amor ao dinheiro, constitui para eles gesto de vulgar bom senso.
Pareceria natural que essa gente visse no Sr. Pedro
Ernesto uma espécie de capeta, pronto a
perturbar a sua vida “gozada”. E que,
portanto, se não por amor ao Cristo, ao menos por amor ao ventre, estivessem
dispostos a lutar contra o grave perigo que constitui a entrega do governo
municipal da Capital do País a um assecla dos revolucionários de 1935.
A confusão de nosso ambiente político é, porém, tão
grande que poucos são os que pensam assim. Quase todos sacrificam seus
interesses mais fundamentais, os espirituais como os materiais, por uma pequena
vantagem política imediata. Pensam no dia de amanhã. Para depois de amanhã,
poderá vir o dilúvio. Pouco lhes importa. O que é necessário é organizar a vida
no dia de amanhã.
Deu disto um exemplo frisante a nossa Câmara
Municipal, quando aprovou uma moção de protesto contra a intervenção no
Distrito Federal.
Na Câmara Municipal, haverá talvez vereadores “cujus Deus venter est”. Mas há muitos
outros que timbram em dirigir suas adorações mais alto, aos pés puríssimos do
Filho de Deus. Como em todos os lugares, há na Câmara Municipal alguns “profiteurs”
de grande estilo. Mas há também idealistas de cuja sinceridade não nos seria lícito
nem agradável duvidar.
Idealistas e “profiteurs” estes por interesse, aqueles por idealismo,
deveriam ter silenciado ante a intervenção no Distrito Federal. Por mais altas
que fossem as razões políticas que militassem em prol
da moção, por mais nobre que fosse o espírito de autonomia que ditou a moção,
não é consentâneo com os legítimos interesses do povo brasileiro que se coloque
à testa do Distrito Federal a um comunista. Porque, não querendo ter um
interventor nomeado pelo Sr. Getúlio Vargas (o que realmente
não é agradável, e os paulistas o sabem melhor do que ninguém), os cariocas
correm o risco de ter, na pessoa do Sr. Pedro Ernesto, um ditador-mirim
governado pela III Internacional.
E o povo brasileiro não quer, não pode e não deve
concordar com isto.