Sob o pseudônimo de “Atahualpa”, um colaborador ou
redator de um diário desta Capital publicou um suelto favorável ao divórcio a vínculo. O suelto, considerado em si, é insignificante. No entanto, o que nos
interessou foi a circunstância de ser ele publicado em um jornal de altas
responsabilidades perante a opinião pública, pois que representa uma das mais
fortes e a mais tradicional das correntes partidárias do Estado.
O que o suelto
dizia era, em suma, o seguinte:
1) No Antigo Testamento, era admitido divórcio
seguido de novo casamento dos cônjuges divorciados;
2) Nosso Senhor Jesus Cristo aceitou o divórcio a vínculo, mantendo,
portanto, a tolerância admitida pela Lei mosaica;
3) A Igreja tolerou o divórcio até o Concílio de
Trento;
4) A decisão do Concílio, que condenou o divórcio a
vínculo, pode ser reformada e revogada por outro Concílio;
5) Em sã doutrina jurídica, o casamento só é valido
quando contraído por mútuo e livre consentimento. Cessando o recíproco
consentimento, isto é, desejosos os cônjuges de desfazer a união livremente
feita, deve cessar o matrimônio. E os cônjuges estão prontos para novo
casamento.
Não nos daremos o trabalho de refutar este conjunto
de fatos, alguns mal interpretados, e outros manifestamente falsos. O suelto de “Atahualpa” não merece refutação.
Mas interessa-nos sobremaneira fazer, a respeito do
suelto, algumas considerações.
Nas eleições de 1934, a maioria, senão a totalidade
dos candidatos a deputado pelo P.R.P., apoiava as
reivindicações católicas.
O programa do Partido prometia manter as conquistas
católicas inscritas na Constituição Federal. E, entre essas conquistas, ocupa
lugar de primeira plana a indissolubilidade do vínculo conjugal consagrada
especialmente por nossa Magna Carta.
Assim, pois, o P.R.P., quer pela sua direção
partidária, que é a guardiã do programa do partido, quer por sua representação
federal e estadual, é, ou tem obrigação de ser, contrária ao divórcio.
No entanto, o jornal do Partido publica um suelto que, não se limitando a pregar o
divórcio, prega francamente o amor livre.
Não se pode negar que o suelto em questão prega o amor livre. Quem afirma que o casamento
deve ser desfeito quando não há o mútuo desejo de manter a união conjugal, e
que a esse casamento desfeito se devia seguir novas núpcias, que outra coisa
faz senão pregar o amor livre, tal e qual ele se pratica na Rússia?
Todos nós sabemos que o P.R.P. conta, em seu seio,
com muitos católicos de valor.
Isto não obstante, o órgão do Partido, indócil aos
seus deveres para com o eleitorado católico do mesmo Partido, infiel ao
programa que o Partido mantém, e indiferente às convicções de muitos e muitos
dos próceres do partido, vem pregar o amor livre e ensinar que a Igreja não tem
razão ao opor-se ao divórcio a vínculo.
Quem não pode ver, em tudo isto, a precariedade do
apoio que nossos partidos políticos afetam prestar à Igreja?
Tais Partidos contam no seu seio com católicos de
valor. Repetimos essa afirmação mais uma vez, para tornar bem claro que não
pretendemos contestar essa verdade.
Mas é incontestável, pela atitude de seus próprios
órgãos jornalísticos que, em tais partidos, também há inimigos da Igreja muito
e muito influentes.
Na eventualidade de ter o Partido de optar pró ou
contra a Igreja, o que fará ele?
Ninguém o sabe. E ninguém pode prever se ele se
pronunciará pró ou contra Deus.
Realmente, se os católicos alistados em tais
Partidos nem sequer conseguem conter as traquinadas anti-católicas
dos seus jornalistas, conseguirão eles porventura conter todo o Partido?
Estamos certos de que se o Partido se pronunciasse
contra a Igreja, muitos dos católicos nele inscritos sairiam de suas fileiras.
Mas isto não contribuiria para orientar o Partido
para o bem. Pelo contrário, deixá-lo-ia entregue às correntes anti-católicas.
Fazendo essas ponderações, não temos o intuito de
hostilizar o P.R.P. Não é ele o único Partido que merece a observação que
fazemos a propósito do suelto de “Atahualpa”.
Pelo contrário, parece-nos que não há, em São Paulo, um único Partido que não
mereça idêntica censura, a propósito de alguma atitude análoga.
Não achamos, pois, que o P.R.P. é
pior do que qualquer outro Partido. Nem queremos ferir de qualquer modo uma corrente
merecedora, como outras correntes, de nosso respeito.
Entretanto, como não deplorar o ecletismo constante
que caracteriza, em matéria religiosa, nossos dois grandes partidos?