A visita dos quatro governadores que vieram
ultimamente a São Paulo deve ser, para todos os brasileiros, sem distinção de
Estado ou de partido, motivo de justo júbilo. Os sulcos da revolução de 1932
ainda estavam profundamente gravados na alma paulista. Uma prevenção latente
continuava a dominar o espírito público, a despeito das cortesias protocolares
e das gentilezas oficiais que foram restabelecidas entre São Paulo e o Brasil
depois da ocupação militar. Essa prevenção era um verdadeiro depósito
subterrâneo de dinamite. O menor incidente político, a menor exploração
jornalística seria capaz de lhe restituir, em poucos dias, a forma aguda de que
se revestiu a 9 de julho.
Ora, todos aqueles que amam com inteligência São
Paulo e o Brasil, compreendiam a delicadeza dessa tremenda situação.
No momento em que se vai ferir o próximo pleito
presidencial, os paulistas amantes de sua terra e de sua Pátria tinham todas as
razões para sentir uma particular apreensão. Tanto mais que uma insidiosa
campanha de origem comunista vinha criando, nos Estados do Norte e do Sul, uma
prevenção anti-paulista tão estúpida e imensamente
mais injusta do que a prevenção anti-brasileira de
alguns paulistas exaltados.
O intercâmbio de
visitas entre políticos brasileiros do Norte e do Sul, e políticos paulistas,
produziu neste assunto os melhores resultados. Realmente, ninguém ama o que não
conhece. Para a maior parte dos
brasileiros residentes às margens do Capeberibe,
do Amazonas ou do Chuy, os habitantes do Tietê são
irmãos desconhecidos, cujos hábitos, cujo progresso, cujo valor, lhe parecem
determinar uma atitude de orgulho insolente, incompatível com o convívio
fraternal de diversos Estados num único e grande Todo.
Por outro lado, o
paulista se supõe, muito freqüentemente, invejado, espiado, caluniado. Olha
seus irmãos não com a simpatia com que o morgado considera seus
irmãos mais moços e menos favorecidos, mas com o terror com que o capitalista
pensa na parentela invejosa, insaciável e caluniadora.
Essa situação, que descrevemos com a máxima
objetividade, fora criada - nunca é supérfluo repetir esta verdade - pelos erros
dos revolucionários de 30 e pela perfídia dos comunistas.
O intercâmbio entre os diversos Estados veio desfazer
esta impressão.
O paulista aprendeu a considerar o Norte como o que
realmente ele é: um repositório de riquíssimas tradições brasileiras e um
depósito de matéria prima com que o paulista, mais uma vez, construirá a
grandeza do Brasil.
O Nortista, conhecendo de perto a São Paulo, pode
sentir com que despretensão, com que simplicidade e eu diria quase com que
inocência o paulista se enriquece e enriquece o Brasil.
Principalmente, o Nortista e o Sulino puderam
sentir que a destruição estúpida e indizivelmente criminosa de São Paulo, que
alguns facínoras sonharam, representaria a destruição do coração do Brasil.
Depois destas palavras que provam à saciedade o
vigor de nosso sentimento brasileiro, e nosso sincero reconhecimento pela obra
de aproximação nacional a que o Governo de São Paulo está procedendo, seja-nos
lícito formular uma pergunta.
Durarão por muito tempo estas grinaldas tecidas
pela mão inconstante da política? Durará por muito tempo o eco dos banquetes
esplêndidos que reuniram em torno de uma mesma mesa brasileiros do Norte, do
Centro e do Sul, e durante os quais se trocaram as provas de carinho próprias a
irmãos brigados, que tinham saudades, uns dos outros?
Francamente, é lícito recear que tal não se dê.
Banquetes, discursos, gentilezas, podem desfazer muitas prevenções. Somos dos
primeiros a reconhecê-lo, e a reconhecê-lo com prazer.
Mas é insuficiente a simples obra de destruição das
intrigas políticas que separavam irmãos feitos para viver em paz.
É necessário, além disto, que se faça uma obra
positiva de amalgamação dos espíritos, dentro de uma
mesma mentalidade que, assegurando a unidade nacional, não prejudique as
peculiaridades regionais.
Essa obra, só a Igreja poderia fazê-la. E só ela a
fará.
Mas, em tantos discursos, em tantas solenidades, em tantos telegramas retumbantes, quem se
lembrou de fazer justiça à obra unificadora da Igreja? Quem se lembrou de lhe
reclamar mais uma vez o indispensável apoio?
Ninguém. Infelizmente, não tanto para a Igreja,
como para o Brasil.