Quem, em São Paulo, entende um pouco de geografia
humana e conhece a posição privilegiada que o Sr. Paulo Duarte ocupa no planalto
das mais elevadas rodas políticas da Capital, não pode deixar de ter atribuído
grande significação ao discurso com que S. Ex.a saudou o Professor Fernando de
Azevedo, no banquete que a este foi oferecido no Hotel Esplanada.
O Sr. Paulo Duarte é uma das figuras mais salientes
do antigo Partido Democrático. Extinto este, passou, com armas e bagagens, para o
Partido Constitucionalista.
E, atualmente, desenvolve atuação preponderante, preponderantíssima até segundo dizem, em altos setores da
administração.
Suas palavras, portanto, tem certa importância.
Principalmente quando se trata de depoimentos a respeito de nossos hábitos e
costumes políticos, o Sr. Paulo Duarte pode ser acolhido com autoridade
incontestável.
Ora, em um dos tópicos de seu discurso, S. Ex.a
confirmou, sem rebuços, a tese que o “Legionário” sustentou em seu último
número. Disse o jovem político que, nos arraiais de nossas grandes organizações
partidárias, numerosos são os elementos que assistem com um surdo desagrado a
intervenção dos católicos na política. Calam-se, disse o Sr. Paulo Duarte,
porque não querem desagradar os numerosos eleitores católicos. Chegam, mesmo, a
externar uma simpatia pelas coisas da Igreja, que está longe de corresponder a seus
sentimentos íntimos. Mas, IN PECTORE, não se desarma seu anticlericalismo.
Em violenta apóstrofe, desafia o ardoroso tribuno
os políticos invertebrados, que sorriem à Igreja com os lábios, enquanto os
dentes rangem de ódio, a que deitem abaixo a máscara. E a que lancem no rosto
dos católicos, enérgica e corajosamente, a luva que Paulo Duarte lhes atirou.
Há muito tempo vem o “Legionário” insistindo sobre
a felonia com que certos políticos procuram atrair as boas graças do eleitorado
católico: sorrisos à vontade, mas parcimônia absoluta quanto a qualquer medida
legislativa verdadeiramente útil à Igreja. Vem agora o Sr. Paulo Duarte, e
coloca-se ostensivamente em uma trincheira oposta à nossa. E, com a insuspeição
decorrente de seu gesto franco, desmascara os finórios que querem acender uma
vela ao diabo e outra a Deus.
Não pode ter melhor confirmação a tese do
“Legionário”.
* * *
Francamente, não deixa de ter suas qualidades o
discurso do Sr. Paulo Duarte, ao par de defeitos que foram apontados em nossa
seção “Sete dias em Revista”, na última edição.
Uma dessas qualidades, incontestáveis, é a
franqueza.
Em diversos tópicos de seu discurso, o Sr. Paulo
Duarte investe clara e ostensivamente contra a Igreja. Não faz como muitos que,
tramando constantemente contra ela, se manifestam em público através de frases
ambíguas e dulçurosas, em que um velho rancor procura
ocultar-se atrás de uma mal arquitetada linha de indiferença.
Tanto mais meritória é a franqueza do Sr. Paulo
Duarte que, estamos disto certo, ela obriga, em consciência, a duros
sacrifícios. É uma questão de “pont d'honneur”.
Todos os elementos dirigentes do Partido Constitucionalista tiveram conhecimento de seu discurso.
Presente à homenagem, estava até o Sr. Prefeito Fábio Prado.
Ora, o Partido Constitucionalista
não quererá, não poderá e não deverá, certamente, permitir que um dos seus
soldados invista clara e rudemente contra o programa do Partido. Nesse
programa, estão inscritas algumas reivindicações católicas. E o Sr. Paulo Duarte
arvorou-se em inimigo de tais reivindicações. A direção do Partido está, pois,
na obrigação de expulsar o Sr. Paulo Duarte. E o Sr. Paulo Duarte está na
obrigação de pedir demissão do Partido.
Tanto mais é isto certo quanto o Sr. Paulo Duarte
não rompeu apenas com o programa do Partido. Rompeu também com o Sr. Armando Salles de Oliveira. No seu discurso de Caçapava,
este último manifestou-se francamente favorável à influência “cristã” no
Brasil, irradiada sobre a vida doméstica, a vida econômica e a vida política. O
Sr. Paulo Duarte é contra essa influência. Logo está em desacordo com o
ex-governador do Estado, e com a situação dominante em São Paulo.
Ora, devemos crer, salvo prova em contrário, que o
Sr. Paulo Duarte tem demais amor às suas idéias, para não sacrificá-las às suas
vantagens. E que o Partido Constitucionalista e seu pró-homem,
que é o ex-governador do Estado, tem um amor tão grande ao seu programa que lhe
sacrificarão certamente o Sr. Paulo Duarte.
Se o Sr. Paulo Duarte pedir demissão do
Partido Constitucionalista, se romper com a situação
dominante, se abandonar os cargos que ocupa, etc., etc., terá escrito uma bela
página de nossa história política contemporânea.
E S. Ex.a o fará certamente. Porque se não o
fizesse, tornaria extraordinariamente fácil a crítica de seus adversários.
Realmente, que lhes diria ele quando o
interpelassem sobre as razões de sua permanência no P. C.?