Merece nossa mais séria atenção o discurso
proferido há dias pelo Santo Padre Pio XI em que S. S.
refutava os rumores, de origem nazista, conforme os quais o Vaticano se
mostraria mais empenhado em atacar o hitlerismo alemão do que o comunismo
espanhol, por já não dispor, hodiernamente, de forças para sustar a onda
vermelha que ameaça a civilização.
Há muito tempo que notamos, por parte de certas
correntes, uma atitude idêntica à do hitlerismo com referência a Igreja. E isso
não apenas no Brasil, mas em diversas partes do mundo.
Por mais inexplicável que isto nos pareça,
comunistas e direitistas estão tacitamente conjurados entre si no propósito de
contestar a eficiência da Igreja na salvaguarda da civilização.
Remontemos ao princípio. A partir de meados do
século passado, quando foi publicado o famoso “Manifesto” de Karl Marx, que foi o ponto inicial de todo o movimento comunista, a
Igreja tem sido a bigorna sobre a qual se tem desferido, sucessivamente, os
mais duros golpes das forças revolucionárias. Marx dizia que a Religião é o
ópio do povo, e que seria impossível levantar as massas contra a burguesia
enquanto vibrasse na alma popular o mais leve sentimento religioso. Todos os
escritores mais representativos do comunismo tem desenvolvido longamente a
mesma tese. E tem acabado por concluir que os obstáculos levantados pela Igreja
ao comunismo são tais, que sua cabal destruição deve ser visada por quantos se
empenham na destruição da família e da propriedade. Nem é por outra razão que
os comunistas, que se apoderaram da Rússia em 1918, trataram de destruir
radicalmente o espírito religioso do povo russo, atacando com particular
virulência os templos católicos estabelecidos em território russo.
Na época em que tais ataques eram feitos à Igreja,
isto é, há 20, 30 ou 50 anos atrás, eles eram de molde a apontá-la às massas
como fautora de tirania, sem que isto lhe acarretasse
o apoio da burguesia interessada em manter a ordem social vigente. É que os
preconceitos liberais de que estava eivada a burguesia a cegavam de tal maneira
que, embora seus próprios adversários lhe apontassem na Igreja a única tábua de
salvação, lhe repugnava escapar à voragem, abrigando-se à sombra da Cruz e
renunciando à dissolução sensual e à vida fácil que levava. Por esta razão, a
Igreja só tinha a perder com a campanha
que, contra ela, faziam os propagandistas revolucionários de todos os matizes.
A ordem era coisa odiada quase igualmente pela plebe revolucionária e pela
burguesia liberal. Apontar a Igreja como baluarte da Ordem era, pois, votá-la à
uma execração quase unânime.
Mas depois de 1918 os olhos se abriram à realidade,
e a reação anti-liberal começou a soprar em todas as esferas sociais.
Estudantes, operários, pensadores, industriais, artistas, militares, todos
começaram a compreender que era necessário romper de vez com os princípios do
liberalismo, e instaurar um movimento de reação, baseado em um sério amor à
Ordem.
E, com isto, inúmeras simpatias começaram a se
voltar para a Igreja, apontada pelos seus próprios adversários como o esteio de
toda a civilização atual e a suprema ordenadora espiritual e moral da
humanidade.
Compreenderam-no com admirável argúcia os comunistas.
E, para evitar que o movimento de reação anti-liberal beneficiasse à Igreja,
cessaram bruscamente de apontá-la como fautora de
tirania. Chegaram, mesmo, no refinamento farisaico de sua habilidade, a
silenciar completamente sobre o Catolicismo, como se ele fosse uma força
desprezível, incapaz de obter o triunfo da civilização ocidental, e a derrota
cabal dos asseclas de Marx.
De 1918 para cá, essa mudança de tática dos
comunistas em relação à Igreja se tem acentuado cada vez mais. Não podendo mais
atirar-lhe a pecha hoje gloriosa de mantenedora da Ordem, pois que assim a
apontariam à simpatia dos bem intencionados, fingem desprezá-la.
E, no entanto, as estatísticas do mundo inteiro
demonstram que o Catolicismo se tem desenvolvido espantosamente em todos os
países ocidentais e orientais, e que, se no século passado e no início deste,
ele poderia ser tido como perigoso pelos comunistas, ele constitui - do ponto
de vista humano - hoje em dia, um perigo mil vezes maior.
A despeito desta verdade, os comunistas
continuam a silenciar sobre a Igreja, afetando desprezá-la. E lançam altos
brados contra os partidos da direita, fascistas, hitleristas, integralistas,
como sendo o mais real obstáculo à sua ação subversiva.
Lentamente, vão se formando mal os espíritos a
respeito do assunto. E até entre católicos não é raro encontrar quem ache que,
se a Igreja não se apoiar sobre as direitas, estará irremediavelmente perdida.
Os partidos da direita tem contribuído para
reforçar esta impressão. Eles se apresentam como os únicos paladinos da
civilização e incitam os católicos a apoiá-los, sob pena de perecerem irremissivelmente. Dir-se-ia que o Catolicismo precisa,
como escora, do fascismo, do hitlerismo, dos “Croix de Feu”,
para se salvar. Ou a Igreja se protege à sombra das direitas, ou o mundo
desabará. Em mais de um setor da direita, o católico que não enverga camisa de
cor partidária é tido como relapso, judaizante, como maçonete.
O Santo Padre mostrou claramente que seria vã a
reação das direitas se não existisse no mundo a Igreja Católica e que é Ela, mais
do que qualquer outra força contemporânea, que escora ainda a civilização
atual, contra as investidas de seus adversários.
A primeira das obras de reação anticomunista deve
ser, pois, a Ação Católica. Subsidiariamente, faça-se ação política. E deverá
ser nítida e rigorosamente Católica, sempre que possível. E deverá ser apenas mitigadamente religiosa, quando não houver remédio.
E, a nosso ver, o Brasil está, não no segundo caso,
mas no primeiro. Em um Estado onde há 20.000 Congregados Marianos, em uma
Arquidiocese onde 150.000 pessoas estão inscritas em associações religiosas,
será necessário que a Igreja se ampare à sombra de qualquer grupo? Ou será
possível que os católicos se organizem independentemente de compromissos
políticos, para cooperar com as correntes sinceramente (acentuamos o valor
deste advérbio) anticomunistas, sem confundir-se ou deixar-se absorver por
elas?
Pensamos que sim.