Plinio Corrêa de Oliveira

 

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 "Folha de S. Paulo"

 

 

 

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22 de maio de 1980

O cavalo, a bruxa e o filhinho

Ponho em dúvida que, aqui ou acolá, na ampla área atingida publicitariamente pela "Folha", se esteja aglutinando o partido político cujo lançamento sugeri no último artigo: PDQNCP. São incontáveis os que, como eu, "não conseguem pensar" à míngua de dados informativos. Estão largamente presentes em todos os partidos políticos. E, ademais, constituem a muito grande maioria dos que preferem não entrar em partido algum. É que, para alguém se inscrever no PDQNCP, é necessário que não tenha vaidade. Pois o PDQNCP é o "Partido Dos Que Não Conseguem Pensar". E arranha a vaidade de todo homem (e mulher...) reconhecer que não consegue alguma coisa. Ainda quando essa coisa seja tão pouco lucrativa e tão subestimada quanto é, hoje em dia, o pensar.

De minha parte, mesmo sem entrar nesse partido, continuo a afirmar que, sem informações, não consigo pensar. Não me envergonho de não ter essas informações, porque não mas põem ao alcance fácil e cômodo, como eleitor, os órgãos públicos e privados aos quais cabe fazê-los. Que remédio, então? Pensar sem estar informado? Disto sim, eu teria vergonha. E quanta!

Contudo, em nossa época, anda tudo às avessas. E precisamente disto muita gente não se envergonha...

Por exemplo, vai se falando muito sobre reforma agrária. E quanta inconfessada desinformação noto nos que sobre ela discorrem...

A começar pela CNBB, sobre cujo documento "Igreja e problemas da terra" estou acabando de limar um estudo. A desinformação sobre a realidade brasileira está presente no documento de ponta a ponta. As parcas fontes mencionadas não cobrem a larga faixa das afirmações feitas. O documento aprovado em Itaici foge da realidade concreta, e regurgita de pressupostos gratuitos, como de generalizações vagas ou ambíguas, tudo num esforço de "conscientização" (para usar o jargão das inefáveis comunidades eclesiais de base) inútil. Sim, inútil, porque nosso povo, muito mais inteligente do que pensam os redatores do documento aprovado por 170 bispos, não aceita lorotas a não ser para fazer piada.

Digo tudo isto com os olhos postos nas afirmações concretas de "Igreja e problemas da terra". Muito de passagem acrescento que, do ponto de vista doutrinário, notei vários traços de influência marxista. E implicitamente de desinformação (para dizer só isso) da doutrina católica.

Quanto tal contrasta com os documentos eclesiásticos anteriores à era conciliar!

Essa mesma desinformação sobre o fato concreto, palpável, mensurável, "computadorizável", noto-o em todo vozerio que por aí se vai levantando sobre reforma agrária. Essa gente desinformada e tagarela terá consciência de que brinca assim com o futuro do Brasil? E de que uma reforma agrária feita no ar, com meros intuitos esculturais, pode trazer-nos mais riscos econômicos – e, por ricochete, sociais e políticos – do que uma bomba de hidrogênio?

Por exemplo, os agro-reformistas anelam para o Brasil um único tipo de propriedade rural: a pequena propriedade trabalhada idealmente só pelo proprietário e por sua família. Isto deveria ser assim tanto para a agricultura quanto para a pecuária. E indiferentemente para todos os tipos de solos de que consta nosso território de 8,5 milhões de quilômetros quadrados.

Se agora temos um país rico em diferenciações nascidas de quase quinhentos anos de experiências tenazes, ágeis, bem-sucedidas, tudo isto – inclusive o sucesso – deverá ceder lugar a um país esculpido como um imenso bloco em que tudo seja igual: as condições de fortuna, de mando, de educação etc. Bem exatamente como preceitua o marxismo.

Mas quais as experiências e as estatísticas capazes de demonstrar que esta tirânica igualitarização pode dar resultados melhores, ou pelo menos iguais, aos do regime atual? Não o dizem os agro-reformistas.

Pelo contrário. Quando alguém lhes faz essa pergunta, costumam responder com as cantilenas e invectivas habituais: quem não deseja a reforma agrária não se condói com a magreza e subnutrição do nordestino, com a vida subumana de tantos trabalhadores do campo pelo Brasil a fora etc. Para torná-los prósperos é preciso dividir tudo entre todos. Quem não o quiser não passa de capitalista egoístico, ou de vil escriba financiado pelas multinacionais que atuam na agricultura.

Ora, nada disto é resposta, e muito menos diálogo. É apenas xingatório no sentido mais exato da palavra, destinado a tapar a boca do adversário. Pormenor picante: em geral, precisamente os agro-reformistas são – com notável frequência – grandes entusiastas do diálogo... com os comunistas.

Admitamos que alguém se obstine em contra objetar. E pergunte, por exemplo, se para terras, climas e culturas tão variadas, é igualmente eficaz a mesmíssima estrutura agrária niveladora. Ou se, pelo contrário, o bom senso e a experiência provam que as dimensões da propriedade devem ser proporcionadas – como tudo no mundo – às realidades concretas nas quais existem. Para estas perguntas, o agro-reformista só teria diante de si uma saída. Essa consistiria em inundar o contraditor com estatísticas irretorquíveis, provando que agricultura e a pecuária dão gargalhadas da realidade concreta e vicejam igualmente bem em todo tipo de situações. Mas ninguém há que exiba estas estatísticas. E quanto à experiência dos países comunistas, ela tem provado clamorosamente o fracasso do igualitarismo agrário. Em sensacional livro que acaba de lançar na França, Nixon afirma que a reforma agrária soviética, ultrarradical e coletivista, acarretou um dos maiores genocídios da História! Se alguém toca no assunto, expõe-se a ouvir o realejo dos insultos funcionar novamente.

Cessado o realejo, restaria fazer ao agro-reformista mais uma pergunta: o que sabe ele sobre a experiência das pequenas propriedades que existem pelo Brasil a fora? São mais rentáveis para o agricultor e para o País do que a média e a grande propriedade? Que estatísticas e que análises ele oferece a este respeito? Ao alcance do homem comum não aparecem nem umas e nem outras. E a resposta é a mesma: toca o realejo.

Assim se desenrola a discussão agro-reformista na imensa massa de cidadãos desinformados deste País.

Com isto só lucram, evidentemente, os partidários de uma reforma agrária socialista e confiscatória. Em nosso País, campeia a desinformação, solta como um cavalo de proporções apocalípticas. Montada nesse cavalo passeia uma bruxa: a reforma agrária socialista e confiscatória. Esta percorre assim todos os espaços trazendo ao peito um filhinho que amamenta infatigavelmente: o comunismo.


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