Plinio Corrêa de Oliveira

 

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 "Folha de S. Paulo"

 

 

 

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10 de outubro de 1979

Prestes-PCB, tema secundário

Com o retorno dos exilados está se pondo em toda a sua atualidade o problema da liberdade para o Partido Comunista no Brasil. É explicável que leitores da "Folha se perguntem qual minha opinião sobre o assunto.

A essa pergunta, não é sem alguma perplexidade que respondo, pois não compreendo a dramaticidade do problema.

Bem ao certo, que alcance tem este resto de liberdade com que faltava brindá-lo? Já antes da abertura, os comunistas gozavam no Brasil de larga margem de franquia para fazer propaganda de suas idéias: livrarias literalmente abarrotadas de livros comunistas, a preços mínimos; redações de jornal notoriamente infiltradas de comunistas que punham seu "sal" no tempero ideológico de toda sorte de notícias e comentários; comunistas, enfim, em cátedras universitárias, em microfones de rádio ou nos vídeos de TV, na direção de atividades sociais e econômicas importantes, onde, por sua presença e por sua palavra, podiam disseminar largamente suas doutrinas.

Ademais, o imenso campo que lhes era assim dado é de alta valia estratégica.

E não é só. Enquanto os comunistas (com máscara ou sem ela) iam entrando, os anticomunistas militantes iam sendo apeados em larga escala.

* * *

Neste contexto, há tanta diferença assim, entre a liberdade muito ampla que desfrutavam e a liberdade total? Na imprensa, rádio e TV, os comunistas não podiam difundir abertamente suas idéias. Imagine-se que se ponham a fazê-lo amanhã. Durante quanto tempo poderão sustentar a nota? O povo brasileiro não é mesmo comunista. Os meios de comunicação centristas que comecem a fazer propaganda inequívoca do comunismo irão sendo marginalizados pelos seus leitores, ouvintes ou telespectadores. Aparecerão também, provavelmente, um – ou alguns – jornais comunistas. Uma pequena minoria vai lê-los. Mas com isso mesmo se ilharão da imensa maioria. Em suma, a meu ver, o comunismo tem possibilidade de expansão no Brasil, sobretudo na medida em que se infiltre, se esgueire, se disfarce e cochiche. A bonomia nacional suporta-o, vai-se habituando a ele, e por fim poderá talvez assimilá-lo. Porém, na medida em que o comunismo arranca a máscara, o brasileiro, que detesta caretas, vira-lhe as costas.

E o PCB? E o PC do B? Digo, antes de tudo, que desconfio da autenticidade da diferenciação entre um e outro, tanto quanto do antagonismo Rússia-China. O que quer dizer que desconfio muitíssimo. Mas deixemos isto de lado. É só agora que o PCB ou PC do B serão reabertos? Sorrio diante da pergunta. Pode alguém acreditar que toda a expansão consentida ao comunismo nos últimos anos não era articulada por uma direção única? E essa direção não era, por sua vez, dirigida por Moscou? Isso tudo não formava um virtual PCB ou coisa do gênero? Sem possibilidades eleitorais, é certo. Oh! Vantagem para o PCB! Se ele tivesse que se apresentar com legenda própria, que fiasco!

Prestes? – Sua importância junto ao público brasileiro é folclore. A meu ver, essa importância não é senão a que o capitalismo publicitário lhe conceda nos meios de comunicação social centristas. Ele só será manchete na medida em que o queiram.

Não digo que a passagem da liberdade ampla para o comunismo, à liberdade total, seja uma bagatela. Pretendo ainda voltar ao tema. Mas a dramatização do assunto me faz sorrir. Sorrio desconfiadamente, acrescento.

* * *

Pois talvez se possa vislumbrar nisto um jogo. Colocado assim na atualidade, o perigo comunista ostensivo desvia as atenções do público da linha de ação verdadeiramente perigosa, o comunismo infiltrado, ou o esquerdismo ambíguo mas empreendedor de certos inocentes úteis.

Por exemplo, assusta-me muito mais do que uma discurseira de Prestes, recente declaração do sr. Bispo d. Luciano Mendes de Almeida, secretário-geral da CNBB: "Não sou a favor nem contra o Partido Comunista, pois esta posição dependerá do grau de respeito de seus dirigentes aos valores fundamentais da pessoa humana".

Esta frase tem dois sentidos. O mais natural, o que o leitor mais facilmente entende, é que o comunismo não é necessariamente contrário aos direitos humanos e, sendo bons os dirigentes do regime comunista, este é perfeitamente aceitável, segundo o prelado.

Os defensores "à outrance" [debandados, n.d.c.] do "esquerdismo católico" podem entretanto encontrar na frase uma escapatória torcicolosa, forçada, mas enfim uma escapatória: d. Luciano teria subentendido que, sendo o comunismo contrário aos direitos humanos, só será aceitável na medida em que não for comunista. Por esta escapatória, escapa mesmo a defesa? Sou cético a respeito.

Assim, a frase de d. Luciano – inserta numa fofa e ambígua entrevista, na qual, em nome da liberdade de opinião democrática, ele quer que se proíba a todo o mundo de discordar da democracia – faz mais a favor do comunismo do que dez entrevistas ou arengas de Prestes. Pois, o menos que dela se pode dizer é que espalha a confusão.

Para o leitor desavisado, que até aqui considerava certa a incompatibilidade radical entre catolicismo e comunismo, tal confusão só pode enfraquecer a barreira ideológica que o protegia contra a propaganda comunista.

Só essa tirada do secretário-geral da CNBB vale portanto mais simpatias para um comunismo mascarado de não violento do que dez discursos de Prestes.

Entretanto, essa enormidade passou mais ou menos despercebida. Ao passo que se dava o maior realce aos problemas de Prestes, não-Prestes, PCB, não-PCB. É ou não é verdade que neste campo está um bem maior perigo?

Esse é o problema.

E a solução? – Não existe, dirá melancolicamente alguém. De minha parte protesto. Ela existe, e existe inteiramente, nas mãos de João Paulo II. Essas coisas, é indispensável que os brasileiros as comuniquem não só diretamente a ele, mas ao sr. núncio apostólico no Brasil.

É o que vou fazer, assim que tiver acabado este artigo.


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