Plinio Corrêa de Oliveira

 

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 "Folha de S. Paulo"

 

 

 

 

24 de outubro de 1982  Bookmark and Share

Para a corda de aço, escravos

Mais de uma vez, as circunstâncias me levaram a discrepar publicamente de S. Emncia. o cardeal D. Eugênio Salles. Fi-lo, entretanto, na tristeza de minha alma. Pois o coração do fiel leva-o normalmente a concordar, a submeter-se, a obedecer. E só razões muito graves podem determiná-lo a proceder de outra maneira.

Assim, não quero deixar passar a ocasião de manifestar meu aplauso a esta afirmação lúcida e nobremente franca, feita por S. Em.a.: "Se a Igreja no Brasil tivesse lutado como o cardeal Motta, o divórcio não teria sido aprovado" ("O Globo", 21-9-82).

Esta apreciação tão autorizada coincide precisamente com o que observei na "Folha de S. Paulo", acerca da insuficiência da quase totalidade das declarações episcopais contrárias ao divórcio, no momento em que a matéria candente era debatida no Congresso (cfr. artigos "Mas a CNBB não quis...", de 16-5-77; "Foguetório, e não bombardas", de 25-6-77: e "34-75-77", de 25-7-77).

A afirmação do Purpurado do Rio merece passar para a História...

* * *

Feito aqui este registro, permita-me o leitor que, contrariando o princípio da unidade de tema – essencial em todo artigo de jornal – mude resolutamente a barra, e enverede para assunto bem diverso.

Todos entenderiam que a "opção preferencial pelos pobres", tão alardeada pela "esquerda católica", houvesse de trazer um incremento às obras de caridade já existentes no País, e a fundação de outras e outras mais. Pois optar pelos pobres importa em ajudá-los... ou não significa nada.

Muito pelo contrário, um levantamento efetuado pela CNBB revela que, a partir de 1974, o número de obras de caridade católicas vem diminuindo. Naquela ocasião eram 12.487, no território nacional, e hoje são 10.236 (cfr. "Jornal do Brasil", 15-10-82). Não é de estarrecer?

Para isso, sem dúvida, a "esquerda católica" tem resposta pronta. Consiste em dizer que o empenho pelos pobres mudou de estilo e de campo.

De estilo: vai deitando cada vez menos ênfase nas obras de assistência social e de caridade, e vai deitando cada vez mais empenho na "conscientização" dos descontentes, na aglutinação deles e nos subsequentes movimentos de agitação de massas.

De campo: importa isto no paulatino abandono da caridade, em benefício do incitamento à tensão e à luta. De que luta? Obviamente da luta de classes... bem no estilo das Comunidades Eclesiais de Base (cfr. Plinio Corrêa de Oliveira, Gustavo A. Solimeo - Luiz S. Solimeo, "As CEBs... das quais muito se fala, pouco se conhece – A TFP as descreve como são", Editora Vera Cruz, São Paulo, 1982, 258 pp.). Só no estilo delas? Obviamente não, mas também no de Karl Marx, o implacável detrator da caridade cristã, e doutor da luta de classes.

Aí, Deus! Como isto tudo é óbvio. Doloridamente, tragicamente óbvio.

* * *

Mudemos a barra para ainda outro lado. Os estilos jornalísticos não devem ser camisas-de-força nos quais se metam necessariamente os jornais do mundo inteiro. Pois estes são feitos para o público, o qual é a grande realidade – perenemente interessante, inesgotavelmente variável, e, em cada país, transbordante de peculiaridades – para o serviço do qual o jornalista tem de adaptar-se.

Ora, há um costume brasileiro que deitou raízes desde o norte do Pará até o extremo sul do Rio Grande. É o da prosinha sobre assuntos atuais, tão frequentemente prévia às reuniões mais sérias e formais.

Assim, reputo que o gosto de muitos brasileiros se sente atendido quando, num artigo, um ou dois temas afloram de passagem, antes do grande tema essencial. Façamos, pois, uma quarta – e última – mudança de barra.

Muitos compatriotas consideram o capitalismo como um regime mais ou menos escravagista. De onde inferem que quanto mais se distanciem desse regime, mais se aproximarão da região ensolarada e utópica de uma liberdade total. Ou seja, nas praias do socialismo ou na terra firme do comunismo, pensa nosso caçador de utopias encontrar a realização de seu mito.

Tudo quanto é dito em sentido oposto, para esclarecer o eleitorado vacilante, importa especialmente nestes dias de escolha. Uma escolha que, se for errada, poderá facilmente converter-se no lance mais trágico até agora ocorrido na vida deste País.

* * *

Sirvo-me da documentação exuberante coletada pela analista política norte-americana Dra. Juliana G. Pilon, Ph. D., que a benemérita "The Heritage Foudation", de Washington, publicou há pouco (16-9-82).

Trata-se de um estudo sobre a construção do gasoduto de Yamal, imensa corda de aço na qual Moscou pretende enforcar tanto a Europa oriental quanto a ocidental. Pois tornará uma e outra dependentes do gás soviético para enfrentar os rigores do inverno.

O projeto Yamal será um dos maiores empreendimentos da Rússia. Custará cerca de 45 bilhões de dólares, e será financiado em sua maior parte com créditos ocidentais a juros baixos. Alguns desses créditos têm juros de apenas 7,5% (cfr. depoimento do especialista Roger W. Robinson, do Chase Manhattan Bank, in "Congressional Record", vol. 128, no. 65, de 25-5-82).

Alcançando por vezes o frio na Sibéria 50 graus abaixo de zero, compreende-se que o Kremlin não tenha conseguido preencher com trabalhadores livres grande parte dos empregos que a realização do projeto acarreta. As estatísticas oficiais da Rússia calculam em cerca de dois milhões os empregos não preenchidos na Sibéria. Considerando que há mais ainda a preencher nos outros ramos da construção pesada em território soviético, torna-se necessário o trabalho escravo nas obras que se realizam na Sibéria. Daí ter havido um encontro entre Brejnev e o chefe comunista vietnamita Le Duan. Do que resultou que o Vietnã pagaria suas dívidas para com o bloco soviético, não com dinheiro, mas com trabalho escravo (cfr. "Foreign Report" da revista "The Economist" de 17-9-82).

A denúncia do "The Economist" foi confirmada por idôneas e importantes organizações anticomunistas do mundo livre. E o trabalho da Dra. Pilon cita ainda, neste sentido, vários outros depoimentos esmagadores. A estes, haveria que acrescentar um importante artigo do senador norte-americano Bil Armstrong, de setembro de 1982, e o relatório da Associação de direitos Humanos de Frankfurt (Alemanha), de junho de 1982.

Mas sobre estes não há tempo para falar aqui... porque os dois dedos de prosa iniciais invadiram o espaço necessário. O que causaria indignação a leitores de qualquer país do hemisfério norte.

Não, porém, a hispano-americanos, nem a brasileiros...


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