"Folha de S. Paulo", 24 de março de 1977

Enquanto Carter faz sua barulheira...

Vai mar alto a atividade do presidente Carter em prol dos direitos humanos. Por isto, tem ela despertado comentários desencontrados.

Entre estes, não me parece supérfluo que o povo brasileiro conheça os de um católico tradicionalista. Ou seja, um católico apostólico romano empenhado especialmente em defender a única Igreja de Jesus Cristo, contra as mutações desfiguradoras que tenta infligir-lhe, de mil modos, o progressismo.

Tanto mais quanto - por razões que seria longo pormenorizar - a pendência entre progressistas e tradicionalistas não é alheia à "cruzada" do chefe do Executivo norte-americano. Com efeito, muitos progressistas encontram nesta a expressão genuína de suas aspirações internacionais. E eu, enquanto tradicionalista, a ela faço as mais sérias reservas.

Porém, não é do ponto de vista "progressismo x tradicionalismo" que me proponho analisar aqui o assunto.

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E, isto dito, entro diretamente nele.

O grosso da atenção e dos esforços de Carter se concentra na violação dos direitos humanos pelos governos de nossos dias. Mais especialmente, tem o presidente manifestado o propósito de garantir contra perseguições legais ou violências policiais as minorias políticas, religiosas ou raciais recalcitrantes.

Assim formulado em seus termos mais genéricos, esse objetivo é simpático. Embora concretamente se preste, não raras vezes, a interpretações e aplicações inaceitáveis. Tudo isto é tão óbvio, tantas vezes tem sido afirmado e negado, que não me deterei no assunto.

Desejo por em realce a estreiteza de vistas com que o jovial plantador de amendoim, eleito presidente da mais poderosa nação da terra vem encarando sua própria "cruzada".

Como veremos, deixa ele alheio a suas fulminações um campo no qual, a meu ver, se dá a mais ampla e grave violação dos direitos humanos registrada pela História do Ocidente.

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Por certo o leitor concordará comigo quando afirmo que o direito mais básico do homem consiste em conhecer, com os recursos naturais que Deus lhe deu, e com o auxílio da graça, a Verdade, o Bem e a Beleza.

Imagine, leitor, que houvesse uma máquina, um gás, ou outro meio científico capaz de penetrar em sua mente, falseando de modo irreversível o processo interior com que o sr. forma suas convicções, traça os rumos de sua existência e delibera sobre seus próprios atos. Imagine ainda que, em conseqüência, sua vida, teledirigida, passasse a ser mero perambular pelas trevas, sem jamais encontrar a Verdade, o Bem e a Beleza. E sem jamais acertar as suas cogitações e as suas vias com as cogitações e as vias do Divino Mestre. Neste caso, caro leitor, o sr. se sentiria mais defraudado, mais surrado, mais torturado do que qualquer vítima de Dachau ou da Lubianka, a qual, não obstante os maus tratos, conservasse interiormente a faculdade de elevar a sua mente e seu coração até Deus.O santo Pe. Maximiliano Kolbe que, num campo de concentração nazista, aceitou de morrer de fome numa câmara de morte para poupar um chefe de família, era por certo, dentro de toda a sua tragédia, um homem menos infeliz do que o seria outro que, gozando embora de bem-estar físico, fosse mentalmente "seqüestrado" e afastado de Deus por algum engenho mefistocientífico.

Tudo isto é claro entre nós, o leitor e eu. Pelo menos desde que, como eu, o sr. tenha fé. E ainda que o sr. não tenha essa Fé - a qual com toda a alma lhe desejo - é provável que o sr. entreveja que tenho razão.

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Ora, se não existe um gás ou um engenho moderno para operar o confisco de mentalidades do qual acabo de falar, é certo que existem métodos que suavemente, discretamente, continuamente, implacavelmente, alcançam neste terreno os resultados mais impressionantes.

Estes métodos constituem o operar da chamada guerra psicológica revolucionária. Importa esta em assestar sobre certo grupo social, certa área, ou então sobre um país inteiro, todos os métodos de propaganda próprios a modificar o pensar e o sentir dos homens a respeito de determinadas matérias.

Evidentemente não se trata de campanhas desabotoadas, nem de estrondos publicitários. Muito pelo contrário.

Nesta matéria, o método comunista consiste em atacar, por exemplo, a família. Não de frente, mas sorrateiramente. Pela corrupção dos costumes principalmente. Pois esta atrai as sensibilidades para prazeres vulcânicos, e em conseqüência, a vida de família vai parecendo enfadonha, a indissolubilidade conjugal insuportável, o divórcio uma necessidade, etc., etc.

Para destruir a propriedade, a guerra psicológica comunista mais sagaz não fala contra ela. Mas através de um noticiário torrencial e jeitoso, vai sistematicamente apresentando ao público todo assalariado como um explorado. De onde as sensibilidades acabam imperceptivelmente por ver, em todo patrão, um ladrão. E o pobre homem da rua que, em 1977, considera com horror o comunismo, pode ser conduzido, aos poucos, a pensar, em 1979 ou em 1980, exatamente como o comunista francês Proudhon: "A propriedade, eis o roubo".

Analogamente, a guerra psicológica revolucionária age contra a religião, a tradição, etc.

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Dou apenas e muito sumariamente estes exemplos, para acentuar quanto é contrária aos direitos humanos a guerra psicológica revolucionária movida pela Rússia e pela China, em todas as nações do mundo, ante a displicência geral, inclusive a do sr. Carter.

Com isto, à medida que os homens vão sendo "roubados" em seu pensamento, as nações vão sendo deterioradas em seu âmago, e o comunismo vai "embolsando" todo o gênero humano.

E o presidente Carter ocupa o tempo em pressionar as nações da América Latina, inspirado por não sei que propagandas. E em torno de sua pressão, se faz uma pressão publicitária imensa.

Bem poucos se dão conta de que, enquanto o presidente Carter dispara, com "bombos y platillos", sua ofensiva; enquanto o Brasil, bem como as nações irmãs sul-americanas, logicamente se defendem, e o mundo inteiro presta atenção; ... enquanto tudo isso se passa na parte mais em foco do palco político, a Rússia e a China continuam discretamente sua guerra psicológica revolucionária, achando excelente que Carter desvie as atenções gerais, com toda a sua barulheira.

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Sumário:

Direitos humanos, direitos humanos, quanta unilateralidade se comete em teu nome!

A mais ampla e grave violação dos direitos humanos da História do Ocidente: a guerra revolucionária psicológica movida pela Rússia e pela China em todo o mundo.

Como um gás imperceptível, ela opera hoje o confisco de mentalidade, modificando o pensar e o sentir dos homens. Os homens são "roubados" em seu âmago e o comunismo vai assim "embolsando" todo o gênero humano.