Plinio Corrêa de Oliveira
Artigos na "Folha de S. Paulo"
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3 de janeiro de 1977 Thiobacillus thiopharus Perdoe-me o leitor a banalidade da assertiva. Mas quando, por ocasião de uma queda, alguém sofre uma fratura e ao mesmo tempo arranha fortemente um braço, bem pode não perceber o arranhão. E este, não cuidado, está sujeito a infeccionar-se, e assumir uma gravidade maior do que a da fratura. Generalizando: o dano maior encobre por vezes o menor. E este pode, em dadas circunstâncias, superar em gravidade aquele. Foi essa reflexão que me ocorreu, ao ler uma notícia velha de três meses (como envelhecem depressa as notícias neste febril mundo de hoje), da revista "Time". Reproduz esta um despacho da AP de Trinidad, Port of Spain. Segundo a notícia, as novas e pequenas nações do Caribe que há algum tempo se tornaram independentes inauguraram regimes democráticos, parlamentares e multipartidários, segundo o estilo inglês herdado da Commonwealth. Contudo, esses regimes se deterioraram rapidamente, e derivaram para um socialismo agro-reformista e avançado. Algumas destas nações, tomando a dianteira na marcha para o abismo, já começam a se declarar marxistas. Sobretudo a Guiana Inglesa e a Jamaica. Assim, são catorze nações do Caribe que vão caminhado em fila indiana para o comunismo.
A contínua preocupação causada por Cuba no mundo anticomunista, tem evitado que a opinião ocidental tome nota dos arranhões que sofre o Caribe e contra eles reaja. E assim, também nesta zona, vai o comunismo avançando maciamente, silenciosamente, sem encontrar obstáculos. * * * - "Sem encontrar obstáculos"? - A expressão diz muito pouco. Quantas vezes esse avanço se dá com apoio dos próprios capitalistas, aliás tão injuriados e surrados pelos comunistas. Dir-se-ia que nos mais variados setores uma doença misteriosa vai minando as resistências anticomunistas. De sorte que o comunismo encontra diante de si inércias e complacências com as quais, no início do século, sequer ousaria sonhar. Essa observação me faz lembrar a notícia, lida há dias num jornal, de que um misterioso bacilo, o "thiobacillus thiopharus", está atacando a fundo, e portanto ameaçando de decomposição, os mármores que sustentam o famoso Palácio dos Doges de Veneza, bem como o convento de Santa Maria delle Grazie em Milão, em que se acha o afresco da "Última Ceia", de da Vinci. Parece que coisa análoga acontece com quase todas as colunas de mármore sobre a quais ainda se esteiam os restos de nossa civilização. * * * Será por isso talvez que Lenine, na previsão de um fato assim, e depois de ter vertido caudais de sangue na Rússia, prevenia seus sequazes quanto a um ataque decisivo contra as barreiras que o comunismo ainda não derrubara: "Adiai a operação até que a desintegração moral do inimigo faça com que o golpe mortal se torne possível e fácil; os capitalistas nos vão vender a corda com a qual os enforcaremos”. * * * Em um ponto, apenas, Lenine se enganou. Os seus sucessores não têm a necessidade de comprar essa corda. Os capitalistas lhe estão dando. Mais. Estão lhes pagando dinheiro, e muito dinheiro, para que a aceitem. - Que corda é esta? Bem entendido, é a dos empréstimos, das compras feitas e jamais pagas, do favorecimento propagandístico etc., com que, depois da visita de Nixon à China, quase todas as nações poderosas do Ocidente vêm favorecendo o mundo soviético. Ao mesmo tempo em que este, assim nutrido, pode acumular as reservas que teria de gastar para evitar um agravamento da fome, e portanto uma imensa revolução. E em seguida desviá-la para se super-armar, rompendo o equilíbrio militar mais ou menos existente, até aqui, em relação ao Ocidente. * * * Muitos não veem isto e não se importam. São cegos. Mais cegos ainda são os que veem mas também não se importam. E são multidão. Como explicar essa cegueira suicida? - "Thiobacillus thiopharus"... * * *
Permito-me pelo menos a alegria de terminar este artigo com um elogio a um bispo. Trata-se do Mons. François Xavier Nguyen Van Thuan, bispo auxiliar de Saigon, que, segundo o "Denver Catholic Register" de 23 de junho p.p., foi atirado a uma prisão secreta pelos comunistas, os quais lhe exprobravam a oposição que fazia à invasão progressista "na liturgia e nas organizações de Padres". O prelado foi encerrado na vila de Cay Vong, mas quando os cidadãos começaram a visitá-lo, e pedir seus conselhos, foi transferido para uma prisão secreta. A singeleza desta narração é natural. Por que gastar adjetivo para explicar a veneração, o afeto, a ufania que todo católico verdadeiro sente quando tem notícias de um bispo, de um sucessor dos Apóstolos que resiste? Nestes dias em que ainda se sente o aconchego espiritual do Santo Natal, lembremo-nos da solidão e do padecimento deste verdadeiro Pastor atormentado pelas garras do satanás soviético. E rezemos um Magnificat e uma "Salve Rainha". Um Magnificat pela coragem que Deus lhe deu. Uma "Salve Rainha" para que a Mãe de Misericórdia lhe obtenha ainda mais coragem, até a vitória na terra ou no Céu. |