Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

 

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25 de março de 1973 

Caixas de sapato: boas urnas de eleição? 

Logo em seguida à apuração das eleições realizadas em seu país, a TFP platina publicou em "La Prensa" e outros diários portenhos, um manifesto que a História séria e imparcial registrará de futuro – segundo me parece – como documento essencial para a compreensão do que se vai passando no país irmão.

O ponto de vista em que se situa esse lúcido e corajoso documento, é a um tempo claro e subtil. Espero enunciá-lo em algumas frases. Perón é o homem escolhido pelos propulsores da "revolução com liberdade" para arrastar a Argentina pelas mesmas vias por onde vai descambando o Chile de Allende. Dado que o velho caudilho não dispõe mais do prestígio de outrora, tornou-se necessário fazer toda uma manobra política a fim de empurrar rumo a ele importantes setores eleitorais não peronistas. O grande instrumento da manobra foi o Presidente Lanusse. A péssima administração deste – atente-se, por exemplo, para a inflação galopante ante a qual ele vem sendo de uma ineficácia estridente – levantou no eleitorado profundo descontentamento. A atitude teatralmente antiperonista do General Lanusse teria levado assim grande parte dos descontentes a votar em Perón, a título de protesto. Ademais, o antiperonismo acintoso de Lanusse uniu em torno de Perón o justicialismo, de há anos gravemente dividido. Mas, de outro lado, e num plano mais discreto, o Presidente Lanusse tomou várias outras medidas realmente úteis a Perón.

A tudo isto acresce que a divisão e a moleza dos "marechais" civis dos partidos antiperonistas, a divisão das correntes centristas, que lançaram cada qual seu candidato (cinco ao todo) face ao Peronismo unido, o apoio discreto mas autêntico dos "sapos" e de uma boa parte do Clero a Perón, constituíram outros tantos fatores que serviram à aglutinação de um eleitorado majoritariamente antiperonista em torno de Campora, o "homem de palha" de Perón.

Esta visão das coisas, não a apresentou a TFP argentina ao público apenas depois da eleições, e só para explicar "vaille que vaille" a vitória do candidato esquerdista. Ela a foi desenvolvendo bem antes das eleições, numa série de publicações largamente vendidas ou distribuídas nas vias públicas de Buenos Aires e de toda a Argentina, e também noticiadas ou reproduzidas na imprensa portenha e das Províncias. E isto, sempre com a acolhida simpática de incontáveis transeuntes, ou leitores de jornal.

Entre estas publicações se destaca penetrante e muito documentado "Los Kerenskys Argentinos" (aparecido em julho de 1972), devida especialmente `pena brilhante de Cosme Beccar Varela Filho. São também de se mencionar os seguintes manifestos: “Ver, Julgar e Agir" (de setembro-novembro de 1971) e "Direito de abstenção: arma de autenticidade" (de janeiro de 1973). A quem se interesse especialmente por estudar em seu texto essa importante série de análises da situação argentina, a TFP brasileira pode por-lhe ao alcance toda a documentação dada a lume pela valente coirmã daquele país.

* * *

Foram só estas, as causas da magérrima vitória de Perón?

Não. Sobre a própria regularidade das eleições, o manifesto assinado pelos dirigentes da TFP argentina fornece dados de estarrecer. Transcrevo textualmente o que ele contém a respeito:

"No que se refere às urnas, todas as notícias dos jornais e relatórios de presidentes de mesa afirmam que elas eram insolitamente pequenas; que a abertura para introduzir as cédulas estava absurdamente colocada de lado e não na parte superior, como seria lógico; que por expressa autorização das autoridades eleitorais, as urnas, quando cheias, eram violadas para ajeitar as cédulas, ou mesmo para tirar algumas, guardando-as em outro lugar; e inclusive que, por esse mesmo motivo, ou então porque as urnas nem sequer chegaram às mesas, a votação foi realizada até em caixas de sapato ou sacolas de plástico (ver "Cronica" e "La Prensa" de segunda-feira, 12 de março).

"Um jornal da Capital chega a dizer que este pleito "mostrou facetas realmente insólitas, como não se tinha visto em outros..." e que os fatos acima citados "provocaram protestos irados dos eleitores que, enquanto tais, se sentiam frustrados e ludibriados..."

"A história imparcial do futuro recusar-se-á a reconhecer a estas o caráter de eleições sérias, pois, onde há urnas violadas, não existe verdadeiramente eleição.

"(...) Os dirigentes antiperonistas deveriam estar denunciando estes fatos e exigindo do Governo uma investigação e um esclarecimento exaustivo a respeito das anomalias nas urnas e na contagem dos votos; deveriam estar exigindo o segundo escrutínio, para salvar o país de um drama espantoso como aquele em que hoje está o Chile submergido na miséria e na opressão. No entanto silenciam ou, se falam, é para "admitir" uma derrota inexistente, e até para somar-se à aparente conspiração oficial que tende a suprimir o segundo escrutínio".

* * *

Não compete à TFP brasileira tomar posição oficial ante este desconcertante conjunto de anomalias. Entretanto, isto de urnas violadas em larga escala, e de votos depositados em caixas de sapato, é coisa realmente de embasbacar...

Parece-me importante que o público brasileiro junte esses dados aos outros – tão numerosos – que a imprensa nacional tem publicado sobre os acontecimentos na vizinha nação. Pois sem eles ficaria realmente incompleta sua visão das coisas.

Encerro esta nota informando que, publicado o manifesto contendo estes dados impressionantes, o telefone da sede da TFP de Buenos Aires não teve repouso. Diariamente os chamados oscilaram entre 100 e 150. Quase todos de apoio. Alguns narrando irregularidades, outros raros, lançando contra a TFP catadupas de ameaças e injurias anônimas, perfeitamente no estilo de que fazem os adversários da TFP em outros países...


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