Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

 

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25 de fevereiro de 1973 

No clima de pós-Assembléia 

A recente Assembléia Geral dos Bispos se realizou num clima de expectativa geral. Entre outros fatores para tal, estava a difusão – feita pela TFP – da momentosa Pastoral de D. Mayer sobre os Cursilhos de Cristandade. Corriam boatos de que a CNBB iria publicar um estrondoso elogio ao Movimento Cursilhista, juntamente com uma ainda mais estrondosa condenação da TFP.

Afinal, publicado o comunicado da Assembléia, verificou-se que, no tocante aos Cursilhos, os prognósticos, ativamente postos em circulação pela propaganda cursilhista, eram quase inteiramente sem fundamento. Os Srs. Bispos inseriram em seu comunicado final tão somente esta referência simpática aos Cursilhos: "Merece o Movimento dos Cursilhos de Cristandade uma palavra de estímulo, sobretudo nesta hora em que surgem objeções a seus propósitos de fidelidade a Cristo e a Sua Igreja. Será ele tanto mais desejado e aplaudido quanto mais se identificar com o espírito do Evangelho. Vem sendo em nosso meio um despertador de energias cristãs adormecidas e um apelo de Deus à generosidade dos apóstolos leigos".

Um leitor arguto bem pode ver nestas palavras, que o Episcopado deixou claro que 1º) não endossa a Pastoral de d. Mayer; 2º) mas também evita de afirmar que no Movimento Cursilhista não se infiltraram os erros apontados pelo Bispo de Campos.

É isto bem diferente do estrondoso elogio tão esperado...

Quanto à TFP, nenhuma palavra. O que, por sua vez, constitui um resultado ainda mais diferente da condenação tão sofregamente anunciada!

* * *

Estas observações servem de fundo de quadro para o tema do presente artigo.

Como acabamos de ver, a intenção manifesta da Assembléia dos Bispos foi de ser comedida e discreta. Ora, quem, ante uma situação de grande expectativa, toma tal atitude, visa evidente pôr água na fervura.

Assim, parece-me óbvio que aqueles Srs. Bispos que, depois da reunião, tiveram ácidas palavras de antipatia contra a TFP, agiram em sentimento oposto ao espírito e às intenções da Assembléia. O que é tanto mais de lamentar quanto, pronunciando-se logo após o encerramento da mesma, davam ao público a impressão de que falavam em nome dela.

Nesse sentido, é de estranhar especialmente a entrevista dada à imprensa por D. Ivo Lorscheiter, Secretário Geral da CNBB. D. Lorscheiter disse aos jornalistas que a Assembléia não condenara a TFP por três motivos. Dois deles, já os examinei em meu último artigo. Restava um terceiro. Analisemo-lo.

Segundo D. Ivo, o Episcopado silenciara sobre a TFP porque, se nos condenasse, causaria a impressão de que temos uma importância maior do que a real. Data vênia, duvidamos da objetividade da informação prestada por D. Ivo. A TFP é uma organização da qual se fala de norte a sul do País. Todo o rebuliço feito por certa imprensa sobre nossa augurada condenação prova a amplitude do público que tem seus olhos voltados para nós. Não creio que esse público crescesse ainda mais só pelo fato de a TFP ser objeto de um ou dois parágrafos no comunicado da XIII Assembléia dos Bispos.

Há mais. A ser objetiva a informação dada por D. Lorscheiter, o que ficaria provado não é a falta de importância da TFP, mas sim o declínio do prestígio da CNBB. Pois seria preciso que esta última estivesse muito desfalcada da influência que a ordem das coisas lhe confere, para que o próprio ato pelo qual estigmatizaria nossa associação nos acrescesse a popularidade.

É tudo isto tão abstruso, que prefiro admitir que os jornalistas a quem D. Ivo falou não interpretaram bem suas palavras.

* * *

D. Serafim Fernandes de Araújo, Bispo auxiliar de Belo Horizonte, foi muito além de D. Ivo. A dar crédito ao "Diário de Minas" de 17 do corrente, D. Serafim teria afirmado que todos os Bispos presentes à XIII Assembléia condenaram a TFP. Essa afirmação lembra um passe de mágica: uma jarra está cheia de um líquido escuro, e quando se entorna seu conteúdo num copo, o líquido flui claro. Todos os Srs. Bispos estariam cheios do propósito de condenar a TFP. Mas o comunicado final, com a palavra oficial deles, não continha essa condenação!

Logo em seguida a essa estranha assertiva, vem entre aspas a seguinte declaração de D. Serafim: "Houve algumas divergências quanto a esta organização. Uns bispos acham que se deve dialogar com a TFP. Outros acham que devemos esquecê-la, pois seus membros não admitem diálogo". Ainda aqui ofereço a D. Serafim dar-lhe a prova de que somos abertos ao diálogo, e de que mais paternalmente andaram os Srs. Bispos que não se prestaram a nos atacar do que os que resolveram "esquecer-nos".

Esse "esquecimento", aliás, me parece inexplicável. O bom pastor do Evangelho não "esquece" ovelha alguma. Pelo contrário, vai ao encalço de qualquer delas, por mais tresmalhada que seja. Foi esse o princípio que vários Srs. Bispos alegaram para ir às prisões visitar padres e leigos contra os quais pesavam as mais graves suspeitas (ou mais do que isso...) de terrorismo.

E precisamente quanto à TFP, vítima do terror e propugnadora dos princípios que os terroristas negam de bomba na mão, esses Srs. Bispos, conhecidos de D. Serafim, preferem "esquecer".

Ai de nós! Sobretudo, ai deles! quando o Bom Pastor vier pedir-lhes conta de cada uma de suas ovelhas.

* * *

É com especial respeito que menciono o nome do Cardeal D. Scherer. Com respeito e com dor, porque também S. Emcia. fez à imprensa (cfr. "O Estado de São Paulo, de 20-2-73) afirmações que não posso deixar sem reparo. Asseverou S. Emcia. que a TFP constituía assunto que "não estava em pauta" na reunião. Ora "O São Paulo" de 17/23-2-73 (pág. 5), órgão oficial desta Arquidiocese, publicou a dita pauta. E nela se lê o seguinte: "A pauta de assuntos a tratar, a pedido de vários Bispos presentes, foi aumentando de mais sete pontos". Segue-se a lista desses pontos. Em sexto lugar leio: "a TFP".

Aliás, vários órgãos da imprensa publicaram até a notícia de que a Assembléia constituíra uma Comissão integrada por D. Gilberto Pereira Lopes, Bispo de Ipameri (Goiás), D. Serafim Fernandes de Araújo, Bispo auxiliar de Belo Horizonte, e D. Antônio Afonso de Miranda, Bispo de Lorena, para estudar especialmente a TFP. E, mais ainda, outros senhores Bispos, antes mesmo que a Comissão iniciasse seus estudos, se puseram a prejulgar o assunto, fazendo declarações à imprensa contra a TFP.

Não compreendo, pois, como pôde o eminente Purpurado gaúcho estar mal informado a ponto de dizer que não estávamos na pauta da Assembléia.

Menciona ainda D. Scherer nosso alheamento face aos "planos pastorais" adotados nas Dioceses.

Como entidade cívica que somos, não temos nenhuma obrigação de nos encaixar em tais planos. Entretanto, faço aqui uma declaração. Não conheço um só plano pastoral diocesano desenrolado no âmbito da CNBB, que comporte campanhas abertas, frontais e corajosas contra o comunismo. Se houver algum plano assim, e o respectivo Sr. Bispo queira nossa cooperação para essa finalidade, é só dizê-lo. Ali estaremos alvissareiros à sua disposição. Se algum leitor souber de algum Bispo que tenha um plano assim, peço encarecidamente que nô-lo comunique.

* * *

Impressiona tristemente o que há de contraditório nessas vozes de pós-reunião dos Srs. Bispos.

Quando os historiadores de nossos confusos tempos se derem conta de todo esse caos, hão de ficar desconcertados. Mais ainda os desconcertará, entretanto, um outro ponto.

Por que – perguntar-se-ão eles – falar com tanta naturalidade de uma condenação da TFP?


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