Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

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Folha de S. Paulo, 28 de janeiro de 1973 

Ferve o cursilhismo 

Ferve por todo o Brasil a dissensão sobre os Cursilhos. Nas mesas da TFP se empilham os dossiers contendo manifestações pró e contra o Movimento analisado na momentosa Pastoral de D. Antônio de Castro Mayer.

Talvez seja interessante publicar algum dia, com base nessa opulenta documentação, uma analise do que são, entre nós, a mentalidade cursilhista e a anticursilhista. Sem me antecipar a tal estudo, aqui registro que a contra-ofensiva cursilhista se distingue por três características: açodamento, padronização e vacuidade.

Açodamento: a maior parte dos que se pronunciam a favor dos Cursilhos, fazem-no como quem está perdendo o fôlego. Tem-se a impressão de que não encontram palavras suficientes para exprimir sua sofreguidão, seu pânico, sua indignação. Dir-se-ia que os conceitos, os argumentos e as palavras se lhes atropelam na garganta, tal a pressa com que procuram saltar sobre a Carta Pastoral... e os que a difundem.

Sob o impulso do açodamento, cada qual se agita a seu modo. Esta asserção, resultante da própria natureza das coisas, não vigora quando se trata dos pró-cursilhistas. Pois de modo geral, eles dizem as mesmas coisas, e evitam igualmente de dizer outras. Assim, eles repetem exatamente os mesmos argumentos (os Cursilhos são bons porque eles os conhecem por dentro, etc., etc.). E ignoram desenvoltamente as esplendidas respostas que lhes deu o pastor campista, em artigos e entrevistas de meados deste mês. De outro lado, eles evitam, por exemplo, com a maior cautela, de afirmar ou negar taxativamente serem falsos os mais de 50 documentos cursilhistas em que D. Mayer estriba as suas críticas.

A esse propósito, é especialmente divertida a uniformidade com que os próprios cursilhistas repetem que quem não fez Cursilhos não pode julgá-los. E que quem os fez só os pode julgar bem. Dir-se-ia que os Cursilhos são algo de esotérico. Imprimem para uso externo coisas que nem seus apologistas ousam defender. Mas dizem e fazem, dentro de quatro paredes, coisas esplendidas, em contradição com o que publicam. Seriam sepulcros com a caiação do lado de dentro...

Parece que os corifeus do cursilhismo argumentam todos segundo um mesmo figurino.

* * *

Para documentar a vacuidade da apologética cursilhista, permito-me citar – com respeito e tristeza – um argumento alegado por não poucos Prelados contra a campanha de difusão da Pastoral.

Esses Prelados se proclamam entusiastas dos Cursilhos de suas respectivas Dioceses, e concluem que difundir nestas a Pastoral de D. Mayer importa num acinte contra eles. Pois a Pastoral ataca o que eles proclamam ótimo!

Sem entrar em consideração de outros aspectos desse argumento, seja-me dado lembrar que ele peca pela base. D. Mayer não entra em contradição com esses Prelados: e isto pura e simplesmente porque, em sua Carta Pastoral, não cuida dos Cursilhos nas Dioceses deles.

D. Mayer afirma simplesmente, e de modo genérico, que dentro da vasta rede dos Cursilhos brasileiros, alguns estão infectados de erros, e outros não. Com que fundamento aqueles Srs. Bispos pró-cursilhistas imaginam que os Cursilhos de suas Dioceses – tão excelentes, segundo eles – estão mencionados na Pastoral como infectados? Em que página da Pastoral está isto afirmado? – Não poderão dizê-lo.

Por este exemplo se vê quanto carece de conteúdo a apologética pró-cursilhista.

* * *

Mudemos agora, algum tanto, de assunto.

As reflexões anteriores nos levam a tratar dos Cursilhos de Burgos.

Em artigo recente, mencionei uma carta escrita por um grupo de cursilhistas à revista "Vida Nueva". A carta reclamava contra graves e severas medidas tomadas pela autoridade arquidiocesana contra sacerdotes dirigentes dos Cursilhos, e contra os próprios Cursilhos. Posteriormente, chegou-me a informação de que o presidente do Secretariado Diocesano dos Cursilhos de Burgos desmentira essas informações. Por dever de lealdade, também disto dei conhecimento aos leitores. Prometi-lhes, ao mesmo tempo, que procuraria novos informes sobre o assunto. Passo a dá-los.

Com efeito, o Secretariado Diocesano dos Cursilhos de Burgos redigiu uma nota, publicada por "Vida Nueva" a 16 de dezembro p.p. Tal nota visava ser um desmentido da carta anteriormente estampada na mesma revista. Na realidade, muito segundo o estilo cursilhista, a nota não desmentiu grande coisa.

Quanto à remoção de dirigentes, disse ela que um franciscano e um jesuíta da equipe sacerdotal diretiva foram transferidos por seus superiores para outras cidades, nas quais estão ocupando cargos diferentes. Em si, o fato não desmente a culpabilidade dos sacerdotes, pois a remoção de um religioso não tem, necessariamente, significado abonador, nem desabonador. Remove-se um padre, tanto para destiná-lo a mais alta tarefa, quanto para afastá-lo de um cargo em que sua atuação é censurável.

A suspensão das Escolas e Ultreyas, acrescenta o comunicado cursilhista, foi feita pelo próprio Secretariado e não pela Arquidiocese. Com esta informação, o comunicado visa desmentir que a medida tenha sido tomada a título punitivo pelo Arcebispado. Também este argumento nada conclui. Acontece freqüentemente que a autoridade diocesana, em lugar de agir diretamente contra uma associação com a qual esteja descontente, incumbe discretamente à própria direção da sociedade de tomar as medidas punitivas adequadas. Para se defender, seria indispensável que o Secretariado dos Cursilhos declarasse quais os motivos que o levaram ao fechamento das Escolas e Ultreyas. E isto, ele evitou cautamente de o fazer.

Bem analisado, o comunicado mais dá motivos para desconfiar dos Cursilhos do que para confiar.

* * *

Outro documento que igualmente não depõe a favor dos Cursilhos é uma carta de quatro cursilhistas, publicada na revista "Vida Nueva", no mesmo número de 16 de dezembro. Trata-se de missivistas que dão os respectivos nomes, e assumem assim toda a responsabilidade pelo que dizem. Solidarizam-se eles com os cursilhistas anônimos, cuja carta "Vida Nueva" havia publicado em 11 de novembro. E afirmam, por sua vez, que o diretor (eclesiástico) de Cursilhos fora destituído, as Ultreyas suspensas, etc.

Ao mesmo tempo, queixam-se os autores desta segunda carta de que a Hierarquia da Arquidiocese só mostrava, em relação aos Cursilhos, "indiferença ou receio", e asseveram que do mesmo modo são vistos outros grupos católicos "vanguardeiros", como a JOC-HOAC.

Em conseqüência, reclamam pelo fato de que as medidas contra os Cursilhos foram tomadas sem ouvi-los, com prejuízo do princípio da "co-responsabilidade" inerente à fase pós-conciliar. O que deixa entrever que atribuem as medidas contrárias aos Cursilhos, não ao Secretariado deste, mas à autoridade arquidiocesana.

Por fim, ainda no dia 16 de dezembro, "Vida Nueva" publica uma terceira carta, também ela assinada por quatro cursilhistas. O documento lança uma interpelação virtual ao Arcebispo de Burgos. Por que são perseguidos naquela Arquidiocese os sacerdotes da linha pós-conciliar? Porque a Arquidiocese, destituído o diretor de Cursilhos, deixa por quatro meses vago o cargo?

Tudo isto mostra que o presidente dos Cursilhos de Burgos quis tapar o sol com a peneira, com seu ardiloso comunicado.

* * *

O interesse de todas essas informações sobre a crise cursilhista em Burgos consiste, para o povo brasileiro, em mostrar que são tão verazes as afirmações de D. Antônio de Castro Mayer sobre certos Cursilhos, que até bem longe de nosso País este movimento desperta inquietações análogas.


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