Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Artigos na

 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

  Bookmark and Share

Folha de S. Paulo, 17 de dezembro de 1972 

Nunca tantos sofreram tanto de um só 

Durante a semana passada, uma série de desmoronamentos se operou no que fora a linha da resistência do mundo civilizado contra a dominação do Pacífico pelos russos e chineses.

O elemento capital dessa linha era o arquipélago japonês. Como se sabe,  Tanaka imprimiu uma rotação fundamental na política exterior de sua pátria, em virtude do que esta começa a passar, de nação anticomunista, a satélite comercial e político de Pequim. Nas recentes eleições realizadas no Japão, o eleitorado aprovou maciçamente essa desastrosa mudança. O partido de Tanaka elegeu uma cômoda maioria. E essa maioria só não foi mais durável porque uma parte do eleitorado resolveu abandonar as hostes conservadoras, para votar em favor dos Partidos Socialista e Comunista. Assim, enquanto o partido governamental perdeu 17 cadeiras, o PC, que contava no Parlamento anterior com 14 cadeiras, passará a dispor agora de 38, e o PS, que tinha 90 cadeiras, passará a ter 118.

Bem entendido, ainda não se trata de uma catástrofe integral. A nação ainda não está no abismo. Mas caminha inteira para ele, tendo na vanguarda dessa marcha os comunistas!

* * *

Há dias a imprensa noticiava que na Coréia do Sul - até há pouco baluarte heróico da luta anticomunista - uma consulta eleitoral mostrou que 92,3 % do povo é a favor de um entendimento com a Coréia do Norte. Um arranjo entreguista do gênero Willy Brandt, com a correlata vantagem para os comunistas.

Na Nova Zelândia, o governo trabalhista anunciou sua intenção de retirar os expedicionários que mantém no Vietnã do Sul, e de paralelamente abandonar a Organização do Tratado do Sudeste Asiático (SEATO), bloco de nações anticomunistas do gênero da NATO.

Apenas não se percebem sinais de desalento e entreguismo em Formosa e nas Filipinas. - Quanto tempo durará a atitude corajosa dessas duas nações? É preciso reconhecer que, de momento, tudo conspira para lhes abalar a firmeza de propósito. De nossa parte, pedimos a Deus onipotente que lhes dê valentia, força e vitória. E aos ocidentais, clarividência e valor, para os ajudarmos em toda a medida de nossas forças.

* * *

Essa prece é especialmente necessária considerando-se as profundas preocupações inspiradas pela situação no Vietnã do Sul. A paz que está sendo imposta ao governo de Saigon ameaça ser, muito provavelmente, uma capitulação ante o comunismo. Os valentes sul-vietnamitas continuam a reagir. - Mas o que poderão alcançar contra as três superpotências conluiadas, EUA, Rússia e China? Também aqui nos compete rezar segundo as intenções que há pouco enunciei.

* * *

Significação ainda maior tem a vitória esquerdista na Austrália. Em princípios deste mês, o Partido Trabalhista venceu, por maioria esmagadora, as eleições parlamentares, reconquistando o poder do qual estava afastado há 23 anos. Os comentadores políticos conjeturam que os esquerdistas australianos diminuirão ou suprimirão o empenho das tropas de seu país no Vietnã do Sul e desligarão a Austrália da SEATO. A maior potência da Oceania deixará de ter assim um papel de baluarte anticomunista, e se disporá a seguir, por sua vez, a triste trilha do Japão.

* * *

Não se pense que esta série de catástrofes, umas já realizadas, outras em vias de realização, correspondem a uma tendência esquerdista das populações do Extremo Oriente. Estas continuam nitidamente anticomunistas, em sua esmagadora maioria. A verdadeira causa desse deslizamento para a esquerda está na política de Nixon em relação à Rússia e à China. Uma vez que a América do Norte se desinteressa da defesa de todos esses povos contra as duas potências marxistas do Pacífico, a conseqüência é que, para elas, só há uma alternativa: o heroísmo ou a finlandização.

Infelizmente, são poucos, no mundo de hoje, os que escolhem o heroísmo...

* * *

Comentando em artigo nesse jornal, a visita de Nixon a Moscou (cfr. "A agenda”, 21-5-72), predisse, nos seguintes termos, o que iria acontecer: "É preciso ser cego para não perceber que a Rússia quer assenhorear-se, a todo custo, da Indochina. (...) Se (Nixon) não resistir, entregará à Rússia uma posição-chave no mundo. Neste caso. Formosa e a Coréia do Sul hoje, o Japão e a Austrália amanhã, sentindo-se abandonadas pelos EUA, serão arrastados a colocar no governo homens de esquerda que conduzam uma política de aproximação com a Rússia".

Pois bem: aconteceu.

Toda essa derrocada, como disse, se deu no Extremo Oriente.

A par disso, na Europa se vão desenrolando lenta, complicada, mas inexoravelmente, os preparativos para a conferência de segurança pan-européia. E os comentaristas internacionais mais penetrantes acentuam o firme propósito da Rússia de impor ao Ocidente a finlandização da Europa no momento oportuno. Tratei disto em meu último artigo. O mais grave, o mais espantoso do assunto, não está em que a Rússia pleiteie essas vantagens. Está em que a opinião pública ocidental se manifeste tão entorpecida, tão deteriorada, tão impotente que não se ergue numa recusa unânime e indignada contra as novas metas soviéticas. Por exemplo, certo jornalista norte-americano - aliás de grande prestígio - comentando os êxitos recentes da atuação de Moscou, concluiu suas reflexões com a lacônica afirmação de que "O Kremlin deve ser cumprimentado por sua paciente e perspicaz diplomacia". É o vencido a felicitar o vencedor!

* * *

Em todos estes desastres, é preciso reconhecer os efeitos da ação de Nixon. A sua ida a Pequim e Moscou, as fabulosas vantagens econômicas que sob o impulso dele a Rússia tem recebido da iniciativa privada norte-americana e européia e a afirmação, repetida ad nauseam, de que cessou a guerra fria por obra do presidente americano, tudo isto lançou a opinião pública do Ocidente num marasmo. Por sua vez, este marasmo, feito de apreensões e esperanças que mutuamente se neutralizam, desalenta para a reflexão e para a luta. E assim o Ocidente vai sendo preparado para aceitar - entre otimista e estupefato - tudo o que possa sobrevir.

* * *

Considerando em seu conjunto o panorama do Ocidente e do Oriente, nota-se entre um e outro um denominador comum: é a queda de todas as barreiras ante a investida do comunismo.

E a causa dessa série de catástrofes é a política do presidente Richard Nixon.

Dele a História dirá um dia, parodiando amargamente o dito de Churchill, que nunca tantos sofreram tanto mal de um homem só!

* * *

Neste panorama dramático, uma nota cômica e alvissareira se define, entretanto. Perón, segundo tudo indica, vai voltar brevemente para sua toca madrilenha. O mito da popularidade do velho demagogo morreu. Placidamente, firmemente, o grande povo argentino virou as costas ao ex-ditador. E ele sai do palco, melancólico e desapontado, como um ator que encontrou o teatro vazio.

Mais uma vez, nesta época de geral decadência, é da América Latina que parte uma lição para o mundo.

A História mostra que o futuro pertence aos povos que sabem dar as lições salutares.

Oxalá a grandeza das nações da América Latina valha para abrir um caminho que conduza o mundo inteiro a uma saída da crise atual.

Para tanto, temos três fatores inapreciáveis: somos latinos, somos americanos e acima de tudo somos católicos.


Home