Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

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Folha de S. Paulo, 26 de novembro de 1972 

Lições de um documento reservado 

Transcrevo hoje, para o conhecimento dos leitores, uma nota reservada existente no arquivo do Vaticano. Lendo-a, lhe ocorrerá desde logo que o documento contém uma versão resumida de uma exposição feita pelo Conselheiro Presidencial Henry Kisinger a alguma personalidade vaticana, por exemplo o Cardeal Villot, Secretário de Estado da Santa Sé.

"No tocante à Rússia, o representante do presidente norte-americano declarou ser pensamento do seu governo que constitui dever de todos empenhar-se em modificar as disposições da Rússia, de modo a fazer dela um membro da família das nações, em lugar de a manter isolada. Na reconstrução de após-guerra, a Rússia isolada constitui, de imediato, um poderoso inimigo, que ameaça a paz que todos devemos desejar durável. Há presentemente numerosas indicações - disse o diplomata americano - de que estão sendo alcançados progressos nessa direção; em Washington há uma confiança crescente de que a Rússia se tornará um auxiliar útil (...) e de que os traços gerais inaceitáveis do sistema russo estão em vias de desaparecimento. O comunismo, enquanto tal, vai deixando de existir; o princípio da propriedade privada vai sendo novamente admitido, pelo menos em parte; se bem que atualmente não haja lá liberdade de Religião, a atitude (das autoridades) face à Religião vai mudando consideravelmente. O diplomata acentuou que o Governo dos Estados Unidos trabalha continuadamente para obter a modificação da política soviética face à Religião (...). É geralmente admitido em Washington que consideráveis progressos têm sido feitos neste sentido (...). Ele voltou a insistir que o aspecto mais importante da situação consiste na necessidade de fazer todo o possível para transformar a Rússia, de inimigo isolado, em amigo.”

* * *

"Por que publicar uma condensação de conceitos e de esperanças tão banais?", perguntará o leitor. "Não li nos jornais que Kissinger teve um encontro com Mons. Villot ou qualquer outra personalidade vaticana. Mas, a ter tido, só poderá lhe ter dito o que está nesta nota. Ela contém todas as razões imagináveis para justificar, aos olhos da Santa Sé, a cessação da guerra fria, mediante a formação do eixo Washington-Moscou. E resume as ilusões e as esperanças de quantos, pelo mundo afora, aplaudem a política de Nixon".

Concordo com o leitor. Não me consta que Kissinger tenha dito tudo quanto está nessa nota. Entretanto, é óbvio que o retrata de corpo inteiro: homem persuadido de todos os mitos lançados pela propaganda soviética, confiante na mitigação do regime comunista, na restauração, pelo menos parcial, da propriedade privada e da liberdade de religião - homem certo de que esse processo pode ser acelerado mediante concessões de vulto, ou comprometido pela manutenção do isolamento em que a Rússia tem estado.

É explicável que o leitor me pergunte, pois, qual o interesse em reproduzir aqui um documento que nada acrescenta de novo ao que já se sabe, que, em ultima análise, nos mostra o que já se conhece: o enorme bluff, a servir de motivação para um erro catastrófico do governo ianque.

* * *

Entretanto, caro leitor, insisto em afirmar que o documento é interessantíssimo. Para prová-lo, preciso apenas aduzir aqui uns poucos esclarecimentos.

Reconsidere o início do artigo, e verá que eu tive o cuidado de não afirmar ser esta nota o resumo de uma conversa entre o Conselheiro Presidencial e algum dignitário vaticano. Limitei-me a dizer que seria essa a impressão que ocorreria ao espírito do leitor.

De fato, essa nota se encontra no arquivo do Vaticano (A.A.S. 6798/42, orig. datil.), mas ela data precisamente de trinta anos e contém o resumo de uma exposição feita pelo Sr. Myron Taylor, então representante pessoal de Roosevelt, a Mons. G.B. Montini, então substituto da Secretaria de Estado do Vaticano, sobre "a guerra e o após-guerra na Europa". Está ela datada de 22 de setembro de 1942, e consta do livro "Pie XII devant l’Histoire" de Mons. Georges Roche e Philippe Saint-Germain, Edit. Robert Laffont, Paris, pag. 495.

Transcrevi aqui só as partes principais. E onde no original se lê "o Sr. Myron Taylor", escrevi "o representante do presidente norte-americano", ou fórmula congênere.

Como se vê pela data, a Rússia desenvolvia, naquele tempo, uma ação junto ao então Presidente Franklin D. Roosevelt, a fim de o preparar para as imensas e catastróficas capitulações de Yalta.

Se através do Chefe de Estado norte-americano, muitos homens públicos do Novo e Velho Mundo não tivessem sido induzidos a crer no declínio da ideologia comunista, e na perspectiva de uma mitigação - quer no campo sócio-econômico, quer no religioso - do regime soviético, teria sido impossível a Moscou fazer suas imensas conquistas de após-guerra.

Obtidas estas conquistas, verificou-se que todas as perspectivas de modificação interna na Rússia, com que Stalin embalava Roosevelt, não passavam de imenso bluff.

Mas todos esses fatos já estão bastante esquecidos. E os sucessores de Stalin se põem, em nossos dias, a fazer aos continuadores de Roosevelt, os mesmos acenos e as mesmas mentiras de há trinta anos atrás.

Por sua vez, os continuadores de Roosevelt se põem a desenvolver a mesma política de capitulação que mereceu a Roosevelt a severa condenação da História.

A opera bufa - ou melhor, a tragédia - se repete. Ninguém aprendeu com a amarga experiência de três décadas.

* * *

Esta reflexão tem especial utilidade para nossos dias.

No pelourinho da História, Roosevelt ficou só, com a pequena equipe de colaboradores, entre os quais o sinistro Marshall, que empurrou a China para o comunismo.

Nixon e Kissinger, porém, não ficarão sós. O número de seus comparsas é imenso! Entre outros, ficará com ele, no pelourinho, o micro Nixon teuto, Willy Brandt. Lutando na Espanha ao lado dos comunistas russos em 1935, o chanceler alemão lhes prestou, então, serviços incomparavelmente menores do que os de sua presente "Ostpolitik".

Na esfera internacional, o acontecimento mais considerável nesta semana foi a pequena mas lamentável vitória alcançada pela coligação governamental nas eleições alemãs. No círculo da Europa central, Brandt é o símbolo do mesmo entreguismo que a dupla Nixon-Kissinger representa na esfera mundial. E o dia das capitulações incomparavelmente mais trágicas que os da Yalta vai chegando.

Não há argumentação que demova os "capitulantes" atuais de sua política de suicídio.

Mas muito se conseguirá para lhes circunscrever a ação, esclarecendo a opinião pública sobre a fundamental insinceridade das promessas soviéticas.

Para tal fim, creio que poucos documentos são tão concludentes quanto este que transcrevi, em que se vê, há 30 anos atrás, a Rússia despertar as mesmas esperanças, tramar a mesma política de mentiras, anestesiar do mesmo modo a outra parte, e fazer por fim... exatamente o contrário do que prometeu.


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