Folha de S. Paulo,
22 de outubro de 1972
A
camarilha dos "Kerenskys"
No
momento em que escrevo, um grande país irmão passa pelos tormentos da
fome, da insegurança e da discórdia. É o Chile.
A
causa desses tormentos que afetam indiscriminadamente os dez milhões de
habitantes daquela nação, todos nós a conhecemos. Uma experiência
infeliz - a experiência socialista - sujeitou toda a estrutura
sócio-econômica às manipulações violentas do estatismo e do dirigismo
igualitários. O resultado é esse naufrágio do bem comum, ao qual
assistimos desolados.
Sim,
deste bem comum em nome do qual também em nosso País, não tem faltado
quem queira arrastar-nos a análoga experiência.
A
experiência chilena que, segundo parece, está se aproximando do termo
catastrófico, já vai mostrando em que campo se encontram os verdadeiros
amigos do bem comum. E o mostrará ainda melhor quando no Chile deixarem
o poder os responsáveis pelas presentes calamidades. Muitas coisas,
agora ocultas, virão à luz. Será então o momento de entrarmos mais a
fundo no assunto.
Por
ora, volto ao tema do domingo anterior.
* * *
Mostrei, então, que a minoria esquerdista, de "sapos", clérigos do
Terceiro Mundo, profissionais da política e intelectualóides, procura
impor à Argentina um sistema socialista, através de eleições. Caso o
êxito se mostre muito duvidoso, ela não duvidará em recorrer a um golpe
de força "peronista".
-
Como pode manipular uma minoria a opinião pública conservadora, de
maneira a arrastá-la à aceitação do esquerdismo? - Obviamente,
lançando-a na inação, na confusão e na divisão. A inação ganhou
extensíssimas áreas do eleitorado. Dois estados de espírito contrários e
simultâneos concorrem para este fim. Segundo muitos, o atual caos
argentino não passa de um fenômeno de superfície. Vista sem
profundidade, a situação do país seria muito mais estável. Pelo que, nem
sequer necessita, de estas camadas não politizadas, um cuidado especial.
Pelo contrário, segundo outros, também numerosos, os fatos atingiram uma
tal gravidade que já não adianta agir. Pelo otimismo ou pelo
pessimismo, fica assim criado o marasmo da maioria e a vitória das
minorias esquerdistas.
Uma
política de "bluffs" favoreceu mais especialmente essa debandada dos
pessimistas para o desânimo total. Esses "bluffs" - mencionarei alguns -
expressos quase com a rigidez de "slogans", são:
1) O
peronismo constitui uma maioria avassaladora diante da qual nenhuma
resistência é possível. Tal "bluff" não se funda em qualquer fato
concreto. Em nosso mundo, todo feito de instabilidade, os vinte anos de
exílio de Perón foram mais do que suficientes para desgastar o demagogo.
Prova-o o fato de que todas as manifestações promovidas, ao longo desta
crise, pelo justicialismo, têm sido anêmicas e esquálidas. O peronismo é
um mito, no que os esquerdistas tratam de conservar, em vão, restos
fugidios de vitalidade.
2) A
CGT e os líderes sindicais que a dirigem, representam a massa
trabalhadora. Esse "bluff" tem apenas aparência de verdade. A CGT dispõe
de imensos recursos arrecadados compulsoriamente entre seus 2.500.000
sócios. Com eles, efetua larga propaganda. No entanto, as manifestações
por ela promovidas reúnem um número muito inexpressivo de participantes.
Na
sua grande manifestação de 4 de junho de 1971, por exemplo, conseguiu
ela reunir apenas 15 mil pessoas.
3) "O
terrorismo e a agitação de rua provam a força da esquerda". Os fatos
mostram que tal não é verdade. As agitações de rua tem sido promovidas
por uns poucos punhados de profissionais. Quanto ao terrorismo, sabe-se
que é produto de uma minoria ínfima de "violentos";
4)
"Os partidos políticos representam o povo". É outro "bluff". Só 9% dos
eleitores argentinos estão filiados aos partidos políticos. A classe
política não compreende a nação, nem é por ela compreendida.
Entre
os "bluffs" que a cúpula esquerdista põe em circulação, outros há que
favorecem o otimismo:
1)
"Perón é direitista e salvará a Argentina do comunismo". Os
pronunciamentos de Perón em favor de Allende e do clero do Terceiro
Mundo são de modo a ir matando rapidamente quaisquer ilusões nesse
sentido.
2) "A
classe empresarial dirige a Argentina, e é naturalmente oposta ao
socialismo". Se assim fosse, não haveria "sapos". Ademais, a classe
empresarial tem aceito até aqui, com uma docilidade próxima da simpatia,
todas as medidas estatizantes adotadas por Lanusse.
* * *
-
Diante dessa perigosa situação, toda criada por "bluffs", que
providências tomar? - Antes de tudo, furá-los um por um. E para isto
saiu às ruas de todo o país a brilhante TFP argentina, denunciando a
minoria de esquerdistas à "Kerensky", que vão fazendo, em seu país, o
triste serviço de Frei no Chile.
Além
dessa medida de saneamento psico-político fundamental, a TFP argentina
recomenda que os conservadores se unam, e utilizem as eleições para
formar um governo "principalmente conservador dos princípios católicos e
das tradições hispânicas", que assegure às atividades lícitas "uma
liberdade conforme à lei natural e divina".
Pleiteia também a TFP a eliminação do terrorismo, por meios que,
excluindo a crueldade, se inspirem em "muita habilidade, constância e
firmeza".
Propõe ainda a TFP que se revigorem e utilizem as instituições
sócio-econômicas inerentes à civilização cristã, perfeitamente aptas a
"elevar o nível moral, cultural, político e econômico" do povo
argentino. Por fim, preconiza o imediato abandono da política de
derrubada das barreiras ideológicas inauguradas por Lanusse, de sorte
que a Argentina se ponha em resoluto combate contra a ameaça comunista
na América Latina.
* * *
Lançando esse manifesto lúcido, leal e corajoso, a TFP argentina dá à
sua pátria, e a toda a família ibero-americana, um exemplo de ação
ideológica de alto quilate. Auguramos que o povo platino seja sensível à
voz desses filhos de escol. Assim se salvará um grande país, e se terão
evitado males sem conta para as nações deste continente.