Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 25 de junho de 1972 

Os dois calcanhares 

A Europa é um Aquiles que não tem só um, mas dois calcanhares vulneráveis.

Desde que corte o abastecimento do petróleo do Oriente Médio, a Rússia pode paralisar, de um momento para outro, quase todas as indústrias e transportes da Europa Ocidental.

Tal medida vai sendo cada vez mais exeqüível, por duas razões. A primeira é que o poderio naval soviético cresce cada vez mais no Mediterrâneo, o que permite à Rússia eliminar ou prejudicar a fundo o transporte do petróleo. A segunda é que o governo de coligação do Iraque, do qual fazem parte comunistas, desapropriou a Irak Petroleum Company, a qual funciona agora, com técnicos russos. A colocação e a distribuição do petróleo ficaram a cargo da Rússia. Acresce que a penetração soviética, sempre mais intensa no Irã, vai tornando periclitante a situação não só do governo desse país, como dos sultanatos petrolíferos do Golfo Pérsico. Assim, todo o petróleo do Oriente Médio poderá cair em breve lapso de tempo, nas mãos dos soviéticos.

Este é um dos “calcanhares de Aquiles” da Europa. O outro é a situação militar.

Sem petróleo, o esforço de guerra da Europa Ocidental fica reduzido a quase nada. Mas há pior. Sem embargo de já se ter estendido pelo Mediterrâneo, o poderio militar russo do norte da Europa atingiu índices alarmantes. Os soviéticos superam a Europa Ocidental em poder aéreo na proporção de sete para um. E o poderio naval deles está para o dos europeus ocidentais na proporção de quatro para um.

Assim, pelo norte e pelo sul, a Rússia vai cercando a Europa Ocidental.

- Mas, dirá o leitor, e a redução equilibrada das forças?

- Respondo que esta só está sendo negociada, no momento, entre o Oriente e o Ocidente, no setor central, vital (e, portanto, nem no norte nem no sul).

Assim facilmente se explica que a Rússia já tenha pronto um plano de invasão da Europa Ocidental, consistente em ocupar o Continente e todo o litoral do Atlântico em duas semanas. Em mais duas semanas, ela contaria neutralizar toda a resistência na zona ocupada. Os Estados Unidos seriam paralisados pelo terror de uma agressão atômica.

A essa invasão, a Europa teria pouco a opor, pois a NATO só dispõe de onze mil tanques, enquanto as nações do Pacto de Varsóvia dispõem de dezessete mil deles.

O mais provável é que, na iminência dessa invasão, a Europa Ocidental se deixe “finlandizar”, sem qualquer resistência militar.

Ou seja, os governos conservariam uma aparente soberania, porém, na realidade, ficariam na dependência de qualquer aceno de mão dos Senhores do Kremlin. Uma situação quase igual à dos países satélites.

Bem entendido, a Rússia aproveitaria esta situação privilegiada para impor gradualmente o comunismo aos países “finlandizados”.

*    *    *

Diante desse conjunto de notícias e previsões catastróficas, o leitor terá um sobressalto e me perguntará no que me fundo.

Quase todos os dados que menciono têm como origem dois artigos publicados pelo Sr. C. L. Sulzberger no “New York Times” e no “Estado de São Paulo” dos dias 17 e 18 de junho último. De meu, só acrescentei alguns fatos de notoriedade absolutamente universal.

O Sr. Sulzberger é um jornalista conhecidíssimo, membro da poderosa família à qual pertence o órgão nova-iorquino. Deste divirjo em tudo e por tudo. Mas o leitor e eu sabemos que é um dos jornais mais importantes do mundo.

Ademais, em seus artigos, o Sr. Sulzberger menciona fontes como o serviço secreto norte-americano, e o relatório “A Europa e o Mediterrâneo”, recentemente aprovado pela União da Europa Ocidental.

Por fim, acresce que o jornalista yankee está muito longe de ser - como eu - um anticomunista empenhado em alertar a opinião mundial contra o perigo russo. Não se acha, pois, exposto à desconfiança “sapa” de que ele exagere o perigo russo, para despertar uma reação do Ocidente.

Por isso, é sem indignação que o Sr. Sulzberger constata, em um de seus citados artigos, a seguinte catástrofe: “É inegável que a Europa Ocidental está se tornando cada vez mais irreversivelmente dependente da boa vontade de Moscou quanto à manutenção de sua segurança e progresso econômico”.

A serenidade do articulista americano tem uma causa. Diz ele: “A União Soviética deseja sinceramente uma conferência pan-européia de segurança, logo seguida por um acordo formal entre Leste e Oeste, e está preparada a pagar pela ratificação das fronteiras vigentes na Europa, concordando com alguma espécie de redução mútua e equilibrada de forças dos exércitos do Pacto de Varsóvia e da NATO”. Para o Sr. Sulzberger, continua assim aberta uma esperança no meio dessas trevas. Ele crê que “a tendência para uma “détente” venha a reduzir a ameaça de crise”.

Tudo isto bem mostra ao leitor quão insuspeito é o redator do “New York Times”, de querer criar, com seus artigos, um sobressalto anticomunista.

*    *    *

- E eu, por que motivo trato aqui destes assuntos?

Recuso-me a admitir que esteja tudo perdido. Porque pertenço pela graça de Deus à categoria de homens que lutam animosamente, mesmo com os mais minguados recursos, contra o mais poderoso adversário. Porque, acima de tudo creio na Providência Divina, e sei que pelos rogos de Nossa Senhora, os bons jamais serão abandonados em sua luta contra o mal. Porque, assim, cumpre alertar logo os bons. Não se pode prestar ao Ocidente, mais fatal desserviço do que deixá-lo dormir diante do perigo que se avoluma.

Não sei fundado exatamente no que, o Sr. Sulzberger afirma que a se efetivarem as hipóteses catastróficas por ele mencionadas, isto só se daria daqui a “vários anos”.

Isto importa em dizer que ainda há muitas resistências por vencer. Entre estas está - em nossos tempos de agressão psicológica - a resistência dos homens de fibra no mundo inteiro.

Estimular essa resistência pela consideração feita a tempo do perigo, criar um ambiente de Fé e coragem, é dever de todos.

Para o Sr. Sulzberger, como vimos, o perigo não existe, porque se pode confiar nas intenções pacíficas dos russos.

Os que, no mundo livre, participam de sua candura, são uma minoria insignificante. Essa minoria não levará a melhor se os que não crêem na boa fé soviética despertarem. Eis porque escrevi este artigo.


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