Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Artigos na

 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 8 de março de 1970

Garaudy esboça outra "aproximação"

No grande público, um acontecimento já velho de meio século, como a revolução bolchevista de 1917, imprimiu marcas profundas, que ainda perduram. A queda súbita e espetacular do czarismo, com sua seqüela de perseguições e massacres, produziu um trauma tão profundo na sensibilidade dos povos civilizados, que ainda hoje, quando se fala de comunismo a reminiscência desses episódios trágicos ocorre à maior parte das pessoas.

Esta associação de imagens é tanto mais explicável quanto ao longo destas cinco décadas, o comunismo parece ter deitado todo o seu empenho em conservar, e acentuar até, o pânico universal que provocou em 1917. Em todos os quadrantes, soprou ele continuamente o ódio, provocou agitações, tramou atentados, suscitou revoluções e atiçou guerras. Ainda hoje é a presença do comunismo que faz pesar sobre o mundo a ameaça apocalíptica da destruição atômica. Tudo isto - bem se sabe - não decorre de circunstâncias fortuitas. Está na própria essência da doutrina comunista a justificação dos meios violentos, sempre que necessários, ou pelo menos convenientes, à vitória do marxismo. E - conforme vimos nos artigos anteriores - corresponde às normas básicas da estratégia comunista imobilizar os adversários pelo medo.

Tudo isto torna inteiramente explicável que, para incontáveis pessoas, o perigo comunista consista essencialmente na eventualidade de uma explosão à maneira de 1917.

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Ora – já o vimos também em outros artigos – reduzir a isto o perigo vermelho importa em simplificar muito o assunto. Na realidade, o comunismo não progrediu só – nem principalmente – com sangueiras e chacinas. Em várias fazes de sua história, ele têm tido necessidade de contemporizar, de sorrir, de fazer promessas, para adormecer a vigilância e a combatividade do adversário, antes de se atirar sobre ele. Para a eficácia desse tipo de artifícios, evidentemente de nada serviriam ao comunismo demagogos descabelados ou terroristas lúgubres. Eram-lhe necessários doutrinadores labiosos, que encontrassem "pontos comuns" para convidar o adversário para uma colaboração cheia de ciladas. Precisava ele de diplomatas sutis, alguns deles infiltrados até em pontos-chaves dos países do inimigo, para conseguir "Yaltas" de todo gênero. Tinha mister de simpatizantes até entre suas vítimas, para suscitar nestas o desejo de capitulações mais ou menos veladas, no estilo "ceder para não perder". Com todo este aparelhamento, em pleno tempo de paz, sorriso a lhes iluminar o olhar e a lhes florir nos lábios, os chefes comunistas têm conseguido mais nos últimos 20 anos, do que com toda a espécie de violências.

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Venho falando sobre a tática comunista em termos genéricos. Infelizmente, não me é difícil ilustrar minhas assertivas com o exemplo clássico.

Este exemplo claríssimo, arquetípico, espetacular e dramático, pode o leitor encontrá-lo examinando o que se passa nas fileiras católicas. Nem Nero, nem Diocleciano nem Juliano, o apóstata, nem os reformistas do século XVI, nem os revolucionários franceses de 1798, nem Lenine, nem Calles, nem os republicanos espanhóis jamais conseguiram causar à Igreja um dano comparável à confusão, à desordem, à esquerdização que entre os católicos se originou e se vem agravando a partir do momento em que os comunistas iniciaram a sua famosa "politique da la main tendue".

Sim, a mão do adversário, quando se estende traiçoeiramente como se fosse amiga, pode ser, em determinadas circunstâncias, muito mais perigosa do que se segurasse um punhal ou carregasse uma bomba. O processo do comunismo, repito, se tem realizado mais com o sofisma, a infiltração, o sorriso hipócrita, do que com a violência. Não é tanto recrutando novos adeptos quanto cegando, dividindo, adormecendo e corrompendo os não-comunistas, que ele obteve seus maiores êxitos.

A utilização do binômio medo-simpatia, cujo complicado mecanismo descrevi neste jornal, é um dos meios mais importantes do comunismo para chegar a este fim. É assim que ele manobra, para seu proveito, o pânico que imobiliza e a astúcia que seduz suas vítimas.

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Tudo isso posto, é o caso de nos perguntarmos a quantas se encontra, no momento, fora do campo religioso, essa avançada blandiciosa do comunismo.

Pergunto, em outros termos, se nas fileiras dos proprietários e nas dos trabalhadores intelectuais ou manuais não se delineia algum fenômeno análogo. Pergunto, se prestando atenção, não encontramos, nestas várias categorias, elementos que, discretamente por enquanto, vão fazendo um papel análogo ao que desempenham na Igreja o pe. Comblin e outros carbonários de nome francês, russo ou brasileiro. E indago, por fim, se dentro de algum tempo esses meios não estarão tão convulsionados quanto os ambiente católicos.

A mim parece que sim. E esta suspeita cresceu de ponto quando vi, no noticiário da imprensa, que um personagem comunista dos mais suspeitos "estendia a mão" de modo sensacional, ao capitalismo norte-americano.

Este personagem teve papel de grande realce na aproximação do comunismo com a Igreja. Parece-me que ele prepara agora análoga manobra, com análogos objetivos e análogos métodos, contra outras frentes de luta comunista para conquista ideológica e política do mundo.

Este personagem é o veterano diretor do PC francês, o especialista caviloso em assuntos religiosos, o expositor labioso e brilhante que responde com o nome de Roger Garaudy.


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