Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 1° de fevereiro de 1970

D. Helder cria problema — Comunistas aplaudem

No momento em que escrevo, dom Helder deve estar terminando sua "tournée" pelo Velho e Novo Mundo. Como de hábito, não perdeu ele ocasião alguma para promover sua costumeira política. Exemplifico com o que ele inventou de fazer no Canadá. Todos sabem que a aliança deste país é fundamental para segurança dos Estados Unidos. A fronteira do "Dominion" com a América do Norte vai de oceano a oceano, e é a mais extensa que há na terra, entre dois países. Atacado pelo Canadá, os Estados Unidos são como um homem com um punhal cravado nas costas. Ora, Pierre Trudeau, o atual primeiro-ministro canadense é sabidamente um esquerdista pouco simpático à nação vizinha. Nesta situação espinhosa, dom Helder nada achou de melhor a fazer do que incitar o Canadá a assumir a liderança das reivindicações do Terceiro Mundo em relação aos dois super-grandes, isto é, a América do Norte e a Rússia. Assim, fez o que pôde para criar um mal-estar entre as duas grandes nações setentrionais de nosso Continente.

Mas — objetaria algum "sapo" — neste caso o lance de Dom Helder não afeta também Moscou? — A resposta é simples. Quem sofreria mais os inconvenientes imediatos e os riscos futuros de um mal-estar com o Canadá? A Rússia remota? Ou os Estados Unidos vizinhos? É claro que mais, incomparavelmente mais, sofreriam estes. Ou seja — em outros termos — o que a Rússia perderia pelo esfriamento de relações com o Canadá seria largamente compensado com o que ela lucraria pela debilitação dos Estados Unidos. Este modo de apresentar o problema bem mostra a quem Dom Helder realmente foi nocivo.

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Chegando a Roma, o arcebispo de Recife foi recebido pelo papa, e pouco depois deu uma farfalhante entrevista à imprensa.

Depois, sempre trêfego, foi a Montreux, onde, perante o famigerado Conselho Mundial das Igrejas, propôs um projeto extravagante, ou seja, uma reunião de técnicos das maiores universidades européias com líderes das principais religiões, para definir o que deve ser feito com relação às mudanças de estrutura. Nessa antipática miscelânea de religiões e universidades, dom Helder, sempre utópico e alheio às exigências da realidade concreta, não quis incluir precisamente o setor dos homens práticos, isto é, dos empresários. É que os espíritos utópicos e demagógicos têm horror à contribuição dos homens de ação, aos quais consideram uns desmancha-prazeres, que os forçam a descer da esfera divertida do sonho, para a realidade séria e sem graça da vida concreta.

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Mas, afinal, tudo isto não é tão importante, pois não vai além da importância de dom Helder. É triste, muito triste, isto sim. E principalmente enquanto motivo de tristeza merece análise. Importante, realmente importante é o que se passou com dom Helder em Roma. A importância, no caso, não vem de dom Helder mas do papa. Pois dom Helder — bem no meio de sua "tournée" lança-chamas — esteve com Sua Santidade, e depois deu uma versão própria do que ocorreu entre ambos. O fato de essa versão ter sido espalhada aos quatro ventos, no Brasil e no Exterior, isto sim, é importante, na medida em que insinua uma atitude do chefe da Cristandade diante das proezas de dom Helder.

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Lembremos antes de tudo que — segundo uma "fonte oficial" do Vaticano — o encontro teria sido "muito cordial".

Dom Helder falou com o Santo Padre sobre suas "experiências passadas" e seus "projetos". A julgar pelo que deixou entrever o arcebispo, não recebeu ele a menor censura. Pelo contrário, saiu da audiência confiante e com "sua alma de bispo reconfortada".

Mais adiante disse que, a seu ver, o Brasil "deve pensar em modelos socialistas proporcionais às nossas necessidades particulares".

E depois de dizer que — segundo pensa — esse socialismo brasileiro não coincide com o que se pratica atualmente nos países socialistas, acrescentou: "Sonho com uma socialização que seja realmente capaz de criar condições de desenvolvimento integral do homem, como define a encíclica "Populorum Progressio".

Por fim, desmentindo a versão de que a Santa Sé lhe teria limitado a faculdade de fazer pronunciamentos sobre matéria econômico-social, declarou ser "plenamente livre para expressar suas idéias em qualquer parte do mundo". Inclusive no Brasil, portanto.

A esta declaração taxativa, o arcebispo acrescentou um longo período enrolado e ambíguo: "No entanto, no Brasil existe um problema de oportunidade prática, que é conseqüência das diferentes posições em relação à realidade do país, as quais podem ser encontradas também nos meios católicos". Dou prêmio a quem entender isto.

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Releva notar que estas declarações de dom Helder, embora cheias das habituais sinuosidades, reticências e escapatórias, em sua linha geral não só induzem os leitores a formar a impressão de que recebeu um "placet" de Paulo VI, bem como a aceitar a idéia de que há possibilidade de se construir, para o Brasil, um socialismo católico. Acerca deste último ponto, o que temos sustentado é exatamente o contrário. Se católicos transviados, e até um arcebispo "sonhador", quiserem construir um regime autenticamente socialista, este regime será intrinsecamente atentatório aos dois mandamentos da lei de Deus: "Não roubarás" e "Não cobiçarás os bens do próximo". O fato de uma violação da lei de Deus ser praticada, não por materialistas mas por católicos ou até por clérigos, absolutamente não batiza nem a torna lícita.

Ora, fazendo esta apologia do socialismo, logo à saída de uma audiência papal tão "cordial" e que tanto o "reconfortou", dom Helder faz crer que nada do que declarou é contrário às diretrizes que — presumivelmente — acabava de receber de sua santidade.

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Há, esparsos pelo Brasil, Argentina, Chile e Uruguai, 2.000.368 católicos que pediram ao Santo Padre providências para que cesse a infiltração comunista em meios católicos. Entre os signatários do gravíssimo documento estão ministros de Estado, altas personalidades do mundo cultural, social e político, figuras exponenciais do clero e das Forças Armadas etc.

Até agora, a mensagem tão reverente e filial está sem resposta.

Ponho-me na pele de um leitor comum. Diante das declarações de dom Helder, e do silêncio até agora mantido pelo Vaticano sobre o pedido de dois milhões de fiéis anticomunistas, compreendo que esse leitor — um tanto desavisado e ingênuo como é o geral deles — fique confuso e perplexo. E isto tanto mais quanto os comunistas não perderam ocasião de triunfar com o "êxito" de dom Helder.

Na Itália, com efeito, o único jornal a dar importância à entrevista de dom Helder foi o diário "Unità", órgão do Partido Comunista, que publicou toda a matéria realçada por um título de chamada na primeira página bem ao lado de uma fotografia de policiais fazendo uma carga de cavalaria contra desordeiros, à saída de uma igreja no Rio.

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Se o Vaticano for devidamente informado de todo este complexo de fatos, criado pelas declarações do arcebispo vermelho, e se condoer da perplexidade cruel em que estas põem o homem da rua, temos de estar certos de que tomará uma atitude esclarecedora. Qual seria esta? Um desmentido às declarações de dom Helder? Ou — se quiser poupar este — uma resposta alentadora ao abaixo-assinado da TFP? É problema de pormenor, para cuja solução sobram ao Vaticano classe, tradição e experiência para resolver.


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