Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 15 de outubro de 1969

"O jogo da verdade" e a crise religiosa

Do aplaudido discurso proferido há dias pelo Sr. General Garrastazu Médici, o povo brasileiro destacou — como particularmente sintomática — esta frase: "Chegou a hora de fazermos o jogo da verdade". Foi ela tida como a definição do espírito que norteará o futuro Chefe de Estado. A perspectiva de haver mesmo chegado a hora da verdade deu ao Brasil a sensação de respirar, por fim, as primeiras lufadas de ar puro...

Não se suponha que, afirmando-o, eu esteja a censurar implicitamente estes ou aqueles. Penso que por muitos motivos — vários deles absolutamente justificáveis — esta rarefação da verdade se foi acentuando em nossa vida pública com a cooperação de quase todo o mundo. O desejo generalizado de contemporizar, de ladear questões, de evitar desentendimentos, levou a isto. Mas, enfim, há limite para tudo. O general Médici teve o mérito de sentir que, no caso, o limite estava ultrapassado, e de o dizer com força. Eis o fato.

Cumpre agora que, sincronizados com o futuro Presidente, caminhemos todos para a verdade plena. No que me toca, dou de uma vez um passo grande, certo de servir assim o interesse nacional.

* * *

Três recortes de jornal, recentes, me dão base para apontar aqui, com clareza ainda maior do que nunca, um dos mais ativos fatores de confusão e mal-estar do Brasil de hoje.

Segundo "O Estado de S. Paulo" de 9 do corrente, foi publicada no "Diário de Justiça" de Belo Horizonte larga documentação sobre a famigerada Ação Popular, que tanta agitação levantou em nosso País. O matutino paulistano transcreve a respeito as seguintes palavras do Procurador militar: "Com o correr desses anos, têm-se positivado os atos subversivos dessa associação criminosa, o que nos dão conta não só os processos em todas as auditorias do País, notoriamente, e com um alastramento e profundidade contínuas, em todas as camadas sociais e entidades de classe, sempre promovendo a tomada do poder com o emprego da luta armada".

Por sua vez o "Globo" de 6 do corrente noticiou haverem sido expulsos do Brasil os três famigerados sacerdotes franceses de Belo Horizonte, e publicou um impressionante resumo da documentação subversiva apanhada em mãos deles.

Sobre o fato, li em "O Estado de São Paulo" de 9 deste mês as seguintes frases de um escritor de notável talento, cuja idoneidade é geralmente admitida. Falo de Gustavo Corção: "Aqueles padres, com o apoio das autoridades eclesiásticas de Belo Horizonte, e da CNBB, difundiam o mais descarado marxismo. Entre os documentos tenho em meu poder uma publicação da JOC intitulada Missão Operária e enriquecida com um autógrafo do Pe. Michel que, além de pregar subversão por conta própria, correspondia-se com vários agentes comunistas do Brasil e da Argentina.

Estas publicações apontam dois escândalos a mais, a se juntarem — para só falarmos dos documentos escritos — ao tristemente célebre documento Comblin. Assim, vem cada vez mais à tona a infiltração comunista nos meios católicos brasileiros.

A tal propósito — e dado haver também fatores não religiosos de propagação comunista no País — os brasileiros desejosos de eliminar o perigo vermelho hão de se perguntar qual, de tantos fatores, é o mais atuante. Pois é para a remoção deste que se devem voltar necessariamente as providências mais urgentes. Ora, segundo é óbvio, o PC, pouco numeroso, dividido e subdividido por si pouco pode na conquista da opinião pública. O que dá ao comunismo condições para ir sensibilizando o País é a chamada esquerda católica.

Entretanto, já que "chegou a hora de fazermos o jogo da verdade", sejamos claros: dos vários setores da subversão, aquele no qual menos se interveio até agora é precisamente o da esquerda católica.

Veja-se o caso do Pe. Comblin. Apesar de denunciado por uma petição com mais de 1.500.000 assinaturas, anda livre pelo Brasil o comunista belga. Os jovens que, persuadidos por ele, se ponham a conspirar, poderão ser punidos. Ele, o grande responsável, continuará incólume.

Ainda aqui, não é minha intenção censurar estes ou aqueles. O que torna o Pe. Comblin quase inatingível pela lei, é um anteparo muito e muito difícil de remover. É a batina que, aliás, ele já não usa...

A complexidade do assunto está no seguinte: pelas leis multisseculares da Igreja, o Sacerdote — em princípio — só pela Igreja pode ser julgado. É este um privilégio deduzido do cunho sacral do sacerdócio. Não posso afirmar se este privilégio ainda existe na mais recente legislação canônica. Mas o certo é que, vigente durante séculos, ele modelou a fundo a sensibilidade religiosa do povo cristão. A esquerda católica, muito sabidamente, sempre que as autoridades civis tomam ou ameaçam tomar medidas contra eclesiásticos, começa a apontar o Poder civil como violador dos direitos da Igreja. E daí uma situação que um homem público pode julgar mais cauteloso não enfrentar, para não coligar em torno dos clérigos esquerdistas a opinião católica. Daí resulta, concretamente, a impunidade de Comblins de toda a casta...

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Dita assim, com coragem, qual a situação, cumpre sugerir para ela um remédio.

Ora, tal remédio só pode ser um. O Poder civil exponha ao país, em toda a extensão, qual é a magnitude da infiltração comunista em meios católicos, de forma que mesmo nos últimos rincões não paire dúvida a este respeito. Pari passu, peça à Autoridade Eclesiástica que remedeie desde logo a situação. Peça-o à CNBB, sempre tão disposta a recomendar soluções para problemas da esfera temporal. Peça-o ao Santo Padre, a quem já se dirigiram neste sentido, por iniciativa da TFP, 1.600.368 brasileiros.

Feitos estes pedidos com publicidade, com decisão, com respeito, motivos não haverá para que a Hierarquia deixe de atender, com providências imediatas e inteiramente eficazes, os anseios do Brasil.

Não há outro caminho adequado. A contemporização, como vimos, de nada adiantou. As tratativas de bastidor — é absurdo supor que não as tenha havido — deram no que se vê. O bolsão esquerdista na Igreja continua bojudo e pronto a derramar sua peçonha sobre o País na primeira ocasião. Na "hora da verdade", só atuações públicas e diretas são oportunas. Neste sentido, os anos de contemporização deram um resultado precioso. Pois provam que, neste caso, o compasso de espera é inútil.

* * *

Mas, dirá algum cético, as providências da Hierarquia não virão... — Julgo que este pessimismo sombrio não nos exime de recorrer a elas.

Apenas para argumentar, imaginemos que pouco ou nada se conseguisse. Creio que, então, o direito do Brasil à legítima defesa — direito inalienável e decorrente do mais fundo da ordem natural — inspiraria aos detentores do Poder Público outros meios de ação: prudentes e respeitosos sempre, mas também inteiramente decisivos.

E então essas medidas não feririam mais a opinião católica. Pois a doutrina católica não justifica que, à mingua de medidas, se deixe arder indefeso, um país inteiro.

O direito à legítima defesa — falo em tese — tem bastante amplitude para isto, segundo a moral cristã. É o que qualquer moralista sério sabe.


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