Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 7 de agosto de 1969

O porquê da insistência

A história recente da investida comunista no Brasil consta fundamentalmente de três lances. A cada lance corresponde uma forma peculiar de agitação, e a cada agitação um insucesso.

O primeiro lance foi a tentativa janguista de implantar no Brasil um populismo à Fidel Castro. Como fundo de quadro da jogada esquerdista, tentou-se montar uma enorme agitação operária, destinada a explodir as populações tanto urbanas quanto rurais. As agitações urbanas — mencionadas por certa imprensa como altamente ameaçadoras — se cifraram, em última análise, em umas conspiratas de quartel, urdidas por uma minoria, que a coragem dos elementos responsáveis das Forças Armadas desarmou. As marchas "da Família com Deus pela Liberdade" mostraram com quem estava o povo das cidades. A agitação rural foi igualmente um fenômeno de minoria. E de minoria minúscula. O livro "Reforma Agrária — Questão de Consciência", apontando o blefe da agitação agrária, liquidou o agro-reformismo janguista. Em discurso, dias antes da sua queda, Jango queixou-se até da frieza das massas rurais em relação aos planos socialistas e confiscatórios com os quais pretendia ele introduzir a luta de classes em nosso "hinterland". Tanto é verdade que as massas rurais não tinham o mínimo desejo de se revoltar.

O segundo lance visava arrastar a juventude inteira para a esquerda. Vieram assim, mais tarde, as agitações universitárias. Ainda uma vez, formou-se a propósito delas o fantasma de um perigo iminente. Dir-se-ia que todo o País estava pegando fogo. Mas os observadores lúcidos não tardaram em perceber que a quase totalidade dos brasileiros via com maus olhos a mazorca, e que até dentro da própria classe estudantil, a maioria se mantinha imune em relação à demagogia de um punhadinho de colegas. A agitação universitária cessou com alívio para todo o Brasil.

Veio então o terceiro lance, que é o de impor o comunismo à força. Surgiu, assim, a agitação terrorista. De início, pode esta criar nos ingênuos a impressão de que os terroristas surgiam das profundidades das massas populares inconformadas. Seriam como os representantes arquetípicos de um estado de alma popular todo feito de revolta. Mas a censura maciça de todos os brasileiros aos atentados foi tal que, segundo geralmente se reconhece, o terrorismo não passa hoje do fruto de alguns extremistas, os quais, desesperançados de vencer pela persuasão, recorrem à força para impor ao País as suas idéias.

Assim, o esquema dos fatos é comprovadamente o que mencionamos no início deste artigo: três lances, três agitações e três frustrações.

Dado que assim é, um observador criterioso não pode evitar a seguinte reflexão. O comunismo é indubitavelmente dirigido por gente capaz. Se essa gente recebe, a cada tentativa, um "não" resoluto do Brasil inteiro, por que insiste em impor suas idéias? Não seria mais útil para o comunismo voltar à sua penumbra inicial, desarmar as reações, reorganizar no sossego seus aparelhamentos de propaganda, e ampliar seus quadros, antes de tentar novas aventuras? É evidente. Então, que fator existe, presentemente, que mantém os comunistas em uma insistência, que já agora começa a parecer ininteligente? A resposta do problema talvez esteja em uma entrevista impressionante, dada à Folha de S. Paulo no dia 1º de agosto p.p., pelo vice-almirante Acyr Dias de Carvalho Rocha, chefe do Núcleo de Comando da Zona de Defesa Atlântica. Não faço senão resumir — na linguagem de um civil — o que declarou esta alta autoridade militar:

1 — O Oceano Atlântico teve, na II Guerra Mundial, uma importância maior do que muitos pensam. Assim, dos navios postos a pique durante o conflito, 70% o foram nesse mar;

2 — Embora, até aqui, a área atlântica mais importante, para efeitos bélicos, tenha sido a do hemisfério norte, o restante do mar está crescendo de alcance militar em razão da facilidade com que o estreito de Suez pode ser obstruído, hoje em dia, pelos árabes ou pelos israelitas. No caso de se verificar tal obstrução, o caminho marítimo da Rússia para a Ásia passará forçosamente pelo Atlântico Sul;

3 — Nestas condições, o interesse dos soviéticos pelas águas que vão de nossas praias às da África cresceu de ponto. O que explica, talvez, a freqüência — recentemente em ascensão — de belonaves soviéticas por estas paragens;

4 — Assim como os russos, para garantir a passagem por Suez, quiseram possuir bases no Mediterrâneo, e as obtiveram largamente na África do Norte, é plausível que, para facilitar sua passagem pelo Atlântico Sul, queiram ter bases africanas concedidas por algum dos incipientes Estados africanos do Atlântico.

Esta perspectiva, é bem de ver, cria um problema grave e direto para todos os países americanos fronteiriços à África. E especialmente para o Brasil, cujo litoral imenso é, por isto mesmo, o mais vulnerável. Tanto mais quanto o vice-almirante Acyr Rocha esclareceu, em sua entrevista, que a marinha soviética tem evoluído no sentido de poder desfechar ofensivas à grande distância de quaisquer bases de terra. Ainda mais empreendedora será ela quando suas bases estiverem bem em frente de nós.

E então se impõe a pergunta: o terrorismo, que atualmente atormenta o País, e que já deve ser considerado um início de guerra revolucionária, poderá servir de apoio a um eventual cometimento russo contra nós?

O vice-almirante Acyr Rocha afirma que sim. Tudo quanto me é dado ver confirma sua tese. E neste caso, a insistência dos terroristas se torna explicável. Pouco se lhes dá que aqui não encontrem ressonância. Suas esperanças lhes vêm de fora...


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