Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

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 "Folha de S. Paulo"

Janeiro de 1979 - Almoço oferecido pela "Folha de S. Paulo" aos colaboradores de sua secção "Tendências e Debates". Vê-se o prof. Plinio Corrêa de Oliveira à esquerda do diretor do jornal, Octávio Frias

Folha de S. Paulo, 30 de julho de 1969

O sapo quer coexistência e Comblin

Encontrei novamente o sapo, meu colega de infância e de bancos acadêmicos. Ele parecia ter esquecido inteiramente o azedume com que, há dias, se despediu de mim. Abriu um largo sorriso logo que me viu entrar no restaurante. E, com um gesto de mão, me convidou para a sua mesa.

– "Tenho várias notícias para você", me foi ele dizendo, com certo ar de vitória.

Na realidade, a primeira notícia não era notícia, era invectiva:

– "Então, começou ele, o..., o...", e procurava um nome que insistia em não lhe vir à mente.

– "O... quem?", perguntei?

– "Ora, o Secretário de Segurança de Minas".

Procurei também lembrar-me do nome, porém não consegui. Na mesa havia três mineiros que também não souberam dizer.

– "Enfim, continuou meu sapo, que grande homem esse tal Secretário, hein? Trancou mesmo a campanha de vocês, em toda Minas. Muito bem! É o que se deveria fazer em todo o Brasil. Não compreendo essa moleza do Governo Federal".

– "Mas, retruquei, você não se diz democrata-cristão? Como cristão, você deveria apoiar nossa campanha contra o IDO-C e os "grupos proféticos", que infiltram o ateísmo na Igreja. Democrata, você deveria ser a favor da liberdade de pensamento, consagrada pela Constituição. Você deveria, portanto, protestar contra o gesto do Secretário".

– "Lá vem você com suas tiradas, exclamou o sapo. Se vocês saem à rua, os comunistas também têm o direito de sair. E os choques são inevitáveis. Foi para prevenir situação como esta, que, a meu ver, se fez o golpe de 13 de dezembro: igualdade para todos, e paz no Brasil".

– Oh, esta é grave, exclamei, e até gravíssima. Então, o golpe terá sido o contrário do que o Brasil inteiro pensou.

Em vez de pôr os comunistas fora da lei, produziu uma espécie de Estatuto do Comunista. Fica assegurado aos comunistas o direito de fazer toda espécie de infiltrações onde bem entenderem. Se alguém, em praça pública, levantar a voz contra tão grande perigo, os comunistas podem impedi-lo a pau e fogo, que a polícia não intervirá. Ou, por outra, ela intervirá para obrigar ao silêncio os que alertam o país contra a avançada velhaca do comunismo. É esta espécie de coexistência pacífica, que você aplaude?"

– "Sim. Exatamente isto. Proibindo a TFP de sair à rua, o Secretário mineiro consegue que os comunistas também não o façam. Se a TFP sair à rua, eles sairão igualmente. Isto é que é igualdade!"

– "Igualdade entre os que estão fora da lei, como nós? O que é então a lei? Uma brincadeira?"

– Olhe, Plinio, você goste ou não, a coisa é mesmo assim. O tal Secretário andou bem. Fechada, em Minas inteira, a campanha da TFP... Ótimo!"

A esta altura, um dos nossos comensais mineiros se dirigiu ao sapo, diplomática e maciamente: - "Escute, você vai além do Secretário. Ele proibiu a campanha da TFP em praça pública, não a campanha de casa em casa". E o outro acrescentou sorrindo: - "Não seja mais secretarial do que o Secretário". O sapo mastigou freneticamente uns pobres camarões, dignos de melhor sorte. E fingiu não ter ouvido.

Resolvi espetá-lo. E disse: - "Pois mesmo assim discordo categoricamente do tal Secretário... aliás o único no Brasil a entender desse estranho modo a missão da polícia".

O sapo saltou: - "Só ele, não. Dom Zattera também". Desta vez, quem pulou fui eu: - "Como assim? Dom Zattera, o bispo de Pelotas?"

O sapo tirou do bolso um jornalzinho que desdobrou e mostrou com volúpia. Era uma folha de Pelotas, de 9 de julho. Realmente, ali se noticiava que o Delegado Regional de Pelotas proibira nossa campanha naquela cidade, a pedido de Dom Zattera, pois este não gostava de nossa forma de atuar. Olhei pasmo. Um dos meus simpáticos mineiros interpretou meu pensamento: - "Curioso, disse ele. No Brasil, a Igreja está separada do Estado, mas, em Pelotas, a polícia funciona como se estivesse em vigor a Inquisição. Basta o bispo não gostar, que a polícia proíbe". O outro mineiro acrescentou com discreta malícia: - "Será que vão proibir a propaganda protestante lá?"

O sapo acabara de trucidar o último camarão. - "Isto, não creio, disse ele. Acho que Dom Zattera é um homem esclarecido, e favorável à mais total liberdade de opinião".

Olhei para os mineiros, e todos rimos. O sapo percebeu que tinha caído em contradição: em lugar de se defender, tomou pois um ar de bonomia, e riu também. Coaxava ele os últimos tons de seu riso, e já sua mão tirava do bolso outra página de jornal. Era uma folha do Rio, do dia 26 de julho. E foi dizendo: - "Então, a TFP tentou invadir o recinto do Seminário do Ipiranga, para distribuir aos bispos, ali reunidos, um opúsculo contra o Cardeal Suenens, hein? Isto é obra de carbonários, e não de medievais defensores da Tradição, Família e Propriedade!"

Em toda a extensão de sua esparramada boca, meu sapo sorria, espreitando de antemão minha derrota. Os mineiros, chocados com o "feito" da TFP, me fitavam.

– "Saiba, meu caro, disse eu, que isto não passa de invencionice. A TFP nada tem com esse estudo sobre a atitude do Cardeal Suenens. Não creio, aliás, que o tal opúsculo tenha sido distribuído, à força, entre os Bispos. Em todo o caso, me dirigi ao Cardeal Rossi e ao jornal, desmentindo que a TFP tenha tido a menor participação em tal fato".

– "Ah, disse o sapo, já mais calmo, então está tudo em ordem".

– "Em ordem não, protestei. Você acha normal que a todo momento estejam surgindo contra a TFP calúnias escritas ou orais? De onde, de que máfia de sapos saem elas?"

Pensei que o sapo fosse estourar. Pelo contrário, ficou macio e desviou o assunto: - "E o pe. Comblin, disse ele, que derrota para a TFP! Depois de toda a campanha contra ele, hei-lo livre como um pássaro, fazendo conferências".

E o sapo me mostrou um folheto de propaganda do II Curso de Medicina Pastoral do Instituto Nacional Pastoral. Lá estava anunciada uma conferência do Pe. José Comblin sobre "Teologia, técnica e fé".

O sapo comentou: - "Como você vê, o Pe. Comblin não é um subversivo. Senão, jamais teria sido convidado para essa conferência. Ninguém tomou a sério a denúncia da TFP".

– "Perdão, disse eu, ninguém tomou a sério o Pe. Comblin. Pois, que o "documento Comblin" é subversivo, ninguém o pode negar. E se não se tomou a sério o conteúdo do documento dele, é a ele mesmo que não se tomou a sério".

O sapo estava recebendo a conta do garçom. O assunto o absorveu tanto, que se desinteressou da defesa do pe. Comblin. Tendo dividido a despesa com seus convidados, o sapo se levantou. Todos o imitamos. Foi o momento mais agradável do almoço.

* * *

Enquanto saíamos, ouvi um mineiro dizer discretamente aos outros: - "Essa do pe. Comblin fazer a tal conferência aqui em São Paulo é forte". Os três estavam evidentemente preocupados.

E eu também.


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