Entrevista à CX 16 RADIO CARVE –
Uruguai, 3 de abril de 1990
Repórter – Estamos em linha direta com São Paulo, com o
Professor Plinio Corrêa de Oliveira, autor do manifesto nos principais diários do
mundo que o estão publicando, e que foi estampado no Uruguai nas páginas do El
Pais no último domingo [Comunismo
e anticomunismo na orla da última década deste milênio – A TFP apresenta uma
análise da situação no mundo, no Brasil]. É o
Presidente da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e
Propriedade. Muito boa tarde, Professor. Este manifesto que se está publicando
nos principais diários do mundo, qual é
o objetivo?
Plinio
Corrêa de Oliveira – O objetivo é fazer ver bem ao
mundo a imensa aventura comunista que foi feita pelo Partido Comunista na
Rússia e pelos outros partidos comunistas nos vários países do Ocidente. Quer dizer,
a tese é que há uma aventura comunista: atirar toda a Rússia, com suas
imensidades territoriais, e ademais os países ditos aliados de Rússia, que são
verdadeiramente escravos da Rússia – Polônia, Checoslováquia, Hungria, os
países dos Balcãs – atirar tudo isso no regime de capitalismo de Estado, para
depois de 70 anos se verificar o fracasso disso, isto foi uma aventura imensa e
trágica. Como podem os chefes comunistas justificar que tenham submetido todos
os povos a essa aventura, sem se darem conta de que isso era um crime?
Segundo: por que razão teriam desejo de generalizar
esse regime de tragédia, de opressão policialesca, de
fome, para todos os outros países do mundo, por meio da propaganda comunista
feita por partidos comunistas subvencionados por Moscou?
Terceiro: por que as grandes potências do Ocidente não
foram mais enérgicas, e em vez de dar subvenções aos regimes comunistas que
prolongaram a existência desses, pelo contrário cortassem os subsídios para que
o regime comunista caísse mais depressa?
Essas são grandes questões que estão muito claras e
muito patentes aos olhos de todos hoje em dia, com a situação da Rússia como se
mostra. E era necessário conscientizar as multidões sobre essas questões.
Repórter – Tomando em consideração os acontecimentos na Europa
do Leste, especialmente na União Soviética, de acordo com os pronunciamentos de
Gorbachev, já não representa nenhum perigo para as nações ocidentais.
PCO
– Eu não estou de acordo com isso, porque eu não estou seguro que Gorbachev
tenha desejos de verdadeiramente transformar esse regime num regime de
capitalismo privado, que é a única solução possível para a Rússia. A meu ver,
ele trabalha para ser um regime de autogestão, em que a sociedade se divida em
pequenos grupos autogestionários, autônomos face ao Estado, é verdade, mas com
uma ditadura interna em cada grupo, férrea. E essa ditadura seria uma espécie
do que eles chamam comunitarismo. É a meta do
comunismo segundo a constituição soviética. O regime de capitalismo de Estado
foi sempre considerado pelos comunistas como uma etapa. É certo que estamos
passando da etapa do capitalismo de Estado para a autogestão. Não é
absolutamente certo que estejamos passando para o capitalismo privado.
Repórter – De acordo com o que o Sr. disse, Professor, isso
seria uma [??? Não se entende a expressão] segundo suas expressões. Que opinião
lhe merece a união européia do Atlântico aos Montes Urais?
PCO –
Essa união, que é ainda uma possibilidade – e quiçá será uma quimera – essa
união pressupõe a liberdade de cada povo de ter seu regime sócio-econômico e
político próprio. A união não tem como meta submeter todos os povos da Europa a
um só regime. De sorte que a Rússia fica livre de organizar-se como queira.
Repórter – Brevemente, Professor, o Sr. poderia definir o que
é a autogestão propugnada pelos atuais líderes do Kremlin soviético?
PCO
– A autogestão é uma fragmentação da sociedade como a temos hoje em dia, quer
dizer, os grandes grupos sociais. Você imagine uma grande cidade como por
exemplo Montevidéu. Essa cidade deveria começar a ter em seus bairros uma certa
autonomia, de maneira que os grupos sociais de um bairro tivessem uma grande
autoridade sobre os habitantes do bairro, mas fossem muito autônomos em relação
à municipalidade global de Montevidéu e à Presidência da República [do
Uruguai].
De sorte que os grupos pequenos ficariam muito mais
fortes, mas o grande todo municipal, e ainda mais o grande todo nacional
ficariam cada vez mais frouxos. Até o ponto em que se dissolvam as nações, e se
dissolvam os municípios, e restem só esses pequenos grupos autogestionários,
porque cada grupo seria mais ou menos autônomo ou soberano em relação a outros.
E porque, em tese, a democracia interna de cada um desses grupinhos
seria a rainha do grupinho.
Mas, na realidade, nós conhecemos o regime
representativo, e não é o que sucederia. Quer dizer, se estabeleceria no
interior de cada grupinho ditaduras, e ditadura de
matiz comunista, que estabeleceria o trabalho comum, a educação em comum de
todos os filhos numa escola, e uma promiscuidade de matrimônios não muito
definida, mas certamente muito maior do que no simples regime do divórcio, que
faria um coletivismo de pequeno grupo. Quer dizer, a coletivização
que não foi possível estabelecer inteiramente em grupos grandes, como por
exemplo a Rússia, se estabeleceria no microcosmos dos bairros municipais, isto
é, nas cidades.
No campo, seriam zonas do campo que constituiriam
grupos similares aos da cidade. Não seriam bairros, mas seriam distritos do
campo, que constituiriam assim pequenas repúblicas, ou pequenos soviets localizados, muito circunscritos.
Eu não sei se me expliquei bem?
Repórter – Bastante claro, Professor. Por último, tomando em
conta o contexto da América Latina, haveria um plano diferente para a difusão e
aplicação desse comunismo que o Sr. disse, ou seria também o modelo
autogestionário que estariam querendo impor?
PCO
– A meu ver, na América Latina pode-se discutir se o plano comunista é de
imediato – para aplicação imediata – a autogestão, ou se não é o capitalismo de
Estado como teve a Rússia. Quer dizer, segundo a mentalidade dos comunistas
teóricos, de alto vôo, o capitalismo de Estado deve preparar as nações para a
autogestão. E a autogestão em última análise deve conduzir à anarquia. Uma
anarquia que eles concebem não como um choque nem como um caos, mas uma anarquia sinfônica, uma anarquia harmônica, que tivesse como
resultado que, sem haver autoridades, os homens se comportassem de maneira
satisfatória uns com os outros. E então o sonho revolucionário dos franceses de
1789 se realizaria: liberdade, igualdade, fraternidade. Nenhuma autoridade.
Esse ponto terminal é muito parecido com o programa de
certos grupos verdes.
Agora, transposta sua questão para a América Latina.
Segundo essa teoria, haveria necessidade de quebrar as grandes estruturas antes
de passar para o microcapitalismo comunitarista.
E esta quebra teria que se fazer pelo capitalismo de Estado. E isto explicaria
o furor com que Fidel Castro se opõe à aplicação da perestroika
em Cuba. Como Havana é um pouco a Moscou da América Latina, pode alguém se
perguntar se a atitude de Fidel Castro não é combinada com Gorbachev para impor
aqui o capitalismo de Estado, que é uma etapa necessária para chegar à
autogestão.
Repórter – Perfeito, Professor Plinio Corrêa de Oliveira,
Presidente da Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família, Propriedade.
Agradeço-lhe este contato direto Montevidéu-São
Paulo. Até qualquer momento. Muito obrigado.
PCO –
Eu que agradeço a vocês a gentileza da entrevista.