Os artistas venezianos quase sempre são mais apaixonados
pelas cores, enquanto os florentinos são mais atraídos
pelas formas. Veneza é colorista por natureza. Isto
devido a seus palácios e lagunas, recebendo da presença
da água o encanto de um ar colorido. Assim, realça todas
as coisas e explica a tendência de seus artistas a
salientar a cor como elemento de arte.
Por sua vez, em Florença, seus artistas — não
recorrendo predominantemente à cor como principal
elemento ornamental — valem-se do desenho, cujas obras
de arte são o que há de melhor.
Então, a respeito da diferenciação entre a escola
veneziana e a florentina pode-se levantar a seguinte
pergunta: como transformar este tema num assunto que se
compreenda e desperte interesse? Para isso vamos dar
dois exemplos.
Neste primeiro quadro o interior da Basílica de São
Marcos em Veneza, pintado por Canaletto, nota-se uma
linha mestra: a igreja apresenta uma planta em forma de
cruz, que é traçada a partir de uma linha desde a porta
principal.
Interior de São
Marcos - Canaletto, 1755, Royal Collection, Windsor.
O grande pintor Canaletto colocou-se de costas para a
porta e de frente para o altar-mor. Na altura do
púlpito, abrem-se duas naves transversais completando o
formato da cruz. O estilo arquitetônico é simples, porém
tudo é abundantemente pintado e colorido! Um exemplo: a
arcada é toda ela repleta de decorações e enfeites. Um
esplendor no qual a cor prepondera, porque tudo é muito
mais pintura do que escultura. Cores luminosas, vivas e
impressionantes.
No segundo quadro, também de outro grande pintor,
Piero della Francesca, que trabalhou em Florença,
representou uma cena pobre do Natal do Menino Jesus.
Observe-se o contraste: enquanto Canaletto pintou uma
das basílicas mais suntuosas da Cristandade, na cena do
Natal quase tudo é desenho, as cores não têm tanta
relevância. Vê-se Nossa Senhora olhando para o Divino
Menino deitado numa almofada.
Natal - Piero de la
Francesca (1420-1492), National Gallery, Londres.
Os personagens, ao contrário dos venezianos, todos
são magros. Em Veneza, tendência para os prazeres da
mesa; em Florença, inclinação para uma atitude ascética.
Na cidade veneziana, todos os personagens estão fazendo
movimentos vivos e exclamativos; na cidade florentina,
movimentos muito comedidos. Nossa Senhora olha para seu
Filho. Ela aparece enlevada, mas sem transportes
exclamativos, mas gestos concisos.
No primeiro plano há figuras tocando instrumentos de
corda em louvor do Menino Jesus. Certamente, as canções
deles não eram dramáticas, mas sóbrias. Quase todos
vestidos de verde, em tons diversos. Nossa Senhora
também com um traje verde. No segundo plano há outras
pessoas igualmente em vestes de um colorido semelhante.
Nos outros personagens também as cores não são muito
vistosas.
A vida do quadro reside mais nas linhas elegantes das
pessoas, em suas atitudes sóbrias e no desenho perfeito.
A cor desempenha papel secundário.
NOTAS
[*] Excertos da
conferência proferida pelo Prof. Plinio Corrêa de
Oliveira em 12 de agosto de 1989. Sem revisão do
autor.
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