Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Marquês de Comillas

varão forte, “Grande de Espanha” e Servo de Deus

 

 

Santo do Dia, 28 de dezembro de 1988

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A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério tradicional da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.

Don Cláudio de López Bru, segundo Marquês de Comillas

Nasceu em Barcelona, a 14 de maio de 1853 e faleceu em Madri, a 18 de abril de 1925. Seu nome completo era Claudio Segundo Bonifacio Antonio López del Piélago y Bru.

Filho de Antonio López y López e de Luisa Bru, foi o quarto dos filhos nascidos. Doutorado em Direito pela Universidade de Barcelona. Em 1881 casou-se com María Gayón Barrié. Não teve descendência. Herdou de seu pai, falecido a 16 de janeiro de 1883, os títulos de Marquês e "Grande de Espanha", além de vultosa fortuna. Em 1945, teve início seu processo de beatificação.

 

Tenho aqui em mãos – deu-me uma pessoa na Espanha (por ocasião de então recente viagem à Europa do Prof. Plinio, no final de setembro até primeiros dias de novembro de 1988, n.d.c.) – uma biografia do segundo Marquês de Comillas, extraída do próprio processo de beatificação, e posta ao alcance do público pelo próprio postulador de sua causa de beatificação. Quer dizer, é um documento, portanto, dos mais seguros.

O título é: "Un Marqués Modelo". E depois embaixo está: "El Siervo de Dios, Cláudio de López Bru, Segundo Marqués de Comillas". "Por el Rvdo. Pe. Eduardo F. Regatillo SJ (da Companhia de Jesus), Postulador", Sal Terrae, Santander, 1950.

Já tive ocasião na reunião passada de dar em pinceladas muito rápidas as linhas gerais da vida desse homem. Eu repito apenas porque hoje o torvelinho das coisas e das circunstâncias é tão grande, que bem pode acontecer que alguns se tenham esquecido dos dados principais.

Capa da biografia aqui comentada

* A vida do primeiro Marquês de Comillas, filho de uma mendiga 

O pai dele era um homem que tinha nascido na mendicância e tinha feito fortuna. Eles eram de um antigo Condado da Catalunha que faz parte do Reino da Espanha, num lugarejo muito pequeno chamado Comillas. A mãe dele era uma mendiga, uma senhora que tinha um bom número de filhos e não tinha dinheiro com que mantê-los filhos. Então, quando não tinha outro meio, ela ia a casas de conhecidos e pedia umas sopas que se fazem lá na Europa, para alimentar operários e gente assim. Pedia que dessem também para a família dela. As pessoas tinham pena, davam alguma coisa e com isso ela ia vivendo.

Quando o filho dela chegou a ser mocinho - o qual veio a ser de futuro o primeiro Marquês de Comillas -, ele pediu licença à mãe para ir a Barcelona. Ela estava na miséria, ele queria ver se ganhava a vida e com a sobra de seu ordenado, poderia mandar alguma coisa para a mãe, a fim de que pudesse educar normalmente os irmãos etc. E, por causa disso, ela lhe deu a bênção e ele foi para Barcelona.

Em Barcelona, a primeira coisa que fez foi tomar contacto com outro rapazinho de sua idade, e que parece que era uma pessoa aproveitável, senão do ponto de vista religioso, pelo menos do ponto de vista humano. Trabalhavam juntos, fizeram amizade e dentro de algum tempo eles resolveram não ser mais empregados, mas fazer negócios juntos. De maneira tal que, com o dinheirinho que eles economizavam, faziam como que um minúsculo pecúlio, que iam aplicando juntos, porque o que cada um tinha era tão pouco que não dava nem para fazer negócio minúsculo. E iam aumentando, aumentando, e afinal de contas cresceu tanto a soma de dinheiro deles que puderam adentrar-se pelo comércio da Espanha com uma parte de suas antigas colônias na América Central, que continuava parcialmente, naquele tempo, sob o domínio da Coroa espanhola.

Fizeram, então, negócio sobretudo com Cuba. Lá eles montaram uma espécie de cabeça de ponte. Tinham alguém em Barcelona – que é o principal porto da Espanha - que os representava e outro agente de confiança em Cuba. E acabaram constituindo uma empresa razoável.

Eles tinham combinado que quando chegasse a um certo montante, cada um tinha bastante capacidade para não precisar do outro e iam começar a andar pelas próprias pernas. Separaram-se e cada um fez uma empresa. E este filho mais velho dessa viúva mendiga resolveu lançar-se em uma atividade muito arriscada: desenvolver uma companhia de navegação transatlântica, que devia fazer todo o trajeto de Barcelona até Cuba e de Cuba até Barcelona, levando passageiros e sobretudo mercadorias. Para o vulto das coisas naquele tempo, isto supunha capitais enormes e era necessário haver um mínimo “x” de navios.

Ele resolveu jogar-se e foi muito bem sucedido, a companhia prosperou enormemente, tornou-se um homem muito rico e começou a aplicar os lucros em outros gêneros de empresas na Espanha: exploração de metais, plantações, gado, etc. E naturalmente a fortuna foi se multiplicando por si mesma e se tornou um dos homens mais ricos da Espanha.

O primeiro Marquês de Comillas, pai do Servo de Deus Don Cláudio de López Bru 

* O primeiro Marquês de Comillas recebe do Rei seu título de nobreza 

Acontece que ao mesmo tempo ele era um homem de convicções monarquistas muito profundas, e como na Espanha houve no século XIX vários movimentos republicanos de fundo comunista, anarquista, etc., ele resolveu, para combater esses movimentos, estabelecer na França, fora da garra do governo republicano espanhol, um centro de invasões militares na Espanha. Então faziam guerrilha monarquista contra os exércitos republicanos ou comunistas da Espanha, que contribuíram seriamente para a derrocada do regime republicano.

Os Srs. estão vendo que o primeiro Marquês de Comillas não era apenas um comerciante preocupado só em fazer dinheiro, mas um homem que tinha vistas mais elevadas, interessava-se pelo futuro do país, era monarquista etc. Então sacrificava dinheiro, tempo, arriscava sua própria posição econômica – pois podia ser perseguido por seus opositores, inclusive pelo governo -, para fazer prevalecer um regime que ele reputava melhor para sua pátria. Era portanto uma pessoa que tinha ideais, ao contrário de tantos e tantíssimos homens de negócio de hoje em dia.

O Rei Afonso XII, agradecido pelo serviço por ele prestado, nomeou-o  Marquês de Comillas. Marquês, como os srs. sabem, é um título de nobreza bem alto. O título mais alto de nobreza é o de duque. Superior ao duque só os príncipes e o Rei. Na Espanha o título de príncipe é dado apenas aos membros da Família Real, que pairam acima do restante da nobreza. Os títulos de nobreza, de baixo para cima, são: barão, visconde, conde, marquês e duque. E ele foi nomeado Marquês de Comillas. Para um filho de uma mendiga, isto era uma promoção de estontear.

Alfonso XII 

O Rei – antes de lhe conferir o marquesado – perguntou-lhe qual o título que desejava, queria ser marquês do quê. E ele teve o bom gosto e o belo gesto de pedir para ser nomeado marquês da cidadezinha onde sua mãe havia praticado a mendicância e onde ele fora visto molequinho, andando de um lado para outro carregando sopa, como quem não se envergonha de seu passado, mas compreende que era uma situação e uma atividade honesta, que era dotado de bons predicados comerciais e que de outro lado tinha saúde, era um homem forte, a Providência o favoreceu e fez uma grande fortuna. Ficou o Marquês de Comillas.

Esse é o primeiro Marquês de Comillas, quer dizer, não houve outro antes. 

* Educação de Antônio e Cláudio, filhos do Marquês 

Teve duas filhas e dois filhos, um chamado Antônio e outro Cláudio. Estes dois eram intimamente ligados com uma amizade de vida e de morte, aos quais quis dar uma educação exímia, que lhes convinha como herdeiros de uma grande fortuna comercial. De outro lado, uma educação intelectual e social muito boa, de maneira que pudessem - para usar uma expressão espanhola interessante – “relucir” nos grandes salões da época, aonde o título de Marquês de Comillas lhes dava acesso.

Assim, estudaram muito. Mas esta biografia, sem dizer claramente, dá a entender que o Antônio era muito menos piedoso que o Cláudio, e que o verdadeiramente piedoso era o Cláudio. 

* Viagem pelas cortes europeias

Quando a educação de um jovem dessa categoria se completava naquele tempo, fazia o que se chamava as “Cortes da Europa”. Na Europa daquele tempo ainda não havia repúblicas, exceção da França.

Então um rapaz de categoria visitava as cortes de toda a Europa. Digamos, a começar por Portugal e acabar em St. Petersburg, no outro extremo. Ou começar, se quiserem, em Londres e acabar em Roma, por exemplo, passando por Viena, Berlim, Paris, aonde visitavam a família real francesa destronada, mas que tinha príncipes lá morando. Eles entravam nesse ambiente de corte da Europa, que é brilhante, de alta distinção, mas que evidentemente podia seduzir para o mundanismo enormemente.

Esse giro pelas cortes deveria concluir a educação deles. Deveriam adotar um porte distinto, maneiras bonitas, sabendo tratar com os grandes da terra, sabendo conversar desembara¬çadamente com os homens mais importantes, mais dignos de atenção etc., de maneira que eles ficassem dos pés à cabeça preparados. Mas ao mesmo tempo com uma formação religiosa muito boa. Isso o pai mandou dar aos filhos e o nosso Cláudio Comillas aproveitou profundamente e desde menino extraordinariamente piedoso. Em todo o trajeto que ele seguiu, era de Comunhão assídua ou diária. E a viagem terminou com uma visita ao Papa Pio IX. O jovem Cláudio enviou uma linda carta para a família descrevendo o Pontífice. Após o périplo, voltou a Barcelona. 

 

Papa Pio IX

* A tuberculose mata Antônio e atinge Cláudio 

Em Barcelona, começa a vida de trabalho. Porque estava tudo muito bonito, tudo lustrado, tudo enfeitado, agora precisava carregar a fortuna nas costas. Como carregar uma fortunaça dessas? Ele e o irmão se puseram ao trabalho.

O irmão Antônio contraiu uma tuberculose galopante e Cláudio cuidou dele. E o fez com tanta dedicação que a doença o contagiou e ficou tuberculoso durante a vida inteira. E isto o fazia sofrer muito, mas que ele escorava no duro,  levando a vida de um homem normal. Naquele tempo não sabiam curar a tuberculose como hoje, não havia os antibióticos, e sobretudo não tinham muita idéia do papel do ar livre na reconstituição do tecido pulmonar, do repouso etc., toda essa cura era muito mais elementar.

 

* Vida de Don Cláudio em seu palácio e na corte real 

Ele levava a vida de um homem comum e trabalhava intensamente. A tal ponto que em seu palácio tinha um escritório naturalmente,  bem como outro no centro da cidade. De manhã levantava-se, comungava, voltava e ficava trabalhando até a hora do almoço. E quando vinham dizer que a refeição estava pronta, ficava trabalhando até a hora em que todos estivessem sentados. Só então entrava para poder aproveitar até o último minuto de trabalho.

Durante o almoço conversava com a senhora, com parentes - os Srs. sabem que na mesa dos ricos nunca faltam convidados - de maneira que sempre havia gente. E a conversa dele era muito agradável, muito afável, muito inteligente, muito interessante. Ele era um homem muito inteligente. Depois com a experiência da vida que ia crescendo, as viagens que fez, sua prosa era muito cheia de evocações etc. Gostava-se muito de conversar com ele, sendo sua prosa puríssima, e nunca, em ocasião nenhuma proferisse uma palavra indecente ou algo que pudesse se parecer. Era um homem irrepreensível.

Devoto muito especial de Nossa Senhora, comparecia com freqüência às igrejas de Madri onde estivesse exposto o Santíssimo Sacramento. Ficava muito tempo rezando e se pode dizer que era o único lugar onde ele por assim dizer esbanjava tempo era rezando diante do Santíssimo Sacramento ou diante de uma imagem de Nossa Senhora. Aí ele gastava o tempo à vontade.

Nas ocasiões necessárias, ele comparecia à corte e então com traje de gala, com as condecorações todas que tinha etc., e sabia se impor também na corte. Infelizmente os costumes da nobreza europeia eram péssimos. Eram apenas um pouco melhores do que os costumes da burguesia contemporânea. E neste livro conta o caso – um entre outros - do respeito que impunha. Durante uma recepção no Palácio Real estavam conversando o Rei e uma série de pessoas. E um marquês começou a contar anedotas inconvenientes. O rei ouviu, olhou para a ponta da galeria, viu Don Cláudio que entrava e disse: "Silêncio, Comillas entrou na sala. Vão parar essas conversas". Quer dizer, ele fazia a lei. Se fossem dizer na sua presença, censuraria. 

Universidade de Comillas, construída graças aos generosissimos donativos feitos pelo primeiro e sobretudo pelo segundo Marquês de Comillas 

* Jornais católicos do Marquês de Comilla

Era um homem muito atento para todo o serviço da Igreja em seu tempo Favorecia de modo assinalado a ação da Igreja, não só no domínio puramente espiritual, mas também no plano temporal. Ou seja, fazer com que as leis da Espanha fossem favoráveis à Igreja, que fossem conforme as Leis do Evangelho, isto era uma preocupação contínua dele, no que inverteu quantidades de dinheiro colossais.

Chegou a fundar mais de um jornal católico do qual ele mesmo dava a direção. Mas como havia muita calúnia e muita oposição, que arrostou de peito aberto, os jornais católicos eram deficitários. Assim dizia ele aos seus funcionários: "Pouco importa, para isso eu tenho dinheiro. Se eu não tenho dinheiro para favorecer a imprensa católica, não me adianta ser rico e carregar essa fortuna nas costas. Eu carrego essa fortuna para poder gastá-la em benefício da Igreja, da Civilização Cristã. Portanto eu vou aplicar".

Há inclusive cartas de consolação dele para seus diretores de jornal, quando estes viam que havia dado déficit no fim do ano. Escrevia então: "Não se incomode que o responsável sou eu, quem paga sou eu. Você está triste com o prejuízo que me deu, eu estou alegre com o que a minha alma lucrou no Céu pelo bem que fez a sua folha. Vamos continuar. Economize o que puder; o que não puder não economize. Toque para a frente porque a vida é essa". 

* Influência junto ao episcopado: presidência da Ação Católica 

Ele era homem de não se contentar apenas com isso. O episcopado espanhol daquele tempo era naturalmente muito mais conservador do que o de hoje. Em nossos dias, seria tido por ultramontano, como ultra contra-revolucionário em comparação com o episcopado espanhol de hoje. Esse episcopado gostava muito dele. Os sucessivos Núncios Apostólicos - embaixadores do Papa em Madri - gostavam muito dele.

Quando havia um posto que exigia inteligência, coragem e absorção de tempo, confiavam-no, desde que fosse proporcionalmente alto para o Marquês de Comillas. Então ele foi, por exemplo, presidente da Ação Católica Espanhola. Pelo que se entendia naquele tempo, algo completamente diferente do que foi depois a Ação Católica. Era uma coligação de forças católicas. Ele foi seu presidente durante muito e muito tempo.

Na agenda de seus trabalhos figurava assim: a Transatlântica, a Mina de Ferro de não sei quê, a Ação Católica, tal Banco, depois tal outro Banco, tudo coisas dele. Entre as ocupações principais para a agenda durante o dia estava uma reunião na Ação Católica.

Às vezes, as pessoas que participavam da reunião lhe diziam: "Marquês, nós vemos que estamos lhe tomando um tempo enorme, o Sr. tem outros encargos. O Sr. não que cessar a reunião?" Ele dizia: "Do meu tempo cuido eu, o Srs. cuidam dos interesses da Igreja. Quando eu entender que vale a pena eu sair, eu sairei, mas eu prefiro deixar de ganhar mantendo-me ausente do expediente durante algum tempo, do que ganhar mais, porém não fazer nada pela causa da Civilização Cristã". Com o que dava aos outros um magnífico exemplo.

Obteve com isso as maiores condecorações que um Papa podia dar a um leigo. O soberano, Afonso XII e depois seu filho, Afonso XIII, o cumularam também de títulos. 

* Exemplo de perseguições contra o Marquês 

Ele era tudo isto e ao mesmo tempo com uma fortuna gloriosa, radiante. Mas como já disse antes, caluniado. E, por causa disso, às vezes alguns políticos lhe faziam onda contra para prejudicá-lo nos negócios.

Para funcionar um banco é preciso ter uma licença governa¬mental. Houve quem quisesse caçar as patentes de seu banco.

Uma companhia transatlântica com sede na Espanha, para aportar em portos espanhóis, era preciso uma licença governamental. E de tempos em tempos era preciso renovar a licença. E se ele obtinha essa licença em Barcelona, por exemplo, nenhum outro podia ter a mesma licença para o mesmo trajeto naquele porto, de maneira que isto era concedido pelo Parlamento Espanhol. Levantavam-se então pessoas no Parlamento e falavam que ele era um carola, um retrógrado, um homem impossível e às vezes procurando por em dúvida sua honestidade.

Nesta biografia se narra que um Primeiro ministro espanhol liberal, de posição oposta ao Marquês de Comillas, o Conde de Romanones, foi atacado no Parlamento por ter dado uma patente ao Marquês de Comillas. Disseram que Romanones não havia verificado bem qual era a honestidade de Comillas. O Romanones disse: "Eu sou adversário político do Marquês de Comillas. Mas eu devo dizer que ele é o homem mais honesto que há na Espanha". Quer dizer, era desse jaez sua probidade... 

* Peregrinação de 10.000 operários espanhóis a Roma, organizada por este Grande de Espanha e Servo de Deus 

Na Ação Católica, promoveu atos de um alcance extraordinário dentro do âmbito espanhol. Por exemplo, organizou com os diretores da Ação Católica espanhola e com a aprovação do Episcopado, uma peregrinação de nada menos de 10 mil operários espanhóis para visitarem a Santa Sé e agradecerem ao Papa a promulgação da Encíclica Rerum Novarum.

A oposição que os revolucionários tinham a essa colossal peregrinação foi tal que organizaram em Roma piquetes de agressão contra os espanhóis que estivessem visitando Roma, para conhecer igrejas, santuários, lugares vários, restaurantes etc., para agredir e depois dizer que foram os espanhóis que começaram a briga. A autoridade do Comillas era tal que àqueles operários, que em grande parte não eram subordinados seus, ele deu ordem - meus caros espanhóis, conseguir isso de espanhol não é fácil... - que ninguém respondesse às provocações, que as acolhessem com dignidade mas com humildade e não brigassem em nenhum caso. E também deu outra recomendação: que saíssem de casa o menos possível e sómente em grupos muito grandes para ir ao Vaticano. Ele obteve isso com tal êxito que não houve nenhum incidente com esses 10 mil espanhóis na cidade de Roma.

Os srs. vêem por aí a alta respeitabilidade moral desse homem. Não era pelo dinheiro que tinha, nem pelo título que portava, mas era o respeito moral que incutia. Eram razões morais.

Ele encaminhou essa gente toda de volta para a Espanha, mas com um fato que mostra bem o atraso do tempo. O Marquês pôs grande parte de seus navios à disposição para transportar os operários dos portos espanhóis para os portos italianos. E um bom número desses operários, quando chegou a hora de voltar, disse que não queria viajar de navio, porque se nausearam demais e não tinham coragem de embarcar. O Comillas fretou, então, trens para todos que não quisessem ir de navio... E assim a procissão se realizou na perfeição! 

O Rei da Espanha Alfonso XIII inaugura o monumento ao Sagrado Coração de Jesus no "Cerro de los Ángeles"

* Inauguração do monumento ao Sagrado Coração de Jesus no "Cerro de los Ángeles" 

A fim de simbolizar adequadamente o predomínio de direito que a Igreja tinha adquirido na Espanha - e que Ela tinha direito de ter -, ele foi um dos que mais contribuíram para que se erguesse o famoso monumento ao Sagrado Coração de Jesus no Cerro de los Angeles. A palavra cerro em português se usa muito também; significa uma certa elevação de terreno, montanha não muito alta. Se não me engano, tal monumento se encontra no centro geográfico da Península Ibérica.

Ele esteve presente na inauguração e foi uma das pessoas principais no ato inaugural pelo muito que fez para que esse monumento fosse levantado (o jornal espanhol ABC de Madrid, do dia seguinte à inauguração, 31-5-1919, pág. 9, publica uma crônica sobre este evento e narra que, entre as personalidades presentes, se encontrava “o marquês de Comillas, alma desta festa, trajando o uniforme da Ordem de São Gregório”, n.d.c.). O Rei Alfonso XIII e a Corte da Espanha participaram também do ato desta solene inauguração. 

Comemoração no Cerro de los Ángeles, pouco tempo depois de sua inauguração

* Apoio a intelectuais, operações financeiras: império econômico e espiritual 

Ao par de todas essas atividades, ele era um intelectual, recebia intelectuais para promover a Contra-Revolução nesse campo também, favorecendo os que mais publicassem obras católicas para combater a onda má.

Os srs. imaginem na São Paulo de hoje um pluri-miliardário que agisse assim... Eu tenho e impressão de que em qualquer grande cidade de hoje a fortuna dele não resistiria, porque seria tal o ataque vindo de todos os lados, tal a sabotagem, tal a difamação, tal a retração de encomendas, tal ataque, que um homem desses afundava, qualquer que fosse a sua fortuna. A dele, conseguiu mantê-la no alto e crescendo, de maneira tal que se lançou até – numa pessoa cujo processo de beatificação esteja em curso causa surpresa - em operações financeiras. Quer dizer, emprestando a juros, comprando uma moeda, vendendo outra, apresentou-se nesse campo e ganhou dinheiro também. Tinha um império econômico - se diria hoje em dia - e tinha um império espiritual! 

* O compromisso com a esposa na noite de núpcias 

Para os Srs. terem idéia de sua seriedade, em sua noite de núpcias, ele fez com a esposa um trato: quando um dos dois estivesse próximo ao fim de sua vida, o cônjuge sadio deveria avisar o outro tão logo que entrasse em perigo de morte, para poder chamar um sacerdote e preparar-se para falecer condignamente.

A marquesa, sua esposa, morreu depois dele. Logo que caiu em perigo de morte, a marquesa avisou: "Cláudio, lembra-se de tal compromisso assim?" Ele disse: "Lembro-me". Ela: "Eu estou cumprindo meu compromisso. Você está em perigo de morte". Ele: "Obrigado, eu já estava percebendo. Mande chamar o padre tal, mande fazer aquilo, aquilo outro...", com toda lucidez, com toda a calma, rumou para a morte como um Bem-aventurado. 

* A coragem contra o respeito humano 

Eu me perguntava a mim mesmo o que esse homem teria propriamente de um gênero de virtudes que a nós nos interessa um tanto e a respeito das quais o autor do processo de beatificação não diz uma só palavra. Esse homem era muito corajoso contra o respeito humano. Dou muito mais valor ao homem que é muito corajoso contra o respeito humano do que ao homem que o é relação à sua vida. Resistir a uma gargalhada prova mais heroísmo do que enfrentar circunstâncias em que se possa levar um tiro. Mas eu gosto que um homem reuna as duas formas de coragem. Às vezes, há ocasiões em que por legítima defesa é preciso até dar um tiro. E às vezes não é legítima defesa da própria pessoa, mas é a legítima defesa de um templo atacado, de um personagem que tem direito a viver e que o homem tem que defender.

E eu me perguntava: "Esse homem tão bom, tão generoso, que criava para seus operários condições ideais de existência, etc., esse homem seria bastante corajoso quanto eu quereria? Tanta doçura não será o contrário da coragem?" 

* O varão forte 

Vou lendo o livro e encontro quase no final, no capítulo XVII, o título: "O Varão forte". E me alegrei!

Sublinhei alguns trechos, mas não fiz isso com a intenção de lê-los aqui no auditório. Durante o dia inteiro não tive ocasião de selecioná-los. Assim, começo com a leitura. 

* Coragem, força e grandeza de alma nas más circunstâncias 

"Mostra-se a virtude da fortaleza no Marquês de Comillas, em sofrer varonilmente as adversidades. E em empreender com grande presença de ânimo coisas árduas e arrostar perigos".

A definição está muito bem feita! A fortaleza supõe força de alma nas circunstâncias más, supõe grandeza de alma para fazer coisas difíceis e coragem para enfrentar o perigo. Isso define o varão forte. É uma definição que vale a pena termos para o nosso exame de consciência, porque todo aquele que pertence a uma TFP deve ter por ideal ser um varão forte. Os Srs. viram no (segundo) Marquês de Comillas a fortaleza de sofrer com coragem a tuberculose, que é uma doença que mina, desgasta; e ele dar muito, vencendo um corpo que dá pouco. Isso é fortaleza!

Empreender coisas grandes: ele o fez de toda ordem! Quando essa peregrinação de 10 mil operários estava para embarcar, ele saiu do palácio episcopal com o bispo e com o governador da província, e os anarquistas atacaram o carro onde iam. O Comillas, de bastão na mão, dava porretadas em quem se aproximava, expondo-se ao risco de ser morto ele mesmo. 

"A resignação tão admirável e sobre-humana do Marquês nas maiores calamidades, o seu delicadíssimo coração, foi notável". E conta aí coisas de caráter íntimo, sensível, em que sofreu muito. (...)

"Nós vimos por ocasião da morte de suas pessoas mais queridas, quanto ele tinha em vista a possibilidade de perder sua fortuna de um momento para outro.

"Era uma coisa sobre a qual ele falava com frequência: `Toda fortuna se arruina facilmente. Como eu farei se eu perder essa fortuna?'"

Ele naturalmente tinha a noção que estava se expondo muito e que de repente lhe passavam uma rasteira e caía no chão. 

"Ele dizia: `Contanto que a marquesa e eu tenhamos do que viver do meu trabalho, eu estarei contente, porque terei servido a Deus até o fim'".

"E quando em suas campanhas pela ação social católica ele encontrava desdém, quando não oposição, daqueles que deveriam prestar-lhe apoio, ou quando se anunciava a ele algum grande prejuízo como o naufrágio de um navio, em que toda embarcação ia a pique, como por exemplo, o navio Santander, ele conservava o vigor de alma até o fim”.

Por exemplo, um navio dele afundou, não me lembro bem se em Barcelona ou em Santander, e vieram avisá-lo: "Marquês, seu navio tal está afundando e todos os esforços para salvá-lo foram vãos. De um lado e de outro os passageiros estão se perdendo. É preciso tomar junto à Companhia de Seguros as providências mais imediatas". Ele disse: "Junto à Companhia de Seguros, não. Minha principal responsabilidade é por aqueles que estão lá perdendo a vida". Por causa disso, mandou vir uma lancha e foi pessoalmente, doente daquele jeito, ajudar o salvamento daqueles que estavam afundando. Apenas depois disto é que foi ver se os funcionários estavam tomando mesmo todas as providências burocráticas, quando naufraga um navio. Ele tinha responsabilidade por isso também, era defender sua empresa. Mas era menor do que salvar as almas. 

"Estávamos numa reunião do conselho da Transatlântica em Madri - era um dos diretores da companhia que depôs no processo de beatificação - quando nos anunciaram ter afundado o navio Esquierre. `Houve vítimas?' `Sim, senhor marquês'. Pereceram quase todos os navegantes. `Então, disse ele, não é hora agora de seguir tratando de negócios'. E suspendendo a sessão, ele foi em seguida à igreja de San Ginés onde estava sendo exposto o Santíssimo Sacramento. Ali ele esteve em oração durante uma meia hora. E logo em seguida retomou a reunião para tomar as providências sobre as famílias das vítimas".

Desta vez ele não foi, por alguma razão, salvar pessoalmente, mas a primeira coisa que fez foi rezar por aquelas almas e depois voltou para a reunião. Os Srs. estão vendo portanto como era um homem de espírito sobrenatural afiado e  resignado. Em vez de ficar abatido por ter perdido um navio, nada! “Vamos providenciar agora o que temos que providenciar!” Isto é um homem! 

"Assim também ele deu provas de uma sublime resignação quando afundou, por razão criminosa, o navio chamado Afonso XII, um transatlântico, na Baía de Santander".

E vem a história que acabo de contar. 

* Enfrentando atentados, grevistas... 

"Ele mostrou a mesma fortaleza na constância com que empreendeu grandes empreendimentos. Tanto empreendimentos espirituais quanto materiais".

Contra ventos e marés, nas circunstâncias mais opostas, ele resolvia fazer e fazia! 

"O valor com que enfrentava os perigos e deixava pasmados até os mais corajosos. Por exemplo, em Barcelona, ante a ameaça dos revolucionários, ele foi a pé, diante da carruagem real, abrindo o caminho para defender a vida do monarca".

Os Srs. precisam notar que era carruagem daquele tempo, a cavalo etc., e que não queriam deixar o rei passar, eram revolucionários. Ele foi à frente, expondo-se para abrir caminho para a carruagem real e está acabado! 

"Nós o vimos num Congresso Eucarístico de Madri, colocar-se atrás de um personagem suspeito, fiscalizando seus movimentos de perto, pronto para lançar-se sobre ele ao menor intuito criminoso que ele deixasse entender de matar o rei".

Quer dizer, ele estava atrás, e, ao menor gesto, ele se atracava com o sujeito. E era um homem doente, um tuberculoso. Ele podia disso morrer de uma hemoptise. Pouco incomoda. Ele quer defender a vida do rei! 

"Nós o vimos também lutando de pistola na mão num lugar chamado Bruxes com outro que se aproximou de Sua Majestade em atitude inquietante".

Ele achou a coisa inquietante e foi de pistola na mão em cima do suspeito. Lutaram e ele o venceu. 

"Vimo-lo também no `Palco de los Calaveras' vigiando caso alguém atentasse no teatro contra a família real". 

* Lutas físicas em defesa da religião 

"Semelhante intrepidez ele desenvolveu na defesa da religião. No começo do século XX o governo anti-clerical desencadeou uma perseguição contra os religiosos e especialmente com uma lei ímpia, chamada Lei das Associações. Os católicos realizaram uma grande manifestação em defesa dos religiosos na Praça de Toros de Barcelona, à qual ele compareceu com toda a sua 'mesnada'...".

“Mesnada” é uma expressão antiga pitoresca, quer dizer todos os parentes, todos os empregados, tudo quanto era gente que dele dependia. 

"Saíamos da praça desarmados e com as mãos nos bolsos - disse o Sr. Ferrer - quando os inimigos começaram a atirar contra nós. 'A eles!', gritou o marquês impertérrito. E ele foi quem se distinguiu nessa ocasião enfrentando os que vinham".

E sem armas, heim? 

* Ajuda aos jesuítas perseguidos pelo governo 

"Ele foi quem mais se distinguiu acima de todos, na defesa dos jesuítas, durante a revolta de 1900 em Barcelona, expondo sua vida a grandes perigos. Deu a cada jesuíta uma passagem para que se refugiasse num vapor dele no porto, que atrasou proposi¬tal¬mente sua saída para que os jesuítas pudessem descansadamente alcançar o navio, para que este os levasse gratuitamente para onde eles queriam. (...)

“Trabalhou com o Governador e Capitão Geral para que enviassem aos jesuítas nessa ocasião gente que os defendesse à unha. E ele mesmo enviou ali pessoas de sua confiança para que se pusessem à disposição do padre provincial. E ainda que estivesse proibida toda a circulação de carruagens, ele mesmo, às dez horas da noite, foi ao colégio para saber se os padres estavam tranquilos e bem protegidos. Tudo isso está escrito no diário do Pe. Arjona, um dos mártires da nossa última perseguição vermelha". 

* Atuação durante a “semana trágica” em Barcelona 

"Ele foi quem, na semana trágica de Barcelona em 1900, defendeu com denodo os religiosos que eram atacados nas suas próprias igrejas".

Defendeu a tiro, a músculo, os religiosos atacados em sua própria igreja. 

"Em uma greve de seus operários, o Marquês se encarregou do serviço de bondes. Como um simples diretor de bondes, ele mesmo empunhou a manivela de um deles para dirigi-lo. E quando um revolucionário pulou no bonde para imobilizar os seus braços, ele com agilidade voltou-se para trás e meteu uma tal bofetada no homem que este saiu correndo. Porque - seja dito de passagem - o Marquês, apesar de suas enfermidades físicas, era muito forte".

"No sanatório de Penticosa, havia ainda um aparelho de ginástica consistente em uma polia com uma corda e um peso. Nenhum dos que ali estavam era capaz de levantar o peso, que só D. Cláudio conseguia levantar.

“Vimos com que valentia ele foi entre as turbas agressoras, que em Valência tentavam impedir o embarque dos peregrinos para Roma".

É aquela história de que já mencionei com o bispo e governador da província. 

* Coragem também durante enterro de uma vítima dos anarquistas 

"Nota um de seus secretários: `Na época do terror em Barcelona ele saía pelas ruas com pistola no bolso, que nunca usou nem usaria para defender-se a si mesmo senão a outros. Foi assassinado por anarquistas, em Madri, o principal contratista de obras, Sr. Madurel, por ter admitido no trabalho operários de sindicatos católicos. Depois de assistir o enterro desse homem em tais circunstâncias, embora soubesse que era arriscadíssimo, fez questão de acompanhar todo o enterro a pé, porque achou que o deixar de assistir ao enterro poderia dar mais ousadia aos socialistas e abater os católicos. E contra pareceres de pessoas mais temerosas, ele mesmo presidiu o enterro expondo-se à morte a qualquer momento".

Os srs. estão vendo portanto que era um homem de uma coragem inteiramente excepcional

* Presença ostensiva em congressos católicos, apesar das ameaças de anarquistas: "Deus o guardou" 

"As ameaças concretas de morte contra ele foram bastante para que lhe aconselhassem de deixar de comparecer a um grande congresso católico em Madri. Pelo contrário, ele não temeu nada e durante todo o tempo presidiu o congresso e depois foi à frente na procissão, enfrentando as ameaças de morte.

"No cumprimento de seus deveres - diz o Marquês de Valdeiglesias - ele não teria vacilado nem sequer diante da morte. Quisemos fazê-lo desistir de presidir a Junta da Companhia de Tabacos das Filipinas, porque se supunha que iria ser tormentosa pela conjuração de muitos membros que queriam apresentar um caso para dar um voto de censura contra ele e derrubar a sua diretoria. Apesar dos nossos esforços, ele presidiu o congresso e o dirigiu durante duas horas. À força de medida e de prudência, ele fez com que tudo terminasse em calma".

Não era portanto um valentão, mas era um homem que sabia aplicar a prudência nas ocasiões necessárias

"A sanha dos revolucionários contra o patrão rico e cristão, contra o sustentáculo firme da ordem, era raro que se contentasse com ataques de pena. Como se explica que caindo tantos patrões de escassa significação, não se lembraram entretanto de matar o marquês? Deus o guardou, porque ele bem pouco fez para se guardar a si mesmo. Ele acreditava que um de seus deveres era apresentar-se tranquilo, em geral, no meio das perturbações e jamais demonstrar medo, mudando seu modo de viver".

Quer dizer, se ele saísse para lugares diferentes, a fim de despistar assassinos, ele demonstraria medo. Era o dever dele demonstrar valentia. E só para cumprir este dever, e dar assim coragem aos outros, ele arriscava sua vida. 

* Durante as greves, passeia desassombrado pelas Ramblas 

"Em 1900 os socialistas inundavam la Rambla de Barcelona, como a primeira festa do trabalho. O receio de possíveis agressões fez com que as pessoas, possivelmente alvos de ataque dos socialistas, baixassem as entradas de suas lojas e as venezianas de suas casas. D. Cláudio, pelo contrário, acompanhou o tempo inteiro a manifestação, e era o único que durante o desfile parecia tranquilo. E era ele dos mais visados.

"Com essa greve geral, o horizonte tornou-se tão ameaçador, que ele fez subir a bordo de um de seus barcos as mulheres de sua família, com ele ficaram apenas a marquesa e seu cocheiro".

Ou seja, a Marquesa não quis deixá-lo. 

"'Francisquito - disse ele ao cocheiro - quer fazer o favor de tirar o carro da estrebaria para eu sair?' O cocheiro percebeu e disse: 'Senhor, com o senhor eu vou para qualquer parte'. Diz o Marquês: 'Vamos então sair e ver o que acontece'. E sua carruagem foi a única de Barcelona que andou por todas as ruas, fez-se ver, e foi à igreja onde se celebrava as 40 horas de Adoração. Depois ele saiu e fez visita a vários parentes, e voltou para casa sem que ninguém ousasse perturbá-lo em nada".

"Seu honroso lacaio se ufanava em ostentar a benção papal que os marqueses tinham lhe trazido de Roma. E como uma relíquia mostrava o magnífico relógio de ouro de cuja cadeia grossa pendia uma autêntica peça de ouro. Esse era um presente de D. Cláudio, agradecido por ele ter arriscado a vida levando-o a cavalo pelas ruas de Barcelona num dia de tanto perigo".

Quer dizer, ele não agradeceu na hora, mas mandou comprar um relógio de ouro muito bonito, com uma corrente de ouro, e ao mesmo tempo lhe arranjou uma benção do Papa. Entregou o prêmio do heroísmo. Vejam o bonito pensamento: não basta dar ouro, é preciso dar bênçãos

* Ante atentado contra ele perpetrado por anarquistas 

"O Ministro do Governo, Marquês de Valdivia, lhe comunicou oficiosamente que uma junta anarquista de Sals, tinham decretado sua morte para o ano de 1907. Ao voltar do sanatório de Penticosa, o conde de La Viña lhe envia um folheto do lugar chamado Torrida de Mármore, publicado no estrangeiro, em que Cánovas, Comillas e outros personagens, eram apontados como causadores das famosas e supostas torturas de Monte Ruiz feitas contra anarquistas. Quando o Marquês viu isto, já havia sido morto um dos sentenciados, o Cânovas. Ele portanto tinha todos os motivos para recear que o segundo seria ele. Contudo, ao telegrama do Marquês de Valdivia em que este lhe ofereceu uma escolta de polícia, ele respondeu recusando, e também recusando os sinais do assassino. Se ao voltar algum dia para casa, aparecesse uma pessoa suspeita, ele saberia como agir.

"De fato, um dia, ao chegar à sua casa, notou um homem suspeito. D. Cláudio dirigiu-se a ele diretamente, em passo reto e disse: 'O que o Sr. deseja?'. A resposta: 'Entregar-lhe este pedido'. Mais tarde esse homem explicou que tinha a intenção de matar o Marquês ao entregar o pedido. Mas tal era o estilo do Marquês que não teve coragem." 

Esses são alguns traços desse homem verdadeiramente excepcional.

Foto do Marquês de Comillas em 1919 

O que devemos deduzir disso? Nós devemos deduzir que a verdadeira coragem católica abrange também esse estilo de fortaleza. E que não é com uma bondade adocicada, com nhê-nhê-nhê, que se resolvem as coisas. Mas por vezes  é com coragem no duro! E que, dentro dos princípios da moral católica, não recusa nenhuma ocasião.


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