Plinio Corrêa de Oliveira
São Miguel Arcanjo: modelo do perfeito cavaleiro e do perfeito contemplativo
Santo do Dia, 28 de setembro de 1966 |
|
A D V E R T Ê N C I A O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor. Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:
|
|
Estátua no alto do Mont Saint Michel (França). Obra de Fremiet (séc. XIX), o mesmo autor do monumento a Santa Joana d'Arc, em Paris
Amanhã nós vamos ter a festa de São Miguel.
Dele afirma este calendário:
São
Miguel, Príncipe da milícia celeste, no combate que houve no Céu, combateu
os anjos rebeldes. Compete-lhe continuar essa luta para nos livrar do
demônio. Dele dependem os Anjos da Guarda. É o anjo protetor da Igreja e o
que apresenta ao Padre Eterno a oblação eucarística. Nós estamos na novena
de Nossa Senhora do Rosário e na novena de Nossa Senhora Medianeira de
Todas as Graças.
Eu
chamo a atenção dos senhores para esse fato: São Miguel é o chefe então, é
o que lutou contra o demônio e o precipitou no inferno. Ele é o chefe dos
Anjos da Guarda dos indivíduos e o chefe também dos Anjos da Guarda das
instituições. E é, ele mesmo, o Anjo da Guarda da Instituição das
instituições, que é a Santa Igreja Católica Apostólica Romana.
Ele
tem, portanto, uma função tutelar, a respeito da qual a gente se pergunta
que relação há entre a atitude dele, ou a missão dele derrubando no
inferno os que se levantavam contra Deus Nosso Senhor, de um lado, e a
proteção que ele dispensa à Igreja e aos homens nesse vale de lágrimas e
nessa arena, que é a vida, de outro lado. E nós vemos que essas duas
missões se concatenam. Ele defendeu a Deus, Deus quis servir-se dele como
de seu escudo, contra o demônio. Deus quer que ele seja o escudo dos
homens contra o demônio; Deus quer que ele seja o escudo da Santa Igreja
Católica contra o demônio. Mas um escudo que não é meramente escudo: é
gládio também. Ele não se limita a defender, mas ele derrota, ele
precipita no inferno.
E é,
portanto, essa a dupla missão de São Miguel. É por causa disso que São
Miguel era considerado na Idade Média, pelos cavaleiros, o primeiro dos
cavaleiros; o cavaleiro celeste, leal perfeitamente como um cavaleiro deve
ser, forte idealmente como deve ser um cavaleiro, puro como um anjo e como
o cavaleiro deve ser, e vitorioso como deve ser o cavaleiro, que põe toda
sua confiança em Deus, e depois de ter nascido Nossa Senhora, põe toda sua
confiança também em Nossa Senhora.
É,
portanto, essa figura admirável de São Miguel que, vista assim, nós
devemos considerar a figura de nosso aliado natural nas lutas, porque o
movimento contra-revolucionário não quer ser outra coisa do que um grupo
de homens que executam, “mutatis mutandis”
em nível humano, a tarefa de São Miguel Arcanjo. Quer dizer, de
defender a honra de Deus, defender a glória de Nossa Senhora, defender a
Igreja Católica, defender a Civilização Cristã. Nós vemos, portanto, que
há uma afinidade enorme e que andam muito bem os contra-revolucionários
que queiram constituir São Miguel Arcanjo seu especial patrono.
Há
em D. Guéranger, uma ficha, a respeito da devoção contemplativa dos anjos:
“Assim a Igreja considera São
Miguel como o mediador de sua prece litúrgica. Ele se mantém entre a
humanidade e a divindade. Deus que distribui, com uma ordem admirável, as
hierarquias visíveis e invisíveis, emprega por opulência, para louvor de
sua glória, o ministério desses espíritos celestes que contemplam sem
cessar a face adorável do Pai, e que sabem, melhor do que os homens,
adorar e contemplar a beleza de suas perfeições infinitas”
Aí é
que diz que ele é o que apresenta ao Padre Eterno a oblação eucarística. E
foi assim que ele apareceu também em Fátima, para os pequenos pastores,
com o cálice na mão.
“Mi – cha – El: quem como Deus?
Esse nome exprime por si só, em sua brevidade, o louvor mais completo, a
adoração mais perfeita, o reconhecimento mais inteiro da transcendência
divina e a confissão mais humilde do nada da criatura, modelo, portanto,
de humildade”.
Porque quem exclama que ninguém é como Deus, exclama que não é nada, e
essa é a humildade perfeita. A forma de humildade própria do cavaleiro não
é a de um dulçuroso sentimental e ilógico.
“Também a Igreja da terra
convida os espíritos celestes a bendizer o Senhor e cantá-lo; a louvá-lo e
bendize-lo sem cessar. Essa vocação contemplativa dos anjos é o modelo da
nossa, como nos faz lembrar o belo prefácio do Sacramentário de São Leão.
É verdadeiramente digno render-Vos graças a vós, que nos ensinais por
vosso apóstolo que nossa vida é dirigida aos céus; que com benevolência
quereis que nos transportemos em espírito ao lugar onde servem esses que
veneramos, especialmente dirigirmo-nos para essas alturas na festa do
bem-aventurado São Miguel Arcanjo”.
Realmente aqui está um traço da devoção aos anjos, que é preciso muito
notar. Os anjos são habitantes da Corte celeste. E na Corte celeste eles
vivem numa eterna contemplação, numa contemplação de quem vê Deus face a
face, e as visões de todos os grandes místicos nos referem às festas que
há no Céu; e que são verdadeiras festas. Não são imagens, ou quimeras não,
mas são verdadeiras festas em que Deus vai manifestando sucessivamente
suas grandezas e eles aclamam com triunfos novos, que não terminam nunca
dos nuncas.
E há
uma felicidade celeste, há um senso de que o Céu é a pátria de nossa alma
e é propriamente a ordem de coisas para a qual nós fomos criados, que
corresponde plenamente a todas as nossas aspirações; há um senso da
felicidade celeste pela contemplação face a face de Deus que é a perfeição
absoluta de todas as coisas, há algo disso que deve e pode passar para a
terra. E nas épocas de verdadeira fé alguma coisa dessa felicidade filtra;
alguma coisa dessa piedade é sentida pelas almas piedosas e comunicada
depois através das almas piedosas, mais notavelmente piedosas, como um
tesouro comum para toda a Igreja.
E é
isso que falta tanto hoje em dia, de maneira tal que não se tem a idéia de
uma felicidade celeste e sem a idéia de uma felicidade celeste não se tem
apetência do céu; e as pessoas se chafurdam na pura apetência dos bens da
terra. Mas se pudessem compreender por um instante o que é uma consolação
do Espírito Santo, o que é uma graça do Espírito Santo, o que é esse tipo
de felicidade que a consideração dos bens celestes comunica, se pudesse
compreender isso por um instante que fosse, então começava o desapego dos
bens da terra; então se começava a compreender como tudo é transitório,
como tudo isso não é nada, como há valores que estão acima disso e que
tornam a terra um pouco de poeira.
Mas
é isso que exatamente falta e que os santos anjos podem nos obter, eles
que estão inundados dessa felicidade, e que de vez em quando se comunicam
sob essa forma aos santos. Há uma forma de fenômeno místico que é um
concerto - Santa Teresinha teve isso, ela até fala na “História de uma
Alma” -, um concerto muito longínquo, de uma harmonia maravilhosa e
extraterrena. E é um pouco do eterno cântico dos anjos que chega por essa
forma, aos ouvidos dos bem-aventurados, para lhes dar exatamente apetência
das coisas do Céu.
Em
nossa época essa apetência falta fabulosamente. Não poucas pessoas só se
interessam e só se empolgam pelas coisas da terra, empolgam-se pelo
dinheiro, empolgam-se pela politicagem, empolgam-se pelo mundanismo,
empolgam-se pelas trivialidades do noticiário de todos os dias, mas não se
empolgam pelas coisas elevadas, pelas coisas doutrinárias e - menos ainda
- pelas coisas especificamente celestes.
Então, pedir aos anjos que nos comuniquem o desejo das coisas celestes de
que eles estão inundados é uma excelente intenção para ser acrescentada,
na festa de amanhã, ao grande pedido dos pedidos, que é o de São Miguel
Arcanjo nos fazer imitadores dele, perfeitos cavaleiros de Nossa Senhora
nessa terra.
|