Plinio Corrêa de Oliveira

 

Santa Escolástica:

a fecundidade da oração e do sacrifício

na construção da Europa

e em todo apostolado

 

"Santo do Dia", 10 de fevereiro de 1965

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A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plínio Corrêa de Oliveira em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.

 

 

Sta. Escolástica

Seção central do altar mor da Abadia Beneditina de

Blaubeuren, Alemanha

(Erhart, Michael -  1469-1522)

Hoje é festa de Santa Escolástica, virgem, irmã e discípula de São Bento, fundadora; século VI.

Amanhã é festa de São Gregório II, papa e confessor: “Resistiu tenazmente à impiedade iconoclasta do imperador Leão III, Isaurico, e mandou São Bonifácio pregar o Evangelho na Germânia”, século VIII.

A razão pela qual figura Santa Escolástica no nosso calendário é que ela é  irmã de São Bento, e desenvolveu uma obra que é entrelaçada com a de São Bento, a fundação das beneditinas, como São Francisco e Santa Clara.

A obra beneditina nos interessa muito. Recentemente São Bento foi proclamado padroeiro da Europa, o que corresponde a algumas necessidades que, por sua vez, se ligam com teses e preocupações nossas.

 Geograficamente falando — se os senhores se colocam diante de um mapa — a Europa não é senão uma península da Ásia. Nessa península da Ásia, que representa uma parte do mundo quantitativamente pequena, entretanto fatos importantíssimos e grandes da História e do mundo aí se passaram.

* Importância da Europa na História por sua fidelidade à Igreja

O que se passou de mais importante na Europa foi que este continente deu, em tempos passados, uma correspondência suficiente e - sob alguns pontos de vista - até grande à pregação da Igreja Católica, sendo o continente que, durante séculos, foi substancialmente fiel à Igreja Católica. Daí partiu a instauração da Civilização Cristã e com ela uma espécie de "invasão" e de embebimento da ordem temporal pelas energias sobrenaturais da graça dispensadas pela Igreja Católica.

* A Igreja é o verdadeiro fundamento da ordem e da moral

 A relação das coisas é assim: só a Igreja ensina a verdadeira moral. Só a Igreja é que, por meio de seus sacramentos, dá força para que a verdadeira moral seja praticada pelos homens. Ora, é só por meio da verdadeira moral que os homens conhecem e praticam a verdadeira ordem, porque a moral não é senão a ordem no procedimento dos homens. Concluindo: só existe verdadeira e perfeita ordem entre os homens onde existe a verdadeira Igreja.

Repito: a Igreja ensina a moral; a moral é a ordem.  Se só a Igreja ensina e dá forças para cumprir a moral, só a Igreja é o verdadeiro fundamento da ordem. Mas também quando os homens seguem a moral da Igreja, é a verdadeira ordem que está adotada, no que ela tem de mais profundo. E acontece com a ordem, por exemplo, o que acontece no corpo humano. Se eu estou com esta parte do braço em ordem, por exemplo, daí eu só posso esperar coisas boas: os movimentos necessários, a reação, os serviços, a defesa que um homem deve esperar de seu braço, eu tenho o direito de esperar do meu. Mas se algo está destroncado aqui, e já não digo um dos ossos grandes, mas desses ossos pequenos do punho, o resto é dor, miséria, inflamação, perigo de gangrena, atrapalhação de toda ordem.

Assim também com a civilização: se toda ela está baseada na moral católica, inclusive nos seus pormenores, não há bem que não se possa esperar. Mas quando ela se afasta da moral Católica, ainda que em pormenores de certa importância, não há mal nem tristeza nem miséria que não se possa esperar.

* O Papel do monaquismo beneditino na construção da Europa

Ora, São Bento, por meio dos frades, monges beneditinos, foi por excelência o missionário que trouxe à Civilização Católica os germanos e deu impulso ao movimento de evangelização que conquistou todos os povos que estão hoje debaixo da cortina de ferro e mais ainda as nações escandinavas.

Por outro lado São Bento, por meio dos monges beneditinos, instituiu um tecido de Ordens religiosas que espalharam por toda a Europa essa moralidade, esse modo de ver etc, quando a Europa estava se reconstruindo. Era um mundo novo que nascia depois das invasões, e a ação da graça penetrou nessa árvore e nas suas raízes, e o resultado foi a maravilhosa Europa, que durante muito tempo constituiu a própria realização dos ideais da Contra-Revolução.

É para a destruição dessa Europa que a Revolução se levantou. E é para essa Europa que nossos olhos se voltam cheios de afeto, nostálgicos e admirativos. Precisamente porque ali estão os restos sagrados da Contra-Revolução. E na base de tudo isso encontra-se São Bento e, pela ação das contemplativas, Santa Escolástica.

* A ação do ideal contemplativo na fecundidade do apostolado de conversão da Europa

Santa Escolástica atraiu religiosas que não faziam assistência social, não davam catecismo, não faziam "nada". Numa época em que sua ação pareceria tão necessária, elas realizavam algo que era muito mais do que agir: rezavam e se sacrificavam. E, pelo seu exemplo, deixaram bem claro que se o apostolado do ramo masculino foi tão fecundo, isto se deveu porque havia um ramo feminino que rezava, que se imolava, que contemplava, além do intenso grau de oração da Ordem beneditina que é, por sua natureza, por seus estatutos, uma Ordem semi-contemplativa. Então, o ideal da contemplação fica profundamente presente nesta fecundidade do apostolado de conversão da Europa.

Aí se vê o papel admirável, insubstituível e, em algum sentido, incomparável de Santa Escolástica. Porque para agir, há alguns tantos; para lutar, já são menos numerosos; mas para sofrer, quão poucos são!

Eu não tenho palavras que bastem para exprimir minha veneração diante do apostolado do sofrimento, daqueles que aceitam as cruzes e - com a aprovação eventual do diretor espiritual - até as aceitam e as pedem para sofrer para que o trabalho dos outros seja fecundo. É dos temas que mais me comovem e que mais me empolgam: a fecundidade do apostolado do sofrimento. E não há o que eu me sinta mais propenso a venerar do que um que sofre intencionalmente para que outro ganhe as batalhas; que toma sobre si o infortúnio, toma sobre si a infelicidade e vai ser um  herói que só Deus vê. E isso tudo para que? Exclusivamente para que o apostolado dos outros seja fecundo. Esse caráter do trabalho de Santa Escolástica merece ser mencionado aqui com uma veneração sem nome.

*   *   *

Ao par disso nós temos amanhã a festa de São Gregório II, Papa e confessor. Ele fez duas coisas ao mesmo tempo: mandou São Bonifácio pregar o Evangelho na Alemanha, transpondo os limites do que seria a cortina de barbárie daquele tempo, com uma ação fecundíssima à qual acabo de me referir. E se com uma mão fazia isso, com a outra resistia a um imperador herege e salvava, portanto, o que na Europa ainda havia de católico. Ou seja, simultaneamente criava uma Cristandade nova e salvava uma Cristandade velha. Os senhores vêem que figura insigne e profundamente relacionada com essa sacrossanta fundação da Europa de que acabei de tratar.

 


 

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