Plinio Corrêa de Oliveira

 

Para onde vai o mundo?

 

 

 

 

 

 

Mensagem aos Correspondentes Esclarecedores da TFP norte-americana, 28-10-1987

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Muito ilustre e reverendo Pe. [Antonio] Royo Marin [O.P.], prezado amigo e digno presidente da TFP norte-americana, prezados sócios, cooperadores e correspondentes da TFP norte-americana. Antes de tudo quero apresentar-vos as minhas saudações.

Chamado a dizer algumas palavras introdutórias que precedam as memoráveis exposições que vos fará o Revmo. Pe. Royo Marin, cabe-me dizer neste ano de 1987, que já acaba, que já vai para seu declínio, que nós temos mais diante dos olhos o resto de século, o resto de milênio que ainda resta para viver, do que propriamente o passado que longo e longo se estende diante de nós. Mas, de qualquer forma, uma comparação entre duas partes distintas do século XX vem muito a propósito no limiar desta conferência, que responde a esta sugestiva e grave pergunta: para onde vai o mundo?

Com efeito, no nosso século que começou sob o signo do otimismo cientificista, laico, agnóstico do período da “Belle Époque” e que deságua nas tragédias dos dias contemporâneos, nós podemos distinguir um período longo de alegria e de perspectiva constante de melhoras na condição humana.

Essa alegria não tinha como principal ponto de referência a Deus Nosso Senhor, nem tinha como conceito de ordem o verdadeiro conceito que se deduz dos ensinamentos imutáveis da Santa Igreja Católica Apostólica e Romana. Era um conceito mais bem positivista.

A ordem é a disposição das coisas segundo as conveniências da humanidade. E essas conveniências da humanidade são inspiradas pela ciência. A ciência que caminhava triunfalmente de descoberta em descoberta, de transformação social, política, econômica, cultural, em novas transformações mais promissoras do que as anteriores – assim ao menos se cria –, a ciência ia traçar as linhas normativas de um progresso indefinido da humanidade.

Em cada ano que se passava, a alegria aumentava porque se aproximava mais a época da felicidade inteira, do paraíso terreno, que a utopia progressista pretendia estabelecer na terra.

Duas grandes tragédias ensangüentaram, com marcas profundas, essa época: a Primeira e a Segunda Guerra Mundial. Sem falar, naturalmente, de outra tragédia que no seu início tinha um âmbito restrito, embora esse âmbito restrito compreendesse uma imensa parte do território do globo e que era a queda do regime czarista na Rússia, seguido pela implantação trágica do regime comunista.

Mas, sem embargo dessas verdadeiras trovoadas, ou desses verdadeiros terremotos, o fato concreto é que a humanidade continuava cada vez mais alegre e cada vez mais otimista.

Depois da Primeira Guerra Mundial sucedeu-se o período que os franceses denominaram “Entre Deux Guerres”, entre duas guerras, que foi um período de festas e de prazeres. Sucedeu ao que também os franceses denominavam “La Belle Époque”, anterior à Primeira Guerra Mundial.

Sobreveio afinal a Segunda Guerra Mundial. Cessou o jovial período do “entre duas guerras” e começou a tragédia de uma conflagração de uma tragédia ainda muito mais mundial do que a primeira. Mas, veio depois a época dos “milagres”. “Milagre” de tal país, “milagre” de tal outro, “milagre” de tal outro. “Milagres” econômicos que operaram “ressurreições” inesperadas no campo da prosperidade. E o homem, sedento de prosperidade de nossos dias, não queria outra coisa senão isso.

Mas depois, a partir - digamos - dos anos 60, o condicionamento geral da humanidade foi se transformando. Verificou-se que as crises econômicas se sucediam umas às outras. Verificou-se que o perigo de guerra se tornava cada vez mais sombrio. E este sombrio era ainda mais sobrecarregado não só pela iminência do período de guerra e pelo fato de que, com essa iminência, o período também se estendia ao mundo ainda mais amplamente do que a Segunda Guerra Mundial, mas o perigo atômico, que as explosões de Nagasaki e Hiroshima anunciaram ao mundo, esse perigo atômico pesava sobre todos os espíritos como uma grave ameaça.

Por outro lado, as conflagrações regionais foram-se sucedendo umas às outras. E quase não houve ano durante esse período em que uma parte do mundo não estivesse em guerra. Longa seqüência de guerras, que sugere quase a idéia de que a Segunda Guerra Mundial não terminou e que caminhamos para  a Terceira Guerra Mundial.

Mas, se fosse só isto! Na realidade, também outra situação se acresceu a esta: é a impressão de que todo o tecido da ordem social e econômica está desgastado. Que por todos os lados as extravagâncias, as loucuras, as reivindicações descabidas, as convulsões se sucedem, se somam e se multiplicam. E que, desde o terreno fútil da dança até o terreno profundo da filosofia – que digo!? – da Filosofia até o terreno sagrado da Teologia se encontra abalado pelos grandes terremotos do pensamento e da sensibilidade contemporâneos. Para não falar senão da Teologia da Libertação; para não falar senão da crise que envolve hoje tão largos espaços da Santa Igreja Católica Apostólica e Romana; para não falar da decadência pronunciada e letal que afeta as demais confissões religiosas, nós temos um mundo que em todos os seus aspectos estremece, em todos os seus aspectos se receia pelo dia de amanhã.

Eu me lembro dos dias longínquos em que no período “Entre deux guerres”, no período da “Belle Époque”, apareciam extravagâncias e as pessoas perguntavam divertidas: “Aonde vai o mundo contemporâneo?”.

Mas, depois essas extravagâncias foram mudando de ar. Elas deixaram de ser extravagâncias para ser modos sistemáticos de ser. E modos sistemáticos de ser num galope de agravamento tão constante que hoje a pergunta está não mais em alguns lábios frívolos e divertidos, mas nos lábios angustiados de quase todos os homens: “Para onde vai o mundo contemporâneo?”

Vós escolhestes muito bem, meus caros amigos, este tema para ser tratado no vosso encontro. Sobretudo escolhestes bem o ilustre conferencista Pe. Royo Marin, com reputação de teólogo e moralista assente no mundo inteiro pelas suas importantes obras. E vós lhe pedistes que vos dirigisse uma palavra sobre este assunto por ocasião do lançamento da edição norte-americana de um de seus mais insignes trabalhos.

Eu vos felicito por esta escolha e vos agradeço, Pe. Royo Marin, pelo fato de terdes aceito o convite que vos torna hoje presente no seio do afeto e da hospitalidade dos meus amigos norte-americanos.

Resta-me externar-vos com meus agradecimentos a admiração que todos vos têm na TFP. Admiração que não é senão um eco daquela que vos têm todos os católicos, todos os verdadeiros filhos da verdadeira Igreja.

E, da minha parte, meus amigos, externar-vos com minha amizade e com minha estima, o meu pesar de não estar entre vós para, pessoalmente, me beneficiar dos caudais de sabedoria e de virtude que emanarão para vós dos ensinamentos do Pe. Royo Marin.

Com isto termino, pedindo a Nossa Senhora Medianeira de todas as Graças, Nossa Senhora da Esperança, que sob a invocação de Macarena, que na sua bela imagem preside o vosso encontro, pedir a Ela que disponha a alma de cada um de vós a receber com perfeita disposição tudo quanto o Pe. Royo Marin vos disser.

Com isto, para todos, os meus mais cordiais cumprimentos.

(*) NOVEMBRO – Realiza-se em Saint Louis encontro regional para correspondentes da TFP. O Padre Antonio Royo Marín O.P. discorre sobre a Teologia da Perfeição Cristã. Na ocasião é lançada a tradução inglesa do livro de sua autoria: Theology of Christian Perfection (cfr. Um homem, uma obra, uma gesta – Homenagem das TFPs a Plinio Corrêa de Oliveira, Parte III, Estados Unidos - Expansão e êxito crescentes na superpotência do século XX)