Discurso
proferido Prof. Plínio quando recebeu a Comenda “Polônia Restituta”,
no Othon Palace Hotel, em
São Paulo, 14 de abril de 1974 - Domingo
O Governo polonês no exílio, sediado em Londres, confere ao Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a comenda da Grã-Cruz da Ordem da
Polônia Restituta. Esta comenda é a mais alta
condecoração polonesa para civis, sendo conferida às personalidades que se
distinguem na luta contra o comunismo. A comenda é entregue ao Presidente do
Conselho Nacional da TFP pelo Coronel Aviador Tomasz Rzyski, Ministro de Assuntos Sociais do Governo Polonês no
exílio, em cerimônia realizada no auditório do Othon Palace Hotel, em São Paulo, perante numeroso público (Cfr. "Catolicismo", nº 281, maio de 1974).
No momento em que uma tal alta honraria repousa sobre
meus ombros, no momento em que ouço dos lábios autorizados de Vossa Excelência
palavras tão generosas a respeito da atuação que venho desenvolvendo contra o
comunismo e a favor da causa católica em todo mundo, nesse momento, Sr. Ministro,
não posso deixar de tomar em consideração que essas palavras, esse ato de
generosidade, esse ato de cortesia me vem de um Governo polonês no exílio, me
vem através de lábios poloneses e de um gesto polonês.
E toda gesta polonesa através da História até os
nossos dias se levanta ante meus olhos, e a velha simpatia que como brasileiro
e como católico sempre tive por vossa nação, essa simpatia aflora nos meus
lábios com o propósito que vem ao meu coração de lutar cada vez mais para que a
Polônia Restituta
efetivamente, a Polônia restituída à sua independência, a Polônia restituída a
Nosso Senhor Jesus Cristo, a Polônia de Nossa Senhora de Czestochowa,
renasça para o sol da liberdade, para a glória da independência efetiva.
Esta Polônia tão nobre, que se pode dizer que é
escravizada, jugulada, continua livre e continua independente porque tem pelo
mundo inteiro, tem na própria Polônia e tem fora dela, Sr. Ministro, pessoas
como Vossa Excelência.
Com efeito, Vossa Excelência acaba de lavrar aqui um
documento comprobatório da liberdade e da independência da Polônia. Não porque
dizendo as afirmações corajosas que fizestes, vosso corpo, na sua integridade,
pudesse correr algum risco. Vós dissestes bem que levantais vossa voz num país
que é anticomunista e onde não têm que temer os que combatem o comunismo, não
por isso, mas porque destes prova de uma independência mais profunda.
Essa independência de alma, rara em nossos dias, por
onde um varão se levanta para afirmar de modo corajoso o contrário do que a
propaganda internacional afirma, para restituir aos fatos a sua verdadeira
fisionomia, para proclamar a realidade com essas nobres palavras: “nós só
valemos pela verdade, e sem a verdade nós não somos coisa nenhuma”.
E é por isso, Sr. Ministro, que vale tão pouco o pobre
homem contemporâneo. Jugulado pela propaganda, esmagado por não sei que
máquinas não só de falar mas de pensar, por falta de independência, por falta
de princípios, porque não compreende ou não quer compreender que não é só de
pão que vive o homem, mas que o homem vive sobretudo da palavra vinda de Deus,
que é uma palavra de verdade, porque é a palavra dAquele que disse: “Eu sou o
Caminho, a Verdade e a Vida”; o homem contemporâneo, não querendo entender
isso, procura se absorver inteiramente no cultivo de seus interesses materiais
e se esquece da verdade. Ele pensa que o pão sem verdade adianta de qualquer
coisa. Nutre o corpo, é bem verdade, mas para uma vida inglória e vazia, uma
vida frustrada mil vezes pior do que mil mortes.
Este é o grande equívoco do homem contemporâneo. Ele
não ousa nem pensar contra a propaganda e vós, que poderíeis vos instalar
comodamente nesse mundo burguês para onde afluem os vossos compatriotas,
justamente espavoridos diante da perseguição, vós estais aqui num ato de sadio
não conformismo, para dizer que não dobrais os joelhos diante da propaganda e
que vós sois desses poloneses fiéis, desses filhos fiéis da Polônia que
proclamam em alto e bom som, por toda parte, a grande verdade: a Polônia pode
estar jogada no chão pelo conluio traidor que a entregou ao adversário; a
Polônia pode estar pisada, ela não está morta, porque quem fala não está morto
e a Polônia fala pelos seus filhos que gemem.
A Polônia está viva, a Polônia vai ressuscitar. Quase
eu chegaria a dizer que para a Polônia é uma glória estar perseguida; quase eu
chegaria a dizer que para a causa polonesa é uma glória estar sendo ignorada
pelos grandes meios modernos de propaganda; quase eu chegaria a dizer que para
a Polônia essa perseguição branca, que cobre por todo lado aqueles que procuram
defendê-la, para a Polônia isso é uma glória, porque é quase inteiramente
verdadeiro que hoje em dia só está de pé, hoje em dia só tem influência, hoje
em dia só tem meios para falar universalmente ao mundo aqueles que abraçaram a
causa da desonra, aqueles que disseram à ruína e à miséria “vós sois a minha
honra, vós sois a minha glória”; aqueles que disseram para a negação “vós sois
a minha verdade”, e que receberão seu prêmio, ou melhor, seu castigo, no dia em
que Vós, Senhor Jesus, cuja ressurreição hoje comemoramos, vier como justo Juiz
para lhes increpar o que fizeram e para levantar
aqueles que jazem na humilhação.
“Derrubou de suas cátedras os poderosos iníquos, e
levantou aqueles que sofriam na humilhação, na perseguição por amor à justiça”.
Essa frase do Magnificat verifica-se
também na história terrena dos povos, Sr. Ministro, e por causa disso há de vir
antes do fim do mundo a era da glória da Polônia em que se dirá: foram depostos de suas cátedras não só os
povos dominados por governos iníquos e que jugulam a Polônia, mas os poloneses
iníquos que aderiram à causa da iniquidade, e serão
levantados os verdadeiros humildes e esses humildes são os poloneses que, como
vós, resistem.
Nós prestamos homenagem à vossa resistência e é por
essa razão que eu, como brasileiro, me desvaneço especialmente em ter aqui
essas insígnias. No meu peito, elas significam um ato de fidelidade à vossa
pátria; nos meus lábios, um hino de amor à vossa causa; na minha alma de
católico, uma esperança firmíssima: Deus restituirá à Polônia, no dia em que
restituir à Santa Igreja Católica Apostólica Romana - também Ela sofrendo a
pior das perseguições internas, a perseguição desferida contra as ovelhas, ó
dor, ó verdade! - tudo isso um dia terá sua verificação; são contas que devem
ser acertadas nos grandes anais da História.
Todos vós, meus caros jovens, conheceis o pensamento
de Santo Agostinho tantas vezes comentado entre nós: os indivíduos podem ser
bons e sofrer nessa terra, porque eles irão depois para o Céu e receberão ali
um prêmio; os indivíduos podem ser maus e felizes nessa terra e podem, depois,
serem lançados no inferno. Deus lhes dá aqui a paga de algum bem que por acaso
se misture no meio de suas más ações e o inferno terrível será o resultado de
sua vida de infidelidade.
Porém, diz Santo Agostinho, e com ele todos os
doutrinadores católicos, as nações, enquanto tal, não vão para o Céu, nem para
o inferno, elas não têm destino eterno, mas destino temporal. Quando as
trombetas dos Anjos soarem para anunciar que os tempos cessaram, quando a
História tiver acabado, quando se fenderem as sepulturas e os mortos
ressuscitarem, não haverá mais nações, nem no Céu, nem no inferno. Então, as
nações devem ser premiadas nessa existência. É por essa razão que nesta terra
os povos fiéis acabam vencendo e os povos infiéis acabam sendo castigados.
Ora, a vossa Polônia, Sr. Ministro, tem essa analogia
com a história brasileira. Em circunstâncias tão diversas, as nossas duas
nações se gabam de serem nações não agressivas, nações não imperialistas,
nações que amam a glória militar, mas a amam em sua legítima defesa, e eu creio
que é exemplo único na História o de vosso belo e nobre país, no sentido de que
se cobriu, ao longo dos milênios, de glórias militares.
Entretanto, se se
verificarem os anais dessas guerras, notaremos o seguinte (ao menos que não os
conheça em tais pormenores, que possa garantir a efetividade disso até nos
detalhes, ao menos em suas grandes linhas gerais, e isso é dizer tanto): numa
história mais que milenar como é a vossa, ao menos em suas linhas gerais, a
história da glória militar polonesa ilustra a história das glórias militares no
mundo inteiro com essa característica: militares, guerreiros, heróis, mas
sempre em legítima defesa de sua nacionalidade. É a maior pureza da glória
militar quando ela não se faz imperialismo, quando ela não se faz domínio,
quando ela é a força sujeita à defesa do direito.
Mais ainda - e aqui é a sublimação que supera tudo -
quando ela é a força que se dispõe ao serviço do mais alto dos direitos: dos
direitos da fé católica, apostólica, romana. Vossas glórias militares se
confundem com vossas glórias religiosas. Basta mencionar o nome do grande rei
da Polônia, João Sobieski, que salvando Viena do ataque
turco, salvou toda a Cristandade. Basta lembrar o nome ainda mais glorioso,
porque toca a Nossa Senhora ser mais gloriosa, sem comparação, do que qualquer
outra criatura, o nome mais glorioso de Nossa Senhora de Czestochowa,
junto a cujas muralhas do Santuário nacional foram feitas as grandes defesas
contra os invasores luteranos da Suécia. Basta mencionar esses dois nomes para
se compreender que aonde quer que haja um coração católico tem que haver uma
ressonância de gratidão e admiração pela Polônia.
Católico o é o coração brasileiro, embora tantas
forças trabalham para deteriorá-lo, para torná-lo não católico e, portanto, não
brasileiro, para o colocar a serviço de Moscou e do adversário comunista
internacional. Nós aqui, vós bem dissestes, Sr. Ministro, nós da TFP lutamos
para que o Brasil continue efetivamente católico e, portanto, efetivamente
brasileiro contra a agressão comunista.
A TFP é uma vasta família de almas que se estende por
toda a América e que já vai atingindo a Europa. Aqui temos representantes da
TFP norte-americana, nos extremos gélidos e setentrionais do continente, temos
aqui representantes da TFP argentina, da TFP chilena,
da TFP uruguaia, que tocam já os outros pólos da região do Sul. De ponta a
ponta se estende a TFP. Ela deitou sementes em Portugal glorioso e invicto; na
Espanha, nação de todas as glórias, de todos os sois, de todos os atos de fé,
de todas as coragens. Ela vai para frente e, no momento, ela está na exposição
de Lausanne [Suíça], convidando todos os outros povos
ali representados para seguirem a sua grande cruzada.
Essa cruzada, Sr. Ministro, é mundial, a favor da luta
de todos os povos contra o inimigo da fé e o inimigo de vosso país. Assim, eu
levanto meu espírito, Sr. Presidente da República Polonesa no exílio, eu me
dirijo a Vossa Excelência, e eu o faço com mais respeito e consideração do que
se estivésseis confortavelmente instalado em Varsóvia, governando de lá vossa
bela nação.
Faz parte de toda glória, mas faz parte de um não sei
quê da alma polonesa e da glória polonesa, de brilhar mais especialmente no
infortúnio e na tristeza, pela superação do infortúnio e da tristeza por um ato
de firmeza e de vontade que é maior que os sucessivos vagalhões que a História
tem investido contra vosso país.
À Polônia no exílio, à Polônia no cárcere, à Polônia
de Jesus Cristo e de Maria, à Polônia filha da Igreja, minhas homenagens, meus
agradecimentos.