Conferência (Santo do Dia), 23 de abril de 1973, segunda-feira

 

Consagração a Nossa Senhora segundo o método de São Luís Maria Grignion de Montfort

Primeira semana preparatória: pedir o conhecimento de si mesmo

 

Devemos tratar sobre a primeira semana preparatória para a Consagração a Nossa Senhora. É a respeito do conhecimento de si mesmo que nós devemos meditar e pedir essa graça durante essa semana.

A respeito disto, diz S. Luís Grignion de Montfort no "Tratado da Verdadeira Devoção a Nossa Senhora":

"Durante a primeira semana aplicarão todas as suas orações e atos de piedade para pedir o conhecimento de si mesmo e a contrição por seus pecados. Tudo farão em espírito de humildade. Para isso poderão, se quiserem, meditar sobre o que ficou dito sobre o nosso fundo de maldade, e considerar-se, nos seis dias desta semana, como uma lesma, um sapo, um porco, uma serpente ou um bode ou, então, estas três palavras de São Bernardo: ‘Cogita quid fueris, semen putridum; quid sis, vas stercorum; quid futurus sis, esce verminum’ (‘Lembra-te que tu fostes uma semente podre, tu és um vaso de matérias pútridas, e tu serás futuramente alimento dos vermes’). Pedirão a Nosso Senhor e a seu Espírito Santo que os esclareça, dizendo: Domine, ut videam."

Quer dizer, é pedir a graça de ver. O cego do Evangelho quando Nosso Senhor se aproximou dele perguntou: "O que desejas?" – Naturalmente Nosso Senhor estava vendo o que ele desejava. Um cego o que quer? Quer sarar da cegueira. Mas Nosso Senhor quis ouvir sua prece e ele então fez este pedido: "Domine, ut videam - Senhor, dai-me a graça de ver". E então o cego foi curado.

E São Luís Grignion de Montfort diz que os devotos que rezarem isto, devem pedir sobretudo a graça de verem como são, acabar com a cegueira que tem a respeito de si mesmos.

"... ou então ‘Noverim me’ ou ‘Veni, Sancte Spiritus’ – ‘que eu me conheça’ ou então ‘Vinde Divino Espírito Santo’, e a oração que segue. Recorrerão a Santíssima Virgem e lhe pedirão esta grande graça que deve ser o fundamento das outras, e para isso recitarão todos os dias, a ‘Ave, Maris Stella’ e as ladainhas."

Então está indicado: é preciso rezar a Ladainha, a "Ave, Maris Stella", o "Veni Creator" para pedir por meio de Nossa Senhora ao Esposo dEla, o Divino Espírito Santo, a graça de nós nos conhecermos a nós mesmos.

 

A água na qual se pinga uma gota de pus

E ele dá alguns princípios genéricos para que cada um se conheça. Qual é o valor destes princípios?

São Luís Grignion Montfort com estas imagens, contunde fortemente com uma impressão para o qual a Humanidade em todos os tempos foi muito propensa e naturalmente é especialmente propensa em nossos dias.

Essa impressão vem a partir da infância quando a gente vê uma criança e diz: "que engraçadinha, que boazinha, é um anjinho, olha como ele é um encanto de criancinha", etc.

Pelo contrário são raros os que vendo uma criança pensam também o seguinte: "Que problema... que saco de preocupações... o que está aqui para explodir dentro desta pobre criatura que ainda vai viver durante tanto tempo?"

Ambos os pontos de vistas são verdadeiros desde que a gente se situe no ângulo adequado para vê-los.

Que uma criança que ainda não atingiu a idade da razão é uma criança que não pecou, entra pelos olhos, uma vez que o pecado só é possível na idade da razão. Sendo uma criança batizada, ela é um Templo do Espírito Santo. De maneira que é razoável pensar: "esta criança está na graça de Deus, Deus a ama inteiramente, Deus não tem em relação a ela a menor restrição, se ela morrer agora ela vai para o Céu, está canonizada ipso fato, porque se ela morrer agora é de fé que ela vai para o Céu".

Aqui começa a nossa discrepância em relação as espírito do mundo: não ver na criança que ela tenha nascido com uma natureza boa, mas ver o papel da graça atuando nela. A criança nasceu com uma natureza má, não só uma natureza má mas uma natureza péssima. É para o que São Luís Grignion de Montfort quer chamar a atenção aqui e que é o ponto fundamental da doutrina da Igreja. Todo mundo no fundo pela sua natureza corrompida pelo pecado original é péssimo, e a criança carrega consigo o que São Luís Grignion chama muito bem, todas as virtualidades más de uma semente em que se misturam coisas boas com coisas péssimas. A mistura da coisa boa com a coisa péssima dá um todo péssimo.

É mais ou menos como uma água pura na qual se pinga uma gota de pus. Ninguém venha me dizer: "Mas Dr. Plinio, é só uma gota de pus!"... É uma água purulenta. Ela toda se tornou nojenta. Embora a quantidade de pus que tenha caído na água seja insignificante em comparação com a massa da água, a água toda se contaminou com aquilo.

Assim a natureza humana com o pecado original. O homem tem qualidades mas o todo é ruim, por causa dos grandes defeitos, defeitos gravíssimos, que resultam em cada alma humana do pecado original.

Então quando ele diz que nós somos lesmas, que nós somos porcos, isto aquilo e aquilo outro, quer dizer que somos sementes pútridas porque fomos concebidos no pecado original. Temos no nosso interior todos esses maus instintos, todas essas más inclinações. Eu tenho, não há nenhum dos senhores que não tenha. Só não teve Nossa Senhora que foi concebida sem pecado original e algum santo que muito excecionalmente, segundo a opinião dos teólogos, foi purificado da mancha original, depois de concebido. Como por exemplo, dizem alguns de São José, outros dizem de São João Batista. Mas são coisas raríssimas, raríssimas. A bem dizer, é discutível se os houve. Quer dizer, todos carregam em si esta má semente.

Então, na criança há um todo no qual entraram as qualidades naturais, entrou a gota envenenada, pútrida, do pecado original, mas caiu em cima deste conjunto uma gota do Sangue infinitamente precioso de Nosso Senhor Jesus Cristo. Quer dizer, a criança foi remida por Nosso Senhor Jesus Cristo.

Nela habita a vida sobrenatural da graça, e o convite para as mais altas virtudes.

Eis aqui este ser heterogêneo que é uma criança: chamada para o mais alto, para o mais nobre, para o mais belo, e propensa ao mais baixo, ao mais infame, ao mais péssimo. E devendo conhecer-se a si mesma – quer dizer, olhar-se de frente com coragem. Todo homem é assim, e quem pensasse por ter adquirido de uma educação errada quando criança (seus pais lhe diziam que era tão bonzinho, tão engraçadinho...) que seu fundo é bom, pensaria de modo herético, pois que a doutrina católica afirma o contrário, isto é, que nosso fundo é péssimo. Quem o negar, nega a doutrina católica.

 

Um exame de consciência sério e global, considerando os aspectos negativos e positivos

Então, se eu quiser fazer a meu respeito um exame de consciência sério, tenho que fazer as seguintes perguntas: "Quais são os movimentos de alma péssimos que eu tenho?"

Não se trata apenas em saber que más ações eu cometi, mas é preciso saber quais são os impulsos de minha alma, para que más ações eu sinto muitas vezes a minha alma mover-se. E ter a coragem de olhar até o fundo, perguntando-se até onde posso chegar se eu atender este mau impulso. Cada um de nós pode chegar ao pecado mortal que leva ao inferno! Sermos precitos, sermos réprobos por toda a eternidade, os mais desgraçados e miseráveis dos homens. Em todos nós há caminhos ladeira abaixo que nos levam para o Inferno, como há caminhos ladeira acima, que nos levam para o Céu. Os caminhos ladeira abaixo estão na nossa natureza; os caminhos ladeira acima estão na graça que dá força aos melhores elementos de nossa natureza para nos levar para o Céu.

Então nós temos que olhar de frente o seguinte: os meus maus impulsos podem me levar para a prática de ações péssimas.

Por exemplo, a vaidade: um homem pode, delirando pela vaidade, ser levado a ações as mais injustas. Ele pode fechar os olhos para as qualidades dos outros, caluniá-los, blefar para passar imerecidamente na frente dos outros. Ele pode conservar ódios e rancores que nunca perdoa por causa da sua vaidade ofendida. Ele pode cair na luxúria, no pecado contra a pureza por causa da vaidade. Por que? Porque isto está no homem.

Como também – e é preciso notar bem este ponto – nós não podemos fazer apenas um exame de consciência deprimente, devemos fazê-lo de modo global, vendo também os lados bons, pois nenhum de nós foi criado para a mediocridade.

 

A vocação para a mediocridade não existe

A vocação para a mediocridade não existe. Todos nós fomos criados para uma virtude autêntica e rutilante. Se correspondermos, seremos astros no reino dos Céus.

De maneira que devemos procurar adquirir um misto de santa admiração e santo horror: "Meu Deus, que coisa esplêndida eu poderei ser pela Vossa graça, se disser ‘sim’ à Vossa vontade. Sinto em mim tal nobreza de alma, tal elevação de ideais, que tenho tal ou tal outra possibilidade de me dedicar, de ser entusiasta, de me sacrificar, de ser um herói. Tudo isto eu sinto em mim. Sinto essas aspirações que são frutos vossos, ou pelos dons da natureza, ou pelos dons da graça. Que magnífica perspectiva eu tenho diante de mim".

Não há um homem criado para um destino apagado ou medíocre. Ele pode não ser célebre aos olhos dos outros homens – isto é diferente – mas ele é chamado para o Céu, e no Céu nada é medíocre. O Céu é um palácio de um Rei, onde todo mundo é gentilhomem e onde portanto todo mundo foi criado para ser um astro, para brilhar por seu grande valor de alma.

 

São Luís e o acomodado

Então verdadeiro conhecimento de si comporta dois extremos que dilaceram a mediocridade.

O acomodado gostaria de poder dizer no seu exame de consciência: "Bem, eu tenho umas qualidades e uns defeitos. As minhas qualidades não são tão grandes de maneira que eu seja chamado a desenvolvê-las. Basta que eu vá vivendo nesta toadinha que já dá certo. Os meus defeitos não são tão ruins assim, e eu tenho duas provas para isso: eu nunca fiz uma ação muito ruim na vida, nunca fui atingido pelo Código Penal. Eu não sou mais ruim do que a média dos homens. Ora, a média dos homens é forçosamente boa". Erro catastrófico: quem pensasse assim no dilúvio, aonde é que ia parar?...

"A média dos homens é forçosamente boa; eu sou como o comum dos homens, minhas qualidades compensam os meus defeitos. Na hora que eu quiser fazer uma coisa ruim, minhas qualidades dão uma brecada. Numa hora em que quiser fazer uma coisa boa, é verdade que meus defeitos darão uma brecada... mas não precisa ser uma brecada muito forte porque eu também não dou para coisa muito boa. O resultado é viver uma vidinha medíocre.

"Eu vou confessando, comungando, fazendo minhas oraçõezinhas, sem grande esforço, recebendo de vez em quando minhas absolvições. De vez em quando, eu caio num pecado mortal, mas também me confesso logo. Tem um Padre ali da Igreja de São tal que dá uma absolvição camarada, não pergunta muito os pormenores etc. Mas isto é raro, e acontece porque o mundo de hoje é muito ruim. Eu de mim para comigo não sou tão ruim, o mundo de hoje é que é muito ruim". E nesta hora, para se justificar, diz o contrário do que pensa, isto é que os outros são ruins e continua: "Em comparação com os outros que não confessam e não comungam, eu até estou bem acima da média. Ora, se a média já é boa – para entrar para o reino dos Céus, basta 6 – eu que estou acima da média – nota 9 ou 8 –, se eu não morrer numa má hora, em pecado mortal, estou bem arranjado.

"Então esses dramalhões todos de São Luís Gringnion de Montfort: ‘Você é um porco! Você é uma lesma!’ Exagero... exagero de um santo missionário que fala assim para sacudir alguns; não a mim que sou cidadão do século XX, frio, lúcido, que tenho distância psíquica, sei julgar as coisas. E vejo que São Luís Gringnion falava para gente do povo, provavelmente aqueles camponeses da Vandée eram analfabetos. Eu passei pelo Grupo Escolar, sou muito superior a um camponês da Vandée. Eu sei dizer b-a-ba. Eu até já entrei no Ginásio, cheguei até o Colegial. Imagine que aventura: colando eu entrei numa Faculdade, e colando eu sai de uma Faculdade. Não é tão pouco. Eu não vou agora na onda do que ele dizia para impressionar aqueles camponeses. Vamos dizer... São Luís Grignion tinha os seus exageros, mas o Clero (progressista) de hoje – é um clero ruim, é verdade – mas nisto houve um progresso. Eles não fazem mais estes sermões de aterrorizar, eles fazem sermões equilibrados, etc. , etc., "Meus caros, vamos tratar de ir vivendo, eu acabo indo para o Céu... eu estou contente comigo!"

Isto é o tipo do exame de consciência errado, mas é errado porque é herético, porque nega verdades fundamentais da fé católica.

A verdade fundamental é que eu, Plinio Corrêa de Oliveira com a minha idade, posso cair a qualquer momento em qualquer pecado grave se eu não for vigilante. E isto vai ser até o fim de minha vida.

 

A graça da perseverança final é uma graça autônoma

Nos conventos de religiosos contemplativos, do alto do monte de São Bernardo, quando morria um frade, estando ele moribundo, pelo regulamento do convento prostrava-se no chão para morrer em toda humildade, e os outros religiosos ficavam em torno dele rezando.

De vez em quando um frade chegava-se a ele, com o receio de que estivesse meio ensurdecido pela agonia e gritava: "perseveras irmão? Estás salvando tua alma irmão?" E ele se podia fazia um sinal que estava. Ou então, que estava tentado e rezassem por ele! Até o último momento depois de uma vida de penitência, estes frades temiam pela sua perseverança.

E a verdade é a seguinte: o dom da perseverança na hora da morte é um dom autônomo, e não uma conseqüência necessária da vida boa. A pessoa pode ter levado uma vida boa, mas se não pedir a graça de uma morte santa, pode depois não tê-la. De tal maneira, é delicado, é importante, é difícil a gente se salvar.

Como é que é difícil a gente se salvar? Para quem dá importância à doutrina da Igreja, para quem a toma a sério e que faz o que deve, a salvação pode custar sacrifícios mas é certa. Para quem não dá importância, fundamenta seu exame de consciência em concepções heréticas, nega implicitamente o pecado original, nega a vocação à santidade, estabelece a sua vida baseada na mediocridade, para este a salvação eterna é muito arriscada. E portanto nós devemos nos olhar de frente!

 

A mediocridade é um ponto resvaladio na rampa do Inferno

Olhar de frente é começar por despojar a idéia de nossa mediocridade. Nós não somos chamados para a mediocridade, ninguém é chamado para a mediocridade. Nós devemos pegar o ídolo da mediocridade e quebrá-lo! Dilacerar ou lacerar o "documento" onde nós escrevemos para nós mesmos na nossa alma que somos medíocres, que temos o direito de ser medíocres! Não há o direito de ser medíocre! Isto é uma mentira! A mediocridade é um ponto resvaladio na rampa do Inferno. Temos obrigação de estar tendendo para a virtude cada vez maior, de estar progredindo. Aquilo que não é progresso é caminhar insensivelmente para o Inferno.

Depois, devemos perguntar-nos o seguinte: uma vez que a Igreja disse que eu tenho tendência para o péssimo, quais são essas tendências e quais são esses movimentos de alma? E com isto procurar-nos corrigir destas tendências. Uma vez que a Igreja me diz que eu tenho movimentos de alma para o ótimo, quais são? Devemos estimulá-los, aperfeiçoá-los. Este é o exame de consciência sério.

 

Como conhecemos nossa tendência para o mal? Concretamente como se pode fazer isto?

É simples. Começar por estudar no que somos apegados, perguntando-se o seguinte: "Se Deus me pedisse isto, qual seria minha reação? Ham... daria. Se Deus me pedisse aquilo? Um tanto forçado, daria. Se Deus pedisse tal outra coisa? Ai, ai, ai, isto não! Na misericórdia dEle, Ele nunca pedirá". Aqui devemos parar e deter a consciência; aqui há qualquer coisa, comecemos a analisar.

Assim, imaginar-se privado disto, daquilo, daquilo outro. Por exemplo, quem de nós aceitaria de ficar mau reputado, desprezado, menosprezado, subestimado? quem de nós aceitaria de repente ficar paupérrimo? de repente ficar doente, mas não destas doencinhas que são quase gostosinhas: a pessoa compra com a doencinha o direito de uma vida mole. Ele toma uns remedinhos, todo mundo toma cuidado com ele porque sofre do fígado! Não pode ser contrariado porque sofre do fígado. Quer dizer, vale a pena sofrer do fígado para não ser contrariado, é um alto negócio!

Não se trata disso e sim das doenças que doem, que atrapalham a vida, que preocupam, que de vez em quando torna a morte próxima. Quem é que estaria disposto a aceitar isto? Por exemplo, de repente uma doença da vista gravíssima pela qual não se vê dois dedos diante do nariz, não sabe se vai ficar cego ou não. Então ir imaginando quem de nós aceitaria. Onde der os estremeções, ali estão os apegos.

Alguém dirá: "Mas isto parece uma câmara de torturas!" A resposta é: "Não meu caro, é para fugir da câmara de torturas eterna e da qual ninguém sai. Estamos num vale de lágrimas, como diz na Salve Rainha. Isto é verdade".

A vida do católico é muito dura. Só há um jeito de levar uma vida mais dura do que a do católico: é a do não católico. Nesta vida tudo é penoso.

Mas então vamos pegar isto e tomar a sério e examinar.

 

Como podemos conhecer nossos bons impulsos?

Todos nós temos na alma certos momentos, certos estados de alma em que nos parece que a virtude se torna fácil e em que temos alegria em praticá-la. Nosso ideal aparece tão belo, com tanta louçania, com tanta vida que se nos torna fácil praticá-lo.

Aquilo é um bom impulso de nossa alma, favorecido pela graça que mostra por onde, se soubermos aproveitar, conseguiremos progredir.

Temos, então, aí os dois meios para nós conhecermos o bem e conhecermos o mal em nós, sempre pensando: "se eu corresponder ao bem não sei até onde eu subirei, e se eu tentar resvalar no mal, não sei até onde rolarei".

 

A consagração confiante a Nossa Senhora

Assim poderemos ter a certeza de termos aproveitado bem esta semana, para que, quando estivermos diante da imagem de Nossa Senhora façamos uma consagração confiante. A consagração confiante não é apenas do homem que eliminou seus defeitos, mas é do homem que deseja vê-los de frente, que pede a Nossa Senhora sabendo que Ela nunca recusa um pedido, a graça de ver os seus defeitos completamente de frente. E aí, então, com confiança, diz aquelas palavras lindíssimas do Memorare: "gemendo sob o peso dos meus pecados eu me prostro a Vossos pés". Quer dizer, o homem pode ter tantos defeitos e tantos pecados, que são para ele como um fardo debaixo do qual ele geme. O que faz este pecador? Ele não foge de Nossa Senhora. Ele se inclina e se põe aos pés dEla sabendo que será atendido.

Tomemos esta disposição de rezar para sermos atendidos, custe o que custar, porque Nossa Senhora ama o pecador e procura tirá-lo do pecado, procura ajudá-lo, pois Ela é mãe de misericórdia. Esta é a disposição que nos deve levar à consagração verdadeira, à consagração confiante que seja depois um passo para maior virtude.

Compreendo que alguém possa ter ficado implicado com tanta franqueza. Permitam-me mais uma franqueza: esta implicância entretanto será muito infantil. É mais ou menos como a criança que vai ao dentista e o vê começar a esgravatar, abrir uma cárie, por chumbo, ouro ou porcelana. A criança pensa: "Esse dentista que começa com essa importunação!" É uma reação completamente infantil; se não for isto vai embora o dente.

Ou então uma pessoa que vai se fazer examinar pelo médico, e o médico começa: tram! tram! tram! O indivíduo pensa: "Mas parece que ele está torcendo para que eu fique doente! Que é isto?!" É uma reação infantil.

O verdadeiro dentista, o verdadeiro médico é aquele que procura dedicadamente as causas do mal para evitar que elas se alastrem. O verdadeiro amigo em matéria espiritual procura encontrar os defeitos para evitar que eles se alastrem. E apresenta então as raízes de defeitos. São colossais!

Qual o resultado? É o mais belo troféu para entrar para o Céu. Quem entra para o Céu carregando como troféu as raízes de seus defeitos que extirpou, entra como vencedor. Porque de todas as vitórias que Nossa Senhora quer sobre o homem, a que mais Ela deseja é que ele se vença a si próprio. Se eu me apresentar no dia do Juízo levando-me acorrentado e bem esbordoado, o Céu se abrirá complacentemente para mim.

Oxalá todos nós façamos isso!

 

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