Conferência Pública - 12 de setembro de 1968, Quinta-feira

 

 

Sessão solene na Casa de Portugal: encerramento da Campanha contra a infiltração comunista na Igreja

 

 

...Sr. Vice-presidente da TFP, Dr. Fernando Furquim de Almeida; sr. Major Josué Figueiredo representante do Sr. Comandante do Segundo Exército; sr. Daniel da Cunha Melo representante do sr. General Comandante da Segunda Divisão de Infantaria; engenheiro Plínio Vidigal Xavier da Silveira, superintendente da Diretoria Administrativa e Financeira da TFP; sr. Coronel Osório de Castro, representante do sr. Comandante Brigadeiro do Parque da Aeronáutica de São Paulo; Dr. Eduardo de Barros Brotero, secretário da TFP; sr. ex-ministro engenheiro Marcondes Ferraz; engenheiro Adolpho Lindenberg do Conselho Regional da TFP; Dr. Caio Vidigal Xavier da Silveira, segundo secretário da TFP; sr. Coronel Eurico José Paulo (...) representante do sr. Comandante da Força Pública do Estado; Excelentíssimos e reverendíssimos arcebispo de Diamantina e bispo de Campos; dignas autoridades militares presentes; srs. componentes desta mesa; minhas senhoras e meus senhores.

É com a maior satisfação que a Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, representada aqui no momento por seu Conselho Nacional, declara aberta esta sessão em que se comemora o feliz término da campanha por ela lançada, de abaixo-assinado a uma mensagem ao Santo Padre Paulo VI, em que se pede ao Vigário de Jesus Cristo na terra medidas necessárias para atalhar o surto da infiltração esquerdista em meios católicos. Essa campanha, como vós bem o sabeis, alcançou em breve espaço de tempo o fulgurante resultado de um milhão e quinhentos mil brasileiros que disseram “não” à infiltração esquerdista em meios católicos; de um milhão e quinhentos mil brasileiros que disseram “sim” ao propósito de permanecer fiéis aos ideais da tradição, da família e da propriedade, que não são os ideais de uma associação, nem são os ideais de um grupo, mas são os ideais que consubstanciam a própria alma da nação brasileira!

Nessas condições, cabe-me dizer alguma palavra rápida a respeito do significado da campanha e de seu verdadeiro alcance, e do dia de amanhã que nos espera, e é para essas palavras que vos peço um instante de atenção.

Nós devemos, para bem aquilatar o significado e o alcance dessa campanha, ter em vista, antes de tudo, qual era a situação anterior ao momento em que ela se desfechou. O Brasil se encontrava em uma situação paradoxal, em uma situação que mais bem se poderia chamar caótica. Porque, com efeito, um movimento todo ele feito de contradições, todo ele feito de anseios inexpressivos ia ganhando vulto no Brasil e em razão de fatores que daqui a pouco pretendemos analisar. O vulto ganho por esse movimento era tal que o Brasil já não reconhecia em si próprio a sua própria face. E se perguntava, ansioso, cada brasileiro de si para si, se era bem verdade que nosso país tinha mudado, se era bem verdade que de um momento para outro nossos ideais eram outros, se era bem verdade que o Brasil de hoje já não queria aqueles grandes ideais que nortearam o Brasil de ontem e que nos faziam caminhar para o Brasil de amanhã.

É este o sentido confuso do que se costuma chamar “progressismo católico”, palavra que tenho uma certa dificuldade em escrever, porque nem sei bem se devo pôr entre aspas a palavra progressismo, ou a palavra católico. Não vejo no progressismo católico nada de verdadeiro progresso; de catolicismo vejo, na melhor hipótese, laivos. E é esse progressismo católico, que com uma promoção publicitária extraordinária, vinha fazendo crer ao Brasil que ele representava a alma do Brasil de hoje.

Como explicar o chamado progressismo católico? Em última análise não faltam, em todas as ocasiões da história, em todos os momentos, espíritos descontentes, espíritos incompatíveis com uma determinada ordem vigente. Esses espíritos se avolumam e se multiplicam em determinadas épocas, e quando as incompatibilidades e as insatisfações crescem de vulto, os espíritos dessa natureza se unem, se enfeixam e se põem a divagar. E no nosso caso concreto, em virtude de circunstâncias que seria muito longo estar enumerando, parece que sonhos vagos de uma igualdade completa, sonhos vagos de uma liberdade completa e anárquica, conjugando-se uns com outros, a par de terem levado muitos espíritos definidamente para o comunismo, numa ruptura clara com tudo aquilo quanto era a civilização cristã, também afloraram em outros espíritos, quiçá mais tímidos, quiçá menos afeitos às mudanças, mas que acalentavam - no fundo - anseios, quiçá inexpressos também, mas cujo ponto terminal, cujo pólo de atração era, em última análise, a igualdade completa, a liberdade anárquica e sem freios. Daí uma tendência para, ficando embora dentro da Igreja Católica, sonhar uma certa mudança da Igreja, sonhar uma certa evolução da Igreja, sonhar uma transformação da Igreja que, ao sabor de cada devaneio, tomava caráter ora mais audacioso, ora menos audacioso, mas que considerado nos seus elementos mais extremos chegava, naturalmente, ao ensaio de uma renovação tão profunda da Igreja que haveria de dar totalmente na construção de uma Igreja nova.

Esse infeliz ideal da construção de uma Igreja Nova, ideal que mal esconde em si a própria apostasia, esse infeliz ideal aflorou - se é que um devaneio dessa natureza merece chamar-se ideal - aflorou de modo protuberante nas declarações de um sacerdote que a Cúria Metropolitana de São Paulo foi levada até a condenar. É o sacerdote Júlio Sérgio Zanella, que num dos últimos números da revista “Cruzeiro”, fez a respeito da Igreja Católica as seguintes observações. Eu não dou senão algo do que há de mais audacioso, de mais característico nas suas afirmações. Ele descobriu - perdoai-me a trivialidade da linguagem, mas a hora de hoje é hora de verdades duras, em que nada deve ser calado e em que as palavras exorbitantes devem ser repetidas - ele descobriu que as prostitutas eram mais sinceras que os eclesiásticos que pregavam uma Igreja com devoção. Ele disse já estar decepcionado com a Igreja e embora A tolere, permanecendo dentro, não acredita nela como Ela se apresenta hoje.

O que mais falta para esse pobre homem apostatar formalmente? Mais adiante ele declara: “é necessário a Igreja nascer de novo e não simplesmente reformar atitudes eclesiásticas ou eclesiais”. Ora, aquilo que nasce de novo morreu antes. Não é possível nascer de novo sem ter morrido antes. Nascer de novo é tomar um ser totalmente novo. Então se declara a morte da Igreja?! Parece que é esse o pensamento dele, porque acrescenta: “Não acredito no Deus que os eclesiásticos pregam. Depois de tanto rezar e, conseqüentemente, perder tempo” - rezar e conseqüentemente perder tempo! – “cheguei à conclusão: o Deus do catecismo que os padres me ensinaram não pode existir. O Deus explicação do inexplicável que a Igreja tanto pregou, e ainda prega, com o avanço da ciência e do progresso, está confinado. Os centros urbanos acham ridículo esse Deus. Até nos meios rurais está sendo sepultado com tristeza de ninguém e alegria de todos”.

Para nós termos chegado a uma época em que lábios sacerdotais proclamam, por essa forma, a morte de Deus; chegarmos numa época em que - como declarou em reportagem recente, o padre Benvenute da Santa Cruz, saindo da reunião de Medellin: um bispo o teria tomado pelo braço e teria dito: “Meu velho, não nos iludamos! Estamos assistindo não simplesmente a mudança da face da Igreja, mas a uma Igreja nova que sai e que deixa os seus velhos trajes, os seus velhos vestuários bolorentos”, - para chegarmos a uma época em que se ouvem coisas tão extraordinárias, é porque precisamente esses espíritos sonhadores de maus devaneios tomaram um impulso, tomaram uma força que não se caracteriza apenas nas suas manifestações de caráter religioso, mas que revertem também nas suas opiniões de caráter moral.

Mais uma vez eu lamento ter que reproduzir, numa reunião tão seleta, pensamentos que não seriam dignos dela, mas tenho aqui, para dar um exemplo do que seja a “moral nova”, disto que talvez se venha chamar a Igreja Nova, tenho aqui um documento que é tirado de uma revista católica, e revista bem conhecida, a “Vozes de Petrópolis”, de setembro de 1967; uma citação do padre Jaime Esnef, que me foi dado por um estudioso nessa matéria, um diretor da TFP, meu amigo Arnaldo Vidigal Xavier da Silveira. Ele trata do tema lamentável, do tema (...) da homossexualidade. E a respeito desse tema, ele declara:

“Em última análise, a questão sobre a homossexualidade me parece ser esta: a vivência homossexual, no plano erótico, pode ou não pode, em tese, promover as pessoas envolvidas em termos de amor oblativo, intersubjetividade, responsabilidade comum na construção do mundo e da humanidade?”

Esses atributos: amor oblativo, intersubjetividade, responsabilidade comum, esse sacerdote considera distintivos do matrimônio E ele pergunta, então, se a união homossexual contra a natureza pode trazer essa conseqüência, trazer frutos de caráter afetivo legítimo, análogos ao do verdadeiro matrimônio. E ele responde:

“Se e enquanto esses valores podem se realizar numa união homossexual, não vejo como a conduta do homossexual a priori, sem mais, pode ser considerada imoral e contra a natureza”. E mais adiante ele acrescenta: “Mesmo se uma união entre homossexuais se dissolve depois de certo tempo, ainda isso não quer dizer que não tenha deixado nada de positivo. Podemos, pois, admitir uma discreta possibilidade de realização de valores através de uniões homossexuais”.

A isso se poderia acrescentar, evidentemente, aquele número da revista “Cruzeiro”, que tantos dos srs. terão visto, com uma reportagem sobre uma Congregação religiosa feminina que fazia representar muitos de seus elementos em maiô de banho perto de uma piscina, sabendo que estavam sendo fotografadas, e em outros trajes análogos diante de professores de ginástica etc.. Esposas de Cristo, modelos da castidade, perfeitas guardiãs da mais delicada das virtudes, entretanto, para elas, não havia outra forma de afirmar a sua modernidade do que afirmar, de um modo tão categórico, a sua adesão aos costumes imorais modernos.

Essas espantosas manifestações tiveram também, no terreno social, a sua necessária repercussão. E assim como de uma religião nova brota uma moral nova, haveria de brotar uma sociologia nova. Sociologia animada, naturalmente, pelo desejo de uma igualdade completa, de uma liberdade completa, que volta os olhos cheios de simpatia, quando não de uma expressa adesão para Cuba e para as formas do governo comunista.

Temos aqui, por exemplo, - dói mencionar o fato, mas é preciso que as verdades se digam inteiras e como elas são - temos aqui, por exemplo, a entrevista concedida por Dom Antônio Fragoso, bispo de Crateús, ao jornal “A Vanguarda”, do Crato, em que ele declara:

“Quando Fidel Castro venceu e estabeleceu a revolução, ele diz: Vamos fazer a reforma agrária! Essa reforma agrária que os camponeses do Brasil desejam, e precisam, e que o governo brasileiro não teve coragem de fazer”.

E então é a reforma agrária de Fidel Castro a reforma agrária de que o Brasil precisa. A reforma agrária que é o confisco completo das terras e nem sequer uma reforma com um confisco parcial. É uma eliminação brutal do direito de propriedade, como fez Fidel Castro em Cuba, e é isso que Dom Antônio Fragoso, bispo de Crateús, deseja. E ele afirma então: “com a coragem da pequena Cuba, eu estou de acordo e peço a Deus que me conceda a coragem de imitá-la e de motivar a consciência de meu povo para que ele imite essa coragem”.

 Os srs. estão vendo aí algumas manifestações extremas de um estado de espírito que dispôs da maior cobertura publicitária que talvez existe na história do Brasil. E foi preciso, nessa hora e nesse momento, que uma organização se levantasse e que essa organização perguntasse a todos os brasileiros se, sim ou não, eles se reconheciam nessa imagem. Porque o esforço publicitário lançado afirmava precisamente que o Brasil novo queria essas coisas; que quem não estava de acordo com essas coisas não representava se não as velheiras do passado; que o caminho nesse rumo era um caminho de caráter irreversível e que, portanto, em conseqüência, quem não quisesse ser superado pelos acontecimentos, teria que dizer “sim” a essa onda que se apresentava.

Feita, lançado o apelo aos brasileiros para assinarem ao Santo Padre a mensagem, desde os primeiros dias, as 50 seções e subsecções que a Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade tem em todo o território nacional, começaram a se dirigir à opinião pública, e em 30 dias um milhão de brasileiros, de todas as classes sociais, de todos os bairros, de todas as condições disseram “sim” à nossa mensagem. O Brasil não quer esse caminho, o Brasil brasileiro, o Brasil verdadeiro, o Brasil atual não é esse! O Brasil verdadeiro, o Brasil brasileiro atual é fiel à sua tradição; deseja íntegra a constituição da família e vê no direito de propriedade uma das mais preciosas condições da prosperidade dos povos, desde que ele exerça a sua função social que lhe é inerente, como, aliás, a quase todos os direitos humanos.

A TFP ampliou então o seu raio de ação. Por um esforço dos nossos militantes, que jamais será suficientemente louvado, cento e sessenta e tantas cidades do Brasil foram percorridas por nossos militantes; de alto a baixo do território nacional, por tempo bem e por tempo mau, enfrentando um trabalho rude que a todos impressionou; com uma cortesia, com uma lhanura, com uma atenção que desafia qualquer elogio, num espírito de respeito inflexível às leis e às autoridades constituídas, esses jovens universitários, estudantes, comerciários, operários, percorreram as alamedas, as ruas, as avenidas, os logradouros públicos de nossas cidades, quase todos eles sacrificando seus fins de semana, depois de dias inteiros de árduo trabalho, para se dirigirem ao Brasil e para levantarem esse inquérito, que é o maior inquérito de nossa história! Nesse inquérito o Brasil respondeu o que já vimos. A Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade, nos trinta dias subseqüentes da campanha, forçosamente mais lenta, porque envolvia um deslocamento enorme para novas cidades com as necessárias adaptações, obteve o total de um milhão e quinhentos mil que protestaram contra esse pseudo progressismo, que não representa o Brasil de hoje e, menos ainda, o Brasil de amanhã!

Esse resultado impressionante revelou, pela unanimidade dos brasileiros, que não se trata apenas de uma elite que pensa assim. A investigação foi feita, as listas foram passadas nos bairros tidos como os mais entusiásticos das pseudotransformações progressistas. Tanto no Jardim América, que é um bairro que pode ser considerado conservador, ou em Higienópolis, ou em Jardim Europa em São Paulo; como, por exemplo, em Osasco, como em Santo André, São Bernardo, São Caetano, Vila Maria, os nossos militantes foram recebidos esplendidamente! E eu acrescento mais: como sempre acontece com as campanhas públicas da TFP, as manifestações de comunismo foram insignificantes nos bairros operários. Elas tomaram vulto um pouco, infelizmente, da parte de uma minoria, precisamente nos bairros ricos e burgueses, aonde pessoas covardes, postas em automóveis às vezes excelentes, passavam perto dos militantes, e bem certo de não serem alcançados pelo revide, gritavam algumas injúria e saíam correndo. De tal maneira é verdade que, a constituir um problema no Brasil, o comunismo é, sobretudo, um problema de salão, sem nenhuma autenticidade na realidade nacional.

 Entretanto, este resultado da campanha - que a todos nós restaura a convicção de que cada um de nós não está isolado e que nós somos todo mundo, e que todo mundo está conosco -, este resultado da campanha é apenas um dos seus aspectos. Este é o seu resultado cheio de promessas.

Mas tal é a tristeza dessa vida que tudo aquilo que tem um aspecto belo, tem o reverso da medalha, e o reverso da medalha foi a enorme oposição de minorias organizadas. Em primeiro lugar, a minoria dos baderneiros e, em segundo lugar, a minoria daqueles que desejam, acoitados nos meios de publicidade, aproveitar-se de sua situação para dar de nossa realidade uma imagem que é inteiramente falsa. Nesses períodos de campanha, em quase todas as cidades do Brasil, foram verificadas agressões contra os nossos jovens, agressões sempre com o caráter de dirigidas, que tinham como fito meter-lhes medo e obrigá-los a recuar. Porque os agressores sabiam, por experiência própria, que os jovens militantes da TFP tinham como palavra de ordem defender-se, mas nunca voltar ao contra-ataque; porque se eles voltassem ao contra-ataque se estabeleceria confusão a respeito da origem do ataque; estabelecendo a confusão a respeito da origem do ataque, dir-se-ia que a agressão era nossa. Dizendo-se que a agressão é nossa, o surradíssimo chavão de que somos fascistas e nazistas seria manobrado por certa imprensa contra nós. E para que a iniqüidade ficasse sem face e a baderna não pudesse ter máscara, nossos militantes tiveram mais essa coragem: por toda parte se defenderam e não voltaram ao conta-ataque.

Para quem sabe o que isso representa para um jovem de brio, para um jovem que sente a força de sua mocidade e tem um impulso de revidar pela dignidade de sua força de músculos à insolência de uma agressão de baderneiros, podemos calcular a força de idealismo, o domínio sobre si, a dedicação, o verdadeiro heroísmo que esses jovens deram prova, permanecendo sempre fiéis a essa linha de ação. Pois bem, tenho pena em dizer, mas em algumas dessas cidades, os açuladores eram os sacerdotes que recomendavam a jovens que iniciassem o ataque. E nós temos 16 cidades em que houve agressões físicas. Em algumas delas correu o sangue de nossos militantes, correu o sangue brasileiro derramado pelos baderneiros. Mas de maneira tal que a própria imprensa não teve a coragem, mesmo os órgãos esquerdistas da imprensa, não tiveram a coragem de dizer que a TFP se manifestava nazista ou fascista no seu modo de ação.

Mas, além disso, houve mais perto de 300 casos de agressão, em que não houve o impacto físico porque os nossos jovens prevendo ataque deixaram o local ou porque o intuito dos baderneiros era de fazer barulho, impedindo que as pessoas se aproximassem para assinar as listas. De maneira tal que minorias respirando o mesmo ar de ódio e de vingança, generalizadas pelo território nacional, quiseram realizar isso que deve ser qualificado [como] um verdadeiro crime. E o crime é o seguinte: temos direito, pela Constituição Federal, direito de manifestação de opinião política e direito à prática de nossa religião. É uma manifestação de nossa liberdade política colhermos assinaturas para aquilo que pensamos que é o verdadeiro. É uma manifestação da prática de nossa religião nos dirigirmos livremente ao Santo Padre.

Essa baderna organizada teve em vista diminuir o número de assinaturas quanto fosse possível. Ela teve em vista atemorizar os nossos militantes; ela violou a Constituição Federal, violou-a gravemente, não só na liberdade dos militantes da TFP, mas na liberdade dos brasileiros que queriam assinar as nossas listas. Mas, como revide, eu tenho esta magnífica resposta a dar: é que, apesar de tudo isso, nossos jovens não tiveram mãos a medir, e que se duplo fosse o número dos coletores, dobrado teria sido o resultado. Esse um milhão e quinhentos mil está longe de representar tudo aquilo que um contingente de coletores verdadeiramente grande teria podido angariar.

Esse sentido de imposição se notou também na campanha contra a TFP - na campanha escrita e na campanha oral - enquanto desenvolvíamos os nossos trabalhos. Ninguém pode ter lido na imprensa - porque isso não se deu - ninguém pode ter lido na imprensa, jamais, alguma palavra de brutalidade ou de hostilidade da TFP contra qualquer de seus contendores. Entretanto, enquanto nós continuamente argumentávamos, enquanto continuamente prestávamos as nossas razões, enquanto temos uma série de obra publicadas pela TFP, entre as quais brilhantes Pastorais de Dom Geraldo de Proença Sigaud e Dom Antônio de Castro Mayer e uma obra modesta contra o comunismo, escrita por mim, mas objeto de uma carta de louvor da Secretaria dos estudos das Universidades e Seminários da Santa Sé, e assinada pelos cardeais Staffa e Pizzardo, enquanto nos apresentamos com argumentos e com cortesia, do outro lado, se estendendo pelo Brasil inteiro uma espécie de campanha de cochicho fabulosamente bem organizada! De ouvido a boca e de boca a ouvido, se generalizam essas coisas e aquelas coisas. Tivemos ocasião de publicar – matéria paga, bem entendido! - tivemos ocasião de publicar uma grande seção de jornal em que todos esses cochichos eram desmentidos, entre os quais o famoso cochicho de que seríamos nazi-fascistas.

Eu tenho a honra de vos dirigir a palavra, neste momento, entre Dom Mayer e Dom Sigaud, a dois passos do professor Furquim, junto de outros amigos meus do Conselho Nacional da TFP, que são meus amigos há perto de 30 anos, que colaboraram comigo num semanário que foi órgão oficioso da Arquidiocese de São Paulo, de gloriosa memória, chamado “O Legionário”. E todos esses sabem, como muitos de vós aqui presentes deveis saber também, que no momento em que o fascismo e o nazismo eram um perigo internacional, nenhuma voz no Brasil se ergueu mais alto do que a nossa, contra eles, a tal ponto que eu, pessoalmente, fui várias vezes objeto de ameaças de agressão pessoal. Apenas o que tem é que não somos de escoicear adversários abatidos, nem somos os inimigos dos adversários da véspera.

Somos inimigos do adversário de hoje, do adversário atual e poderoso, do adversário arrogante e perigoso. Este menos nos fará calar e nunca nos fará dobrar os joelhos e é por essa razão que nós, no jornal, publicamos: “Provem, em algum documento, que somos fascistas ou nazistas! Ignoram que “O Legionário” publicou uma longa série de ataques nossos, anos inteiros a fio, contra o fascismo e o nazismo. Querendo, venham ver o “Legionário” em nossas coleções”. A resposta a todo esse zunzum foi o silêncio. O silêncio também e a repetição das calúnias e uma saraivada da imprensa - eu estou longe de dizer que dela tenha participado toda a imprensa; devemos agradecer a várias figuras eminentes da imprensa, a alguns órgãos da imprensa de merecido destaque, o apoio que nos deram - mas uma saraivada tal de propaganda de adversários acoitados na Imprensa.

Eu vos mostro estes volumes aqui: é um volume representando o mês de julho; outro volume representando o mês de agosto; até o dia 10 de setembro, mais esse volume de publicações de imprensa com fatos falsos a respeito da TFP; com comentários injustos que a TFP não pode desmentir todos por não encontrar as portas abertas, nem segundo a Lei de Imprensa, para retificação das calúnias que contra ela foram feitas. Todas as retificações da TFP não tiveram como resultado a não ser insistência na mesma versão falsa. “Menti, menti, qualquer coisa ficará sempre”, dizia o ímpio Voltaire. O conselho dele não foi esquecido pelos sequazes que ele tem em nossos dias. A mentira continua insistente, a agressão continua terrível, a TFP vitoriosa.

Haja visto, por exemplo, para compreendermos esse estilo de polêmica, haja visto, por exemplo, o escrito do padre Comblin, escrito completamente subversivo, que pede a revolução armada, que pede a distribuição das armas ao povo, pede desmoralização do Poder Judiciário, que pede a destituição do governo, que pede reforma agrária, urbana, empresarial do tipo declaradamente cubano. Esse documento do padre Comblin foi analisado pelo obscuro orador que tem a honra de lhes falar neste momento, numa carta que - como início da campanha - a TFP distribuiu 500 mil exemplares no Brasil. Essa carta foi objeto de algumas respostas.

As repostas eram simples afirmações: “O padre Comblin é muito bom, logo a carta dele, o documento dele não pode ser ruim”. Do que vale essa lógica? É como quem diz: “tal árvore é muito boa, logo a fruta que eu colhi, que é ácida, não é ácida. Eu é que estou errado”. É a mesma coisa. Ou então outra coisa: “O documento do padre Comblin não é ruim porque eu conheci pessoalmente o padre Comblin e sei que ele não tem essas idéias”. Ele escreveu ou não escreveu o que ele disse? Escreveu! Ele mesmo encontrou para se justificar a afirmação de que se tratava de um rascunho. Quem de nós vai rascunhar coisas dessas? Um rascunho da subversão completa das coisas. Pois bem, os srs. sabem o que de norte a sul do Brasil se repetiu? E às vezes do alto de púlpitos? Que a nossa campanha era anticlerical porque visava um padre, padre Comblin. E o padre Comblin, no escrito dele, fala mal dos bispos, fala mal do clero; diz que houve dinheiro mal empregado da parte da Igreja em ter seminários; que era melhor ter constituído escola de revolucionários. Quer dizer, quem toma a defesa inclusive do clero contra padre anticlerical, este é anticlerical e, em sentido contrário, de norte a sul do Brasil, vozes eclesiásticas se levantaram nunca para dar um argumento, mas sempre para reafirmar: ele é bom, ele bom, ele é bom!

Destoou disso pela vivacidade, pela mordacidade, pela violência, uma personalidade respeitável pela sua alta investidura, mas que como toda nota mais aguda num concerto, dá ao concerto a sua característica. Eu vou ler essas palavras:

“O estudo de Comblin é notabilíssimo sob todos os aspectos, inclusive político, embora sua natureza e sua finalidade sejam puramente pastorais. O fato do documento de estudo ter sido divulgado com certa intenção malévola em nada prejudica o seu aproveitamento. Pelo contrário, dará lugar a uma verdadeira formação da opinião pública - uma verdadeira formação da opinião pública! - em torno de assuntos de suma gravidade e importância para a Igreja na América latina. A Igreja nada perde com a interpretação arbitrária dada ao trabalho consciencioso do padre Comblin”.

Qual é a prova de que essa interpretação foi arbitrária? Não há. À guisa de prova vem um insulto – por pessoas sem nenhuma competência - essa interpretação foi dada por pessoas sem nenhuma competência, até mesmo por indivíduos marginalizados na inteligência, na religiosidade e na posição político-bajulatória.

“No Brasil pode-se dizer que estamos de parabéns. A divulgação do documento de estudo de Comblin trouxe colaborações valiosas de várias fronteiras, que o enriquecerão na certa. O estudo de padre Comblin faz luz e desperta-nos para atitudes pastorais positivas serenas, prudentemente (?) levar-nos-á longe”.

A única coisa com que estou de acordo com todo esse palavreado é que “esse estudo, a ser atendido, nos levaria longe”. “Mordam-se os reacionários! Mordam-se os reacionários de todos os tipos, sem exceção, até de alguns católicos de olhos fechados, causa-nos pena dizê-lo”. A mim causa-me pena declinar o nome do autor desse ataque: é o Excelentíssimo e Reverendíssimo Sr. Dom Delgado, Arcebispo de Fortaleza. É um trabalho dele publicado num opúsculo chamado “Cadernos de Estudos da DAJK”. O título é: “A Revolução”.

Aí os srs. têm então os dois aspectos que se casam maravilhosamente. É a força para obrigar a TFP a se calar, é a força para impedir o povo brasileiro a se manifestar É a publicidade que mentirosamente procura inculcar o contrário do que é a realidade, do que nós queremos fazer sentir. Isso tudo nos indica o quê? Que o método proposto pelo padre Comblin é o método que está sendo aplicado no Brasil: minorias insignificantes que tomem conta do poder e estabeleçam a ditatura da extrema esquerda, para não dizer a ditadura do comunismo. Estabeleçam essa ditadura da extrema-esquerda custe o que custar, seja como for, pela imposição ou de outra maneira. Por que? Porque o Brasil tem que ser escravo, O Brasil tem que obedecer aos representantes de Moscou, de Pequim ou de Cuba. Esta é a realidade.

Daí os pródromos da situação em que nos encontramos. Uma outra personalidade, que teve o maior apoio publicitário que na história do Brasil jamais um brasileiro teve - mesmo o falecido presidente Getulio Vargas, porque ele era Chefe de Estado e como tal atraía naturalmente olhares, não teve um tal apoio publicitário - o sr. Dom Helder Câmara, Arcebispo de Olinda e de Recife, ameaça, ou promete, ou já começa a executar o seu movimento de pressão moral libertadora. Pressão - notem bem como a palavra é curiosa - quanto ela diz: não é um movimento para convicção, não é um movimento de argumentação, não é um movimento que vise atrair o povo para algo. É uma pressão que se exerce sobre um país, uma pressão de um movimento sobre uma nação inteira. O que os srs. dizem de uma nação que sofre uma tal pressão? Quando essa mesma sofre a pressão de outra nação mais poderosa, nós dizemos, como é o caso que daqui a pouco vai ser brilhantemente exposto pelo sr. Arcebispo de Diamantina, dizemos que se trata de um crime de caráter internacional. Quando é uma minoria que quer exercer uma pressão sobre a maioria, para levar a maioria a fazer algo, nós o que podemos dizer senão que é uma violação da liberdade e da dignidade dessa nação?

Eu bem sei que nessa época de rascunhos, a Pressão Moral Libertadora mudou de nome depois de ter sido lançada como tal, e vai se chamar Obra de Justiça e de Paz, não sei bem que outra coisa. Mas o rascunho aí está. Ele saiu pelos jornais. E é a idéia, evidentemente, de começar com um núcleo que produza greves, que produza agitação; que por meio disso - e com apoio publicitário provável de que lhes falei - impressione o país e faça delirar o país, como a França delirou alguns dias durante este nosso ano agitado de 1968. Mas a isso eu tenho, como brasileiro e não apenas como presidente da TFP, uma resposta a dar, e a resposta é esta: há no Evangelho uma promessa de bem-aventurança que diz o seguinte:

Bem-aventurados os mansos porque possuirão a terra; bem-aventurados aqueles que não amam a rixa nem a briga; bem-aventurados aqueles que não amam a violência, porque deles será a Terra. Deles será a Terra porque eles atrairão a si o amor dos homens que realmente amam o bem; deles será a Terra porque elas saberão opor-se, com uma força invencível, àqueles que os queiram jugular por uma violência ilegítima. Oh! A força cristã do verdadeiro católico que tem a mansidão de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Cordeiro de Deus, ou do verdadeiro católico, que tem a força indomável de Nosso Senhor Jesus Cristo, o Leão de Judá! No momento em que Nosso Senhor Jesus Cristo foi preso, alguém lhe perguntou: És tu Jesus de Nazaré? E Ele respondeu: “Ego sum”. E todos, tomados de terror, caíram com a face na terra! Esta é a majestade, esta é a força, esta é a dignidade daqueles que têm a mansidão cristã.

Nosso país é um país cordato, um país que ama a mansidão, um país cuja história tem fugido às lutas. Mas se algum dia alguém de nós se aproximar e disser: És ainda o Brasil cristão? Não aceitas a pressão que se quer fazer contra ti? Eu tenho a certeza que essa nação responderá com uma força que ainda ninguém lhe conhece, mas que está nascendo nas tormentas do momento atual, responderá: Ego sum. E os povos todos da terra e todos os agitadores serão obrigados a se prostrar. E os agitadores cairão por terra porque conhecerão isso que existe entre outras coisas de autenticamente novo no Brasil novo: é a decisão de progredir fiel a si mesmo e fiel à tradição cristã; fiel à família, fiel à propriedade e de lutar com uma força que impressionará o mundo contra quem quer que imagine que sua mansidão é moleza e que contra ele pressões possam trazer resultado. Tenho dito.

 

*     *     *

 

O Brasil é um país de coração grande. Ele não poderia celebrar sua alegria, sem se associar à dor dos outros. E é por essa razão que ele convocou os representantes dos povos cativos, especialmente da nação tchecoslovaca para comparecerem a essa sessão, para ouvir a palavra com que um dos mais ilustres prelados nacionais, exímio por sua inteligência, por sua cultura, por seus serviços prestados ao Brasil e por sua grande coragem vai falar no momento a respeito desse crime que a todos nós impressiona e que é a invasão da Tchecoslováquia.

Entretanto, quero vos comunicar algo. Acabo de receber a informação de que estão vindo, no momento, de ônibus, para participar de nossa sessão, os jovens militantes da TFP que percorreram todo o nordeste e boa parte do norte, em demanda de assinaturas, alcançando, inclusive em Recife, em alguns dias de permanência, em colaboração com o valoroso núcleo da TFP em Recife, o impressionante total de 20 mil assinaturas, 45 mil assinaturas! Os srs. vêem bem que a memória não é o meu forte... Peço que façam entrar esses jovens e eu vos peço para eles a acolhida que vosso coração lhes ditar.

 

(Nota: Para aprofundar este lance, vide “Um homem, uma obra, uma gesta – Homenagem das TFPs a Plinio Corrêa de Oliveira”, Parte II, Segunda seção, 1. A Paulo VI, dois milhões de sul-americanos pedem medidas contra a infiltração comunista na Igreja)