Plinio Corrêa de Oliveira

 

A Revolução nos ambientes e a atitude dos contra-revolucionários

 

 

 

 

 

 

 

 

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A D V E R T Ê N C I A

O presente texto é adaptação de transcrição de gravação de conferência do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a sócios e cooperadores da TFP, mantendo portanto o estilo verbal, e não foi revisto pelo autor.

Se o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira estivesse entre nós, certamente pediria que se colocasse explícita menção a sua filial disposição de retificar qualquer discrepância em relação ao Magistério tradicional da Igreja. É o que fazemos aqui constar, com suas próprias palavras, como homenagem a tão belo e constante estado de espírito:

“Católico apostólico romano, o autor deste texto  se submete com filial ardor ao ensinamento tradicional da Santa Igreja. Se, no entanto,  por lapso, algo nele ocorra que não esteja conforme àquele ensinamento, desde já e categoricamente o rejeita”.

As palavras "Revolução" e "Contra-Revolução", são aqui empregadas no sentido que lhes dá o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira em seu livro "Revolução e Contra-Revolução", cuja primeira edição foi publicada no Nº 100 de "Catolicismo", em abril de 1959.

Apresentação

As considerações aqui registradas foram feitas pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira em janeiro de 1967, em duas reuniões destinadas a alguns sócios da TFP. Sucessivas adaptações – nos textos extraídos “ipsis verbis” das duas gravações em fita, com o que a matéria se tornou aproveitável por todos os Sócios e Cooperadores de qualquer região ou cidade do País.

Aqui está um conjunto de princípios – magistralmente expostos pelo Prof. Plinio – relativos à conduta dos contra-revolucionários face aos ambientes engendrados pela Revolução.

Esses princípios, como o próprio estudo irá mostrar, devem ser aplicados por todos os sócios e cooperadores aos respectivos ambientes onde exercem o combate à Revolução igualitária e gnóstica. A própria fisionomia moral do contra-revolucionário: a vida interna da sede; o estilo, a decoração e o “espírito” da sede; o trato entre os sócios e cooperadores; tudo, enfim, deve ser objeto de uma aplicação metódica dos princípios aqui expostos.

Cor Sapientiale et Immaculatum Mariae,

Opus tuum fac !

*     *     *

I - A Revolução não existe apenas no plano teórico, mas se manifesta, concretamente, nas pessoas, nos costumes e nos ambientes. E ela toma aspectos próprios e característicos locais nos diversos ambientes atingidos

1. A Revolução não existe nas nuvens

Algumas pessoas não são adestradas para serem o contrário, diametralmente, da mentalidade revolucionária que impregna alguns meios que freqüentam. Não têm consigo mesmas a preocupação de serem diametralmente o contrário do espírito revolucionário que existe em torno de si. Fazem o seguinte raciocínio: "Do que é pecado a gente não gosta e o combate; do que é heresia a gente não gosta e a combate. A heresia e o pecado são coisas universais, e, portanto, nós combatemos valores universais ou antivalores universais. Nós não estamos em condições - nem há razão para isso - de combater características locais, as quais constituem, aliás, o que há de bom, o que há de bonito na sociedade orgânica etc."

Acontece que a Revolução não existe nas nuvens. Ela em cada lugar toma um aspecto. E não adianta a gente querer ter um espírito contra-revolucionário livresco se a gente não tem o espírito contra-revolucionário oposto ao espírito revolucionário tal como ele existe em torno de nós.

2. Verdadeiro dever de vida espiritual

Tem-se a impressão de que em algumas pessoas a visão disso não é muito clara, e que tudo quanto se tem dito sobre os ambientes, as mentalidades deles, é tido como se fosse uma teoria sociológica que fica nas nuvens, como se fosse literatura, e não como um verdadeiro dever de vida espiritual.

3. A Revolução nos ambientes e o amor de Deus

Nisso eu encontrei sempre, em alguns, uma espécie de pouco caso, uma coisa assim como quem diz: "Não, o importante é a gente não pecar contra a castidade, cumprir os mandamentos, ler a R-CR (Revolução e Contra-Revolução) e outros livros que nos formam do ponto de vista contra-revolucionário. Essa história de ambientes revolucionários... Bem, isso é um fundo de quadro, mais ou menos científico, que querem pôr no assunto, mas que para efeitos práticos a gente não tem que tomar em consideração".

Ora, tem-se que tomar em consideração. Por quê? Porque o espírito de qualquer ambiente revolucionário diz diretamente respeito ao 1º Mandamento, ao amor de Deus. É algo que quebra, que prejudica o amor de Deus. Como o amor de Deus é o meio que nós temos de nos santificarmos, a essência da santificação é o modo pelo qual nós tomamos energia para o cumprimento dos outros mandamentos, é o que dá até valor ao cumprimento dos outros mandamentos, porque o mandamento que não for cumprido por amor de Deus não vale nada. Uma debilidade no 1º Mandamento debilita todo o resto, e tira ao apostolado a sua fecundidade.

 

II - Análise de alguns ambientes

1. Há diversos tipos de ambientes, cada um com características próprias, com um espírito próprio

Há ambientes que têm um espírito muito definido, diferentes de outros que são, vamos dizer, o mare magnum de todas as indefinições. Nestes há de tudo: em um lado se poderia ter um centro armênio; no outro um centro budista, florescendo ambos; um centro ultramontano no meio; uma espécie de minúscula Nova York, uma Babilônia. Enquanto outros ainda são ambientes completamente orgânicos, em muitos aspectos, com um espírito próprio, com uma expressão própria, e isso se chocando com o espírito ultramontano.

Certos ambientes apresentam, marcantemente, ares dengosos, "enfeites" e moleza nas pessoas que lá vivem. Já o defeito capital de outros ambientes é o horizonte fechado, a mediocridade, o gosto pela coisa vulgar, trivial. Vê-se também velhacaria.

2. Ambientes de “microlice” e vidinha

Vejamos mais pormenorizadamente, a título de aplicação de todos os princípios aqui expostos, um outro tipo de ambiente com um espírito muito definido e muito marcantemente impregnado de erros e vivências revolucionários, no sentido da “microlice” (horizontes mentais reduzidos ao próprio egoísmo, n.d.c.), da vidinha, etc.

Quais são as coisas típicas desses ambientes, as que interessam especialmente?

Em primeiro lugar há um estado de microlice crônica, que dá no seguinte: perpétuo brinca-brinca, e uma atitude perante os problemas da vida como se no fundo nada fosse grave, tudo mais ou menos se decidisse com jeito, e a vida fosse uma coisa muito gostosinha, em que todos cooperam uns com os outros para tocar para frente a coexistência de todos; um ambiente de muita camaradagem em geral, mesmo quando sai briga. No fundo, vidinha.

Contraste com a posição contra-revolucionária

Isto se choca fundamentalmente com a posição do ultramontano. Porque o ultramontano vê a vida como uma coisa muito grave, uma coisa trágica, ordenada não em função desses ambientes, mas em função de Deus Nosso Senhor, ao qual, a todo momento, nós estamos servindo ou traindo. De maneira que, em face da sublimidade de Deus, não se pode ter aquela vidinha micro desses ambientes. Temos que tomar as coisas muito a sério; ver em cada pequena ação da vida algo que tem caráter profundo, sublime; temos que ter facilidade em admitir o conluio do mal contra o Bem, em admitir que o Bem é perseguido, isolado e traído.

Nesse tipo de ambiente que estamos analisando, mesmo para quem é meio perseguido, o meio exclui todas essas idéias, sobretudo a idéia de uma organização que trabalhe para a Revolução, isolada da população, atuando sobre a população por meio de agentes que querem o mal e a perda dos homens. Sobretudo em certos setores "sapos" (ricos e esquerdistas, n.d.c.), isso é claríssimo, mas espalha-se um pouco por todo o ambiente.

Chama a atenção, nos ambientes do gênero que descrevemos, que alguém que não tenha esse tipo de mentalidade revolucionária, encontrando na rua outra pessoa, pode tratar com amabilidade, com gentileza, mas não com extroversão excessiva: "Oh! Fulano, venha lá!... um abraço!" Conforme o caso, trata-se com um fundo de reserva e um fundo de desconfiança.

Por outro lado, uma pessoa não infectada por esse espírito de abertura desordenada, encontrando outra, a trata com uma certa cerimônia. Não vai logo brincando, só brinca se tem muita intimidade, e assim mesmo só brinca um pouco. Parado o pouquinho de brincadeira, as relações voltam para os termos de seriedade, e se trata de coisas sérias mais ou menos conforme o nível de cultura de cada um, a educação de cada um, mas ambos tratam de coisas sérias.

Igualitarismo e brincadeiras

Em outros ambientes existe a diferença de classes sociais. Não é todo mundo que se joga nos braços de todo mundo, como se fosse um igual. Já nos ambientes que estamos analisando, todo mundo, quando se encontra com outros, é uma espécie de abertura. Quantas vezes a gente vê pela rua: "Oh! Fulano!" Às vezes se encontraram na véspera. Às vezes moram lado a lado, mas passaram um ano sem se ver. É aquela festa. Por quê? Pela idéia de que, no fundo, todo mundo é bom, de que todo mundo deve ser tratado com cordialidade, de que não se deve desconfiar de ninguém, e que se deve abrir para todo mundo.

Depois vem logo a brincadeira, feita até com pessoas de cerimônia, com pessoas de respeito. Sai a qualquer hora a brincadeira mais sem propósito. E o normal é todo mundo estar rindo: conta uma coisa engraçada, ri; conta outra coisa engraçada, ri; é tudo muito interessante etc. Ora, isto não tem propósito, porque aquele a quem a gente respeita, com este a gente não pode brincar! A brincadeira não ocupa o dia inteiro nem a vida inteira, é uma exceção dentro da vida. As pessoas sérias tratam de coisas sérias, e não têm vontade de brincar o dia inteiro, da mesma forma que é desequilibrado a gente chorar o dia inteiro. Rir e chorar são situações efêmeras da alma, passageiras, transitórias, excecionais. Habitualmente o homem sério nem ri nem chora. Mas certas pessoas, não: é o tempo inteiro brincadeira, e feita para rir etc.

Quando não é brincadeira, é o teatro. É mostrar-se para outro tomando uma atitude, fazendo uma coisa muito bonita que o outro admire. Porque o teatro é uma coisa fantástica nesse tipo de ambiente. Conferência teatral, aula teatral, conversa e discussão teatrais. Se passam desse brinca-brinca para a briga, a briga tem de ser teatral. Também isso não é normal. O normal é eu fazer o que estou fazendo, sem estar preocupado com o que se está pensando sobre mim, nem fazendo teatro para o outro.

E há também a analisar o igualitarismo. A gente vê que nesses meios só existem duas classes sociais: os trabalhadores manuais e os que não são trabalhadores manuais. Os que não são trabalhadores manuais se tratam mais ou menos de igual a igual, não existem barreiras. Mesmo com um trabalhador manual as barreiras são muito relativas. Se há um trabalhador manual que é engraçado e tem boa prosa, puxa para a mesa e conversa. Quer dizer, é o igualitarismo completo. Não é igualitarismo concebido em tese, não é uma negação do pecado original concebida em tese, mas é nesses estados de espírito. Porque se a doutrina da hierarquia social é verdadeira, esse modo de ser é errado. Se o homem foi concebido em pecado original, essa teatralidade é uma coisa errada. Como isso não colide frontalmente com nenhum mandamento, muitos entendem que podem fazer a coisa como quiserem.

Daí vem uma atitude de alma mole e sentimental, diante dos agentes da Revolução, pelo fato de eles pertencerem aos círculos das nossas relações.

 

III - Como deve reagir o contra-revolucionário

1. Oração

Em primeiro lugar é preciso rezar. Recorrer a Nossa Senhora. Por exemplo, pôr em todos os rosários e comunhões esta intenção: que Nossa Senhora me dê uma graça para dar uma sacudidela nisso, ajudando-me a compreender bem todos esses princípios e auxiliando-me a perceber os erros e os defeitos que impregnam muitos dos ambientes que nos cercam, e a reagir continuamente contra eles. Pedir a Ela que me "desintoxique", caso eu não tenha reagido convenientemente e me tenha contaminado com a mentalidade desses ambientes revolucionários.

2. Estudo

Em segundo lugar, estudar esta matéria e pensar nestes pontos com freqüência.

3. Crítica e reação contínuas

Em terceiro lugar, é preciso fazer um exercício da presença de Deus, quando se estiver em presença dos homens. Quando se está tratando concretamente com uma pessoa, ou se está andando numa rua, faz-se este exercício da presença de Nossa Senhora:

"Eu sei, pelas graças que Nossa Senhora me concedeu, que devo ver esta realidade assim, assim, assim etc; sei que os que vivem segundo a Revolução têm uma concepção de vida errada. Estou reafirmando em face deles as minhas convicções ou não? Estou, ao olhar neles, vendo o erro dentro deles? Estou tomando uma atitude interior de separação em relação a eles, porque eles pensam desse jeito? Sim ou não?"

Fazer isto concretamente, na hora. Aqui está o exercício efetivo, e isto o dia inteiro. Isto é um martírio, mas a alma que assim age subirá como um rojão!

A) Como deve ser a crítica

Contínua - O modo verdadeiro de fazer a coisa é o seguinte: quando se está em contato com os ambientes revolucionários, procurar fazer internamente a crítica desses ambientes de acordo com os critérios da R-CR. Quer dizer: aqui está um gesto de tal defeito; aqui está outro gesto de tal erro; aqui está um igualitarismo em tal ponto, etc. Ir adquirindo um senso crítico das coisas.

É preciso criticar, por exemplo, determinada música enquanto eu a ouço, e rejeitar o efeito que ela está produzindo em mim. Isso é de dia, de noite, quando se está tratando com um e com outro, quando se observa o que se vê nas ruas etc. Vendo isto por toda parte onde se está, e criticando. É preciso viver com alma de moralista-sociólogo.

Procurar os erros por trás das atitudes e dos modos de ser - O diapasão da Contra-Revolução é o oposto do diapasão dos ambientes revolucionários. Procurar um fato que se tenha passado, com espírito revolucionário bem saliente, e perguntar: o que tal coisa tem de ruim? Que erro há naquilo, para eu detestar?

Por exemplo: que erros há por trás do hábito de vestir-se sem dignidade e compostura?

A justificativa deles: 1) O gostoso é estarmos com naturalidade, sem constrangimento. Compostura e constrangimento eu rejeito. 2) Compostura é mera formalidade, e todos sabem que, ainda que eu esteja em mangas de camisa, sou muito composto, pois o hábito não faz o monge.

Que argumentos eu tenho contra isso? Nas maiores civilizações da Terra, que tiveram os homens mais compostos, sempre se achou que não bastava a excelsa personalidade deles, e que era preciso vestir-se de acordo com aquelas posições. Não somos nós que iremos pensar de modo diverso. São dois erros, estes, que chegam à conaturalidade com o descomposto, o que é uma falta de amor de Deus.

Todos os erros desses ambientes igualitários e vulgares, como os que descrevemos, tendem, em última análise, a não dar "amolação", para deixar todos inteiramente à vontade, tão largados quanto uma planta ou um bicho, sem controle.

Verificar, portanto, em tudo, quais erros característicos do espírito dos ambientes revolucionários existem. Um ambiente do tipo que descrevemos não gostaria de um filme sobre a Madame de Pange. Que distância! Léguas!

É de grande utilidade não apenas a análise dos ambientes em todas as ocasiões em que entramos em contato com eles - exercício não só útil, mas inteiramente indispensável - mas também uma crítica metódica freqüente, algumas vezes na semana, daquilo que fomos vendo no correr dos dias, e que muito caracteristicamente, ou até de modo larvado, traduz o espírito revolucionário, em quaisquer de seus matizes regionais.

Ver os erros em seu ponto de encontro, não isoladamente - É preciso ver os erros em seu ponto de encontro, porque eles constituem uma filosofia, constituem um nexo. No tipo de ambiente que aqui analisamos, o nexo é: na vida nada é grave, na vida nada é sério, há um jeito de se passar a vida subestimando tudo, divertindo-se continuamente, rindo continuamente, estando continuamente no maior dos comodismos e fazendo aquilo que a gente acha gostoso. Isto é o fundo da coisa. E tudo se põe, então, em um trato pessoal sem cavalheirismo, sem gravidade e sem nobreza; um trato todo ele igualitário, que faz desses ambientes meios onde quase não existem classes sociais.

Mas daí vem um modo de tratar os assuntos pelo qual cada pessoa que aborde a outra já aborda para brincar, para dizer uma coisa engraçada, para tratar como camarada, e nunca para tratar de uma coisa seriamente até o fundo. Nas reuniões e conversas - a gente vê pela rua - o assunto é negócio ou brinca-brinca. O convívio humano, de alma para alma, é continuamente brinca-brinca. Tendência para transformar o pijama e o chinelo na indumentária local; a maior comodidade, a maior sem-cerimônia, o maior desabuso possível a respeito de tudo, e isso tudo porque a vida foi feita para ser passada rindo, para ser passada no meio de galhofas e de brincadeiras, e porque nada é trágico, nada é horroroso.

Fazer confronto com o espírito contra-revolucionário – O resultado é o seguinte: nada é sublime. Primeira ruptura com o espírito ultramontano, para o qual tudo tem perspectivas últimas sublimes. Tudo é gravíssimo, tudo é elevadíssimo, tudo pede cerimônia, pede compostura, pede seriedade, pede elegância, pede distinção, pede nobreza. Quer dizer, há um choque fundamental entre as duas mentalidades.

De outro lado, a par desse perpétuo brinca-brinca, fica insinuado que todos os homens são camaradas uns dos outros, que todos se estimam, como se o pecado original não existisse. Fica insinuado um espírito que exclui completamente a idéia do conflito dos inimigos de Nossa Senhora com uma humanidade que eles procuram ludibriar para fazer mal, e sobretudo a idéia da oposição irredutível entre a causa do Bem e a causa do mal. Nesses ambientes, ninguém é inteiramente da causa do Bem - ao menos a impressão que se quer dar é esta - e ninguém é inteiramente da causa do mal, porque não se deve ser, porque a posição medíocre de espírito é a verdadeira. Então se recusa a achar que alguém é traidor, que alguém é conjurador, como se recusa a achar que alguém é um grande homem. Carlos Magno e seus Pares não estão no firmamento desses ambientes. Quer dizer, é uma microlice crônica.

Quanto aos defeitos morais, eu diria que, no fundo, é uma falta de sabedoria. Porque a virtude da sabedoria é exatamente aquela que nos leva a querer ver as coisas pelas suas mais altas causas, pelos seus mais altos aspectos, o fim último das coisas, o sentido mais profundo. E isto que analisamos nesses ambientes é uma falta crônica de sabedoria, é deter-se numa parte da realidade que é a realidade palpável, a realidade que cai debaixo dos sentidos; e a realidade impalpável, a parte espiritual da realidade, aquilo que é espírito, aquilo que, em última análise, é Deus, isto fica posto de lado. É um pecado contra a sabedoria. É um tipo de ambiente fundamentalmente não sapiencial.

B) Como deve ser a reação

É preciso ser diametralmente contrário - Não basta ter um espírito contra-revolucionário igual, universal, contrário aos erros fundamentais da Revolução. Deve-se compreender que a mentalidade dos ambientes revolucionários é viciada e errada, e isso de um modo peculiar, gerando aspectos próprios em cada lugar ou região que se considere. É preciso conhecer esses erros, e é preciso ser diretamente o oposto deles. Os senhores não calculam como uma fidelidade nesse ponto é capaz de os pôr para frente!

O triunfo de um grupo de contra-revolucionários consiste em dar aos seus membros uma formação diametralmente contrária ao espírito dos ambientes revolucionários que os cercam. É necessário criar o ambiente que Nossa Senhora quer, o oposto dos ambientes infectados pela Revolução, e que envolve os militantes da Contra-Revolução. Esse é o modo verdadeiro de fazer apostolado.

Posição contra-revolucionária vivencial - Os contra-revolucionários devem ter o espírito verdadeiro na hora das vivências, e não apenas teoricamente. Sem um exercício contínuo, eles correm o risco de se deixarem contaminar pelo espírito revolucionário que os rodeia. Os que percebem que absorveram esse espírito, e os que não desejam absorvê-lo, devem tratar de repelir as influências da Revolução - como elas se apresentam concretamente nos meios revolucionários que os cercam - e devem não apenas pensar, mas viver e agir segundo os princípios da Contra-Revolução. É necessário que tais princípios estejam impregnados na própria alma.

O principal é esta impregnação, mas se a gente não se lembrar continuamente disso, volta-se a viver e a agir segundo os padrões dos ambientes que devemos detestar.

Percebendo que a própria alma não tem essa impregnação dos princípios contra-revolucionários, há necessidade de um trabalho de enxerto: enxertar-se na Contra-Revolução até receber toda a seiva. É, de fato, um trabalho artificial. Ele exige, antes de tudo, um esforço de atenção, para não se sair do diapasão contra-revolucionário. É, entretanto, cabível para alguns, para não ser um trabalho inumano, fazer o exame por etapas. Colocar-se cada hora no diapasão. Isto acaba mantendo uma continuidade. Fazer em cada etapa uma jaculatória: "Sapiencial Coração de Maria, ajudai-me".

Habituar-se, assim, a ver as coisas e agir segundo o diapasão verdadeiramente contra-revolucionário. É como se alguém usasse óculos para ter uma visão mais perfeita e real das coisas. Se o defeito é não ver as coisas de acordo com a Contra-Revolução, procurar então, com freqüência, lembrar-se disso e como que ver através dos óculos da Contra-Revolução.

Examinar-se assim: se Nossa Senhora estivesse aqui, o que Ela acharia disso? Que atitude Ela tomaria face à minha atitude diante disso? Ela aprovaria? Estou neste diapasão? O que está faltando? Fazer isso, por exemplo, de hora em hora.

C) Sem crítica, tende-se a afundar na Revolução

Enquanto os que desejam lutar pela Contra-Revolução não fizerem uma crítica dos ambientes e dos fatos, para estarem numa espécie de atrito interno habitual com os ambientes revolucionários, não podem sair do lugar. Isso é não se dar inteiramente, o dia inteiro, a Nossa Senhora, é se dar às meias. Porque acaba sendo que, tendo nós em relação aos inimigos dEla - inimigos dEla são todos os que seguem a Revolução - um estado de espírito de falta de oposição, algo do espírito deles se comunica a nós.

O resultado: a alma do contra-revolucionário, que deveria ser um sacrário do espírito ultramontano nos ambientes onde vive, e que deveria ser um tabernáculo para espalhar as graças da Contra-Revolução, não o é.

D) Repercussão nas relações com Nossa Senhora

Isso tem depois uma repercussão na relação da alma com Nossa Senhora. Quem tem essa vivência, essa falta de vigilância e de oposição ao mal, pode teoricamente ter Nossa Senhora em conta de Chefe, de Guia, de Farol, mas se estiver espiritualmente com Ela, não pode ter essa posição de alma. Porque não é possível ao mesmo tempo estar inteiramente de um lado e inteiramente do outro. A pessoa pode ter uma adesão teórica sem limite a Nossa Senhora, pode ter uma intenção de manter essa adesão teórica até de olhos fechados, aceitando o que Ela inspira e manifesta às almas, porque é Ela quem o faz, mas a comunicação de alma faz-se de modo incompleto, e o faz porque a alma não está inteiramente voltada para a oposição contínua, teórica e vivencial, ao mal como ele se apresenta concretamente em seu redor.

O resultado é que há uma infidelidade a Nossa Senhora, por omissão. O espírito dela não se comunica à alma adequadamente, por causa disso. Como o espírito (mentalidade, feitio etc.) se comunica por uma espécie de "osmose", de pessoa a pessoa - a graça é assim, basta ver em “A Alma de Todo Apostolado” de Dom Chautard - essa osmose se dá de modo precário, muito insuficiente, por causa dessa vivência errada. A dedicação a Nossa Senhora começa a amortecer, com a falta de reação ao espírito dos ambientes revolucionários, pois se a pessoa toma um rumo diferente do dEla, como evitá-lo?

O curioso é que quando uma alma fica assim, não vigilante e mole diante das influências dos ambientes impregnados de Revolução, o demônio não atormenta muito. A pessoa é nociva a ele, e ele preferiria mil vezes que ela não existisse. Se ele pudesse matar, matava, é bem verdade. Mas para ele ainda é menos mal assim do que haver fogo e entusiasmo. Por isso ele nem cria grandes catástrofes nem grandes tormentas, e deixa correr. Eu olho para os que não enfrentam adequadamente a Revolução, e vejo uma vida espiritual mais ou menos calma, e a coisa tocando...

E) Contatos com os ambientes intensamente contra-revolucionários

Devem ser feitas viagens aonde há ambientes intensamente contra-revolucionários com o intuito de se firmar no espírito da R-CR. Mas, naturalmente, quando já se vai com uma orientação de espírito que, a priori, antes de a viagem ser começada, produz uma obstrução nos benefícios que ela pode produzir, o contato com a Contra-Revolução não produz todo o bem que deveria produzir.

Cada um não encontra, no ambiente do outro, os defeitos próprios dos quais tem que se desintoxicar. É como uma pessoa que vive à beira-mar, e faz estação climatérica na montanha; e quem mora na montanha faz estação climatérica à beira-mar. É normal.

 

IV - Reação aos defeitos dos ambientes e o apostolado

1. O modo de atrair as graças de Nossa Senhora e de atrair as almas

Ambiente da sede definidamente contra-revolucionário - Talvez não tenha sido antes explicitado que o modo de atrair as almas para Nossa Senhora é ser fiel nesse ponto. Ou talvez não tenha sido usada esta fórmula. Mas Nossa Senhora está dando esta graça agora. O modo de atrair as almas - em primeiro lugar, atrair as graças de Nossa Senhora - é este: uma posição militante, na sede, contra os erros que infectam os ambientes revolucionários. As pessoas percebem a razão de ser delas na sede, quando encontram a diferença entre a TFP e o que há de revolucionário no mundo que as cerca. Quando não encontram essa diferença, instintivamente todo o Grupo não tem sua razão de ser.

Onde o ambiente é de indefinição, por exemplo, a formação a ser dada deve ser frontalmente de definição. Se não for isso, o Grupo fica vazio. Resultado: não atrai. Está bem - alguém poderia dizer -, mas não repele. Repele, porque uma sede que não tem rádio, não tem televisão, não tem isso ou aquilo, mas também não tem uma outra coisa para atrair, fica vazia. Além do mais, nós só devemos querer de fato atrair aqueles que são frontalmente contrários ao espírito dos ambientes revolucionários que os envolvem.

Vivências revolucionárias que afastam as graças - Isso supõe um trabalho prévio, por parte dos militantes da Contra-Revolução: ter o espírito contra-revolucionário na hora das vivências, e não apenas no plano teórico.

2. O fracasso no apostolado

Um grupo de pessoas que desejam combater a Revolução, e que, entretanto, não faz seriamente a crítica e a reação ao espírito revolucionário dos ambientes que o cercam, vive em um estado de conivência comum, corrente, com esses ambientes moldados pela Revolução. Resultado: estanca. A conseqüência é que as pessoas vão à sede e não encontram o contrário dos ambientes revolucionários que conhecem. Encontram uma espécie de coisa adaptada, melhorada. Mas não cria aquele caso de consciência (o “choque” contra-revolucionário, como está escrito na RCR, n.d.c.), que resultaria de uma posição definidamente contrária à Revolução tal como ela existe no lugar. Quer dizer, na ordem prática das coisas há uma porção de vivências que não são as vivências contra-revolucionárias.

Quando isso acontece, o resultado é o que vemos algumas vezes em vários exemplos históricos: as graças caem poucas; ou melhor, são muitas e entram poucas, porque são rejeitadas. E dentro do ambiente do movimento não há aquele sal forte do verdadeiro ultramontano. É uma coisa meio aguada.

Imagine-se alguém chegando aqui e tendo um choque. Vem falar comigo, e me encontra com uma pilha de títulos, e eu o tratando assim: "O senhor me desculpe, pois eu não vou conversar com muita atenção, porque há aqui uma transação financeira muito importante, que preciso fazer, e que me está tomando muito a cabeça. Mas, enfim, vamos conversar". Só de eu dizer isto, seria como se eu tivesse dado na pessoa uma pancada! E a comunicação dessa pessoa comigo cairia. O que houve aí? Eu teria aderido à mentalidade errada, dos ambientes sinárquicos.

Alguém pode me perguntar, a respeito da mentalidade dos vários tipos de ambientes revolucionários, se são um pecado. Eu digo: para as noções correntes de pecado, não são; mas quando a gente vai ver o que é o amor de Deus, são. Eu me meter assim com os títulos seria pecado, não porque a transação é desonesta, mas porque entra uma impostação do espírito que me afasta do amor de Deus.

3. Os novos querem ver o holocausto dos mais velhos

Uma certa admiração, que aqueles que se aproximam dos militantes da Contra-Revolução devem ter em relação a estes, e que uns e outros devem ter em relação aos mais velhos e aos dirigentes dos Grupos da TFP, tem algo de pessoal, como não pode deixar de ser, mas não nasce se não encontra uma oposição definida e frontal ao espírito revolucionário.

Os que entram querem ver em nós almas sofredoras, que de fato estão sofrendo. Eles querem, simbolicamente falando, ver nosso sangue. Se não sentirem nosso sangue, nosso suor, nossas lágrimas - como dizia Churchill - derramados em favor da causa católica, nós não atrairemos gente em torno de nós. Há uma expressão da Escritura que diz: "Sine sanguine non fit remitio" - Sem sangue não se faz a remissão dos pecados, não se atraem as almas. Se, por exemplo, alguém achasse que, segundo a expressão corrente, eu sou um "boa vida", eu não teria a amizade dessa pessoa, a sua confiança, que poderiam alegrar-me tanto. Por quê? Porque ela desejaria ver em mim a pessoa que se sacrifica de fato pela Contra-Revolução, que está inteira na Contra-Revolução. Isto os contra-revolucionários, consciente ou subconscientemente, querem ver em mim. E se não vissem, eu não teria a confiança deles.

Se em algum lugar houver esse estado de espírito que acabei de descrever, de não oposição frontal aos ambientes deformados pela Revolução, não aparece o sangue. E o resultado é o vazio. Porque, no fundo, aí não se encontra essa ruptura com o espírito revolucionário, não se encontra esse fogo, não se encontra esse sacrifício.

4. Como agir, concretamente, em cada lugar

Em cada lugar, os sócios e militantes devem estudar um modo que seja, o mais definidamente possível, contrário ao estado de espírito, aos estilos de vida, aos erros explícitos ou implícitos que impregnam os ambientes revolucionários que os envolvem fora da sede.

Uma coisa, sobretudo, que seria muito importante, é uma formação que procurasse acentuar muito os valores culturais e artísticos que a Civilização Cristã fez desabrochar através dos séculos, e a criação de um ambiente digno, elevado, e que fale de combatividade, sublimidade, etc. tudo isso em oposição à conaturalidade com a vulgaridade, com o descomposto, com o igualitarismo, com o brinca-brinca, com a idéia de que todos os homens são bons, etc. Pôr nas paredes aqueles quadros e gravuras adequados, indicando uma coisa completamente diferente e elevada. Começar a chamar a atenção das pessoas que freqüentam a sede para todas as riquezas da Civilização Cristã. Enfim, em cada lugar, as peculiaridades ou o tônus do espírito contra-revolucionário dos sócios e cooperadores, do ambiente das sedes, das técnicas de apostolado, etc., devem ser estudados e aplicados, concretamente, com o intuito de oferecer uma frontal oposição à mentalidade que caracteriza os respectivos ambientes, deformados pela Revolução.

É da maior importância que aqueles que se dedicam ao recrutamento de novos contra-revolucionários apliquem os princípios aqui estudados nos lugares em que exercem suas atividades. Isso lhes será útil, não apenas para se imunizarem contra as várias manifestações locais do espírito revolucionário - cujo colorido varia de região para região, e que precisa ser detectado em seus diversos matizes - como também lhes possibilitará fazer a modelagem do ambiente interno das sedes, dos estilos de vida interna, das modalidades de atuação junto aos novos, etc., de modo a que tudo reflita um estado de espírito definidamente contrário à mentalidade revolucionária que conseguiram perceber em torno de si. Sem essa crítica e essa oposição frontal ao espírito dos ambientes deformados pela Revolução, os que fazem apostolado terão sua vida interior e o seu trabalho apostólico expostos à esterilidade.

São as graças de Nossa Senhora, antes de tudo, que deverão ser almejadas pelos que trabalham pelo aumento das fileiras da Contra-Revolução. Tais graças não caem - ou caem poucas, ou então caem muitas e poucas ficam - se as almas não se transformam em “tabernáculos” da Contra-Revolução.

Para isto é preciso, em primeiro lugar, recorrer a Nossa Senhora, e depois aplicar os princípios aqui desenvolvidos: crítica e reação contínuas diante da Revolução tal como ela, in concreto, se manifesta em torno de nós; e atitude frontalmente oposta à mentalidade dos ambientes revolucionários.

É assim que se cria em cada sede, em cada lugar, o ambiente que Nossa Senhora quer. Os senhores devem fazer o seguinte raciocínio: a sede deve ser tal como seria se Nossa Senhora estivesse presente. Não sendo assim, não está bom!

ORAÇÃO

Ó Coração Sapiencial e Imaculado de Maria, imploramo-Vos que torneis profunda a nossa formação e eficaz a nossa ação, para a Vossa maior glória neste lugar. Assim, nós Vos suplicamos que nos concedais a plenitude de Vosso espírito e uma fidelidade inteira aos princípios da Contra-Revolução, e que nos abrais os olhos para conhecermos, rejeitarmos e combatermos aquelas disposições de alma, aqueles modos de ser, de pensar e de viver que caracterizam, no ambiente em que nos encontramos, a oposição à implantação do Vosso Reino.

Cor Sapientiale et Immaculatum Mariæ,

Opus tuum fac!


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