Plinio Corrêa de Oliveira

III SEMANA DE ESTUDOS DE "CATOLICISMO" (1)

 

Conferência de abertura

1955
 

( Sem revisão do autor )

 

 

O problema contemporâneo e sua solução

 

[...] quando as suas manifestações são esporádicas e originais, pode se entender que a descrição de uma determinada situação é difícil. E que, por outro lado, quando as vantagens de uma situação são numerosas, quando elas são opulentas, quando elas são grandes, é difícil descrever tudo o que elas tem de verdadeiro.

Con[siderando] a atual quadra contemporânea nós podemos bem dizer que a descrição é fácil. Porque de um lado os problemas afloram com uma exuberância tal,  de outro lado eles se congregam... que considerações tão nítidas e tão visíveis, que verdadeiramente não é preciso nem muita atenção nem muita precisão de termos para evocar o quadro dessa situação atual, diante da qual se abre a nossa terceira semana de estudos.

Duas palavras parecem compendiar todas as preocupações de nossa época, e se bem que a época atual, como todas as épocas históricas, também tenha algo de bom - pois uma época que tivesse tudo de ruim seria necessariamente a época do Anticristo e o Anticristo não está entre nós -, pois bem, se é verdade que em nossa época há algo de bom, esse algo não é pequeno, nós podemos dizer entretanto que os problemas que nele [existem] de tal maneira são importantes e são eminentes, que eles compendiam toda a época. E que quando se estuda o século XX, é sobretudo o estudo desse problema que vai marcar a atenção dos estudiosos.

De um certo modo, pode se dizer que a história dessa segunda metade do século XX já foi feita e nós já podemos saber que ela consistiu na preparação da problemática terrível diante da qual nós nos encontramos, problemática que se pode resumir em duas palavras que estão constantemente diante de nossos olhos lembradas pela imprensa e em toda a nossa realidade cotidiana, lembrada pela vida de todos os dias, e essas duas palavras nós podemos definir: guerra e crise.

O quadro da guerra

De um lado, uma iminência de guerra. Iminência de guerra da qual a ninguém é lícito duvidar. Nós temos não só a evidência dos fatos internacionais, como ainda recentemente neste discurso de Natal tão tocante do Santo Padre Pio XII - prostrado num leito que se poderia chamar seu leito de morte - dando ao proferir este discurso os últimos alentos de sua existência quiçá e chamando a atenção do mundo em linguagem agoniada para essa paz, que ele chama muito bem, de acordo com a terminologia consagrada, de guerra fria, para essa guerra fria que ele mostra ser, debaixo de algum aspecto, mais atroz do que a própria guerra quente e - coisa mais terrível - o prefácio, o prefixo talvez da guerra atômica que é a grande catástrofe que todos nós receamos.

Participantes da III Semana de Estudos de "Catolicismo"

1955

E ainda há pouco falando a um grupo de colaboradores, de agentes de "Catolicismo", o almirante (Carlos) Penna Boto, com a sua responsabilidade de Comandante das Forças brasileiras de alto mar, com a sua responsabilidade de Presidente da Cruzada Brasileira Anticomunista, nos dizia que as autoridades navais norte-americanas consideravam a etapa atual como mera preparação da III Guerra Mundial. E estão persuadidos de que esta III guerra é absolutamente inevitável.

Absolutamente inevitável, é claro, nas palavras humanas. A oração pode remover esta guerra. As súplicas de um Papa podem mover montanhas.

Mas diante do quadro humano e das possibilidades humanas não há como duvidar de que a III Guerra Mundial é um risco de certo modo iminente, com o qual todos têm que contar.

Quanto à gravidade desse risco, por que falar? A expressão "desagregação do átomo" diz tudo quanto nós pensamos simplesmente na bomba de hidrogênio e nas suas conseqüências, nós não podemos deixar de fazer nossas as palavras espirituais, mas terríveis, de Einstein, que interrogado por certo jornal norte-americano a respeito de como seria a III Guerra Mundial, declarava o seguinte:

"Não posso saber como ela será. Só sei como será a guerra mundial". A sua resposta causou certa surpresa.

"Mas a quarta, portanto - continuou ele - se houver depois da III Guerra Mundial humanidade, a IV Guerra Mundial vai ser travada com arco e flecha. A civilização terá desaparecido".

Ora, nós bem sabemos que o que caracteriza o risco é dele ser grave e dele ser próximo. Risco mais grave do que este no plano da realidade humana não se pode imaginar. Nunca a humanidade inteira esteve ameaçada de um período global tão terrível como a desagregação do átomo.

Nós sabemos isto: a queda de Tróia, a queda de Bizâncio, a queda do Império Romano de Ocidente, outros impérios florescentes ao longo da história, e, próximo de nós, a ascensão do nazismo, foram catástrofes que enlutaram nações, que fizeram desaparecer impérios. Mas não foram catástrofes estritamente universais.

Nós não. Pelo progresso da técnica nós ficamos colocados diante de uma catástrofe estritamente universal. Universal pela generalização de seus efeitos, universal pela profundidade de seus efeitos, atingindo eventualmente todos os campos da atividade humana.

Ora, por outro lado, se nós consideramos que esse é o quadro da guerra, qual é o quadro da paz?

O quadro da crise

O quadro da paz - não há como negar - é dominado ele também por uma palavra, e essa palavra eu já mencionei. É a palavra crise. Crise que nós encontramos em tudo.

É só folhear os jornais: há crise da educação, há crise do cambio, há a crise da importação, há a crise da produção, há a crise da exportação, há a crise da falta de medicamentos, há a crise da falta de alimentos, há a crise da família, da crise do Estado nem se fala e por cima de todas essas crises, envolvendo-as, escondendo-as, multiplicando-as há a grande crise da moralidade humana, pois que não é difícil perceber que a crise da moralidade humana é a razão mais profunda de todas essas crises, que como um conjunto de serpentes enlaçam o corpo febril e atormentado da humanidade moderna.

Qual é a solução?

Ora, nós colocados diante dessa perspectiva de uma guerra mundial, de uma catástrofe universal, nós somos levados a nos perguntar: qual a solução para essa crise, qual o modo de adiar essa crise? Se existe talvez uma fórmula, se existe uma palavra, se existe um pensamento, se existe uma escola, uma doutrina, um remédio capaz de afastar de nós todas essas nuvens que estão sobre as nossas cabeças?

Esta pergunta me parece ridícula. E até, de um certo modo, de uma certa desconfiança, um X que todo homem sensato desconfia das panacéias, desconfia dos remédios que com uma palavra, uma fórmula resolvem tudo. E entretanto, um X que a guerra existe como em perspectiva e um X que a crise está debaixo de nossos olhos, está dentro de nossa realidade. Nós não podemos deixar de procurar o remédio, nós não podemos deixar de pensar nele.

Se a guerra e a crise têm uma causa única, uma causa moral, quem sabe se haverá para um mal tão grande,...(que tem) uma só causa, também um remédio que seja um só, que atinja a causa no seu único mal e que resolva portanto a crise em todas as suas manifestações. É esta a preocupação de todos os homens contemporâneos.

Condições para que uma solução seja autêntica

Para que nós consideremos que um remédio de fato cura, nós devemos exigir duas condições. A primeira é que, feito o uso do remédio, o mal desapareça. E em segundo lugar, a afirmação, se bem que condição não muito indispensável, cessado o uso do remédio, o mal volte. Se sempre que um doente toma um remédio, ele volta à normalidade e sempre que ele relaxa o tratamento ele volta ao estado de doente, ele tem todas as razões para concluir empiricamente que aquele remédio de fato é bom.

E não há um só homem de bom senso que estando doente e verificando que um determinado remédio produz nele esse duplo efeito de cessação do mal e de volta do mal se o remédio é abandonado, não se aferra a esse remédio como à sua verdadeira salvação.

Mas ao lado dessa experiência, ao lado dessa verificação empírica, pode haver também uma verificação de caráter doutrinário. Estudar cientificamente o mal, verificar bem exatamente qual ele é de um lado. Verificadas depois as propriedades do remédio, se compreende que de fato aquele mal é de natureza a ser dissipado por aquele remédio. E então a prova é verdadeiramente completa. Tecnicamente, cientificamente aquele remédio debela aquele mal.

De outro lado, feita a aplicação, [se] o mal cessa diante da aplicação do remédio, está provada a eficácia do remédio.

O remédio para a situação contemporânea

Com o espírito de reserva, de precaução, de rigor, que deve ser a condição para a aceitação de qualquer remédio para a crise contemporânea, nós podemos bem dizer que a crise atual tem um remédio. Que esse remédio é um só remédio. Que esse remédio faz cessar o mal sempre que aplicado e sempre que esse remédio é afastado o mal volta. E que esse remédio é teoricamente de molde a debelar o mal.

E isto me faz lembrar um trecho famoso de Santo Agostinho. Santo Agostinho era acusado, e os cristãos de seu tempo também, do fato de que a queda do Império Romano de Ocidente - que acabava de esboroar precisamente nos dias de sua vida -, a queda do Império Romano de Ocidente era provocada pelo fato de que os romanos tinham passado em grande massa para o cristianismo, e então os deuses iracundos se vingavam derrubando o antigo Império Romano, que durante tanto tempo eles tinham protegido.

Santo Agostinho responde com indignação a essa falsa [questão]. E ele disse que, pelo contrário, a religião católica é a verdadeira condição para a prosperidade de todos os povos. E então, numa exclamação famosa, ele diz: "dai-nos reis e súditos, dai-nos generais e soldados, dai-nos contribuintes e cobradores de impostos, dai-nos pais e filhos, esposos e esposas, que vivam de acordo com a doutrina do Evangelho, dai-nos pessoas que todas elas em todas as manifestações de sua vida procedam como o Evangelho manda, e eu vos perguntarei se não é verdade que uma nação assim constituída será a nação mais ordenada, a nação mais gloriosa e a nação mais poderosa da terra".

Essa frase de Santo Agostinho, pronunciada diante do Império Romano em combustão e em ruína, tem toda a sua atualidade em nossos dias. E é ao mundo contemporâneo que o católico pode dizer altivo, consciente do valor da doutrina que ele representa: "dai-nos chefes de Estado como os quer o Evangelho e dai-nos súditos como os quer o Evangelho, dai-nos esposos e esposas, pais e filhos, [mestres] e alunos, patrões e empregados,  homens dotados da força do braço militar, homens dotados da responsabilidade da pena e do pensamento como o Evangelho nos manda, e nós vemos imediatamente as crises do mundo passarem completamente".

Imaginar simplesmente que no nosso Brasil, a lei de Deus fosse seguida por todos nós, teríeis dentro de pouco tempo o Brasil uma das mais prósperas nações da terra. E, pelo contrário, quando nós nos perguntamos por que razão o mundo todo sofre, nós [vemos muito bem] é porque o mundo afastou-se da lei de Deus. É porque o mundo abandonou a lei dos mandamentos e a Igreja Católica, e a morte de que ele morre não é senão o fruto de sua apostasia.

Apostasia que começou com Lutero, até que seu [processo desfechou] na Revolução Francesa e em nossos dias chega a essa intensidade e a essa intensidade que a ninguém é difícil verificar.

Nestas condições nós temos, muito rapidamente embora, verificado que a solução de todos os problemas contemporâneos está na religião católica.

Se a religião católica é a solução, como explicar o esplendor das nações não católicas?

Mas não basta dizer que a solução está na religião católica. É preciso dar um passo para frente e reconhecer que fora da religião católica não existe outra solução. Existem talvez situações intermediárias que durem mais tempo, menos tempo. Existem por exemplo nações como a Inglaterra, que é uma nação em sua maioria herética e, entretanto, ainda conhece dias de esplendor e de glória. Existem nações como, por exemplo, o Japão pagão na grande maioria de seus habitantes, mas que renasce de uma crise terrível e promete tornar-se mais uma grande potência mundial.

Mas esses são casos excepcionais que devem ser vistos no conjunto da evolução histórica. E no conjunto da evolução histórica nós vemos que o mundo, tendo abandonado a Deus, tendo abandonado a Igreja, para ele não há verdadeira solução a não ser com a volta à Igreja.

Seria longo e seria fastidioso analisar nas próprias nações que chegam agora ao ápice  de sua grandeza: os Estados Unidos por exemplo; de algum modo a Inglaterra, que se não está no ápice de sua grandeza está numa situação que ainda pode ser considerada de grandeza; o Japão que talvez venha a readquirir uma tal ou qual grandeza. Mas não seria difícil analisar essas nações e perceber que ao mesmo tempo em que elas crescem, cresce dentro delas os germes de sua decadência. E que a história do século XXI será a história da ruína dessas nações, porque essas nações elas também constroem sem Deus, constroem longe de Deus, e essas obras que são construídas longe dAquele que é a Fonte e o Autor da vida, não podem ter a vida em si. Elas podem ter aparência de vida, elas podem ter a aparência do poder, mas elas passam. Como a Sagrada Escritura nos diz, elas passam como nuvens. Nuvens baixas que toldam o horizonte durante algum tempo, mas que qualquer vento não tarda a dissipar.

É possível fazer que o homem contemporâneo volte à religião católica?

Nestas condições a pergunta que nos resta a considerar é se é viável a solução que nós preconizamos.

Quando nós consideramos de um lado o enorme extravio dos pensamentos e das almas, quando nós consideramos a decadência quase monstruosa dos costumes, quando nós consideramos com que impacto todas as almas se jogam para os bens da terra, nós podemos perguntar a nós mesmos se o esforço destinado a fazer voltar para o céu os olhos dos homens tem algumas condições de possibilidade.

A solução só pode ser aplicada pelas nações católicas. Mas como estão elas?

E essa pergunta, já de si bastante difícil de responder, ou por outra, que conduz facilmente  a uma negativa se analisada superficialmente, essa pergunta ainda se torna mais cruciante se nós consideramos a realidade do mundo contemporâneo.

Se nós fôssemos fazer um mapa do mundo contemporâneo nós poderíamos pintá-los com 3 cores ou 3 zonas diferentes. Nós temos de um lado o mundo cristão, abrangendo nações católicas, protestantes, cismáticas. Nós temos de outro lado o mundo soviético que está debaixo do jugo da ditadura do ateísmo. E nós temos por fim o mundo pagão que é formado por nações que ainda não deixaram as superstições de sua gentilidade antiga e vivem, portanto, segundo a expressão tão característica da Escritura, "deitadas ainda à sombra da noite".

É evidente que dessas três zonas do mundo, se há uma zona à qual cabe a missão de anunciar a fórmula salvadora e de aplicar é evidentemente aquela que constitui a zona cristã. De modo que não se pode conceber que alguém dê aquilo que não tem. Não podemos esperar que as nações que não são católicas dêem ao mundo a fórmula católica. Evidentemente a fórmula católica só pode ser dada ao mundo pelas nações católicas.

Mas quando nós consideramos a condição das nações católicas, nós vemos que elas são poderosas e elas têm possibilidades de ação poderosas, tem uma situação cultural invejável no mundo, seus filhos são inteligentes, são doutos, que a sua história é ilustre, que enfim suas possibilidades são grandes. Mas que de outro lado duas coisas se notam quanto às nações católicas: de um lado, infelizmente, essas nações católicas não podem ser consideradas global e coletivamente como nações católicas. Elas são nações constituídas por católicos, mas elas não são propriamente nações católicas, e eu direi daqui a pouco qual a razão disso.

Mas, de outro lado, nós vemos que essas nações, elas mesmas, encontram-se num tal e qual declínio. E se nós consideramos as grandes nações do mundo de hoje veremos que nenhuma delas pode ser considerada uma nação preponderantemente constituída por católicos. Assim, portanto, o problema se torna agudo. Porque não só as nações católicas não têm a liderança do mundo para fazer prevalecer a fórmula de salvação única, da qual o mundo tem que esperar tudo e sem a qual ele não pode esperar nada.

Mas há alguma coisa de mais grave que é a seguinte: as próprias nações católicas não têm, elas mesmas, inteiramente, nem a consciência, nem a convicção do valor que representa essa fórmula na qual, entretanto, elas crêem. Elas não praticam nelas mesmas, dentro de si mesmas, esse principio que deveriam praticar, elas não estão em condições de praticar a tarefa histórica que elas deviam realizar.

E nós então somos levados a nos deslocar de ponto para ponto para a seguinte posição: é verdade que a solução só pode ser dada pelas nações católicas, mas para que essa solução seja dada é preciso antes de tudo que as nações católicas mudem de espírito, recuperem a sua antiga plenitude de nações católicas, porque sem elas recuperarem essa plenitude, nada poderão fazer da incomparável missão histórica que tem diante de si.

Alternativa na qual se encontram os povos católicos

E então nós, considerados como povos católicos, e o nosso tão grande e querido Brasil está bem dentro dessa enumeração, nós, considerados como povos católicos, nos encontramos numa alternativa: ou nós readquirimos aquela plenitude do espírito católico que é a nossa vocação histórica [e] nós conseguimos salvar o mundo, ou se nós não fizermos isso para o mundo, não haverá salvação.

Mas, neste caso, nós nos devemos lembrar de uma coisa: que no dia do Juízo Final os outros povos da terra se levantarão contra nós e eles nos perguntarão o que nós fizemos da luz que Nosso Senhor Jesus Cristo pôs em nossa mão. Nós tínhamos a luz, nós tínhamos a vocação histórica, nós tínhamos a fé, nós tínhamos os meios para realizar a missão. Mas no momento em que a civilização se encontrava às voltas com o maior drama de toda a história, tudo tendo dependido de nós, nós não tivemos nem  o gesto, nem a palavra, nem a renuncia de que deveria depender a realização de nossa extraordinária vocação.

Vós podereis um pouco imaginar o que se poderia pensar de um homem que tendo, por exemplo, a fórmula para a cura do câncer, conservasse preguiçosamente na sua gaveta os estudos últimos necessários para efetivamente esse remédio ser posto à venda? Que ele já  está cansado, que ele já estudou muito, que a essência da fórmula ele já encontrou, que ele pode bem levar mais de 10 anos estudando agora o restante da fórmula, que daqui a 10 anos ele dará ao mundo essa solução. Se não for ele, outros cientistas descobrirão depois. Ninguém é necessário no mundo. A ciência encontrará essa verdade mais cedo ou mais tarde. Ele o que quer é descansar um pouco. Que se diria de um tal homem?

Vós diríeis que é responsável por todos os doentes que se contorcem com dores de câncer nos hospitais, ele é responsável por todas as mortes que a doença nesses anos de preguiça causará, ele é responsável por todas as lágrimas, que essas lágrimas, que essas mortes por sua [indolência] causarão. Sua preguiça indigna e inglória será a sua vergonha e o mérito do descobrimento será de pouca valia diante do labéu desse relaxamento, desse atraso em fazer beneficiar a humanidade com sua invenção.

Ora, muito mais do que a cura do câncer é a cura da crise contemporânea, grande câncer universal. Os meios para isto nós os temos. Os meios estão em nossa fé. A nossa responsabilidade consiste exatamente em atuar esses meios, em nos tornarmos capazes de  realizar essa missão e é isso que a Divina Providência espera de nós no século XX.

De que maneira nós nos poderemos tornar capazes da realização dessa missão? Eu sou obrigado aqui a deslocar minhas considerações do terreno dos interesses gerais para o terreno dos aspectos particulares, para o terreno da vida espiritual de cada indivíduo e tomar algumas regras muito conhecidas da vida espiritual para aplicá-las depois à vida dos povos e das nações.

As duas amizades: a misericordiosa e a justiceira

Há um principio que nos diz o seguinte: quando um amigo tem um amigo e ama esse seu amigo, ele não se incomoda com suas ingratidões, ele não se incomoda com injurias, ele perdoa as vilanias e ele é capaz de ir ao encalço desse seu amigo para afetuosamente lhe dizer: "tu não agiste bem comigo, mas volta a mim que eu te receberei de braços abertos, eu restaurarei pelo meu perdão  a nossa antiga amizade".

É próprio do amor e é próprio da amizade saber querer bem, saber perdoar, saber levar o perdão já antes mesmo de haver verificado o arrependimento, provocando amorosamente o arrependimento ao amigo que lhe tiver feito mal.

Mas há um outro principio também, que é muito inerente à amizade e que parece estar em antítese com esse, e que é o principio da dignidade na amizade. De fato, uma pessoa ciosa de si, uma pessoa que tem aquilo que nós chamamos brio e pundonor, de fato dá sua amizade a quem merece e retira sua amizade quando ela não é merecida. E por causa disso, quando verifica que um amigo não é capaz de compreender a amizade de que é objeto, ou que ele não tem as qualidades morais necessárias para concentrar em si os sentimentos de estima que ele tinha imerecidamente despertado, o amigo deve retrair esses sentimentos, deve cortar essa amizade, porque nisso está o pundonor.

Há uma certa falta de brio, há uma certa falta de compostura interior em esbanjar, em derramar gratuitamente seus sentimentos para aqueles que não merecem. O homem que tem o senso do valor das coisas é não avarento, mas cuidadoso de sua amizade e faz questão de não estimar a não ser àquele que merece.

Esses dois princípios [que parecem contraditórios] mas que se harmonizam perfeitamente nós os encontramos de modo admirável praticados na Segunda Pessoa adorável de Nosso Senhor Jesus Cristo.

Em Nosso Senhor Jesus Cristo nós vemos ao mesmo tempo duas coisas: ninguém encontra termos mais emocionantes para manifestar o estado de espírito do amigo de coração ferido, mas que sabe perdoar, que sabe ir ao encalço do amigo ingrato, que sabe tentar convertê-lo, que sabe esperá-lo por um tempo indefinido, do que Nosso Senhor Jesus Cristo.

Vemos nessas duas parábolas, que nenhum católico pode mencionar sem sentir uma comoção interna, a parábola do Bom Pastor que tem a sua ovelha e a defende e que vai ao encalço da ovelha que foge e que tira dentre os espinhos para a proteger e a reanimar. E, de outro lado, aquela palavra tão admirável do pai do filho pródigo, o filho sai de casa e que o pai fica do alto de uma torre esperando o filho que volte, e ama o filho, e que quando o filho volta lhe dá além do seu perdão mais um esplêndido vestido de reconciliação.

Mas, de outro lado, nós vemos em Nosso Senhor uma noção do valor da amizade e uma escolha, um discernimento de suas amizades, uma coisa verdadeiramente extraordinária. Vemos, por exemplo, que Ele deu sua predileção a São João Evangelista. Essa predileção Ele não deu a ninguém como a São João Evangelista. E a razão disso era porque São João Evangelista era o apóstolo virgem, era um homem puro, que merecia por excelência o amor dAquele que era a própria personificação da pureza.

E passando de um extremo a outro, passando de São João Evangelista, que na hierarquia do amor ocupa entre os apóstolos o primeiro lugar, para aquele infeliz que é o ultimo dos apóstolos, o filho da perdição, o filho da traição, nós encontramos a mesma coisa no procedimento de Nosso Senhor, que até o último momento o atrai, que até o último momento procura chamá-lo a Si, mas que ao mesmo tempo e nas próprias palavras que o chama a Si lhe exprobra com uma espécie de horror a sua conduta. Nós vemos ao mesmo tempo o dever de o atrair à vida, mas o horror à sua conduta, a repulsa de Judas e a censura e...  naquelas palavras supremas que Nosso Senhor disse, das mais pungentes que [tivera]: "Judas, com um ósculo tu trais o Filho do Homem?". É que Nosso Senhor ao mesmo tempo que perdoa, que é misericordioso, que vai ao encalço do pecador, Nosso Senhor de fato não dá ao pecador a normalidade de sua amizade, a não ser quando o pecador se emenda. Ele chama o pecador para que o pecador se torne seu amigo, para que Ele se reconcilie com o pecador. Mas enquanto o pecador não está arrependido, enquanto o pecador de fato não volta à casa do Pai, Nosso Senhor não estabelece em relação ao pecador a normalidade de sua amizade. A amizade está suspensa a uma imensa condição. E essa condição é o arrependimento, que o Bom Pastor tanto e tanto deseja.

Nós vemos isto muito na [vida] dos santos. Os santos que tem revelações particulares, que a Igreja não nos obriga a admitir, mas que a reverência e a piedade aceitam em todo o orbe católico, os santos vêem em suas revelações, suas visões, que Nosso Senhor é terrivelmente cioso das almas que Ele ama. Se Ele sabe perdoar, de outro lado Ele sente e se dá com a menor ingratidão. Ele quer as almas inteiras. Nosso Senhor não se contenta com meios termos.

Nosso Deus é um Deus ciumento. O pecado da tibieza

E há uma coisa no Evangelho que é bem clara: Nosso Senhor não permite que um homem divida o seu amor. Nós fomos criados para amar a Ele e a Ele inteiramente, com todo o nosso coração, com todas as nossas forças e a nossa alma, de tal maneira que todas as coisas que nós amemos nós amemos com [vistas] a Ele, para amá-Lo a Ele, fazendo dEle o centro de nosso amor e não desviando nem o mínimo ápice da nossa capacidade de amar [a Ele], que nos ama até a morte e a morte de cruz e que exige tudo, absolutamente todo o nosso amor.

Essa é a regra da verdadeira amizade, da qual Nosso Senhor nos dá o exemplo.

E as palavras do Evangelho que nós bem conhecemos, que Nosso Senhor declara que ninguém pode servir a dois senhores, Nosso Senhor que declara que toda cidade dividida contra si mesma perecerá, Nosso Senhor que declara que se nosso pé nos escandaliza é preciso cortá-lo e que se nosso olho nos escandaliza é preciso arrancá-lo, Ele afirma nessas palavras que se nosso próprio pé ou se nosso próprio olho, que é a luz de nossa vida, for um impedimento a amá-Lo, nós devemos renunciar a isto, porque nós não podemos amar nem a menina dos nossos olhos mais do que a Ele, isto é, amá-lo a Ele de todo coração.

E há um pecado que é exatamente o dos corações divididos. Há um pecado dos corações divididos, que é justamente o pecado da tibieza. Do homem que crê, do homem que de certo modo ama, mas ele não crê tanto que sua fé seja viva e operante em obras. Ele ama de uma coisa que se pode chamar analogicamente de amor, mas que não é verdadeiramente amor, não conduz à prática dos Mandamentos, à entrega total da alma a Ele.

Nosso Senhor, a esses homens assim, que são os homens tíbios, os homens fracos, os homens incapazes de um pleno amor, a esses homens que Ele chama e chama para a plenitude do amor, se esses homens se recusam, Ele diz aquelas palavras terríveis da Escritura: "se tu fosses frio ou quente, Eu te aceitaria, mas como tu és morno Eu começo a vomitar-te de minha boca".

Ele, que disse que não veio apagar a mecha que ainda fumega, que não veio romper [o arbusto] que estava partido, Ele mesmo declarou que aqueles que estão divididos contra si mesmo, perecerão, e perecerão longe dEle.

Quer dizer, Ele chama o tíbio à penitência, Ele chama o tíbio ao amor, mas Ele não pode amar o tíbio na medida em que o tíbio ainda se confessa tíbio, contra todos os ensinamentos da graça.

O tíbio na aparência estagna, no fundo, decai

Ora, o que acontece com o tíbio? Duas coisas acontecem com ele no campo da vida espiritual. De um lado, o tíbio estaciona, ele estagna, não progride, não tem vontade de adquirir novas virtudes, não tem gosto pela fé. Quando se apresenta a ele algo considerado à luz da fé, ele olha para aquilo com uma indiferença absoluta. Nenhum de nós que não conhece nada de oceanografia olharia para uma célula do fundo do mar que nos apresentam: "olha, isto é interessante, foi colhido a mil metros abaixo da superfície", "ah, sei". Outra coisa quer dizer: "eu não me importo com o fundo do mar". Assim é o tíbio e assim é que o tíbio considera as coisas de Deus.

O tíbio, nessas condições, não pára apenas. E todos os doutores da vida espiritual são unânimes em afirmar que o tíbio não só não pára, mas que ele tende a decair. Ele talvez não decaia na aparência, mas na realidade ele tende a decair.

E daí vêm essas surpresas: "fulano não [sabe] o que fez. Um homem que era um bom chefe de família, casado há tantos anos, que teve filhos e que era modelar, de repente fez tal coisa assim e desorganizou o seu lar". Ou então "tal rapaz, era excelente filho, ele era o arrimo, o amparo, a glória, a consolação de seus pais; ele ia muito bem; de repente... ". Quantos repentes nós não vemos? São tão numerosos esses repentes que nem são tão repentinos. Qual é a razão disso?

Há um ponto, uma máxima que diz: "nada de extremamente grave se faz de repente". Esses repentes são para os olhos dos outros. Essas crises bruscas foram precedidas pela tibieza que minou aquela alma como o cupim devora a madeira: de repente é toda uma fachada que cai. De repente, sim. Não para o cupim, que durante muito tempo esteve instalado na madeira, alimentando-se dela.

E isso se dá também na vida dos povos. Nós vemos de repente na vida dos povos umas catástrofes. Os visigodos, século VIII, todos católicos, de repente apresenta-se um punhado de árabes, e depois desse de repente os árabes transpõem o estreito de Gibraltar e em algum tempo dominaram a península ibérica. Não se compreende como foi isso. Que coisa interessante!

Cai o império dos czares de repente e depois da monarquia absoluta e do domínio da religião cismática, nós temos o oposto: o comunismo. De repente!

Vem de repente a Revolução Francesa. Vem de repente a Reforma Protestante.

É de repente? É tudo, menos de repente. E a história mostra bem que uma crise de tibieza religiosa precedeu durante longo tempo essa situação. Gastou todas as energias de maneira que quando o inimigo se apresentou, a alma caiu de podre diante de [seu inimigo].

Transposição destes princípios à vida dos povos

As regras da vida espiritual que se dão para os homens, dão-se para os povos. Nosso Senhor é cioso do amor dos povos. Nosso Senhor quer o amor inteiro dos povos. Nosso Senhor não se contenta para as suas benções, porque o povo toma uma tinturinha de religião católica e com ela enfeita sua Constituição, por exemplo, invocando o nome de Deus no preâmbulo, mas depois fazendo a Constituição como se Deus não existisse. Ou então estabelecendo alguns princípios de legislação interessantes, por exemplo o ensino religioso nas escolas públicas, coisa em si excelente, mas realizando todo o resto como se os princípios ensinados na aula de religião não devessem ter nenhuma aplicação.

Esses povos em que todo mundo se diz católico, mas as leis quase não são católicas, os costumes de nenhum modo são católicos, a imoralidade das modas é radicalmente anti-católica, esses povos são povos tíbios, esses povos Nosso Senhor os chama ardentemente porque Ele veio reacender a mecha que fumega, Ele veio consolidar o arbusto partido.

Mas, de outro lado, esses povos estão sujeitos à terrível ameaça: "se tu fosses frio ou quente eu te aceitaria, mas como tu és morno, ó povo católico, eu começo a vomitar-te de minha boca".

Como revigorar uma nação católica?

Esta situação assim delineada, nós compreendemos muito bem que o problema é esse: como revigorarmos uma nação católica?

Antes de tudo tendo bem a noção do que é uma nação católica vigorosa. A nação católica vigorosa não é apenas a nação poeticamente católica. É bom fazer poesia a respeito da religião católica, porque ela é uma fonte de beleza, mas fazer consistir a religião católica apenas em poesia é uma coisa radicalmente insuficiente.

Logo, nós não devemos nos contentar em dizer que nós somos católicos porque [há o] Cruzeiro no mais alto de nosso céu, porque o Cristo do Corcovado abre misericordiosamente seus braços para nós, porque nós somos o reino de Nossa Senhora Aparecida, porque Dom João VI, Dom Pedro I consagraram o Brasil a Nossa Senhora Aparecida e porque o Episcopado Brasileiro ratificou esse gesto pela coroação de Nossa Senhora Aparecida. Tudo isso é excelente.

Mas nada disso basta, porque quando essas coisas são realidade, existe um desejo e esse desejo é de restabelecer a religião católica nas idéias, nas mentalidades, nos princípios, nas relações com o Estado, nas escolas, em tudo, fazendo uma nação totalmente católica.

Não existe meio termo entre essa marcha de uma nação para a integridade da fé, para a prática sincera, lógica, coerente de todos os princípios católicos e essa decadência que é própria das nações tíbias.

Para nós, católicos, o caminho é esse. Nós não nos contentamos  com um catolicismo acomodatício, amorfo, sem esperanças nem exigências. Nós devemos querer um catolicismo integral e completo, um catolicismo ávido, que seja inteiro ele mesmo, desejoso com todas as fibras da natureza humana estimulada pela graça, de se realizar na terra, compreendendo que nada é tão importante do que isso e disposto firmemente a remover montanhas se for necessário para que esse programa se realize.

E é só com as almas que não se contentam a não ser com esse ideal, é só com essas almas que verdadeiramente o mundo pode ser salvo, é só com essas almas que uma nação católica pode ser reintegrada na fé e cumprir sua grande missão diante do mundo inteiro.

O homem invencível

Mas se isto é verdade, de outro lado é verdade que essas almas podem muito. Elas podem muito porque o homem não vale pela quantidade, mas vale pela qualidade. E não há mais alta qualidade para o homem do que se deixar penetrar pela graça de Deus, como o cristal se deixa penetrar pela luz. Não há mais alta qualidade para o homem do que ele se deixar entregar a Nosso Senhor Jesus Cristo completamente, de maneira a ser em todos os sentidos da palavra um membro do Corpo Místico de Cristo.

E quando um homem está verdadeiramente penetrado desse espírito, ele tem todas as coragens, ele tem todas as misericórdias, ele tem todas as renuncias, ele tem todas as esperanças que fazem e que caracterizam, delineiam o homem verdadeiramente invencível. Invencível da invencibilidade dos mártires. Vivo: por uma palavra sua causa terror em todos os seus adversários, ele desperta o amor em todos aqueles que querem ouvir a voz de Deus. Morto: o seu sangue ainda é uma garantia de vitória. E espalhado sobre a terra ele pede a Deus perdão e misericórdia pelos pecadores, ele pede justiça para aqueles que oprimem os bons e levam as almas para o caminho do mal.

Essas almas assim são invencíveis, porque a sua prece pede muito. Essas almas são aquelas que movem montanhas e Deus por elas opera maravilhas. Não tem dúvida nenhuma que se 10 justos teriam evitado que Sodoma fosse destruída, a presença de muitas almas assim salva as nações e evita todas as catástrofes.

Formar almas dessas, integralmente católicas, apaixonadamente católicas, vivendo só para a religião católica, na compreensão de que então vivem para tudo o que a vida tem de belo, de justo, de grande, de digno, é isto que é o sentido profundo da obra que nós temos que fazer.

Essa obra consiste em elevar no horizonte de nossos corações, por cima de todos os valores, a cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo, com aquela exclamação que é a confissão de nossos corações: "Ave crux, spes unica", eu te saúdo, ó cruz, que é a nossa única esperança.

A História confirma esta tese. O espírito de Covadonga e nosso espírito

A história confirma a [trajetória] de uma salvação feita assim.

Nós conhecemos a história emocionante dos heróis da Reconquista espanhola. Eram guerreiros que lutaram contra os mouros invasores. Eles, que eram os únicos que em toda a Espanha visigótica, decadente e corrupta, eram os únicos que conservavam o amor à religião católica integral e completa, eles lutaram até o último e estavam reduzidos a um punhado de guerrilheiros, a um canto do território espanhol, perto da gruta de Covadonga, pois de todas as partes os mouros os tinham derrotado, os tinham encostado. E então, na gruta de Covadonga fizeram um voto a Nossa Senhora de pedir a Ela a vitória, de confiar nEla inteiramente, embora a vitória então fosse um verdadeiro absurdo, nada faria esperar, e se Nossa Senhora desse a vitória, eles haveriam de consagrar as suas almas, a sua vida e a Espanha à direção de Nossa Senhora.

Feito o voto, nem os céus se abriram para descer os anjos, nem as terras se abriram para que os demônios delas saíssem para pegar os maus. Tudo continuou na mesma. Mas eles começaram a obter suas modestas e primeiras vitórias. E nessas lutas eles morreram, mas Deus lhes deu uma graça, talvez tão grande quanto a de lutar por Ele: era a de ter filhos capazes de continuar a luta...

E esses filhos, no espírito de Covadonga, continuaram a lutar e também tiveram algumas vitórias. E esses filhos tiveram netos e esses netos tiveram bisnetos. E ao cabo de alguns séculos de luta, Isabel, a Católica, e Fernando de Aragão consumavam o feito de Covadonga expulsando da Espanha os últimos mouros, os últimos muçulmanos.

Este espírito de Covadonga, que numa gruta e no meio dos desastres, confia em Nossa Senhora e não pede um milagre evidente, não pede nada de extraordinário, mas pede apenas a Deus que faça brilhar sobre a terra a sua glória, que rechace os seus adversários, que exalte por cima de todas as coisas a Igreja Católica, esperando se necessário um milagre, se o único caminho for esse, mas contentando-se com a vida inglória, a vida obscura e sacrificada, mas vivida com a intenção de recuperar alguns passos, porque a outra geração recuperará outros passos, mas a convicção de que é preciso lutar, lutar e absolutamente lutar, porque só a luta contra o mal dá de fato a plena realidade do amor do bem, só ela dá a dignidade da vida.

Esse espírito é bem o nosso espírito, espírito que se atira rezando aos pés de Nossa Senhora em Covadonga.

É diante dessa grandiosa história que eu encerro essa conferência preliminar da nossa semana de estudos.

Que Nossa Senhora nos dê o espírito de reconquista e de recuperação. Que a todo transe, com todo o sacrifício, mas de todo jeito, porque essa recuperação tem que se fazer e porque nós confiamos em Nossa Senhora mais do que em todas as forças humanas, saudando nas palmas que devem terminar saudando essa conferência, - não a conferência, que não a merece -, mas essa aurora que está nessa esperança e que é a esperança de um mundo completamente católico, numa verdadeira realização do Reino de Maria, coroada há pouco Rainha do mundo pelas mãos augustas de nosso Sumo Pontífice, nessa grande esperança de Reino de Maria raiando sobre a terra, por cima das convulsões, das hesitações, dos estertores do mundo contemporâneo, como uma coisa inevitável como o  raiar do sol, o Reino de Maria virá sobre a terra e nessa sala, nessa noite, se saúdam com emoção, com esperança e com entusiasmo as primeiras claridades dessa grande aurora melhor.


(1) Sobre as Semanas de Estudo de "Catolicismo" e seu papel na consolidação do Grupo que anos depois daria origem à TFP, sugerimos a nossos visitantes a leitura de seu histórico no livro "Um Homem, Uma Obra, Uma Gesta", na seção "Biografia".