D. Antonio de Castro Mayer Bispo de Campos

 

Carta Pastoral prevenindo os Diocesanos contra os ardis da seita comunista

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Catolicismo n° 127, julho de 1961

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Nota deste site: O jornal "O Estado de S. Paulo" de 2 de julho 1988 publicou a seguinte declaração do então arcebispo de São Paulo, cardeal Dom Paulo Evaristo Arns: "A cisão com a TFP aconteceu com o afastamento do próprio dom Antônio de Castro Mayer da organização, quando o ex-bispo de Campos aderiu à pregação de Lefèbvre", disse dom Paulo.

Í N D I C E

I - Os objetivos humanitários dos comunistas e a colaboração com os católicos

1. Cooperação entre católicos e comunistas em Sierra Maestra

2. Um grande equívoco

3. …do qual os católicos não desconfiavam

4. Ardil dos comuno-fidelistas em relação aos católicos

5. Engodo comunista habitual: luta contra a miséria e a injustiça

6. Insinceridade fundamental do "humanitarismo" comunista

7. A seita comunista oculta ao grande público suas verdadeiras doutrinas

8. Colaborar com as campanhas da seita marxista é fazer-lhe o jogo

9. …mesmo quando ela propõe planos conformes à doutrina católica

II - Como reagir contra a tática comunista

1. A grande dificuldade: discernir a presença da influência comunista

2. Recusar as campanhas paralelas de católicos e comunistas com objetivo comum

3. Como se faz o jogo do adversário

III - Causas do alastramento do comunismo

IV - Conclusão

1. O comunismo, inimigo de morte da Religião

2. Comunismo, a pior das barbáries

3. Exortações

4. Benção final

* 

No mundo moderno duas mensagens se defrontam: a de Nossa Senhora em Fátima, advertindo os homens de que "a Rússia espalhará os seus erros pelo mundo" se eles não derem importância ao aviso vindo do Céu, e a de Satanás, procurando atrair toda a humanidade para a "civilização" infernal que é o comunismo. A advertência da Virgem se vai transformando em larga e assustadora realidade: lembra-o a gravura que mostra o desfile impressionante de lança-mísseis soviéticos na Praça Vermelha de Moscou. Para reivindicar em sua Diocese os direitos da Rainha do Céu e da terra — simbolizados aqui pela coroa ornada com 3.000 pérolas, que as mulheres de Portugal ofereceram à imagem de Fátima — e precaver seus filhos contra a ação exercida pelo comunismo em Campos como por toda parte, S. Excia. Revma. o Sr. Bispo Diocesano publicou a magnífica Carta Pastoral que "Catolicismo" tem a honra de oferecer a seus leitores neste número especial.

*     *     *

D. ANTONIO DE CASTRO MAYER

Por mercê de Deus e da Santa Sé Apostólica

BISPO DIOCESANO DE CAMPOS

Ao Revmo. Clero Secular e Regular, à Venerável Ordem Terceira de Nossa Senhora do Monte Carmelo, às Associações religiosas e de apostolado, e aos Fiéis em geral da Diocese

SAUDAÇÃO, PAZ E BÊNÇÃOS EM NOSSO SENHOR JESUS CRISTO

Amados filhos e diletíssimos Cooperadores.

1. A Igreja perseguida em vários países

Na alocução consistorial de 16 de janeiro próximo passado, o Santo Padre gloriosamente reinante, João XXIII, referiu-se com angústia e dor a nações em que os poderes públicos criam obstáculos à ação da Igreja, particularmente no plano educacional, sujeitando muitas escolas católicas, fundadas e mantidas pelas vigílias, suores e angústias dos missionários, a medidas de coerção e compressão (cf. A. A. S., vol. 53, p. 67).

2. A perseguição comuno-fidelista

As palavras do Augusto Pontífice aplicam-se, sem sombra de dúvida, à nação cubana, convulsionada pela situação nela criada com a revolução de Fidelio Castro, ou Fidel Castro, como é geralmente conhecido.

a. No plano religioso

Com aparências de movimento renovador, cuja intenção seria unicamente restaurar a ordem jurídica tradicional, gravemente lesada pelo arbítrio de um governo pessoal despótico, a revolução fidelista colimava de fato a instauração, na grande Antilha, de um regime comunista, sem respeito às liberdades fundamentais inerentes à pessoa humana, entre as quais tem primazia a de crer e praticar a Religião verdadeira. Pois, de acordo com o testemunho dos Prelados cubanos, essa foi a obra encetada desde seus primórdios pelo governo de Fidel Castro. Em 4 de dezembro passado, todo o Episcopado de Cuba enviou uma carta ao primeiro ministro denunciando o caráter anticristão do novo regime (cf. «Cristiandad», de Barcelona, n.° 358, p. 297). Agora, alguma dúvida que ainda pudesse subsistir sobre o cunho da revolução fidelista desapareceu de todo. Em 1° de maio deste ano, Fidel Castro proclamou Cuba Estado socialista, confiscou todas as escolas católicas da ilha, prepondo-lhes dirigentes revolucionários, e ultimamente decretou a expulsão dos Padres estrangeiros, prenuncio natural de perseguição mais atroz contra a Igreja, como tem acontecido em outros países.

b. No plano social

Paralelamente a esses golpes desferidos diretamente contra a Religião, a revolução cubana atacou a fundo duas instituições básicas da civilização cristã, isto é, a propriedade e a família. A primeira ficou praticamente abolida por sucessivas reformas, fundamentadas no falso princípio de que o Estado pode, a seu talante, dispor dos bens particulares: a reforma agrária, que feriu de morte a propriedade rural, a reforma urbana, que suprimiu a propriedade imobiliária nas cidades, e a reforma industrial, que confiscou as fábricas. A família, de seu lado, foi vulnerada pela lei que, tirando aos pais o direito de escolher livremente as escolas para seus filhos, os privou de uma das mais importantes prerrogativas do pátrio poder.

3. Oração e reparação pelo povo cubano

No momento, o que de melhor podemos fazer, à vista destes fatos dolorosos, é redobrar nossas orações e boas obras, sacrifícios e penitencias, a fim de que Deus Nosso Senhor conceda aos católicos de Cuba a coragem e a fortaleza de que precisam para imitarem os mártires dos primeiros séculos, os quais nutriram com seu sangue a semente cristã, e contribuíram para dar-lhe o vigor de espalhar-se por toda a terra. Orações, boas obras e sacrifícios nessa intenção, e também para que a misericórdia divina se apiede da nação irmã, purgue-a logo de seus pecados, lhe dê em breve a alegria de nova alvorada de liberdade cristã no santo temor de Deus, ali pregado por missionários da envergadura de Santo Antonio Maria Claret.

Já ordenamos, nesse sentido, preces especiais durante o mês de maio. Recomendamos, no entanto, aos Nossos caríssimos Cooperadores que levem o povo fiel a conservar, mesmo passado o mês de Maria, o fervor de caridade pelos nossos irmãos de Cuba, e a confiança na poderosa intercessão da Santíssima Mãe de Deus.

4. Levantar em prol dos cubanos perseguidos a opinião pública

Este fervor haurido na oração deve frutificar em atos. Se cada fiel, nos ambientes que freqüenta, se valer de todas as ocasiões para manifestar sua repulsa à revolução comunista de Fidel Castro, e para acender no próximo uma santa indignação contra ela, se todos em conjunto aproveitarem as oportunidades que se apresentarem para dar solene e público testemunho de sua reprovação à perseguição religiosa na ilha, terão feito quanto em si está para combater o comuno-fidelismo, e se portarão como autênticos membros do Corpo Místico de Cristo, sensíveis a todos os golpes que esse Corpo recebe em qualquer parte da terra, como filhos amorosos da Igreja que não suportam seja Ela perseguida em qualquer nação do mundo.

5. Aproveitar a lição que nos vem de Cuba

Entretanto, não pensemos só em Cuba. Não estamos livres de sofrer também uma revolução marxista. O exemplo das Antilhas constitui ameaça para toda a América Latina, e não vemos reação proporcionada à gravidade do perigo. Muito pelo contrário, assistimos a um recrudescimento de ousadia por parte dos comunistas, e de simpatia, mais ou menos generalizada em vários setores da sociedade, pelo mundo socialista. De onde a urgência em tirarmos proveito da lição que nos vem do Norte, meditando atentamente sobre a doutrina marxista, sua propaganda seus ardis. Com efeito, a Providência, permitindo a eclosão do comunismo em Cuba, dá às demais nações católicas do continente um sinal, altamente expressivo, da gravidade da situação em que elas mesmas se encontram. Tomar na devida conta esse sinal corresponde, pois, a um dos mais sérios deveres do momento.

6. ...especialmente a lição sobre os ardis comunistas

Mais especialmente, amados filhos e Cooperadores, pareceu-Nos importante chamar vossa atenção para os ardis da propaganda vermelha. Por meio deles, a minoria comunista, seita tenebrosa, fanatizada e disciplinada, mas incapaz, por seu pequeno número, de impor seu jugo a um país tão vasto e católico como o nosso, pretende instaurar entre nós a chamada ditadura do proletariado. 

I - Os objetivos humanitários dos comunistas e a colaboração com os católicos

1. Cooperação entre católicos e comunistas em Sierra Maestra

A revolução de Fidel Castro, segundo declarações dos Prelados cubanos (cf. «Cristiandad», de Barcelona, n.° 358, p. 298), teve, no seu início e durante todo o período mais duro da conquista do poder, a colaboração franca, corajosa e entusiasta de católicos. A maioria dos guerrilheiros de Sierra Maestra era constituída de católicos, que lutavam com o rosário na mão, animados e acompanhados por Padres católicos.

2. Um grande equívoco

Houve pois estreita colaboração entre os católicos e os revolucionários fidel-castristas na aparência tinham o mesmo objetivo: libertar a pátria de um governo tirânico. Na aparência, dizemos, porque no fundo as intenções eram muito diversas. Os católicos desejavam acabar com os desmandos de um regime corrupto, e restaurar a ordem dentro da civilização tradicional de Cuba, a civilização cristã. Os fidel-castristas empenhavam-se, pura e simplesmente, pela destruição de um estado de coisas que detestavam, porque impedia a implantação de outro, ainda mais tirânico que o então existente, no qual seriam os donos de uma nação escravizada, subordinada a Moscou. Os católicos batiam-se pela reparação de certas injustiças, e mesmo pela punição dos culpados. Os fidel-castristas, como os comunistas em geral, não cuidavam das injustiças a não ser como meio de atrair adesões à sua causa. Não queriam apenas a punição dos culpados, mas a total destruição de todas as instituições e pessoas que fossem empecilhos ao domínio do partido.

3. …do qual os católicos não desconfiavam

Eis, portanto, duas forças que se conjugam para a consecução de um mesmo fim material: pôr cobro a uma situação de fato. O desaparecimento de um governo tirânico é, em si, um bem. Ele não pode ser, no entanto, pura e simplesmente destruído. Ele precisa ser substituído por outro, pois que a sociedade não subsiste sem poder público. De onde a impossibilidade de abolir a tirania existente num país, sem se cogitar da nova autoridade que há de tomar o lugar do tirano. No caso cubano, a solução parecia muito fácil. O que se fazia necessário era abater um governo corrupto, e substituí-lo por outro, honesto, dentro do mesmo regime político. Não constituíam problema as instituições vigentes, mas a maneira como as conduziam os governantes. A solução era tão lógica, que não passou pela cabeça dos católicos houvesse entre os homens de Sierra Maestra quem pensasse de outro modo. Na aparência, portanto, tudo se preparava no sentido de corrigir os males introduzidos, especialmente pelo abuso do poder, num regime legítimo e digno de ser aprovado.

4. Ardil dos comuno-fidelistas em relação aos católicos

Os comunistas, porém, pensavam diversamente. Eles tinham seu fim preestabelecido, e, como costumam fazer, aproveitavam-se da ocasião propícia, para ampliar seu poderio com vistas ao objetivo último: a dominação mundial. Não o declaravam. Guardavam seu segredo à espera de que, senhores da situação, pudessem dispensar a máscara com que iludiam os companheiros de armas.

E assim um país de imensa maioria católica caiu sob a dominação dos piores inimigos da Igreja.

5. Engodo comunista habitual: luta contra a miséria e a injustiça

O que se deu em Cuba é um exemplo típico do resultado a que leva a colaboração com comunistas. Estes, com efeito, não desdenham a cooperação dos católicos. Antes, a solicitam, provocam-na mesmo, salientando miséria e injustiças que possam despertar a indignação e a reação dos espíritos retos. E, infelizmente, amiúde conseguem a colaboração desejada. Habituados a agir de boa fé, os católicos tendem muitas vezes a achar impossível que por detrás de considerações humanitárias possa alguém esconder um fim perverso. Terminam assim empolgando-se, não pelo movimento comunista, mas pela luta em benefício dos infelizes, dos oprimidos e sofredores. E trabalham juntos, católicos e comunistas, certos os primeiros de que os outros, como eles, desejam sinceramente curar a sociedade das chagas que a enfeiam; mais certos os últimos de que a agitação humanitária lhes proporcionará o ambiente ideal para a ampliação de seu poderio.

6. Insinceridade fundamental do "humanitarismo" comunista

De fato, os comunistas não querem a reparação dos males, das injustiças sociais. O regime que eles aplaudem é a mais tremenda tirania, arvorada em sistema de governo.

O que eles desejam é produzir um ambiente de luta, de exacerbação contra as elites. Seu fim imediato é provocar a inquietação social, a desunião dos espíritos. Não os perturba, de modo nenhum, a violação da lei moral. Para eles não existe lei moral (cf. Enc. «Divini Redemptoris», A. A. S., vol. 29, pp. 70 e 76). O que lhes é sobremaneira útil é excitar e manter a luta de classes, luta de extermínio, sem qualquer tentativa de conciliação harmoniosa, como quer a Igreja. De fato, na História do Partido Comunista da URSS, publicação oficial dos soviets, lê-se: «Para não se enganar em política, é preciso ser revolucionário e não reformista (...). É preciso seguir uma intransigente política proletária de classe, e não uma política reformista de harmonia de interesses do proletariado e da burguesia, não uma política conciliadora de integração do capitalismo no socialismo» (apud «Itinéraires», de Paris, n.° 52, p. 99). Na Encíclica «Divini Redemptoris», por seu lado, Pio XI consigna que o ideal que visam os esforços dos marxistas é exacerbar a luta de classes (A. A. S., vol. 29, p. 70).

7. A seita comunista oculta ao grande público suas verdadeiras doutrinas

Hoje, a propaganda dos comunistas não apresenta nem sua doutrina, nem seus objetivos de modo claro, patente ao grande público. Fê-lo no começo, mas logo percebeu que assim afastava os povos do marxismo (cf. Enc. cit., ibid., p. 95), tão brutal é a essência deste. Por isso, a seita «mudou de tática, e procura ardilosamente seduzir as multidões, ocultando os próprios intuitos atrás de idéias em si boas e atraentes» (Enc. cit., ibid., p. 95). É assim que os comunistas, «mantendo-se firmes em seus perversos princípios, convidam os católicos a colaborar com eles, no campo chamado humanitário e caritativo, procurando, por vezes, coisas em tudo até conformes ao espírito cristão e à doutrina da Igreja» (Enc. cit., ibid., p. 95).

8. Colaborar com as campanhas da seita marxista é fazer-lhe o jogo

De onde se vê que toda colaboração prestada a uma campanha na qual se empenham também os comunistas — ainda quando não se apresentem como tais — é uma colaboração que se dá à implantação do marxismo. O exemplo doloroso de Cuba nos adverte, e a simples observação da maneira de agir da seita nos convence.

Cumpre distinguir, a esse propósito, entre colaboração mútua e ocasional convergência de esforços. Há colaboração quando católicos e comunistas, trabalhando para o mesmo objetivo imediato, se auxiliam uns aos outros, ou, pelo menos, calam temporariamente o fundamental e recíproco antagonismo em que se encontram. A colaboração redunda sempre em proveito dos marxistas. Pode acontecer, entretanto, que os católicos iniciem uma determinada campanha, e, fortuita ou ardilosamente, os comunistas também se movimentem no mesmo sentido. Haverá então, como adiante veremos, uma convergência de esforços ocasional, que poderá não trazer vantagem para os comunistas, se os católicos recusarem articular qualquer ação com eles, bem como estabelecer com o comunismo um armistício ainda que temporário.

Os asseclas de Marx jamais trabalham senão para favorecer a sua causa. Se há um movimento totalitário no mundo, no qual não se desperdiça força alguma, no qual tudo, absolutamente tudo, é calculado em função do fim colimado, é o dos comunistas. Assim, onde quer que haja ação destes, há ai um interesse do comunismo, é infantil pretender desviar-lhes a atividade, uma vez que o comunista, enquanto permanece tal, não abandona seu posto de mira, e habitualmente não se engana nos seus cálculos. Não por outro motivo condenou Pio XI qualquer colaboração com os marxistas.

9. …mesmo quando ela propõe planos conformes à doutrina católica

Ainda mesmo quando eles propõem — o que o Papa prevê — «projetos em todos os pontos conformes ao espírito cristão e à doutrina da Igreja», ainda nesses casos (e, atendendo-se ao espírito da «Divini Redemptoris», mais especialmente nesses casos), «não se pode permitir em campo algum a colaboração recíproca com o comunismo» (Enc. cit. ibid., p. 96). A proibição de Pio XI é categórica, e não admite exceções: é preciso que não haja colaboração recíproca em nada — nulla in re — com essa seita execrável.

E a razão é que, quando os comunistas aliciam os católicos, à sua maneira, isto é, com «projetos em todos os pontos conformes ao espírito cristão e à doutrina da Igreja», eles nada mais fazem do que preparar uma armadilha, porquanto, como diz o Papa, procuram «ardilosamente seduzir as multidões, ocultando os próprios intuitos atrás de idéias em si boas e atraentes» (Enc. cit., ibid., p. 95).

De toda essa lição de Pio XI se deduz que os fiéis que se unem aos comunistas na busca de objetivos inteiramente «conformes ao espírito cristão e à doutrina da Igreja», caem numa cilada e colaboram para a implantação do comunismo no mundo.

 

II - Como reagir contra a tática comunista

1. A grande dificuldade: discernir a presença da influência comunista

Tudo isso está muito certo e muito claro, dirá alguém. Há, no entanto, uma dificuldade que parece insuperável. Quando Fidel Castro encabeçou a revolta de Sierra Maestra, não se apresentou como comunista. Como era possível saber-se o que ia no íntimo desse caudilho?

De fato, problemas como esse se põem com freqüência. Não se deve esperar dos comunistas lealdade alguma, uma vez que, para eles, não existem obrigações morais (cf. Enc. cit., ibid., pp. 70 e 76). Muito pelo contrário, é num ambiente saturado de hipocrisia, cinismo e falsidade que se movem (cf. Enc. cit., ibid., pp. 69, 70, 95 etc.). Para eles só há uma norma de ação: ser útil ao movimento. Ora, qualquer pessoa tem facilidade de perceber como, no Ocidente de modo particular, será o comunista tanto mais útil ao partido, quanto menos for tido e havido por tal. Por isso, escondem os membros da seita marxista, quanto podem, sua filiação partidária. Aparecem como socialistas, como homens de esquerda, mas muito mais, muitíssimo mais, como humanitários que só desejam o bem dos pobres, dos operários, que se confrangem à vista das injustiças que se cometem na sociedade, detestando-as vivamente, e muito mais vivamente a seus autores. É assim que eles conseguem obter a simpatia e até a colaboração dos não comunistas (cf. Enc. cit., ibid., p. 95).

a. Conhecendo a doutrina comunista

Ora, semelhante simpatia e colaboração, amados filhos, é que devemos evitar a todo custo. E para tanto convém que saibamos discernir o lobo marxista sob a pele de ovelha humanitária.

A fim de que possais identificar os comunistas, importa antes de tudo conhecer sua verdadeira doutrina. Isto vos permitirá também aquilatar com mais clareza a oposição radical e insanável que existe entre o comunismo e o Catolicismo. Passamos pois a expor sumariamente a doutrina marxista, isto é, a filosofia dessa verdadeira anti-Igreja que é a seita comunista.

— o comunismo, uma seita

Empregamos intencionalmente a palavra «seita». Não deveis pensar, com efeito, que o comunismo seja apenas um partido político. Ele o é, certamente, e suas redes envolvem em muitos países milhares e até milhões de homens e mulheres organizados politicamente, e que servem de núcleo em torno do qual gravitam outros milhares de simpatizantes e colaboradores. Mas, o comunismo é mais do que isso. Ele é uma seita filosófica, que pretende conquistar o mundo todo para sua maneira de pensar, de querer e de ser. Para conseguir tal conquista, os comunistas se organizam em partido; mas a arregimentação partidária é apenas um meio, um instrumento para atingir a meta universal.

O que anima a ação da seita marxista e lhe dá energia interna, clareza de fins, coesão e conseqüência é sua ideologia. Vamos expô-la sucintamente.

— Materialismo evolucionista

O sistema comunista é o materialismo levado a suas últimas conseqüências. Afirma o marxismo que só existe a matéria. Não há Anjos nem demônios; não há alma espiritual nem Deus. O homem é pura matéria. Uma força misteriosa impele esse universo material num processo de desenvolvimento irreprimível, numa evolução irrefreável. Da matéria anorgânica emanou a vida, da planta nasceu o animal. Entre os animais houve um aperfeiçoamento lento e constante, até que apareceu o animal atualmente mais perfeito, cujo cérebro apresenta o mais alto grau de desenvolvimento. Este animal se chama homem. Com o tempo, o mesmo processo produzirá outro ser mais perfeito, pois assim como no passado surgiu o homem vindo do bruto, no futuro deverá surgir um outro ser, um «super-homem», tanto mais perfeito do que nós quanto nós somos mais perfeitos do que o macaco. Esta evolução não tem limites.

— Tudo é relativo, inclusive a moral

Sendo assim, nossas idéias são relativas. O que me parece verdade metafísica e moral não tem valor objetivo. É verdade para mim, para meu estado de evolução. Para um ser mais evoluído, não o será. Em uma palavra, não há verdade objetiva. Eu crio a verdade; por conseguinte, crio o bem. Logo, não há metafísica, não há moral. É verdade e é bom o que eu quero que o seja. Não há Deus. Não há ordem natural que me obrigue. Não há direito natural. Não há autoridade legítima.

O homem comunista liberta-se de toda aquela maneira de pensar que tem prevalecido ao longo dos séculos, e estabelece o princípio: a verdade é o que me convém. É bom o que contribui para meu bem-estar subjetivo. Ora, a massa é a soma dos indivíduos, dos «eu» que a compõem. Assim, pois, a expressão máxima do homem é a massa. A massa que mais genuinamente representa o homem puro, autêntico, é a massa proletária. Portanto, o proletariado, a massa pobre dos trabalhadores é o árbitro supremo do bem e da verdade.

— Destruição da Igreja, da autoridade, da hierarquia social

Daí se segue que a Religião, a autoridade dos pais e dos patrões, a propriedade privada, a moral obrigatória e imutável são quimeras burguesas que se devem apagar da memória dos cidadãos da «era nova». Igreja, elites sociais, classes tradicionais não têm o menor direito de existir. Céu, vida futura, ascese, santidade são conceitos que nada representam de aproveitável.

— Ditadura do proletariado

O homem não deve ter nenhuma preocupação religiosa ou moral. Seu único cuidado deve ser lutar para dar ao proletariado o domínio absoluto da sociedade e proporcionar aos seus semelhantes, reduzidos todos à condição de proletários, o bem-estar na terra.

— Luta entre os opostos. "Dialética"

A força metafísica que impele o universo para a perfeição é a luta entre os opostos. Existe nele uma desarmonia constitucional. Do choque dos elementos opostos brota a síntese, a harmonia momentânea. Mas logo aquilo que resultou da síntese encontra outro elemento a que se opõe, e eis de novo uma tese que se defronta com sua antítese para dar origem a uma nova síntese. Este princípio rege o universo. Rege também a sociedade humana. Poder-se-ia deixar que o processo que descrevemos se desenvolvesse em seu ritmo natural. A sociedade lentamente iria realizando suas oposições, à tese contraporia a antítese, daí resultaria uma síntese, e no fim ter-se-ia necessariamente o comunismo. Mas este processo necessário pode ser acelerado. O marxismo ensina a técnica de fazê-lo. É a luta de classes. Descobrindo os opostos, atiça-se a luta entre eles, lançando um lado contra outro. Assim, um processo que naturalmente duraria séculos pode desenvolver-se em poucos anos. É a isso que o marxismo chama «dialética». Joga os pobres contra os ricos, os colonos contra os fazendeiros, os inquilinos contra os senhorios, os pretos contra os brancos, os nortistas contra os sulistas, os nacionais contra os estrangeiros, os leigos contra os Padres, — eis alguns exemplos de luta possíveis.

— A ciência da Revolução

O comunismo desenvolve uma ciência nova: a ciência da Revolução. Assim, cientificamente promove a luta dos opostos. Têm esta luta dois aspectos: um tático e outro estratégico. Este último consiste em apressar cientificamente a destruição daquelas oposições que, naturalmente, não se destruiriam antes de séculos, primeiro de coexistência, depois, de luta. A ciência da Revolução estuda, além disso, o aspecto tático. Entre as muitas lutas possíveis, os dirigentes do comunismo escolhem aquelas que destroem classes e ordens que mais tenazmente impedem o nivelamento total da sociedade.

— Igualitarismo completo

O objetivo final dos sectários de Marx é, portanto, o nivelamento total, a abolição das classes, o igualitarismo. Esse igualitarismo é essencial ao comunismo, e é por ser igualitário que ele destrói e suprime o direito de herança, a família, a propriedade privada, as elites sociais, a tradição.

— Negação total da Religião Católica

Como acabamos de ver, é, pois, por uma razão profundíssima que o comunismo, além de ateu, é revolucionário, violento, cínico, traidor, mentiroso, implacável, imoral, contrário a família e à propriedade (1). É por isto que ele é intrinsecamente mau, como declarou Pio XI (cf. Enc. «Divini Redemptoris», ibid., p. 96).

É impossível conciliar o comunismo com o Catolicismo. Ele é uma seita filosófica que nega radicalmente tudo o que o Cristianismo ensina, e destrói o próprio fundamento deste, de todo o direito e de toda a filosofia. É a mais completa negação de Deus (cf. Enc. cit., ibid., p. 76).

— Paraíso ateu

Desta negação total do bem e da verdade, e da esperança satânica de realizar o paraíso na terra, sem Deus, sem Cristo, sem a Igreja e sem autoridade, provém a força interna, o dinamismo obsedante e diabólico que empolga os comunistas e os faz soldados que não conhecem trégua nem quartel em sua luta para demolir a ordem baseada no bem e na verdade, baseada em Deus e em Cristo, que chamamos de Cristandade.

— O Partido Comunista

Nessa campanha contra a civilização cristã tem um papel central e preponderante o Partido Comunista. Realmente, ele se arvora em único representante genuíno da massa proletária. De maneira que se arroga, em concreto, o poder ditatorial sobre a verdade e o bem que, em tese, o comunismo atribui ao proletariado.

— Socialismo, comunismo aparentemente mitigado

Após a exposição da teoria do marxismo, convém dizer uma palavra sobre o socialismo. A realização mais conseqüente deste é o marxismo. Mas, ao lado do socialismo marxista, há variantes que procuram implantar a sociedade igualitária, materialista, sem lançar mão dos recursos brutais que geralmente são preconizados e usados por ele. Essas variantes preferem os meios legais, as transformações lentas, de modo que, num processo mais suave, mas igualmente irreprimível, sejam destruídas as instituições da sociedade tradicional, pondo-se em lugar delas instituições de uma sociedade sem classes, igualitária, em que o Estado tudo prevê, providencia e domina. Assim, às vezes o socialismo é o próprio comunismo nu e cru. Outras vezes, adotando aspecto pacífico e marcha gradual, ele introduz na sociedade sub-repticiamente o comunismo, e é a ponte, a porta pela qual este penetra na Cristandade.

b. Algumas características dos movimentos influenciados pelo comunismo

Conhecidos a doutrina e os princípios marxistas, será ainda necessário estudar a maneira como os comunistas agem para chegar ao seu ideal de uma sociedade sem classes (cf. Enc. cit., ibid., p. 70). Em outras palavras, quais as características pelas quais se conhecem os movimentos comunistas, ou os que, embora não sendo tais, servem ao comunismo.

Na impossibilidade de descrever todas estas características, lembremos apenas duas mais importantes e freqüentes.

— Ódio e intransigência pessoal

A primeira delas é a odiosa intransigência pessoal dos movimentos comunistas. Eles tendem sempre a criar e exacerbar a aversão contra uma classe social cuja existência, segundo a ordem natural das coisas, nada tem de injusto. Como a subsistência de tal classe constitui um empecilho ao triunfo da seita, os comunistas a votam ao extermínio. Pode haver motivos para se condenarem pessoas, sem que, por isso, se falte à justiça e à caridade. O que não é cristão é investir furiosamente contra uma classe sempre tida como legítima e necessária à boa ordem social, como se ela não passasse de um câncer da sociedade, a ser urgentemente extirpado.

Quando, pois, se enceta uma ação contra determinada categoria social, não com base em princípios definidos ou em fatos concretos e comprovados, mas com fundamento em doutrinas vagamente humanitárias e acusações imprecisas, excitando os espíritos à detestação pura e simples da classe em vista, podemos ter certeza de que há nessa campanha o ódio característico dos comunistas, ainda que seus promotores não se confessem tais. Sempre que uma campanha se reveste desse cunho de oposição fanática e incondicional contra uma classe determinada, há nela dedo comunista. E a colaboração que se dê a semelhante movimento é, no fundo, uma colaboração para o triunfo do comunismo.

— Demagogia e exagero a propósito de problemas secundários

Além disso, como as campanhas marxistas são determinadas por considerações estratégicas e não por motivos morais, é muito freqüente não focalizarem elas a injustiça social mais grave, nem a que é mais urgente remediar; ou então não a focalizarem nos seus justos termos. Assim, quando se generaliza uma campanha contra um mal social, uma injustiça, uma situação deprimente, etc., é preciso examinar e ver se o caso posto em foco existe de fato, se apresenta a importância que a campanha lhe atribui, se esta o situa bem no conjunto das atividades sociais, de sorte que se possa afirmar que ela não é movida por um intuito de oposição sistemática, de acirramento de ódios e lutas, mas por uma vontade certa e sincera de corrigir um mal existente. Sempre que não se verifiquem estas características todas, podemos estar seguros de que a campanha envolve o interesse de fomentar a luta de classes, meio de que se utilizam os comunistas, como vimos, para implantar o domínio de sua seita. Colaborar com semelhantes campanhas é colaborar para o triunfo do marxismo.

— Exemplo atual: a influência comunista na campanha pró-reforma agrária

Exemplifiquemos com o que atualmente se observa no movimento a favor da reforma agrária no País. De fato há entre nós injustiças no campo, de fato é preciso melhorar, o mais breve possível, as condições de existência e trabalho do operário agrícola brasileiro. E um movimento que tenda verdadeiramente a esse fim só pode ser louvado. O que se nota, no entanto, em quase toda a presente campanha em prol da reforma agrária, é um esforço para excitar os espíritos contra a própria estrutura rural hoje existente no Brasil, acusada, sem provas, de responsável pelos males do campo e pela crise econômica nacional; e com essa excitação visa-se a levantar a opinião pública contra os proprietários da terra, sem considerar a inviolabilidade do direito de propriedade e os imensos benefícios que muitos fazendeiros proporcionaram e ainda proporcionam à coletividade.

2. Recusar as campanhas paralelas de católicos e comunistas com objetivo comum

O exemplo acima nos leva a uma advertência necessária a propósito das chamadas ações paralelas. Os comunistas, em geral, a fim de obter a colaboração dos não comunistas, sondam primeiro o ambiente para ver qual a campanha que terá maior receptividade entre estes. E não é difícil encontrar injustiças verdadeiras, objetivas, a deplorar numa sociedade que apostatou de Deus, e vive dominada pelo egoísmo e pela sede dos prazeres materiais. Ora, é natural que os cristãos se indignem com fatos semelhantes. Os Papas têm repetidas vezes levantado a voz contra tais abusos e particularmente contra as injustiças causadas pela nova ordem econômica, na qual domina o dinheiro e não se dá atenção às necessidades espirituais e morais mais urgentes das classes menos favorecidas. Fazer eco aos Papas, e tentar ordenadamente pôr cobro a essas desordens sociais, é coisa justa e digna de todo o aplauso.

Em semelhantes circunstâncias concretas, os comunistas como que se associam à campanha dos cristãos. Também eles alçam a voz para condenar as injustiças e pedir a punição dos culpados. Pergunta-se: seria lícita, em tal caso, uma ação paralela? Os comunistas, de seu lado, com seus argumentos e seus métodos sem dúvida detestáveis, propugnariam, não obstante, um objetivo justo e desejável. De outro lado, os católicos, com os métodos e argumentos ensinados pela Moral, pelos documentos pontifícios, se empenhariam, sem ligação nenhuma com os comunistas, para conseguir, na prática, o mesmo resultado, isto é, a correção das injustiças sociais.

a. Não há de fato um objetivo comum

É fácil solucionar a questão.

Primeiramente, não nos iludamos, os comunistas jamais desejam reparar injustiça alguma. Eles só querem fomentar agitação, mal-estar, oposição de classe contra classe, de maneira a obter a aversão e o ódio de uma contra outra. Ainda quando, na aparência, estão a defender objetivos inteiramente de acordo com as exigências e a doutrina da Igreja, ainda nessas ocasiões, o que de fato intentam é promover a luta de classes, o grande meio que Lenine lhes pôs nas mãos para atingirem seu fim último: o domínio do mundo e a tirania da nova classe dirigente, o partido comunista.

b. Não pode haver paralisação na luta dos católicos contra os comunistas

Em segundo lugar, e por esse mesmo motivo, qualquer campanha cristã, contra as injustiças sociais, para não carregar água para o moinho comunista, precisa, ao mesmo tempo que ataca com veemência tais injustiças, mostrar de modo claro e insofismável que não pretende o aniquilamento de qualquer das classes de que forçosamente se compõe o corpo social, que o que deseja tão somente é purificar este último de defeitos que o deformam, e isso através da harmonia das várias camadas sociais; a par disso, é coisa não menos indispensável combater e impugnar, com veemência igual ou ainda maior, a campanha análoga de cunho comunista, denunciando-a como insincera e revolucionaria. Ora, agindo os católicos de acordo com estas normas, os próprios comunistas rejeitarão a colaboração que antes procuravam (2).

— Ódio comunista contra "Reforma Agrária — Questão de Consciência"

Ainda aqui, um aspecto da luta em torno da reforma agrária servirá para exemplificação. De fato, sobre este problema, juntamente com o Exmo. Revmo. Sr. Arcebispo de Diamantina, D. Geraldo de Proença Sigaud, o Professor Dr. Plinio Corrêa de Oliveira e o economista Luiz Mendonça de Freitas, escrevemos o livro «Reforma Agrária — Questão de Consciência», que a Editora Vera Cruz, de São Paulo, publicou. Essa obra trata do assunto com serenidade. Reconhece os males gravíssimos introduzidos no campo pela ganância de certos proprietários, e especialmente pelo amoralismo da economia liberal, exorta os responsáveis pela situação a sanarem com a possível brevidade injustiças clamorosas, e dá veemente brado de alerta contra a reforma agrária de cunho socialista. Em resumo, uma obra com objetivos humanitários (para usar aqui a palavra corrente entre os não católicos), mas que nitidamente se alheia de qualquer compromisso, ainda em linha paralela, com os comunistas e comunistizantes. Foi o suficiente para que aqueles e estes recebessem o livro com verdadeiro e estrepitoso ódio. É que os autores, ferindo uma injustiça real, não o faziam à moda socialista, nem silenciavam os engodos que a solução socialista envolve. «Reforma Agrária — Questão de Consciência» era uma força que aos marxistas só convinha destruir. O ódio comunista contrasta significativamente não só com os aplausos que nosso trabalho recebeu em outros setores, mas também com a discrepância cortês e serena com que foi acolhido por elementos não comunistas que dele discordaram.

— A ação dos católicos não tem o caráter destrutivo próprio à ação dos comunistas

Os movimentos inspirados pela caridade cristã jamais tendem à destruição de uma ordem existente que em si não é injusta, como a respeito do regime da propriedade privada, chamado capitalismo, disse Pio XII (cf. Aloc. sobre problemas rurais, de 2 de julho de 1951, «Dircorsi e Radiomessaggi», vol. 13, pp. 199-200), mas procuram, e isso com toda a energia, corrigir os erros verificados, a fim de que voltem a paz e a harmonia necessárias ao corpo social. Pois neste, embora composto sempre de classes diversificadas, deve reinar uma orgânica união de todos os elementos, assegurada pela caridade recíproca e auxilio mutuo.

3. Como se faz o jogo do adversário

Vêm a propósito algumas observações sobre a maneira como, inconscientemente embora, se chega a auxiliar em certos casos o movimento comunista.

— Omissões e silêncios que favorecem os comunistas

O comunismo, como se sabe — e esta é sua característica mais visível — é contrário à propriedade privada. A anulação desse direito constitui para ele uma das metas a atingir para chegar ao ideal supremo da sociedade sem classes (cf. Enc. «Divini Redemptoris», ibid., p. 70); e, como sempre, a campanha contra a propriedade privada é conduzida por seus asseclas sem a menor atenção à ordem moral, aos direitos legitimamente adquiridos, uma vez que para os comunistas — convém tê-lo sempre presente — não há freio moral (cf. Enc. cit., ibid.). Eles se movem unicamente pela consideração do que é útil à finalidade da seita.

Ora, é patente que, na atual ordem de coisas, aquele instituto, não raras vezes, tem sido utilizado de modo abusivo. Os Papas o reconhecem. É, pois, certo que tais abusos devem ser eliminados.

Um movimento destinado a abolir os abusos da propriedade privada, e a levar os proprietários a fazer uso honesto de seus bens, é em si benemérito. Acontece, não obstante, que facilmente pode ele favorecer o comunismo. Basta que não se afirme de maneira enérgica e categórica que o instituto da propriedade privada é legítimo, para que a campanha auxilie a criação de um clima hostil aos proprietários enquanto tais, apresentados pelos comunistas como parasitas da sociedade. Não é só. Cumpre que um movimento assim saliente bem o interesse social que há na existência da classe dos proprietários, da qual se beneficiam todos, especialmente os menos galardoados pela fortuna. É advertência de Pio XI. Assinala o Pontífice que «a própria natureza exige a repartição dos bens em domínios particulares precisamente (grifo nosso) a fim de poderem as coisas criadas servir ao bem comum de modo ordenado e constante» (Enc. «Quadragésimo Anno», A. A. S., vol. 23, pp. 191-192). Este princípio, acrescenta o Papa, deve tê-lo «continuamente diante dos olhos quem não quer desviar-se da reta senda da verdade». É enfim preciso que a campanha de que tratamos não fique em reivindicações vagas, mas antes tome todo o cuidado em não exagerar de tal maneira as restrições ao direito de propriedade, que atinja também a própria existência dele. Assim, por exemplo, não se há de exigir por justiça o que pertence a outras virtudes, como sabiamente ensinava Pio XI (cf. Enc. cit., ibid., p. 192).

Em vários documentos de Pio XII nota-se a preocupação com os movimentos surgidos para combater os abusos da propriedade privada, ou do capitalismo (palavra de que ardilosamente se serve o comunismo para confundir o direito de propriedade com as injustiças da atual ordem econômica). A preocupação do saudoso Pontífice revela como houve excessos nessas campanhas. Citemos apenas o trecho da rádio-mensagem dirigida ao Congresso Católico de Viena em 14 de setembro de 1952, pelo qual se vê quanto interessa aos comunistas a falta de uma afirmação nítida do direito de propriedade. Eis as palavras de Pio XII: «É preciso impedir a pessoa e a família de se deixarem arrastar para o abismo, onde tende a lançá-las a socialização de todas as coisas, ao fim da qual a terrível imagem do Leviatã tornar-se-ia uma horrível realidade», na qual soçobrariam «a dignidade humana e a salvação das almas». Como impedir esse desastre? Mediante a afirmação categórica do direito de propriedade. Continua, realmente, o Papa: «É assim que se explica a especial insistência da doutrina social católica sobre o direito de propriedade privada. É a razão profunda pela qual os Papas das Encíclicas sociais e Nós mesmo Nos recusamos a deduzir, seja direta, seja indiretamente, da natureza do contrato de trabalho, o direito de co-propriedade do trabalhador ao capital e, portanto, seu direito de co-direção» (Rádio-mensagem ao «Katholikentag» de Viena, de 14-9-1952, «Discorsi e Radiomessaggi», vol. 14, p. 313).

As expressões do Papa são para nós sabia advertência. A Igreja apresenta como ponto inalterável de sua doutrina o direito de propriedade privada, resultante da natureza e objeto de um dos Mandamentos do Decálogo. Faz portanto ele parte dos fundamentos da civilização cristã, cuja manutenção, pela observância dos vínculos jurídicos que a compõem, é um dever grave que obriga a todos os fiéis. Por isso, a Igreja mantém-se vigilante em face dos atentados que contra esse direito se sucedem na agitação da sociedade de hoje, trabalhada pelo espírito socialista. Ouvimos o pranteado Papa Pio XII a falar para o Congresso Católico de Viena. Firmemo-nos na doutrina pontifícia para não aceitarmos as limitações propugnadas por um não se sabe que novo cristianismo progressista, as quais vulneram o direito de possuir nascido da própria natureza. Deixar este último, com efeito, ao sabor de dispositivos legais imprecisos e indeterminados, de medidas como a desapropriação pelo chamado interesse social, quando feita sem causa justa e demonstrada, ou ainda sem indenização correspondente ao valor real e feita em tempo hábil, é mutilá-lo no que lhe é essencial. Os Papas, que tanto e tão energicamente salientaram o papel que a propriedade privada tem na sociedade, jamais a reduziram a mera função social.

— Amar os pobres não é odiar os ricos

Amemos, pois, desveladamente os pobres, sejamos seus protetores, defendamos seus direitos — salvando sempre, porém, os direitos das outras camadas da sociedade, porque a felicidade do corpo social está na harmonia de todas as classes, com seus direitos e deveres, e não na supremacia de uma sobre outra, tripudiando sobre a lei moral.

— A laicidade favorece a seita marxista

Nesta mesma ordem de idéias, convém fazer algumas reflexões a respeito do falseamento freqüente dos movimentos destinados a ajudar e defender os operários, trabalhadores rurais, empregados domésticos, enfim, a classe dos que ganham dignamente seu pão com o trabalho assalariado.

Qualquer iniciativa no sentido de elevar essa classe espiritual, cultural e moralmente, é digna de todos os encômios. Assim também os movimentos que se propõem a defesa dos legítimos direitos dela nas relações com os empregadores. Há de aqui, porém, levar-se em conta, primeiro, que em tais movimentos, vistos em seu conjunto, jamais se deve recusar a primazia à parte espiritual e moral. Se eles cuidarem apenas da parte econômica, no fundo estarão auxiliando a difusão dos erros comunistas, uma vez que estes afirmam precisamente que são os fatores econômicos os únicos que realizam todo progresso, mesmo cultural e, enquanto não se pode acabar inteiramente com as crenças, até religioso. É isso falso, e uma campanha em prol das classes menos favorecidas da fortuna, que não sublinhasse essa falsidade, estaria indiretamente beneficiando o comunismo. Por semelhante razão, lamentamos profundamente o caráter laico dos nossos sindicatos, quer de empregados, quer de patrões. Posta de lado a influência direta da Religião, resulta impossível resolver os problemas sociais dentro dos quadros da civilização cristã, baseada em valores espirituais, aos quais os econômicos devem estar subordinados, como meros auxiliares.

— A tendência a igualar as condições de patrões e empregados serve o comunismo

É por esse esquecimento dos valores espirituais que freqüentemente as reivindicações operarias descambam para a exigência de uma igualdade absoluta de direitos entre empregados e empregadores. Coisa em si absurda, uma vez que o próprio contrato de trabalho supõe duas situações distintas, cada qual com seus direitos legítimos, não porém os mesmos, pois que se fossem os mesmos nem sequer seria possível contrato. Quando duas pessoas contratam é porque não têm os mesmos direitos: a uma falta o que a outra tem, e o contrato é feito precisamente para que se completem, se auxiliem reciprocamente, ficando ambas satisfeitas, conservando, porém, cada qual, seus direitos. As campanhas a favor dos direitos dos operários e empregados em geral, com tendência a igualar as situações, servem aos comunistas, cujo ideal é a supressão da diversidade de classes sociais. Eis, pois, um campo em que a defesa de direitos autênticos e até sagrados pode prestar-se, nas condições em que vivemos, à exploração da seita marxista.

Ao cuidar dos operários é preciso marcar bem a função que eles têm na sociedade, função digníssima e deles própria, que bem desempenhada os leva a dar seu contributo indispensável para o bem comum, e que no entanto será fundamentalmente viciada se, corroídos de inveja porque lhes não coube outra posição mais elevada, vierem a sabotar a tarefa que executam, ou a colaborar em movimentos que provocam a desordem no campo econômico-social. Com semelhante procedimento, eles prejudicariam a sociedade toda, e a si mesmos, espiritual e materialmente.

— Sem o concurso das virtudes cristãs nada se fará de útil para os pobres

Não é preciso insistir para que se veja como as reivindicações operarias — tão legítimas e simpáticas — quando feitas nesse espírito ajudam poderosamente a criar ambiente favorável ao comunismo e contrário à civilização cristã. Esta é feita das grandes virtudes sociais, a obediência, a humildade e o amor. Virtudes que falam em desapego e dedicação. Virtudes não só dos operários, mas também dos patrões. Virtudes cujo concurso assegura que as reivindicações operarias, por mais categóricas e enérgicas que sejam, jamais se transformarão em fator de desordem social. Virtudes que, se vierem a falhar, nem se obterá a salvação eterna, razão por que fomos criados, nem a paz e a prosperidade social, motivo por que existe a sociedade civil. Sem elas domina a inveja, a desconfiança, o ódio, causas da desagregação social, sobre a qual lança o manto negro da tirania, o despotismo moscovita.

— o desvirtuamento dos documentos pontifícios aproveita aos comunistas

Ainda neste assunto, queremos fazer uma última advertência aos Nossos amados filhos, pondo-os de sobreaviso com relação à maneira como, por vezes, se interpretam os ensinamentos pontifícios que tratam das questões sociais.

Como é sabido, os Papas, especialmente Leão XIII e Pio XI, se ocuparam dessas questões em documentos solenes, entre os quais as famosas Encíclicas «Rerum Novarum» e «Quadragesimo Anno». Neles, a par das obrigações, registram-se e defendem-se também os direitos dos operários. Por este lado, podem os comunistas e comunistizantes abusar dos próprios documentos eclesiásticos. É preciso, pois, ao fazer deles uso, cuidar que nossa atitude não venha a favorecer a consecução de objetivos socialistas e comunistas. Cautela tanto mais oportuna, quanto é freqüente em certos movimentos sociais salientar-se apenas a parte econômica desses ensinamentos pontifícios, deixando-se em segundo plano, ou inteiramente no esquecimento, a insistência dos Papas sobre o indispensável revigoramento da Fé, a imprescindível reforma dos costumes, e outros meios de ordem espiritual necessários para que se elimine a inquietação provocada pela economia laica moderna. Além disso, mesmo na parte econômica, é comum apegarem-se muitos ao que é acidental e até marginal nas Encíclicas, como se fora o núcleo central, o objetivo primeiro delas.

— Exemplo: o alarido em torno da co-gestão e da participação nos lucros

É o que se dá, por exemplo, com a participação dos operários nos lucros das empresas, preconizada na «Quadragesimo Anno» (cf. A. A. S., vol. 23, p. 199). Fala o Papa de modo opinativo — «Julgamos que dentro do possível» — e incidentemente, pois que se pode tirar todo o trecho, sem que se mude em nada o sentido da Encíclica. E, não obstante, faz-se tanto alarido em torno desse ponto — erigido até em programa de partidos políticos que pretendem ser cristãos — como se constituísse a grande lição da «Quadragesimo Anno». Não forçamos a expressão. Mais ou menos por toda parte, como que sob uma palavra de ordem, difundiu-se essa opinião.

Tanto assim que Pio XII se sentiu na obrigação de dar ao trecho em questão o seu justo valor dentro da Encíclica e da doutrina de seu Predecessor. Fê-lo em várias oportunidades. Citemos uma: a alocução que dirigiu em 3 de janeiro de 1952 ao Conselho Nacional da União Cristã dos Diretores de Empresa. Advertiu então o Pontífice: «Fala-se hoje muito de uma reforma de estrutura da empresa, e os que a promovem pensam em primeiro lugar em modificações jurídicas entre os que dela são membros, sejam os empresários, ou os dependentes incorporados na empresa em virtude do contrato de trabalho.

«A Nossa consideração não podiam escapar as tendências que se infiltram em tais movimentos, as quais não aplicam — como se aduz — as incontestáveis normas do direito natural às condições mudadas do tempo, mas simplesmente as excluem. Por isso, em Nosso discurso de 7 de maio de 1949 à União Internacional das Associações Patronais Católicas, e no de 3 de junho de 1950 ao Congresso Internacional de Estudos Sociais, Nos opusemos a tais tendências, não tanto, na verdade, para favorecer os interesses materiais de um grupo antes que os de um outro, mas para assegurar a sinceridade e a tranqüilidade de consciência de todos aqueles a quem se referem estes problemas.

«Nem podíamos ignorar as alterações com as quais se deturpavam as palavras de alta sabedoria de Nosso glorioso Predecessor Pio XI, atribuindo o peso e a importância de um programa social da Igreja, em nosso tempo, a uma observação totalmente acessória sobre as eventuais modificações, jurídicas nas relações entre os trabalhadores sujeitos ao contrato de trabalho e a outra parte contratante» («Dircorsi e Radiomessaggi», vol. 13, p. 465). Mais tarde, em 14 de setembro do mesmo ano de 1952, na já citada rádio-mensagem aos católicos austríacos, torna o Papa a dizer que a Igreja se recusa terminantemente a deduzir do contrato de trabalho qualquer direito do empregado à co-direção ou à co-propriedade da empresa (cf. «Discorsi e Radiomessaggi», vol. 14, p. 313).

Pretender, pois, impor tais participações, como se constituíssem exigência da doutrina da Igreja, é um erro que favorece o ambiente de agitação e antagonismo de classes propicio à consecução dos objetivos comunistas. É ainda que inconscientemente, colaborar com o maior inimigo da civilização cristã.

Ao estudo e à difusão das Encíclicas aplica-se o axioma dos escolásticos: «bonum ex integra causa, malum ex quocumque defectu». Assim, a doutrina delas é doutrina de salvação quando tomada na sua integridade harmoniosa, e pode produzir péssimos frutos quando mutilada pela consideração de uma só parte isolada do todo. Nas relações com patrões e operários, não nos esqueçamos do exemplo do Filho de Deus. Jesus amou os pobres, deles Se compadeceu, aliviou-lhes as misérias. Nem por isso desprezou os ricos, que Ele também veio salvar. Assim, dedicou profunda amizade à família rica e principesca de Lazaro, Marta e Maria, em cuja casa gostava de repousar das labutas do apostolado.

— Distinção ardilosa: combater o comunismo, não porém os comunistas

Passemos a considerar outros ardis que o inimigo semeia em nosso caminho. Há uma distinção que não raro ilude a boa fé dos não comunistas. É a que se costuma fazer entre comunismo e comunistas. Todos os ódios se voltariam contra aquele, e para estes só haveria tolerância e compaixão. Distinção semelhante se faz com freqüência entre o erro e os que erram, segundo a frase atribuiria a Santo Agostinho: «Interficite errores, diligite errantes». Sem nos determos no verdadeiro pensamento do Doutor da Graça — bastante inteligente para perceber que o erro não tem existência senão por alguém que o professa, e por isso mesmo só desaparece com a conversão ou com o desaparecimento desse alguém — sem nos determos, portanto, na consideração do verdadeiro sentido do axioma atribuído a Santo Agostinho, observamos que, aplicado ao comunismo, ele é sempre perigoso.

De fato, em outras heresias há a possibilidade de se encontrarem pessoas de boa fé, que, tendo se enganado na busca da verdade, aceitam todavia os primeiros princípios da razão, e cuja conversão, portanto, pode ser eficazmente auxiliada por uma elucidação ideológica. Não assim no comunismo. Este, negando o princípio de contradição, torna impossível uma discussão de ordem intelectual. Por isso mesmo, Pio XI, na «Divini Redemptoris», praticamente não distingue entre o comunismo e os comunistas. Assim, menciona os princípios do comunismo como aparecem nas instituições e métodos dos bolchevistas (cf. A. A. S., vol. 29, p. 69); a doutrina dos comunistas (p. 75); os preceitos que estes difundem (p. 69); os erros e meios violentos dos bolchevistas (p. 76); quando se refere à completa e total emancipação da mulher, fala da doutrina dos comunistas e não do comunismo (p. 71); do mesmo modo, quando atribui aos comunistas o princípio da tirania da coletividade (p. 71); refere-se outrossim ao evangelho que os comunistas, bolchevistas e ateus anunciam (p. 72), ao poder político como meio de que os comunistas se apoderam para conseguir seu fim (p. 72); e em geral, onde normalmente se falaria de comunismo (como aliás se vê em várias traduções da «Divini Redemptoris»), o Papa não usa o termo abstrato para indicar a doutrina, mas o concreto que aponta as pessoas dos comunistas, aos quais ele diretamente acusa (p. 77).

De onde é lícito deduzir um especial cuidado do Santo Padre em prevenir os fiéis contra a pessoa dos sequazes de Marx, apontando-lhes o engodo que representa essa distinção entre comunismo e comunistas. Podemos, pois, concluir, e na conclusão fazer uma paterna advertência aos Nossos amados filhos em Jesus Cristo. Os verdadeiros comunistas rejeitam os primeiros princípios da lógica e os próprios fundamentos da ordem moral; são pessoas por cuja conversão se deve rezar, sem dúvida, e muito, mas em quem não se pode, de maneira nenhuma, confiar, e cuja ação se deve temer e combater.

— Há comunistas e comunistas

Uma distinção melhor caberia entre comunistas e comunistas. Pois, de fato, nem todos os que se encontram sob o jugo soviético, na Rússia e satélites podem ser considerados comunistas. Há, nessas infelizes nações, um número enorme de indivíduos, a maioria, que gemem debaixo do domínio cruel a que os comunistas os submeteram pela força. Esses tais só com uma grave injustiça se poderiam chamar de comunistas. Eles detestam o regime que sofrem em silêncio porque não lhes é facultado externar seu pensamento. Além desses, quer nos países de atrás da cortina de ferro, quer nos do chamado mundo livre, não são poucos os que aderiram ao partido comunista sem lhe conhecer toda a perversa doutrina e iludidos por enganosas esperanças. Deles, muitos o abandonaram já (na França, de um milhão de aderentes que contava o comunismo em 1945-1946, não restam hoje mais do que duzentos mil), outros ainda não se animaram a esse passo decisivo. De verdadeiros comunistas sobra uma pequena minoria (4% da população na Rússia), porém ativa e audaz, que poderosamente coadjuvada pela boa fé de muitos não comunistas, e intencionalmente por não poucos dos chamados cristãos progressistas, cuja mentalidade só na aparência difere da marxista, constitui o maior perigo atual para a civilização cristã (cf. Enc. «Divini Redemptoris», ibid., pp. 66 e 76).

Tenhamos, pois, compaixão dos que sofrem sob o despotismo vermelho, bem como daqueles que a seita iludiu. Ao mesmo tempo, estejamos sempre em guarda contra os manejos e ardis dos comunistas. A vigilância juntemos a oração para que Deus nos proteja e os converta. Todos sejam abraçados pela caridade de nossa alma, traduzida em preces, sacrifícios e boas obras.

— Dupla vantagem em expor a tática comunista

Quisemos, com a exposição da tática e dos ardis dos marxistas, proporcionar-vos, amados filhos, duas vantagens: de um lado, esclarecer-vos sobre o modo de combater o terrível inimigo; de outro, prevenir-vos a respeito do triste papel desempenhado a favor dele por aqueles que se dizem, muitas vezes, seus adversários. Cumpre ainda pôr em relevo a malícia do comunismo, considerado em si mesmo, e não mais em seus ardis e suas táticas.

 

III - Causas do alastramento do comunismo

— Uma objeção capaz de embaraçar

Poderia, diletos filhos, embaraçar-vos uma dificuldade. Sendo o marxismo intrinsecamente mau, e a natureza humana feita para o bem, como explicar a rápida e prodigiosa expansão dele? Já em 1937 registrava Pio XI «as falácias do comunismo espalhadas em todos os países, grandes e pequenos, cultos ou menos desenvolvidos, a ponto de que nenhum canto da terra estivesse delas imune» (Enc. «Divini Redemptoris», ibid., p. 74). Hoje, só um cego não vê as enormes conquistas da seita marxista, que alcançou o domínio político em várias nações da Europa bem como em grande parte da Ásia, e vai alimentando agitações crescentes nos demais países tanto do Velho como do Novo Continente. Como explicar tão rápida difusão de um movimento celeradíssimo (cf. Enc. cit., ibid., p. 75)?

— Promessas alucinantes

A Encíclica «Divini Redemptoris» aponta várias causas para o fato, que hoje ainda são atuantes. Declara o providencial documento que «muito poucos conseguiram perceber o que intentam os comunistas» (ibid., p. 72), ao passo que a grande maioria — menos afeita ao estudo apurado das questões — «cede à tentação, habilmente preparada, sob forma de alucinantes promessas» (ibid.). E realmente, o comunismo, que no começo se mostrou qual era, desde que percebeu que assim afastaria de si os povos, «mudou de tática e procura ardilosamente seduzir as multidões com uma linguagem dúbia e alguns objetivos imediatos atraentes» (ibid., p. 95). Apresenta-se desde então como desejoso de «melhorar a sorte das classes trabalhadoras, de eliminar os abusos causados pelos assim chamados liberais, e de obter mais equitativa distribuição dos bens terrenos» (ibid., pp. 72-73).

— Crises econômico-sociais

Além disso, a eclosão de crises econômico-sociais cada vez mais sérias propicia ao marxismo ocasião para ampliar sua influência. Assim é que ele penetrou em classes por princípio avessas a qualquer materialismo ou terrorismo (cf. Enc. cit., ibid., p. 73).

— Liberalismo

A responsabilidade pela difusão dos erros comunistas recai largamente — se bem que não de modo exclusivo, como querem os progressistas — sobre o liberalismo laicista. Ele pretendeu construir a cidade sem Deus, e terminou preparando o terreno para os demolidores de qualquer sociedade digna deste nome. Mediante o abandono moral e religioso a que votou os operários, pelas dificuldades que lhes criou para a pratica da piedade, pelos obstáculos surdamente levantados contra a ação dos ministros de Deus, os Sacerdotes, pelo fomento das instituições de assistência laicas — hoje disseminadas e aprovadas praticamente em todos os países do mundo livre — o liberalismo concorreu poderosamente para contaminar o operariado com as concepções revolucionarias dos comunistas (cf. Enc. cit., ibid., p. 73).

— Forças secretas

Cabe ainda considerar a obra das forças secretas, que de há muito procuram destruir a ordem social cristã (cf. Enc. cit., ibid., pp. 74-75). Intimamente relacionada com a atividade delas, está a campanha do silêncio com relação às obras anticomunistas, e a «propaganda verdadeiramente diabólica, como talvez o mundo nunca viu» (Enc. cit., ibid., p. 74), de que se beneficia o comunismo. «Propaganda dirigida por um único centro, mas que muito habilmente se adapta às condições dos diversos povos; propaganda de grandes recursos financeiros, de gigantescas organizações, de congressos internacionais, de inúmeras forças bem adestradas; propaganda que se faz por meio de folhas avulsas e revistas, nos cinemas, nos teatros, pelo rádio, nas escolas e até nas universidades, penetrando pouco a pouco em todas as classes sociais, ainda as melhores, sem quase perceberem elas o veneno que sempre mais lhes corrompe a mente e o coração» (Enc. cit., ibid., p. 74).

 

IV - Conclusão

1. O comunismo, inimigo de morte da Religião

Os comunistas exploram uma realidade social: as injustiças, as misérias, os sofrimentos que acompanham a humanidade e a dividem hoje em dia em dois campos opostos, o dos infelizes e desgraçados, e o dos ricos e gozadores. Com isso o marxismo adquire visos de verdade aos olhos dos que consideram as coisas superficialmente.

— O plano do Criador e a Redenção

Essa realidade, diz-nos a Revelação, é conseqüência do pecado original, triste herança de nossos primeiros pais. A existência, portanto, desses males não é intrínseca à natureza humana, e sim algo de acidental que lhe sobreveio devido ao abuso do livre arbítrio com que o Criador a dotou. Não foi o homem criado assim. Deus no começo o fez reto, isto é, com domínio das paixões que, subordinadas, deveriam servir à ordem racional, e dar amenidade e doçura ao convívio social, pois «no plano do Criador, a sociedade seria o meio natural de que o homem deveria utilizar-se para alcançar os seus fins, e isso não no sentido individualista do liberalismo, mas mediante a união orgânica de todos na sociedade, por mutua estima e colaboração, a fim de nela se aperfeiçoarem as qualidades individuais e sociais que pairam acima do interesse imediato, e na sociedade reproduzem a imagem da divina perfeição». Teria assim o homem, na sociedade, «o reflexo da perfeição divina que o levaria ao louvor e adoração do Criador» (Enc. cit., ibid., p. 79).

Esta ordem admirável que estava nos desígnios divinos foi perturbada pelo orgulho humano, que sobrepôs o homem ao seu Senhor. Jesus Cristo, porém, na sua inefável misericórdia, reparou-a com sua obediência até a morte, destruindo na cruz o quirógrafo de nossa condenação (cf. 1 Cor. 2, 14). De sorte que, embora na peregrinação por este mundo carregue consigo as conseqüências do pecado original, tem o homem sempre a possibilidade de vencer as desordens oriundas da primeira culpa, pela graça de Jesus Cristo, que o leva a imitar a vida de amor e penitência de seu Divino Mestre.

— O comunismo acena com outra redenção

A essa, luminosa e apaziguadora doutrina, a seita marxista opõe um plano diametralmente contrário. Enquanto o cristão se esforça por destruir a obra do tentador, ela propugna a concepção falsa proposta pelo demônio a nossos primeiros pais no Paraíso. O comunismo, além de negar a existência de Deus e do espírito, para só aceitar a matéria, afirma que a desarmonia é intrínseca à natureza do homem e do universo. A luta interna das coisas, e por conseguinte também da sociedade, é mesmo a causa de sua evolução e progresso.

De onde, em vez de buscar a solução para o conflito social na ordem moral, pelo mutuo amor que aplaina as discórdias e as resolve na harmonia das classes, o comunismo acena com outra redenção do gênero humano, que se obteria exacerbando as desarmonias, fomentando as discórdias entre as classes da sociedade, até a destruição destas e o nivelamento total. Enquanto, pois, a Igreja busca a conciliação, a organicidade de partes desiguais num todo harmônico que espelhe a perfeição divina, o comunismo estimula precisamente o contrario, a oposição e a desagregação, a subversão enfim do plano de Deus a respeito do homem e da sociedade. A Igreja, fiel a Jesus Cristo, tem como base de ação o amor, reflexo daquela caridade que levou o Divino Redentor a derramar seu sangue pelo mundo, a dar a vida pelos homens. O comunismo age em função do ódio que destrói e elimina as classes em que ordenadamente Deus dividiu a sociedade. A beleza do plano divino, de subordinação e coordenação dos diversos elementos no todo, opõe o comunismo a recusa terminante de reconhecer a ordenação da obra de Deus. É ele a renovação na terra do «non serviam» que precipitou do Céu os anjos maus e criou o inferno. Não é possível conceber-se oposição mais radical, carência mais absoluta de condições para qualquer coexistência. Por isso mesmo, os comunistas jamais cessarão a luta enquanto não tiverem escravizado a humanidade inteira. Planos de paz, propostas de coexistência pacífica com o mundo ocidental — no qual ainda palpita algo da antiga Cristandade — só visam a obter armistícios em que a seita cinicamente se prepare para novas e vitoriosas arrancadas.

— Não há seita mais radicalmente anti-religiosa

Não há apenas uma divergência ideológica entre Cristianismo e comunismo. Há um antagonismo de morte. Proclamou-o Lenine: «O marxismo não é um materialismo que se limita ao ABC. O marxismo vai mais longe. Ele diz que é preciso saber lutar contra a religião (...), que é preciso fazer desaparecer as raízes sociais da religião» («De la Religion», 1933, p. 15 — apud «Itinéraires», de Paris, n.° 52, p. 99).

De fato, não é só no conceito que tem da natureza humana, na explicação que dá para os egoísmos antagônicos em conflito na sociedade, na falsa redenção do gênero humano que apresenta, que o comunismo contradiz fundamentalmente as verdades reveladas. O mundo ainda não viu, e talvez jamais veja, seita mais radicalmente anti-religiosa que o comunismo. Ele nega até os fundamentos da religião natural. «Pela primeira vez na Historia assistimos a uma luta friamente voluntaria e cuidadosamente preparada pelo homem contra tudo o que é divino (2 Tes. 2, 4)» (Enc. cit., ibid., p. 76).

2. Comunismo, a pior das barbáries

Por esse motivo, o comunismo conduz a humanidade à pior das barbáries (cf. idem, ibid.). De fato, fora da Revelação puderam certos povos observar no convívio social os princípios que a luz natural lhes evidenciava, e assim lograram chegar a alguma grandeza, que ainda hoje deslumbra a certos estudiosos superficiais da história humana (cf. idem, ibid.). Mas, sem aceitar os princípios da lei natural, não há freio para as paixões, toda crueldade é admissível, é o reino da barbárie propriamente dita. Acreditamos, à vista desses fatos, que o comunismo, afastando o mundo do reconhecimento das normas jurídicas da ordem natural, prepara a vinda do Anticristo de acordo com a profecia de São Paulo (cf. 2 Tes., 2, 6).

3. Exortações

a. Não cair nos ardis do adversário

As considerações acima, amados filhos, que podeis ver mais desenvolvidas na Encíclica «Divini Redemptoris» do saudoso Papa Pio XI, mostram a gravidade da situação em que nos encontramos e a imensa responsabilidade de quem aceita qualquer colaboração com o comunismo.

Evitai, portanto, nos empreendimentos e nos escritos em defesa das classes menos favorecidas, tudo o que possa nelas excitar a antipatia, o ódio contra as classes superiores. Não patrocineis reivindicações que se inspirem na inveja, no desejo insofrido de sacudir qualquer subordinação, pois sem a obediência e a humildade é impossível o convívio social, não pode haver harmonia entre superiores e subordinados, como o quer a Igreja e o exige uma sociedade bem ordenada. Falando aos operários, lembrai-lhes em toda a extensão seus legítimos direitos, e não deixeis de recordar-lhes seus deveres, cujo cumprimento é indispensável para justificar a reivindicação dos direitos.

b. Luta ideológica vigorosa

Consideremos, por fim, de acordo com a memorável Encíclica «Divini Redemptoris», os remédios e as armas de defesa contra a invasão da mentalidade marxista.

Primeiramente, através da imprensa católica e por outros meios de difusão do pensamento, é preciso, de um lado, desvendar as verdadeiras intenções dos comunistas, precatando os que não o são contra a astucia e os enganos com que eles procuram, e muitas vezes conseguem, atrair pessoas de boa fé (cf. Enc. cit., ibid., p. 95); de outro lado, cumpre explanar e tornar sempre mais conhecida a doutrina autêntica da Igreja, entrosando a parte social no conjunto das verdades e práticas de toda a economia da Redenção, não aconteça que uma hipertrofia do social falseie o espírito cristão.

c. Recusa de qualquer cooperação

Evite-se, depois, qualquer colaboração com os comunistas, com os movimentos que favorecem as idéias comunistas, e até com os movimentos paralelos, desde que estes não sigam as normas recordadas nesta Nossa Carta Pastoral. Sem isso não poderá ninguém dizer que toma todo o cuidado para não ser contaminado pelo espírito materialista do comunismo.

d. Desapego dos bens terrenos

Insistamos muito, por isso mesmo, sobre o amor ao próximo e o desapego dos bens terrenos, como nos ensinou Jesus Cristo. Desapego dos bens terrenos, objeto da primeira bem-aventurança — «bem-aventurados os pobres de espírito porque deles é o reino dos Céus» (Mat. 5, 2) — sem o qual é impossível escapar ao contágio da mentalidade materialista difundida na sociedade hodierna. Desapego necessário quer aos pobres, para aceitarem de boa mente sua pobreza e semelhança maior com o Divino Redentor; quer aos ricos, para fazerem bom uso de suas riquezas, inclusive em largas esmolas em benefício dos necessitados e em outras obras pias. Desapego necessário aos trabalhadores, para que não ponham seus anseios de felicidade nos efêmeros prazeres deste mundo que as riquezas proporcionam, não venham a se deixar corroer pela inveja que infelicitará seus corações e os levará a faltar aos seus deveres. Desapego indispensável aos empregadores, para que satisfaçam larga e alegremente às suas obrigações de caridade e de justiça social, — dessa justiça social, cumpre mais particularmente notar, a que não podem subtrair-se nem patrões nem operários (cf. Enc. cit., ibid., p. 92), mas que urge especialmente os patrões, uma vez que as condições destes os tornam mais responsáveis pelo que é necessário ao bem geral (cf. idem, ibid.).

O desapego dos bens terrenos é tão indispensável na prática, que deve ser objeto freqüente da pregação, pois que é a miragem das riquezas, habilmente proposta pelos comunistas, que ilude os incautos e alicia as classes mais modestas. É acenando com o paraíso soviético, que pertence a esta terra (cf. idem, ibid., p. 76), que os sectários de Marx afastam os operários da prática da Religião; ao passo que os princípios religiosos que se referem ao além-túmulo dissuadem o proletário de ter por fim a consecução do bem-estar neste mundo (cf. idem, ibid.).

e. Desejo dos bens celestes

Insisti muito na esperança cristã. É ela virtude básica da vida do fiel. «Nostra conversatio in caelis est», adverte São Paulo (Filip. 3, 20), precisamente porque nesta terra devemos viver da esperança dos bens eternos. E é especialmente contra essa virtude que se levanta o comunismo. Nada teme ele mais do que o cristão bem ancorado na firme esperança do Céu. Esteja esta, pois, presente em todos os movimentos em prol das classes menos favorecidas. É sumamente pernicioso, mesmo sem negar os dogmas da fé, habituá-las a buscar contínua e quase exclusivamente melhorias das suas condições de vida terrena. Este exclusivismo vai empalidecendo nas almas a esperança dos bens futuros, de maneira a não mais servir ela de estímulo à pratica das grandes virtudes. E sem estas não há felicidade nem mesmo na terra.

f. Espírito hierárquico

Ao lado desse indispensável desapego dos bens perecíveis, iluminado pelas claridades celestiais que a esperança cristã alimenta em nossas almas, é preciso insistir muito sobre a hierarquia social, parte integrante da doutrina católica. Mesmo nas democracias, Pio XII quer que a sociedade respeite a diversidade de classes criada pela fortuna, pela tradição e outros fatores legítimos (Rádio-mensagem de Natal de 1944, «Discorsi e Radiomessaggi», vol. 6, p. 239). No espírito hierárquico, ensina o mesmo Pontífice, deve ser formada a infância e a mocidade (cf. Rádio-mensagem de 6-10-1948 ao Congr. Interameric. de Educ. Cat., «Dircorsi e Radiomessaggi», vol. 10, p. 247). Sem esse espírito, é praticamente impossível o exercício das virtudes da obediência e da humildade, indispensáveis quer para o amável convívio social, quer para a assimilação viva da doutrina de Jesus Cristo, feito obediente até a morte de cruz (cf. Filip. 2, 8).

g. Renovação da vida cristã: a mensagem de Fátima

Por todas estas considerações se vê que «o remédio fundamental (contra o comunismo) é a renovação sincera da vida particular e pública conforme os princípios do Evangelho» (Enc. «Divini Redemptoris», ibid., p. 86). E aqui fazemos Nossa uma advertência do Papa, para dizer que ela tem toda aplicação em Nossa Diocese: «Numerosos são os católicos só de nome e os que, seguindo embora mais ou menos fielmente as práticas mais essenciais da Religião que se ufanam de professar, não cuidam todavia de conhecê-la melhor, de adquirir mais profunda convicção, e, menos ainda, de trabalhar por que ao verniz externo corresponda o brilho interior de uma consciência reta e pura, que sente e cumpre todos os deveres sob os olhares de Deus» (Enc. cit., ibid., p. 87). Nas condições atuais, paternalmente admoestamos os Nossos caríssimos filhos que não basta a prática da vida cristã comum, ordinária em tempos normais.

Todos os meios poderosíssimos, de que se utiliza o comunismo para difundir-se por toda parte, não teriam eficácia alguma se não houvesse esfriado a nossa fé, se não tivesse diminuído o fervor com que os discípulos de Cristo seguiam o exemplo de austeridade do Divino Mestre. Não se tivessem estiolado as verdades nos filhos dos homens — «diminutae sunt veritates a filiis hominum» (Sl. 11, 2) — vivessem os católicos a integridade de sua Fé, e não encontrariam campo favorável os meios de ação de que dispõe o comunismo, por mais poderosos que fossem.

Atendendo ao pedido que a Mãe das Misericórdias fez com insistência em Fátima, entreguemo-nos à oração e à penitência. Oração e penitência, partes integrantes da vida cristã, constituem remédios particularmente eficazes em situações críticas para a vida do fiel e da Igreja. Elas devem ser intensificadas atualmente, dadas as condições angustiosas em que se encontra a Igreja em muitos países, devido às ameaças cada vez maiores do comunismo bárbaro e ateu. «Espírito de oração e penitência cristã», recomenda Pio XI (Enc. «Divini Redemptoris», ibid., p. 96), porque o comunismo é daquele gênero de demônios que não se expulsam senão pela oração e pelo jejum (cf. Mat. 17, 20).

h. Consagração ao Imaculado Coração de Maria

Queremos recomendar muito especialmente a consagração das pessoas, das famílias e das paróquias ao Imaculado Coração de Maria. Pelas palavras da própria Mãe de Deus em Fátima, vemos quanto Lhe é agradável esse ato de piedade filial. Consagração que se deve renovar sempre, e deve ser vivida na existência quotidiana, pela austeridade dos costumes, pela prática fiel dos Mandamentos, pela fuga vigilante das ocasiões de pecado, e pela confiança inabalável na proteção da Virgem.

i. Palavras afetuosas e confiantes, ao Revmo. Clero

Uma exortação paternal e afetuosa, cheia de confiança, aos Nossos caríssimos Cooperadores, os Sacerdotes que na Diocese mourejam na vinha do Senhor. Certo de que a piedade, o temor de Deus e a virtude do povo fiel se modelam pelo exemplo do pai espiritual, o Sacerdote encarregado de guiá-lo na senda do Céu, lembramos aos Nossos caríssimos Padres que se empenhem eles mesmos em levar uma vida austera, abnegada, de orações e sacrifícios, de maneira a edificarem sua grei pelo esplendor de suas virtudes. As dificuldades peculiares do ministério nas condições de Nossa Diocese sejam-lhes incentivo para se desapegarem sempre mais das coisas terrenas, e para se fixarem na esperança da mercê eterna. Essas mesmas dificuldades nos sirvam, a vós, caríssimos Cooperadores, e a Nós que também com elas arcamos, para nos estimular à fidelidade à nossa vocação, «in sortem Domini vocati» (Conc. Trident., sess. 22).

4. Benção final

É com esta esperança, caríssimos filhos, que vos damos, a vós, Sacerdotes que aliviais o peso de Nossa cruz, e a vós, ovelhas que o Vigário de Cristo confiou à caridade de Nosso coração, Nossa muito afetuosa benção pastoral † em nome do Padre † e do Filho † e do Espírito Santo.

Dada e passada em Nossa episcopal cidade de Campos, sob selo e sinal de Nossas armas, aos 13 dias do mês de maio de 1961, 44° aniversario da primeira aparição de Nossa Senhora do Rosário, em Fátima.

† Antonio, Bispo de Campos

Notas

1 - A dialética da ação comunista foi exposta com maior desenvolvimento por Jean Madiran em «Itinéraires», de Paris, n. 52, pp. 47 ss., artigo «La pratique de la dialectique». O Revmo. Pe. Julio Meinvielle tratou da técnica de difusão do comunismo na primeira parte de uma conferência pronunciada no Instituto Juan Bautista Bustos, de Córdoba, Argentina, em 21-XI-1960, que «Avanzar», de Madrid, revista dos Cooperadores Paroquiais de Cristo-Rei, publicou em seu número de março deste ano, pp. 58 ss., sob o título: «Conozcamos la táctica comunista — Un ejemplo prático do la dialéctica de la acción — Como se propaga el comunismo en Argentina». Sobre o mesmo assunto, se lerá com fruto o livro de Jean Ousset, «Marxisme-Leninisme», edição «La Cité Catholique», 1960; o mesmo se diga da obra do Revmo. Pe. F. Dufay, «L'Etoile contre la Croix», Hong-Kong - Paris, 1953.

2 - Veja-se a distinção entre «colaboração recíproca» e «convergência ocasional», que fizemos acima.


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