TFPs no epicentro do

 

mundo comunista

 

 

 

 

Catolicismo, N° 482, Fevereiro de 1991

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O que viram, ouviram e fizeram

TFPs no epicentro do mundo comunista

Dez dias no império gorbacheviano: diário de viagem da delegação das

TFPs pela Lituânia e Rússia.

"De Maria esperávamos o impossível. Uma parte Ela já realizou".

 

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A presente crônica é uma síntese de entrevistas com os 11 membros da delegação das TFPs, contidas em mais de 800 páginas datilografadas. E a delegação gravou em fitas magnéticas, que se encontram arquivadas, a íntegra dos discursos de autoridades religiosas e políticas lituanas, consignados nesta reportagem.

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2-12-90 - Chegada a Moscou

A delegação das TFPs, 11 membros, parte de Bruxelas pela manhã, em vôo da Lufthansa. Após escala em Frankfurt, chega a Moscou às 18.05 hs. O grupo viaja como convidado oficial do Parlamento da Lituânia. Aguardam no aeroporto moscovita, entre outros, o deputado Antanas Racas, membro da Comissão de Relações Exteriores do Parlamento lituano; representantes do International Lithuanian Center (Centro Internacional Lituano); e uma equipe da TV lituana.

O deputado Racas declara que a situação na Lituânia é tensa e a chegada da delegação, providencial.

Na sala VIP, reservada para a Nomenklatura (altos funcionários do regime comunista), a delegação é recebida pela primeira ministra lituana Kasimiera Prunskiene, que acaba de chegar do Exterior. Dirige ela, em português, palavras de boas-vindas e, em seguida, pronuncia um discurso em alemão sobre o delicado relacionamento político entre a Lituânia e o Kremlin.

Durante o jantar, na embaixada lituana em Moscou, chega o presidente da Comissão de Relações Exteriores do Parlamento da Lituânia, deputado Emanuellis Zingeris, procedente de Vilnius, trazendo uma mensagem de boas-vindas do Presidente daquela nação, Vytautas Landsbergis. O deputado agradece a presença da delegação, em um momento crucial para seu país.

À meia-noite, o Presidente Landsbergis procura por telefone o Dr. Caio Vidigal Xavier da Silveira, presidente da delegação das TFPs, a fim de cumprimentá-lo e agradecer a visita. Manifesta seu desejo de receber a delegação em Vilnius, sede de seu Governo. 

3-12-90 - No avião presidencial

Pela manhã, novo telefonema do Presidente Vytautas para Dr. Caio V. Xavier da Silveira, comunicando-lhe que enviará a Moscou o avião presidencial, a fim de trasladar a delegação a Vilnius. O vôo fica combinado para a noite.

Ao meio-dia, o programa oficial contempla uma visita ao Soviete de Moscou (Câmara Municipal). A comitiva se desloca em três automóveis da embaixada lituana, que estacionam no pátio interior do edifício.

Serve de anfitrião um jovem deputado que lhes mostra diversas dependências do prédio, construído antes da Revolução de 1917. A seguir realiza-se uma reunião com uma comissão de 12 deputados de orientação contrária ao Partido Comunista. O Dr. Luiz Daniel Merizalde, da TFP colombiana, explica o que são as TFPs e sua atuação doutrinária anticomunista. Vários deputados fazem perguntas e tomam notas. Em meio à reunião chega a TV lituana e, pouco depois, uma equipe da principal TV soviética. Membros das TFPs concedem diversas entrevistas.

As 23:30 hs. chegam a Vilnius (570.000 habitantes), no avião Yakovlev 40, do Presidente lituano. 

 

4-12-90 - Com o Chefe de Estado

Dr. Caio V. Xavier da Silveira narra o cordial encontro

"No dia 4, às 11:35 hs., somos introduzidos no amplo gabinete presidencial. Portamos todos nossas capas rubras, com o leão dourado das TFPs. Levamos conosco numerosas caixas de microfilmes com os cinco milhões de assinaturas de apoio à independência da Lituânia.

"O Presidente Vytautas dirige-se ao centro da sala, para cumprimentar-nos. Apresento-lhe cada membro da comissão. O encontro é muito cordial. O Presidente pronuncia um discurso de boas-vindas e agradecimento. Dele, destaco o seguinte trecho:

`Não esperava ver aqui um grupo tão maravilhoso de jovens de tantos continentes.... Entendo que estão representando muitos países e muitos continentes, e poder-se-ia mesmo dizer que estão representando o mundo ocidental.... Toda a Lituânia ficará agora sabendo de sua ação por nós. Cinco milhões de pessoas que nos apoiam, mais do que a população lituana (ri). Espero que sua mensagem atinja as consciências das pessoas no mundo todo.' Respondo com um breve histórico da campanha das TFPs, e termino com um `Teguivoia laisva Lietuva!' (Longa vida para a Lituânia livre!).

"Seguem-se trocas de presentes. Entregamos-lhe, primeiramente, um artístico pergaminho, com o texto da petição em prol da liberdade da Lituânia. O pergaminho possui uma única assinatura: a do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, inspirador da campanha. A seguir, lhe são apresentados os microfilmes. Depois um álbum com fotografias da campanha em 26 países, que o Presidente folheia detidamente e comenta. Por fim, uma árvore de artesanato brasileiro feita toda de topásios.

"É meio-dia. O Presidente Landsbergis assina um documento atestando a recepção oficial de um dos maiores abaixo-assinados da História.  Retribui com um álbum documentando as perseguições sofridas pelo povo lituano, e impondo a cada qual um distintivo com o cavaleiro lituano, símbolo da nação.

Logo após somos fotografados junto ao primeiro mandatário lituano, com a bandeira de sua nação e o estandarte da TFP (o mesmo que dois dias depois tremulará na praça Vermelha de Moscou).

"No final da audiência, de cinqüenta minutos, a fisionomia do Presidente reflete o contentamento pelo apoio recebido da opinião pública ocidental. A despedida é efusiva. Pouco depois, viajará ele para os Estados Unidos e Canadá. Um membro de nossa delegação lhe oferece a colaboração da TFP norteamericana.

Ao sair, meu olhar se fixa, em uma pequena mesa da sala, sobre expressiva imagem do Cristo Pintójelis, muito venerado pelos lituanos: coroado de espinhos, sentado e apoiando a cabeça em uma de suas sagradas mãos".

Às 19.00 hs a delegação retorna de trem a Moscou, no vagão do Presidente da Lituânia. 

5-12-90 – Em Moscou

9:30 hs, chegada à capital soviética. Contatos de imprensa e um giro pela cidade. 

6-12-90 – Grande ousadia

Fernando Antunez A., integrante da delegação das TFPs, relata o episódio altamente simbólico.

"Na quinta-feira, dia 6, às duas da tarde, saímos da embaixada lituana, nossa residência em Moscou, e nos dirigimos à praça Vermelha. Nosso guia explica que `vermelho', em russo, significa `belo' e que a praça já se chamava assim à época dos Czares.

"Sopra um vento gelado. O frio atinge alguns graus abaixo de zero. O céu está coberto, branco, prestes a nevar. Diante das cúpulas da Basílica de São Basílio revestimo-nos logo de nossas capas e desfraldamos o estandarte `belo' da TFP... A seguir, passando em frente à porta do Salvador (entrada principal do Kremlin) caminhamos em direção ao centro da praça. Adiante, à esquerda, divisa-se o sinistro mausoléu de Lênin...

"Reunimo-nos em torno do estandarte, de costas para as muralhas do Kremlin. Atônitos, os transeuntes detêm-se para olhar. Mas nada perguntam ou comentam, ensimesmados e absortos em seus próprios pensamentos. Muitos fotografam. Um turista sueco, desgrenhado, aproxima-se e, em inglês, comenta que parecemos pessoas perigosas. Afirma que somos fascistas, ao que nosso guia, apontando o túmulo de Lênin, lhe responde com ênfase: `O maior fascista da História é aquele que está deitado ali, sou lituano e sei o que estou dizendo!'"

"À distância, dá-se uma troca da guarda diante do túmulo de Lênin. O passo dos soldados - com algo de autômatos - é lento, frio, soturno.

"Guardas russos se aproximam: interpelar-nos-ão? Após instantes de dúvida, vemos que eles continuam seu caminho.

"O momento é especialmente solene. Esse estandarte que tremula representa valores da civilização cristã pelos quais estamos dispostos a dar nossas próprias vidas. E tremula não só no centro da praça Vermelha, no coração de Moscou, mas no epicentro mesmo do império comunista. Mal podemos esconder a emoção. Um sonho que parecia impossível começa a realizar-se. Rezamos pela conversão da Rússia, pela católica Lituânia, por tantas outras intenções. O primeiro brado — `Tradição, Família, Propriedade!' — é merecidamente em honra do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, inspirador das TFPs.

"Anoitece cedo no rigoroso inverno moscovita. Enquanto nos retiramos, caía uma chuva gelada".

Às 20.00 hs., realiza-se a segunda viagem a Vilnius, no vagão presidencial da Lituânia. 

7-12-90 - Capela de São Casimiro

Às 7.30 hs, chegada a Vilnius. É a primeira sexta-feira do mês. Os membros da delegação desejam comungar, tendo a satisfação de fazê-lo na capela de São Casimiro, Patrono da Lituânia, na Catedral, por sugestão do Bispo de Mariampole, que viaja com eles desde Moscou. Da estação ferroviária todos se dirigem para ali.

A capela de São Casimiro, patrono da Lituânia, construída com belos mármores, contém no centro do altar-mor uma urna de ouro e prata com as relíquias do Santo. No recinto, chamam também a atenção oito magníficas estátuas de prata em tamanho natural de reis e grão-duques.

A Catedral, transformada em depósito durante os primeiros tempos da ocupação comunista e, mais tarde, em museu, foi devolvida ao culto em 1989.

Nessa capela, na presença dos Bispos de Vilnius e Mariampole, um sacerdote explica aos fiéis a campanha das TFPs, em favor da Lituânia e agradece em nome de SãoCasimiro. Os fiéis cantam; e os membros da delegação também: Ave Maris Stella, Anima Christi, Salve Regina... Na saída, o público se aproxima para cumprimentar. Uma senhora, emocionada, comenta que a campanha de assinaturas das TFPs é o começo da salvação para a Lituânia, brutalmente pressionada pelo Kremlin.

O programa, elaborado pelos anfitriões do Parlamento lituano, prevê uma visita à sede do movimento "Sajudis", conglomerado de partidos e movimentos em sua maioria decididamente anticomunistas, que canalizou os anelos de independência do povo lituano. Nas últimas eleições, esta coalizão obteve maioria no Parlamento.

A reunião com diretores do "Sajudis" é longa e cordial. Expõe-se a eles o que são as TFPs e seus métodos de ação doutrinária no Ocidente. Os membros do "Sajudis" falam da necessidade que têm do maior apoio possível das TFPs, neste momento crucial para a Lituânia.

Às 17.00 hs, a delegação dirige-se à Universidade de Vilnius, fundada pelos jesuítas no século XVII.

À noite, realiza-se conferência no anfiteatro da Casa da Cultura de Vilnius

 

8-12-90 - Peregrinos na Lituânia

É a festa da Imaculada Conceição. O programa oficial contempla uma visita aos dois principais santuários marianos do país, bem como a cidades da região de Kelme. Este distrito elegeu o deputado Antanas Racas, membro da Comissão de Relações Exteriores e acompanhante oficial da delegação durante toda a estadia. A partida é às 6.30hs, quando ainda é fria madrugada em Vilnius.

A primeira etapa é a capela da Patrona da Lituânia, Nossa Senhora Porta da Aurora. A pequena e histórica capela está situada sobre um dos portões das muralhas que cercavam a antiga Vilnius. Desde horas matutinas, mulheres e crianças se alternam rezando de joelhos junto ao quadro da Virgem, como puderam constatar os membros da comitiva, no dia 8 de dezembro. "Colocamos nossas capas, desfraldamos  o estandarte e rezamos a primeira dezena do Rosário", comenta um de seus integrantes. "O deputado Racas explica que estamos fazendo uma peregrinação para pedir à Virgem a independência da Lituânia". Uma senhora entoa o cântico "Maria, Maria", súplica dirigida à Santíssima Virgem, na qual se pedem forças para suportar a dor de ver a Pátria ocupada, e a Religião oprimida.

Os integrantes da comitiva atravessam, com capas e estandarte, a Porta da Aurora. Logo após, são conduzidos de ônibus pelo interior da "Terra de Maria". Umas duas horas mais tarde, na cidade de Raisenai, vêem cair os primeiros flocos de neve na Lituânia. 

Guillaume Babinet, da TFP francesa, narra alguns "flashes" de uma fecunda viagem.

"Em todas as cidades visitadas a recepção é calorosa e comovente. As igrejas, cheias de fiéis e especialmente decoradas para a ocasião. A igreja de Raisenai está ornada com ramos de pinheiros, grinaldas e fitas com as cores da Lituânia, que pendem do teto. Os fiéis entoam o `Maria, Maria’, cântico que já ouvíramos na capela da Patrona da Lituânia.

"Em Siluva, a comitiva dirige-se em cortejo pelas ruas, acompanhada por um sacerdote e seus fiéis, até o Santuário onde Nossa Senhora apareceu em 1608. 0 fervor então suscitado por essa aparição permitiu aos lituanos vencer a ameaça protestante: a Lituânia continuou sendo a `Terra de Maria', segundo antigo título pontifício.

"Em meio a cânticos religiosos, todos osculam a pedra onde a Virgem apareceu. Os membros da comitiva entoam o Magnificat. Neva cada vez mais. O deputado Racaslembra que a agenda é apertada e o tempo escasso. O ônibus aguarda a delegação. Seus membros cantam o Hino Pontifício, despedem-se do sacerdote e dos fiéis e prosseguem seu caminho.

"Em Tytuvenai somos recebidos no limite do município por populares com trajes típicos, os quais, segundo costume tradicional, nos oferecem um saboroso pào negro e sal. Ao aproximarmo-nos da igreja, os sinos começam a tocar. O pároco nos recebe na porta, rodeado de pequena multidão.

"O órgão da igreja toca, e os fiéis entoam um cântico religioso composto no exílio da Sibéria, enquanto o sacerdote impõe a cada membro da delegação pequena cruz de metal feita clandestinamente durante a perseguição religiosa. Uma tradutora comenta: `O povo viu que vossas almas são belas!'

"O ônibus passa pela cidade de Siauliai, onde se acha acantonada enorme guarnição russa, com um dos maiores aeroportos soviéticos. E dirige-se ao histórico e comovente Monte das Cruzes, junto ao Rio Kulpe. Ali, desde o século XV, foram eretas muitas cruzes. Na década de 70, funcionários comunistas locais destruíram as 5000 cruzes que o Monte contava então. Novas cruzes se reergueram não só por obra dos habitantes da região, como também de outros lituanos e ainda de estrangeiros, que ali vinham agradecer graças recebidas. Naquele famoso local o Ministro da Educação e Cultura espera a delegação das TFPs. O lugar é impressionante! Sente-se a imensa tragédia, o imenso sofrimento, a imensa Fé da `Terra de Maria'.

"O giro pelas cidades da região termina na cidade de Kelme, com uma recepção no teatro da Casa da Cultura, seguida de visita à igreja Matriz e jantar com personalidades locais na casa paroquial.

"Na igreja, transbordando com mais de 1.200 fiéis, a delegação entra precedida por bandeiras lituanas e pelo estandarte da TFP. Nove meninas de cada lado do corredor, vestidas com trajes típicos, conduzem até o presbitério a comitiva, que foi rodeada com fitas coloridas. Ali, as fitas baixam, e a comitiva avança por sobre elas. Trata-se de antiga tradição do lugar, que simboliza respeito para com pessoas a quem se quer honrar exprimindo suma deferência.

"Um sacerdote diz algumas palavras explicativas sobre as TFPs e celebra a Missa, acolitado por dois outros, pela independência da Lituânia. A seguir, as meninas entregam flores a todos. Sacerdotes, cooperadores das TFPs e fiéis se dirigem então, sob a neve, ao cemitério.

"Junto a uma antiga vala comum, utilizada pelos soviéticos para dissimular os corpos dos combatentes anti-comunistas, os sacerdotes cantam o Réquiem. Todos vão depositando suas flores. O presidente da delegação das TFPs, em breves e sentidas palavras, afirma que aqueles que ali estão sepultados precederam o povo lituano e as TFPs, na luta contra o comunismo; e os precederam também no Céu, pois, sem dúvida, são mártires da Fé.

"Cantando 'La Virgen Maria', a comitiva se dirige, a pé, até a casa paroquial, onde é oferecido um jantar aos visitantes. Estão presentes os três sacerdotes, o Ministro da Cultura da Lituânia, o deputado Racas e personalidades do lugar. Discursos, brindes pela Lituânia e pelas TFPs, em um ambiente de verdadeira amizade e calorosa confraternização.

"Aquela cordial refeição encerra com chave de ouro o circuito da delegação das TFPs pelo interior do país, nesse dia.

"Nosso ônibus ruma para Vilnius, chegando à capital às 2:20 hs. da madrugada". 

9-12-90 - Visita ao Cardeal

O programa dedica todo o dia à visita à segunda cidade do país, Kaunas (420.000 habitantes)

A delegação assiste a uma Missa, rezada em sua homenagem, na Catedral da cidade. O celebrante, Cônego Alfonsas Svarinskas, passou 20 anos em campos de concentração da Sibéria. Estão presentes ainda o Cardeal Primaz da Lituânia, Vincentas Sladkevicius, e seu Bispo-auxiliar. Diante deles, do lado do Evangelho, o estandarte da TFP escoltado por dois membros da delegação. A Catedral acha-se repleta com 2.500 fiéis.

O Cônego Svarinskas aplica uma passagem do Evangelho do dia à campanha das TFPs: São João Batista endireitou os caminhos para a vinda do Senhor, selando sua missão com o próprio sangue.

Analogamente, a campanha prepara caminhos para que a civilização cristã possa renascer na Lituânia; e essa tarefa foi selada com a morte de dois membros da TFP norte-americana (os Srs. Frederick Vincent Porfilio e Daryl Huang Huang, que participavam ativamente da coleta de assinaturas, e faleceram em acidente automobilístico nos Estados Unidos).

Terminada a homenagem, os membros da comissão encontram centenas de pessoas diante da sacristia que desejam encomendar Missas pelas intenções das TFPs e dos cinco milhões de assinantes.

A seguir, dirigem-se ao palácio cardinalício, onde o Cardeal Primaz pronuncia significativas palavras referentes à delegação das TFPs, das quais se destaca o seguinte trecho: "Temos o que aprender com os senhores. Os srs. afirmaram estarem encorajados com a coragem de nosso povo. Mas podemos dizer que os srs. é que nos encorajam mediante esta petição. E estamos encorajados por vosso sacrifício e profunda fé. Muito obrigado pelo enorme presente feito a nosso país".

Dali a delegação dirige-se até o antigo palácio episcopal, para um encontro com associações católicas; e, a seguir, para o Seminário de Kaunas. Durante o almoço, o reitor do Seminário, sacerdote jesuíta, que durante anos padeceu em campo de concentração soviético, comenta que as graças que atraíram os 200 seminaristas são fruto da perseverança e da Fé dos católicos lituanos, enfrentando as perseguições à Igreja.

Posteriormente, apresentação das TFPs aos professores e seminaristas no auditório do Seminário. O reitor, em suas palavras finais, lembra que João Paulo II disse que é hora de dar voz à Igreja do Silêncio. E afirma que, no momento atual, as TFPs são essa voz. 

10-12-90 - No Parlamento lituano

No programa oficial, está prevista uma despedida no Parlamento. Ali a delegação é recebida pelo presidente do Parlamento, pelo presidente da Comissão de Relações Exteriores, e por outras personalidades. Um dos deputados afirma que a comitiva marca sua presença num momento em que o Ocidente parecia abandonar a Lituânia à sua própria sorte. Na reunião, guarda-se um minuto de silêncio em memória dos dois cooperadores da TFP norte-americana falecidos em desastre automobilístico, aos quais o Cônego Svarinskas já havia se referido em seu sermão, proferido na catedral de Kaunas.

À tarde, na Universidade de Vilnius, a comitiva é recebida na sala do Conselho Superior pelo seu Vice-Reitor, que agradece a visita, bem como a doação de livros editados pelas TFPs, pois pretende que a Universidade faça reviver as tradições nacionais. A autoridade universitária externa seu desejo de restabelecer o culto católico na bela igreja da Universidade, transformada pelos comunistas em "Museu do Pensamento Científico"...

À noite, na estação ferroviária da capital, grata surpresa aguarda a comitiva. Uma pequena multidão se reúne espontaneamente para a despedida. Flores, doces, álbuns, trabalhos artesanais em âmbar e vários outros objetos são ofertados pelos presentes, que também entoam músicas populares e religiosas. O secretário do movimento "Sajudis" entrega carta oficial de agradecimento, numa pasta de couro.

O cântico "Maria, Maria" é entoado pelos presentes. O presidente da delegação das TFPs brada "Teguivoia laisva Lietuva!" (Longa vida para a Lituânia livre!). Um membro da comitiva oscula a bandeira lituana e, diante daquele gesto, a multidão emocionada avança para oscular o estandarte da TFP. Lentamente o trem começa a por-se em movimento e os circunstantes fazem o sinal da vitória gritando ritmadamente "Atchu, Atchu!" (obrigado! obrigado!). Do vagão vêem-se lituanos correndo atrás do trem, na neve, para prolongar por alguns instantes aqueles breves, mas reconfortantes dias na Lituânia.

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Com o Cardeal Primaz da Lituânia

Juan Miguel Montes, Diretor do Ufficio TFP, de Roma

"No domingo, dia 9, terminada a Missa na Catedral de Kaunas, o Cardeal Vincentas Sladkevicius nos recebeu em um belo salão de seu Palácio arquiepiscopal. Com voz embargada, lembrou que várias pessoas, anteriormente, já lhes haviam levado presentes. Mas que o único presente verdadeiro recebido até o momento pela Lituânia, constituíam os cinco milhões de assinaturas de apoio trazidas pelas TFPs.

"Tive ocasião de recordar, respondendo-lhe em nome da comissão, o dia do Consistório em que ele havia sido nomeado Cardeal: em meio da pompa do palácio pontifício, Sua Eminência representava a dor da Igreja perseguida. Externei-lhe também que, sem dúvida, seus sofrimentos tinham contribuído para preservar, na Lituânia, 'Terra de Maria', a Fé católica.

"O Cardeal nos deu a bênção, segundo o rito tradicional. Em seguida, caminhou rapidamente em direção a Dr. Caio V. Xavier da Silveira, Presidente da delegação, que ainda se achava ajoelhado. Osculando-lhe a fronte, disse: 'Tu és um cidadão da Lituânia', repetindo depois o gesto com cada membro da comitiva".

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11-12-90 - Para Gorbachev refletir

Último dia da visita à Lituânia e Rússia. Tanto o Presidente Landsbergis, quanto membros do Parlamento lituano insistiram para que a delegação entregasse aGorbachev uma carta na qual expusesse os resultados da campanha empreendida pelas TFPs em prol da Lituânia. Atendendo a esse apelo, a comitiva dirige-se aos escritórios do presidente soviético.

Lá chegando, a funcionária comunista que os atende, ao se inteirar do que se trata, e notando a presença de máquinas filmadoras, câmaras fotográficas e gravadores, resolve consultar alguém por telefone, antes de assinar o recibo de entrega da carta: "São das Sociedades Tradição, Família, Propriedade", anuncia em russo.

Alertado por ela apresenta-se um agente, de maneiras abrutalhadas e ar sombrio:

"O que querem, camaradas?", pergunta ele. Nosso guia lituano retruca: "Não são camaradas, mas sim senhores!". O agente interpela: "que são estas câmaras todas, é para documentar?" — "Sim", diz nosso guia. "Vocês não sabem que é proibido filmar em repartições públicas como esta?" Nosso guia, uma vez mais intervém: "Não há nada escrito proibindo isso, e o que não está proibido está autorizado..." Lívido, o agente se controla a duras penas.

Nesse momento, a funcionária, que durante todo o tempo esteve ocupada com tratativas telefônicas, recebe uma resposta. Assina o recibo, colocando inclusive a hora de entrega: 13:01 hs.

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Três membros da comitiva que ficaram em Moscou por mais três dias levam um "press release" a agências internacionais de notícias, assim como enviam fax a cerca de 20 representantes da mídia internacional, contendo tanto a cópia da carta entregue a Gorbachev quanto o comunicado de imprensa alusivo a esse documento. A rádio e a TVlituanas dão informações completas de todo o programa de visita da comissão inter-TFPs à Rússia e à Lituânia. Pelo contrário, as agências de notícias ocidentais, acreditadas em Moscou, fizeram um silêncio unânime.

Gonzalo Guimarães

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KGB passa recibo

"Sob instruções" de Mikhail Gorbachev", assinala o "Le Figaro" de Paris, de 13/12/90, Vladimir Krioutchov, chefe da KGB, a temível polícia política soviética, declara pela TV de Moscou, em 10 de dezembro — quando a delegação das TFPs ainda se encontrava na capital russa — que "não tolerará a ingerência nos nossos assuntos internos... desses organismos e grupúsculos que, no estrangeiro, ...  moveram durante décadas e continuam a mover, uma guerra secreta contra o Estado soviético".

O leitor conhece, no Ocidente, além das TFPs, outros "organismos e grupúsculos" que tenham incomodado tanto o Kremlin?

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Assestando o foco nos pontos nevrálgicos

Sob intensa pressão econômico-política do Kremlin, a Lituânia aceitara, em junho passado, "congelar" temporariamente sua independência (cfr. "Catolicismo", n° 476, agosto 1990). Seguiram-se tensas negociações com os soviéticos. No final do ano, estas se encontravam num virtual impasse: enquanto Moscou exigia que a separação da Lituânia em relação à URSS fosse apenas parcial, e pautada por um emaranhado e lento processo previsto na Constituição soviética, o povo lituano reclamava a independência total e imediata. As posições de ambas as partes eram, pois, basicamente inconciliáveis.

Gorbachev começou então a dar sinais de irritação atrás de sua máscara perestroikana.

Mas nem por isso os movimentos favoráveis à independência dentro da URSS, sobretudo no Báltico, se retraíram. A grande maioria dos jovens dos três países bálticos, em idade militar, que deveriam no início do ano incorporar-se ao Exército Vermelho, recusou-se a fazê-lo. Gorbachev anunciou então o envio de tropas suplementares a essas três nações, com a missão de recrutar — "caçar" seria o termo mais próprio — os jovens à força. Milhares de paraquedistas e tropas de elite foram destacados para a Letônia, a Estônia e a Lituânia. As populações os receberam com aberta hostilidade.

Estava já redigida a matéria desta edição, quando, em 12 de janeiro, tropas soviéticas cercaram o prédio da televisão de Vilnius, a capital lituana. Uma multidão desarmada acorreu para defendê-lo, formando uma barreira humana. Na madrugada do dia 13, os tanques russos atacaram: 14 civis foram mortos (dois deles esmagados pelas lagartas dos tanques) e 240 feridos. Pouco depois a Letônia sofria tratamento semelhante.

Caía a máscara da perestroika. Stalin revivia na pessoa de Mikhail Gorbachev, cuja face cínica se patenteou ao mundo.

A TFP norteamericana recebeu, no mesmo dia, uma mensagem do Governo lituano, relatando a agressão e suplicando: "A Lituânia se encontra em perigo, a ajuda do mundo é necessária. Transmitam isso a todas as organizações TFP e Bureaux". A mensagem era acompanhada de uma carta do Presidente Landsbergis, que assinalava: "A responsabilidade por cada vítima cairá sobre Mikhail Gorbachev".

No mesmo dia 13 de janeiro, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira dirigiu, através do Escritório da TFP norte-americana em Washington, uma resposta ao presidente lituano solidarizando-se em nome das 20 TFPs e Bureaux-TFP com "a nobre resistência que seu governo e todo o povo lituano estão opondo à ofensiva com características nitidamente stalinistas que Mikhail Gorbachev e seus agentes vão desenvolvendo de um modo implacável contra a independência da Lituânia". Depois de comunicar as medidas que as TFPs tomariam para denunciar ao mundo essa agressão soviética (ver matéria na contracapa) — inclusive na imprensa e no Congresso norte-americanos — a mensagem do Prof. Corrêa de Oliveira concluía:

"Amicus certus in hora incerta cernitur. Nesta hora incerta, o Sr. e a Lituânia podem contar com a amizade certa e a fidelidade intransigente das vinte TFPs e Bureaux TFP".