Nos albores de 1992,

 

São Paulo assiste à

 

Passeata da Fidelidade

 

 

 

 

Catolicismo, N.° 494, Fevereiro de 1992

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Nuvens esparsas acumulavam-se nos céus da capital paulista, naquela tarde de sexta-feira, 3 de janeiro. Na fisionomia dos transeuntes, notava-se certo imponderável de expectativa e insegurança.

— "Será que vai chover?" perguntavam-se muitos, preocupados com as trombas d'água que costumam cair de modo repentino em São Paulo, nos meses de verão.

Se o clima físico denotava incerteza, o psicológico não ficava atrás. Há pouco se transpusera os umbrais do novo ano, e já 1992 surgia carregado de apreensões. "Um túnel nos espera no final dessa luz", diziam ironicamente os mais pessimistas...

É verdade que a movimentação nas lojas era intensa, e que a atmosfera de preocupações se diluía um tanto por efeito da bonomia habitual dos brasileiros. Por outro lado, como a insegurança e a incerteza aumentam a cada dia num país marcado por crises morais, políticas e econômicas de todo gênero, nosso povo parece ter conseguido a insólita combinação de uma sossegada insegurança com uma incerta tranqüilidade.

Naquele dia, no centro velho de São Paulo, nada fazia crer que alguma novidade alvissareira viesse alterar o ritmo de vida de uma megalópole moderna.

Apenas uma concentração invulgar de pessoas começava a se formar num ponto importante da cidade. O que será?

 

No Pátio do Colégio

De todos os lados, homens e mulheres, jovens e adultos, afluíam para o Pátio do Colégio, o berço de São Paulo. Sem vozes de comando, como Anjos, por encanto, uma colossal e pacífica manifestação em pouco tempo tomou conta daquela área privilegiada, rica de significado histórico.

Num instante, o cinza da atmosfera poluída cedeu lugar ao rubro de centenas de capas. Ao vento, flutuaram então dezenas de estandartes com o lema Tradição, Família, Propriedade, semelhantes aos que já tremularam junto à Casa Branca, em Washington, e na Praça Vermelha, em Moscou, perto do Kremlin, antes mesmo do arriamento definitivo do sombrio pendão comunista.

Toques de trompetes, logo seguidos pelo rufar de tambores e bumbos, ecoaram pelas extensas galerias de edifícios, atraindo a atenção de todos. Uma parte da cidade parou. As janelas dos escritórios e repartições públicas ficaram apinhadas de gente. Nas ruas, uma multidão de curiosos se aglomerou, parecendo esquecer as incertezas e as preocupações. Até o céu se abriu, e um raio de luz iluminou as fisionomias. Naquele momento, iniciava-se o monumental desfile da TFP comemorativo do V Centenário do Descobrimento da América.

"Meu Deus, será que voltamos à Idade Média?!", exclamava uma senhora ao ver e ouvir a Fanfarra dos Santos, da TFP, cujos componentes trajavam seu uniforme de gala: túnica branca e escapulário marrom, no qual de alto a baixo se destaca uma cruz em forma de espada, a conhecida Cruz de Santiago.

Se os símbolos evocavam o passado, aquele desfile no entanto rumava para o futuro. Prova disso é a juventude da maior parte de seus integrantes, demonstrando assim a capacidade de expansão dos ideais da Civilização Cristã. De fato, ali se concentraram delegações de cento e onze cidades da Federação brasileira, e os cartazes assinalavam a presença de representantes de dezesseis países das Américas, da Europa, Ásia, África e Austrália.

Sob o Viaduto do Chá

Lentamente, com a solenidade adequada às grandes ocasiões, o enorme cortejo partiu, atingiu o Vale do Anhangabaú e causou viva impressão aos circunstantes que o observavam de cima, postados ao longo do Viaduto do Chá. Muitos o aplaudiram. Outros, indiferentes, passavam como se nada vissem. Nem os mais enragés [radicais] dentre os esquerdistas ousaram vaiá-lo.

"Quem são eles?", indagou uma menina à sua mãe. "Devem ser da TFP, pois só ela é capaz de fazer manifestações assim tão belas!", foi a resposta.

"Viva Fidel Castro!" gritava freneticamente um isolado militante petista, que pelo jeito parece ter perdido o trem da História.

Na passarela sob o Viaduto, ouvia-se um grupo de rapazes comentarem admirados a grande formação em farpa executada pelos jovens da TFP. "Incrível como ainda existe gente conservadora!", aclamava um deles, maravilhado com a beleza policromática da cena.

"Eu não quero só o folheto", dizia outro, dirigindo-se a um Correspondente da TFP que distribuía material de propaganda: "vocês não me conseguiriam também uma capa com o leão dourado?"

Sob o Viaduto do Chá

Na Praça Ramos de Azevedo, nas escadarias do Teatro Municipal, o desfile fez uma pausa e como por encanto se converteu novamente numa imponente concentração, na qual a bandeira nacional, tendo a seu lado um grande estandarte da TFP, de 9 metros de altura, ocupava o lugar central.

Cânticos, brados e slogans reboaram pelos ares. Um deles dizia: "O Descobrimento da América foi ocasião de alegria e glória para a Igreja e a Cristandade; homenagem das TFPs americanas aos Papas, aos Monarcas, aos Descobridores e aos Missionários propulsores do esforço evangelizador e civilizador".

Ecoou então o inconfundível acorde inicial do Hino Nacional, executado pela Fanfarra dos Santos Anjos e ouvido numa posição de respeito.

 

Um discurso histórico

O encerramento do desfile deu-se na Praça da República, com um vibrante discurso pronunciado pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, de elogio à epopéia dos Descobrimentos e à ação evangelizadora da Igreja nas Américas.

Ao se referir à força da Tradição, suas ardorosas palavras alcançaram grande ressonância nos presentes, acendendo nos corações o fogo sagrado da fidelidade aos valores perenes da Civilização Cristã. Por isso, bem se poderia dizer que aquele magno evento teve por nome: Desfile da Fidelidade.

Tal era ali a identidade de princípios e sentimentos com o passado católico que, do fundo dos séculos, pareciam soprar uma vez mais os ventos de heroísmo e dedicação à Santa Igreja que outrora enfunaram as velas das naus de Colombo e de Cabral. Ventos da História que continuam a soprar e a impelir rumo ao terceiro milênio os estandartes da Tradição, Família e Propriedade!

BRÁULIO DE ARAGÃO


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