Plinio Corrêa de Oliveira

AMBIENTES, COSTUMES, CIVILIZAÇÕES

Em busca de arquétipo

para o pesadelo do século XX

 

"Catolicismo" Nº 191 - Novembro de 1966

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Frangos selecionados, gordos peixes, esplêndidos frios, eis o que apresenta nossa primeira foto. O leitor pensará: trata-se, sem dúvida, da prateleira de uma bem sortida mercearia ou de um supermercado. E, considerando o outro clichê, dirá: é sem dúvida um supermercado. Se alguém lhe sugerisse a idéia de que se trata respectivamente de objetos de arte e de um angulo da galeria que os expõe, o leitor riria sem dúvida, como diante de um absurdo. Pois quem poderia tomar como criações artísticas queijos, salames, melancias, latas de alimentos?

Entretanto é bem disto que se trata. Para a famigerada "pop art" constitui uma verdadeira obra de arte a cópia mais fiel que induz o público a tomar a imitação por realidade.

Que alguém se esmere nesse gênero de produções, nada de mal. Elas revelam uma habilidade artesanal por vezes digna de nota, e podem constituir sob certo ponto de vista autênticas curiosidades. De outro lado, podem apresentar certa utilidade comercial, como ocorre, por exemplo, com a montagem de vitrinas de bom efeito publicitário.

Por certo, deve-se negar resolutamente a artigos destes a qualidade de obras de arte. A arte envolve necessariamente uma interpretação da realidade pelo artista, e não apenas a cópia perfeitamente exata — e portanto perfeitamente servil — de determinado objeto. Ademais, mesmo quando represente acidentalmente o horrendo, a arte tem a missão de elevar o espírito humano acima do nível do trivial, do comezinho, do perfeitamente banal. Essas proposições podem fazer sorrir por parecerem antiquadas, mas são perfeitamente verdadeiras e por isso devem ser proclamadas com crescente insistência. Muitos pintores têm representado, em suas telas, víveres, objetos domésticos, etc. Isto ressalta nos quadros chamados "natureza morta". Porém em nenhum caso pretenderam os artistas fazer obra de pura cópia. Sempre animaram suas produções com uma interpretação pessoal.

A representação exata - e por vezes surpreendentemente exata - da realidade, obtida em trabalhos de cera e de outros materiais, é coisa já bem velha. Em mais de uma capital européia há museus de figuras de cera que alcançaram, nesse gênero, uma desconcertante perfeição. Assim, entre outros, o Museu Grevin. Ninguém se lembrou até agora de chamar isto de arte, de equiparar os bonecos do Grevin às esculturas do Louvre, à Vênus de Milo ou à Vitória de Samotrácia, por exemplo.

Ora, não se vê porque recusar a qualidade de obra de arte à cópia servil de uma figura humana e concedê-la à reprodução não menos servil de uma lata, um presunto ou um pedaço de melancia.

Por isto mesmo, também não é compreensível que os partidários ( ou melhor, os sectários ) da "pop art" aclamem com entusiasmo as "maravilhas" que se vão fazendo neste gênero.

Chamar isto de arte é depreciar a arte e, portanto, depreciar o homem.

Neste sentido, a "pop art" é uma novidade semivelha que está em inteira consonância com tantas outras "novidades" que fazem parte do terrível esforço de depressão do homem que em nossa época se nota... Mas haverá só isso na "pop art"? Não trará ela no bojo algum significado mais nitidamente deprimente?

Narra o magazine "Look" que o "pop artista" Robert Delford Brown organizou em um frigorífico de carne - o "Washington Meat Market", em Nova York - uma mostra de imitações dos produtos que normalmente nos frigoríficos se guardam. Disse o expositor que ela serviria como inauguração da "Primeira Igreja Nacional do Pânico Refinado". A revista comenta que a "pop art" visa, por meio de hábeis jogos de ilusão, exprimir o "arquétipo do pesadelo do século XX". E acrescenta que segundo o "pop artista" essa exposição de carnes "induziria espantosas revelações espirituais, sexuais e estéticas no espectador", através da apresentação da "medonha e bela visão de toneladas de carne, galões de sangue [...] e outras visões ainda não desvendadas".

Aí está mais um lance desse contínuo caminhar para baixo, para a trivialidade, para o prosaísmo, e por fim para o desequilíbrio.


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