Não
se pode considerar a figura de nosso primeiro clichê sem sentir um
respeito profundo. Trata-se de uma velha mãe de família, com todo o
aspecto de quem passou a existência no ambiente digno e santo do lar. A
dedicação aos seus, a temperança, um frescor de alma que lhe permite
saborear as castas alegrias da vida doméstica, e participar sem tédio nem
preguiça dos trabalhos inerentes a esta: tudo enfim, nessa humilde
fiandeira da Sardenha, incute acatamento sincero e simpatia cordial.
Quem a considera percebe, aliás, que ela tem o hábito
de viver cercada do respeito geral, e que apesar de sua maternal doçura
tem bastante consciência de sua dignidade para se impor a quem lhe quiser
faltar com a devida consideração.
Entretanto, ela está contente com seu estado: não quer
ser, nem parecer, culta, nobre ou rica. É que, aceitando embora a
hierarquia social, está cônscia de que tem a dignidade essencial de
criatura humana, de filha de Deus remida por Nosso Senhor Jesus Cristo. E
com isto se satisfaz sabiamente, segundo a condição em que a Providência a
fez nascer.
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N
o
museu de Belas Artes de Lyon se conserva este quadro de David: uma "maraîchère",
isto é, uma plantadora de legumes em terras alagadiças. É o tipo clássico
das megeras que atuaram na Revolução Francesa.
Enquanto a fiandeira sarda é toda afeto, dignidade,
temperança e paz, esta virago é toda ódio, revolta, destempero e agitação.
Seu ambiente normal não é o lar, mas a rua. Seu olhar parece crepitante de
chamas interiores, seus lábios cheios de amargor acabam de proferir uma
injúria. E outra já vai aflorando neles. Não se diria que seus braços
foram feitos para embalar crianças, mas para brandir nas arruaças algum
sabre velho ou um pé de cadeira.
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Duas mulheres que criam em torno de si ambientes
diversos, praticam costumes opostos, representam duas civilizações
irreconciliáveis entre si: a civilização cristã e a civilização
revolucionária neopagã... na medida em que esta possa ser chamada
civilização.
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A criatura humana é o que há de mais típico em matéria
de "Ambientes, costumes, civilizações". Entretanto, é por vezes mais
difícil interpretar a significação de uma fisionomia do que a de um móvel
ou um prédio.
Gostaríamos, pois, que nos escrevessem os leitores que
neste ponto tenham particular dificuldade.