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Plinio Corrêa de Oliveira AMBIENTES, COSTUMES, CIVILIZAÇÕES Beleza e dignidade de uma vida simples
"Catolicismo" Nº 51 - Março de 1955 |
Há um igualitarismo revolucionário que teve seu primeiro arauto no demônio, quando este proferiu o seu "non serviam", e que consiste em aviltar, rebaixar, degradar todas as coisas, por ódio a qualquer hierarquia, autoridade ou preeminência. Ao longo da crise aberta com o protestantismo e levada ao auge pelo comunismo, a influência deste igualitarismo se vem tornando sempre mais dominante e tem tido como conseqüência a implantação entre os povos ocidentais de um estilo de vida cada vez mais grosseiro, materialista e vulgar. Nas classes ricas, este fenômeno se exprime por uma degradação progressiva do gosto, das maneiras, e da cultura, pelo apetite já quase sem freios, de prazeres desbragados, sensuais e materialistas. Nas classes pobres, por uma crescente sujeição do homem à máquina, por uma brutalização sempre maior, por uma revolta que o mau exemplo contagioso das "elites" não faz senão agravar. Entre ricos e pobres há, evidentemente, exemplos de meritória resistência a esta avalanche. No entanto, seria impossível não reconhecer que este impetuoso tufão de igualitarismo produz suas devastações em todas as esferas da vida contemporânea.
O próprio desta secção consiste em ilustrar os princípios com exemplos. Em contraposição ao tipo tão freqüente, do proletário moderno vítima infeliz do igualitarismo mecanicista neopagão, eis duas figuras populares que exprimem algo daquela beleza e dignidade da vida simples, de que acabamos de falar. Já que um sadio movimento mundial tende a reintegrar a nação alemã no convívio e na amizade dos povos, é com muito prazer que escolhemos como exemplo dois tipos populares alemães, um rural e outro urbano.
É provável que este vigoroso camponês de Bernau, na Floresta Negra, não saiba grego nem latim, entenda pouco de política, e quase não leia jornais. Sua ancianidade robusta e como que juvenil, indica porém um tipo racial admirável, tendo atrás de si uma larga tradição de gerações inteiras de campônios bem nutridos, vivendo num ambiente calmo, dotados de admirável equilíbrio físico e psíquico. Camponês, estritamente camponês, há neste homem qualquer coisa de régio, um tal ou qual esplendor patriarcal, que se reflete não só nas barbas abundantes e alvas, mas no porte ereto, na imperturbável segurança da fisionomia, no olhar resoluto, de homem habituado a ver longe e firme, e a cobrir extensas áreas com sua autoridade de "pater familias". Ele não conhece Homero nem Virgílio, é certo, mas – coisa muito mais gloriosa – se Homero ou Virgílio o tivessem conhecido, provavelmente lhe teriam consagrado alguma bela referência, que tornaria imortal seu nome ou seu tipo.
E passemos ao fabricante de violinos. Mittenwald, na Baviera superior, já existia no século XIV. A partir do século XVII se destacou por sua indústria de violinos, que até hoje ali floresce. Este especialista evidentemente está muito longe de ser um sábio, ou um professor de universidade. É um trabalhador manual. Mas quanta inteligência luz em seu olhar, quanta perseverança em sua face, que admirável hábito de trabalho metódico, intenso e calmo, no gesto que está realizando, que perícia perfeita, e que transparência de esplendor do artesanato se nota em todo o seu ser. Homem que numa profissão modesta encontra condições de vida dignas, capazes de justificar uma verdadeira e nobre ufania.
É claro que cada exemplo concreto, pelo próprio fato de ser concreto, se reveste de características históricas, pessoais ou locais acessórias, certamente legítimas, mas que podem variar conforme os tempos e os lugares. Nestes exemplos, o que nos interessa é o que têm de universal: a beleza e a dignidade de uma vida simples, quando compreendida à luz da civilização católica. É o que transparece no bem estar que cada um destes homens sente em sua profissão. O camponês, robusto, saudável, próspero; o artesão de um físico enfermiço e precocemente envelhecido, que faz lembrar as agruras ainda recentes da guerra, tão mais pesadas para os habitantes das cidades do que para os dos campos; mas um e outro com a alma cheia de satisfação em poder respectivamente cultivar a terra e fazer violinos. |