Catolicismo Nº 115 - Julho de 1960

 

Revolução e Contra-Revolução em 30 dias

Plinio Corrêa de Oliveira

 

Já se verificaram em parte as previsões que fizemos no último número, no tocante aos golpes de Estado da Coréia do Sul e da Turquia.

A despeito dos seus pretextos democráticos, a Revolução não tolerou a presença de Syngman Rhee no território coreano. O ancião teve de se afastar sob toda sorte de ameaças.

Não teria sido mais coerente que os chefes revolucionários lhe permitissem disputar livremente as eleições?

Era ele um ladrão? Não é impossível. Neste caso, teria sido melhor divulgar as provas de seus roubos, organizar a respeito delas uma grande propaganda, derrotá-lo eleitoralmente, e por fim instaurar ainda contra ele um processo criminal em grande estilo. Derrotado nas eleições, infamado pelo julgamento de juízes insuspeitos, num processo feito segundo as melhores normas, com toda a publicidade e todas as garantias de defesa, Rhee teria ficado aniquilado. O desprezo geral e o cárcere em breve o teriam levado à sepultura.

Entretanto, nada disto se fez. É que o fim da Revolução não era dar liberdades à Coréia, nem fazer justiça a quem quer que fosse. O fim era derrubar um adversário do comunismo.

E isto foi alcançado.

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Caiu também Menderes, na Turquia. Os pretextos, os mesmos: moralizar, democratizar, etc. E o curso dos fatos, se não é igual, é análogo. Os membros do governo estão presos e serão julgados. De eleições em data próxima e certa não se fala. É claro que políticos encarcerados não podem disputar eficientemente as eleições. Vejamos se pelo menos o processo criminal será feito com justiça e imparcialidade, mas é lícito duvidar, pois este não é o hábito das revoluções... quando sopradas pela Revolução.

Na Turquia também, os fatos se cifram nisto: foi derrubado um obstáculo ao comunismo.

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Para ser substituído outro obstáculo? As primeiras declarações do novo governo reafirmam os compromissos do anterior com o Ocidente. Mas em política as promessas tranqüilizam bem pouco, e só os fatos impressionam. Ora, os fatos apresentaram de tal maneira as notas características da Revolução – insinceridade, demagogia, violência – que é com o espírito muito reticente que acolhemos as promessas.

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Claro está, reafirmamo-lo, que a nosso ver a opinião católica não tem motivos especiais para se interessar por Rhee ou por Menderes. Que eles tenham sido honestos ou não, na gestão dos negócios públicos, quem pode neste Brasil tão distante de Seul e de Ancara ter uma idéia a respeito? E que interesse pode isto ter para nós?

Não é pois este o ponto que visamos em nosso comentário. Temos em mira outro aspecto da questão. E este aspecto interessa ao mundo inteiro. É que em dois pontos-chave do globo caíram em condições muitíssimo suspeitas dois governos com os quais os soviéticos antipatizavam, e que lhes pagavam com a mesma moeda.

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A nosso ver, o nexo existente entre os golpes de Estado da Coréia do Sul e da Turquia e a Revolução é o mesmo que existiu entre esta e os movimentos revolucionários do Egito, da Síria, e do Iraque. Apesar de todo o silêncio que há a respeito deste último, e da aparente moderação daqueles, qual o homem sensato que se sente tranqüilo quando pensa em qualquer deles?

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No momento em que escrevemos, os jornais estão cheios de notícias alarmantes vindas de Cuba. Fidel Castro estaria pensando em convidar Kruchev e Chu-en-Lai para uma visita à ilha. Os soviéticos, por seu lado, pensariam em instalar bases em Cuba. A Revolução em sua forma mais extremada e odiosa teria, pois, um ponto de apoio na América. E se Arquimedes não pedia senão um ponto de apoio para levantar o mundo, K. de sua parte não precisa senão desse ponto de apoio para fazer estremecer toda a América.

Com efeito, com bases instaladas a dois passos do Canal do Panamá, e em posição de ameaçar qualquer grande cidade americana, qual a situação psicológica em que ficarão as populações deste continente?

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Não nos parece que Moscou tenha principal e proximamente em vista a instalação dessas bases. Isto seria provavelmente "encostar na parede" os Estados Unidos, e desencadear ipso facto uma guerra mundial. A guerra não está fora dos planos do senhor do Kremlin, porém não parece ser seu principal desígnio. Melhor, para ele, do que a guerra seria uma coexistência mundial em que todos os benefícios fossem da União Soviética, para assim mais segura e facilmente bolchevizar o mundo. Ora, para impor aos norte-americanos essa coexistência ser-lhe-ia talvez útil poder formular contra eles uma ameaça: instalação de bases em Cuba, se os Estados Unidos não renunciassem às que têm na Alemanha Ocidental e alhures. Washington cederia e cumpriria sua palavra. K. faria, por detrás da cortina de ferro, quanto às bases ali existentes, o que melhor lhe parecesse. E assim estaria dado mais um passo rumo ao desmantelamento das defesas do Ocidente.

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Os americanos do Norte não verão isto?

Alguns, sim. O senador democrático Smaters lamentou recentemente que, com o ouro que recebe pelo açúcar vendido a bom preço aos Estados Unidos, Cuba compre artigos em grande quantidade na URSS. Assim, é o ouro norte-americano que mantém a tirania revolucionária de Castro e serve para abrir um mercado ótimo em benefício de Moscou, e quiçá para formar um quisto em plena América.

Mas o que Smaters vê, o Departamento de Estado parece não ver. Tanto é, que continua a se manter na mais incompreensível inércia em relação a Castro.

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Falando dos assuntos americanos, nosso pensamento vai naturalmente a outro ponto. É a ONU.

O discurso que o representante argentino junto àquela entidade, Sr. Mário Amadeo, pronunciou a respeito da conferência de cúpula, foi o melhor comentário que se fez sobre o assunto nas altas esferas diplomáticas mundiais: argumentação inteligente, incisiva e corajosa, que merece nosso aplauso.

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E, antes de deixarmos os assuntos americanos, registremos nossa admiração pelos comentários claros e santamente enérgicos que o Exmo. Revmo. Mons. Eduardo Boza Masvidal, Arcebispo Auxiliar de Havana, fez, há poucos dias, a propósito do governo de Fidel Castro. Começou o Prelado por fazer suas as advertências contra o perigo comunista, corajosamente formuladas pouco antes pelo Exmo. Revmo. Mons. Henrique Perez, Arcebispo de Santiago de Cuba. Em seguida, acrescentou que "o Estado pode expropriar a propriedade privada quando o bem comum o exigir, mas neste caso deve indenizar adequadamente o proprietário, de acordo com o valor real do bem expropriado. A confiscação ou expropriação arbitrária e injustificada constitui um roubo". Também lamentou o caráter totalitário do regime, que restringe tanto o âmbito de ação do indivíduo, que se diria que "a cabeça do ser humano não serve senão para usar chapéu".

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O mais precioso fruto da ação missionária no Oriente são, sem dúvida, as Filipinas. Nossa gravura dá bem uma idéia da importância da Igreja, não só na vida particular, como também na vida pública daquelas ilhas: nos funerais do Presidente Magsaysay, o Arcebispo de Manilha celebra Missa de corpo presente perante cem mil soldados e civis.

A anunciada visita do Presidente Eisenhower ao Japão está ocasionando naquele país movimentos de oposição profundos e apaixonados. Se esses movimentos são em parte devidos a ressentimentos decorrentes da última guerra, revestem-se entretanto também de um cunho esquerdista manifesto. É o comunismo que, sempre admiravelmente servido pelas esquerdas, tenta por esta forma separar o Império nipônico, do Ocidente. Depois do que sucedeu na Coréia, seria mais uma boa vitória soviética rumo à derrubada dos dois outros bastiões anticomunistas que restam no Extremo Oriente: Formosa e as Filipinas, essas Filipinas tão caras a todo coração verdadeiramente católico.

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O Partido Conservador inglês não pode de nenhum modo ser considerado contra-revolucionário. Cremos mesmo que, se alguém o fizesse, ele protestaria.

Na terminologia de nosso trabalho "Revolução e Contra-Revolução", é este caracteristicamente um partido "semi-contra-revolucionário".

Entretanto, o fato de o eleitorado inglês, que já foi majoritariamente trabalhista, dar crescente apoio aos conservadores significa que a opinião pública na Inglaterra, em lugar de seguir o impulso da Revolução, está se movimentando em direção oposta. Embora não se deva exagerar a importância do fato, é impossível negar que ele contraria as tendências da Revolução. E, nesta medida, é ele um bem.

Em outubro do ano passado, os conservadores obtiveram uma grande maioria nas urnas. Todavia, nas eleições municipais de maio último, realizadas na Inglaterra e no País de Gales com exceção de Londres e algumas outras grandes cidades britânicas, num total de 3.511 postos de conselheiro, os conservadores e independentes obtiveram 2.333 cadeiras contra 1.162 obtidas pelos trabalhistas. Em Liverpool, Cardiff e Birmingham, a maioria trabalhista sofreu forte abalo.

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E vem por fim o vinho melhor. O prestigioso "Diário de Notícias" de Lisboa informou que no dia 17 de maio, primeiro aniversário da inauguração do monumento a Cristo Rei, situado na parte sul do Tejo, diante de centenas de pessoas presentes à cerimônia, o sol começou a girar de forma rara, e a dançar. Foi a repetição do fenômeno ocorrido em Fátima por ocasião da última aparição de Nossa Senhora.

S. Eminência o Cardeal Cerejeira, Patriarca de Lisboa, mandou abrir inquérito cujo resultado aguardamos ansiosos.