Plinio Corrêa de Oliveira
Em meio à tormentosa crise por que passa o País, a palavra do prof. Plinio Corrêa de Oliveira
Catolicismo, Novembro de 1987, pags. 2-4 |
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ANALISADA a grave crise sócio-econômica em que se debate o País, é incontestável que, no âmago dela, se encontra a perspectiva da implantação das três Reformas indissociáveis — a Agrária, a Urbana e a Empresarial — que ameaçam arrastá-lo ao comunismo. Ou seja, a uma ordem de coisas baseada no ateísmo, no materialismo e numa das maiores e mais mentirosas utopias: a igualdade obrigatória entre todos os homens. Desde seus primeiros lances na vida pública brasileira, na década de 60, a TFP vem denunciando o perigo reformista, através de contínua produção e publicação de livros, manifestos e artigos, com oportunas campanhas de difusão em ruas e logradouros públicos em todo o Brasil. Agora, esta Sociedade entra mais uma vez em cena, com o livro Projeto de Constituição angustia o País, em que o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira historia a gênese da Constituinte, analisa seus trabalhos em adiantada elaboração e apresenta a Proposta da TFP, concreta, serena, equilibrada, para, dentro da lei e sem traumas, resolver o impasse a que chegou naquela Magna Assembléia. A obra leva a palavra da TFP sobre o atual momento crítico do País e ao mesmo tempo dá resposta a incontáveis brasileiros que, desde o início do ano, se perguntavam, até com certa ansiedade, se a TFP não iria intervir em grande estilo nos debates em torno da Constituinte. Para dar aos leitores idéia da divulgação que se espera fazer desta nova obra, lançada através de uma edição extra de "Catolicismo", bastará dizer que sua primeira tiragem, a par de outra, em forma de livro, a cargo da Editora Vera Cruz, é de 40 mil exemplares... E isto num País onde, segundo as estatísticas mais idôneas, a tiragem média de livros não-didáticos não chega aos 6 mil exemplares! O Prof. Plinio Corrêa de Oliveira expõe a seguir, para nossos leitores, a Proposta da TFP ante o atual impasse da Constituinte. Os subtítulos do texto foram inseridos pela redação de "Catolicismo" (os negritos são deste site). 1986: uma eleição-sem-idéias - alheamento do eleitorado Na mais recente obra que a TFP acaba de lançar, demonstro que o mandato popular para fazer uma nova Constituição foi conferido, na maior parte dos casos, a cidadãos brasileiros acerca dos quais o eleitorado ignorava o que pensavam no tocante aos grandes problemas nacionais (e que presumivelmente ignoram, por sua vez, o que a maioria do povo pensa a tal respeito). O alheamento entre o povo e os candidatos daí decorrente, é tão grande que foi impressionante o número de votos em branco ou nulos, e se pode recear que grande parte do eleitorado se teria abstido de votar, caso a lei vigente não tornasse (aliás antidemocraticamente) obrigatório o exercício do voto para o povo proclamado contraditoriamente soberano. A propriedade privada e a livre iniciativa sob o rolo compressor do íntervencionismo estatal Na Constituinte que resultou das "eleições-sem-idéias” de 1986, as correntes de esquerda vêm conseguindo envolver a maioria conservadora, de forma a fazer prevalecer os pontos de vista delas e incluir na futura Constituição dispositivos que implantem no Pais as Reformas Agrária e Urbana, ao mesmo tempo que abrem caminho para a Empresarial – as duas primeiras com o apoio oficial do Poder Executivo, e a terceira com claras simpatias em altas esferas políticas, eclesiásticas e publicitárias. Ora, a implantação dessa tríplice Reforma contraria princípios morais e jurídicos até há pouco afirmados pela grande maioria do País como sagrados e indiscutíveis, bem como interesses privados da maior monta, fundamentais para a estabilidade social e econômica de incontáveis famílias. Situação essa tanto mais grave quanto, até o momento presente, a opinião pública ainda não recebeu das autoridades competentes uma explicação clara e documentada sobre o motivo pelo qual a difusão fundiária não se faz exclusivamente mediante a distribuição de terras no maior latifúndio inaproveitado do Ocidente, constituído pelas terras incultas pertencentes aos Poderes Públicos. À vista de tudo isso, é natural que incontáveis brasileiros, perturbados, chocados, lesados a fundo em seus direitos e contundidos do modo mais grave em seus interesses pessoais e familiares se ressintam do divórcio cada vez mais acentuado entre suas reais aspirações em tanto do que se vem fazendo na Constituinte. Quando essas injustiças em série sobrevierem, ao longo do verdadeiro ciclone nacional em que importará a implantação em cadência das três Reformas, os Ministérios competentes, o Palácio do Planalto e quiçá o próprio Palácio da Alvorada terão os telefones a tilintar incessantemente ao longo dos dias e noites adentro. Do Brasil inteiro as autoridades locais, perplexas com o impacto desse ciclone, perguntarão sem cessar: que fazer? que fazer? que fazer? Estará criado o impasse, em todos os lugares do território nacional, em que brasileiros labutam e produzem. Como remediar a situação inautêntica, resultante da falta de representatividade da Constituinte? A saída para tudo isso, os Poderes Públicos e a Nação por-se-ão a procurá-la, percorrendo todo um mar de hipóteses e de perplexidades, do qual mais provavelmente... não encontrarão saída alguma. Juridicamente, será impossível declarar sem efeito as decisões da Constituinte, sem que se descambe para um golpe de Estado cruento ou incruento. Mas que a demagogia de certas esquerdas tudo fará para tornar cruento. Quem, como eu, deseja, de toda alma, que tal não se dê, outra coisa não poderá fazer senão prever e avisar. Pois, caso os acontecimentos enveredem por aí, ter-se-á transposto o sinistro limiar do absurdo. E, a partir daí será tarde para fazer previsões. Incontáveis brasileiros estarão a se perguntar: haverá algo a fazer para que, alertados sobre o perigoso rumo no qual corremos o risco de despenhar, seja possível obviá-lo dentro da lei e sem traumas, pelo concerto geral dos espíritos clarividentes, cautos e ágeis? Minha resposta afirmativa deixo-a consignada na Proposta da TFP, que a seguir passo a expor. Constituinte erra quanto à meta; procura popularidade mas desperta espanto e susto A população brasileira, como em geral a das demais nações ibero-americanas, se divide em duas camadas. Uma, que reluz na publicidade, que se constitui dos setores ricos, poderosos ou então cultos da população, é fortemente cosmopolitizada pelo contato com as "últimas modas" indumentárias, ideológicas ou outras sucessivamente lançadas nos grandes centros mundiais. Nesses setores, a tendência para a esquerda é verdadeiramente fator de popularidade. E nos clubes mais ricos, como nos meios de comunicação social de maior projeção, nas universidades mais ilustres como em tantos Seminários e Noviciados, é certo que os vanguardeiros da caminhada para a esquerda contam com possibilidades eleitorais importantes. Mas abaixo dessa superfície reluzente, há um Brasil que é e quer continuar a ser autenticamente brasileiro, em legítima continuidade com seu passado, e cujos passos se orientam na linha dessa continuidade, para constituir um Brasil em ascensão, fiel a si próprio. E não o contrário de um Brasil que seja o oposto do que ele foi e é. Esse Brasil profundo, marcadamente majoritário, em quem a nova Constituição vai provocando susto e rejeição, tem pouca presença na publicidade. Em Brasília e nas grandes capitais de Estado, ele é sempre mais ignorado. Mas é ele o Brasil real. E à medida que o Brasil de superfície caminhe para a extrema-esquerda, irá se distanciando mais e mais do Brasil de profundidade. E este último irá despertando, em cada região, do velho letargo. E, de futuro, os que atuarem na vida pública de nosso País terão de tomar isto em consideração. E, em vez de olharem tão preponderantemente para o Brasil cosmopolitizado que se agita, terão de olhar para o Brasil conservador que constitui parte da população dos grandes centros, e se patenteia mais numeroso à medida que a atenção do observador desce das grandes cidades para as médias, das médias para as pequenas, e destas últimas, já meio imersas no campo, para nossas populações especificamente rurais. Caso não sejam extremamente prudentes as próximas votações no Plenário da Constituinte, chegar-se-á assim a uma distonia gravíssima entre o Brasil de superfície e o Brasil profundo, o Brasil constitucional e o Brasil real. E tal distonia será ainda maior à medida que a aplicação das famigeradas reformas sócio-econômicas for metendo as garras nos patrimônios dos particulares. Qual o resultado de tudo isto? — Empilhar os fatores de incompreensão e de indignação uns sobre os outros. Desse modo, indigne a quem indignar, custe o que custar, doa a quem doer, certo Brasil de superfície nos irá arrastando para o esquerdismo radical, com a fundada alegação de estar aplicando a nova Constituição... O reformismo festivo parece não se incomodar com isto. Mas cada vez mais serão raros os partícipes de sua alegre farândola, ganhos gradualmente pelo sentimento de inconformidade e apreensão nascido, a justo título, das camadas mais profundas da população. "Inconveniência em submeter a referendum a Constituição globalmente considerada" Nessa conjuntura, abre-se diante do observador um caminho para chegar à normalidade constitucional, sem recurso a qualquer forma de ilegalidade — cruenta ou incruenta. Na atual Constituinte, os assuntos colocados em debate, de naturezas aliás muito diversas, podem ser agrupados em duas categorias distintas: 1°) os que dizem respeito ao Estado brasileiro como entidade política soberana. Quanto às linhas gerais de todas essas matérias, reina na opinião pública um amplo consenso. Tal consenso não é rompido pelo desacordo — em alguns pontos — entre propugnadores de teses opostas. Pois se bem que seja importante o assunto da controvérsia, os adeptos de uma solução não se sentirão golpeados a fundo se prevalecer a outra. É o que acontece, por exemplo, no desacordo entre parlamentaristas e presidencialistas. Com efeito, essa diversidade de opiniões anima atualmente com um tema nobre nossa vida política. E de nenhum modo cria o risco de dilacerar o País em duas correntes radical e irremediavelmente antagônicas. Bem ao contrário do que vem fazendo o reformismo agrário-urbano-empresarial. 2°) amplas matérias de caráter social e econômico, como as já mencionadas Reformas, as transformações a serem instituídas na família, a opção entre a índole confessional e laica do ensino público, o agravamento das condições do ensino privado, a estatização da Medicina etc. — temas que interessam presentemente muito mais o eleitorado. Ora, a respeito de quase toda a matéria elencada no item 2°, a divisão de opiniões entre os brasileiros é muitíssimo mais acentuada. Em tais condições, um referendum convocado pela atual Constituinte, que convidasse os eleitores a dizer sim ou não, em bloco, à nova Constituição, coloca-los-ia em uma alternativa pungente. Com efeito, responder sim implicaria na aceitação total de uma Constituição contendo, eventualmente, dispositivos múltiplos, opostos à voz da consciência de muitos eleitores. Colocar o eleitor, por meio de um referendum sobre a Constituição, globalmente considerada, na dura contingência de aceitar, por exemplo, as três Reformas que ele repudia globalmente, para conseguir a aprovação das inovações de índole meramente política com as quais esteja de acordo, será exercer contra ele uma violência psicológica, moral e política que importaria em grave ato de despotismo. Solução saneadora proposta pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira Diante do impasse que então se criaria, a solução saneadora consistiria em que os Constituintes votassem desde já uma Constituição dispondo sobre a organização política do País, segundo uma linha geral em que facilmente se pode conseguir o consenso notório de toda a população. A parte sócio-econômica seria deixada pela própria Constituição para outra Assembléia, a ser eleita com poderes Constituintes especiais a fim de dispor sobre tal. Obviamente, tanto a parte política quanto a parte sócio-econômica da Constituição seriam submetidas a referendum popular, tão logo elaboradas e promulgadas. Essa proposta tem o mérito de dar ao Brasil um prazo — por exemplo, de três anos — para que nosso eleitorado lúcido e ágil possa ter a preparação necessária para opinar maduramente sobre tais assuntos, encontrando-se em condições suficientes para eleger uma Constituinte autenticamente representativa, na qual se refletirá com fidelidade — e portanto com autenticidade — o que ele pensa e deseja sobre matérias sociais, econômicas, sócio-econômicas e sócio-políticas. Essas convicções do eleitorado se exprimirão, então, através da vitória nas urnas, de numerosos candidatos-com-idéias, apresentados por partidos-com-idéias, e verdadeiramente representativos do sentir dele. Para que tal preparação seja eficaz, será indispensável um esforço publicitário informativo e formativo de alto quilate, e ao mesmo tempo de fácil compreensão pelo eleitorado, esforço esse no qual se empenhem a fundo todas as forças vivas da Nação. Olhar de frente essa situação, e enfrentar as perplexidades e apreensões que ela traz consigo, oferecendo ao Poder Público e à opinião do País sugestões viáveis: assim pode o bom brasileiro cumprir seu dever em ocasiões dramáticas, como esta em que vamos entrando. Em consequência, quaisquer atitudes deste gênero devem ser acolhidas de boa mente pelas autoridades públicas, ainda que elaboradas a partir de pontos de vista diversos dos delas. Pois isto faz parte do direito de opinar livremente, que assiste a cada cidadão em um regime efetivamente democrático, como é ou quer ser o nosso. Pelo contrário, o Governo que visse em atitudes como esta da TFP um ato de oposição política levado quiçá às raias da ilegalidade, tenderia — talvez inadvertidamente — a transformar o regime democrático em mera ficção política, cuja essência seria ditatorial. Sinto-me, pois, na qualidade de Presidente do Conselho Nacional da TFP, inteiramente à vontade para trazer ao conhecimento da Nação — isto é, Governo e povo — a Proposta desta Sociedade para resolver o impasse da Constituinte. Queira Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, abençoar esta iniciativa da TFP e tornar eficazes as presentes palavras, para que os srs. Constituintes, seguidos pelo clamor majoritário dos brasileiros, freiem a marcha de tantos males, e ainda cheguem a deter, nos bordos do abismo, a perigosa caminhada do Brasil. |