Plinio Corrêa de Oliveira - Home Page

Instituto Plinio Corrêa de Oliveira

 

A Inocência Primeva e a Contemplação Sacral do Universo

no pensamento de

PLINIO CORRÊA DE OLIVEIRA

© 2008 - Todos os direitos desta edição pertencem ao

INSTITUTO PLINIO CORRÊA DE OLIVEIRA

Dezembro de 2008

Clique para adquirir a obra impressa

 

Parte I

 

Capítulo 2

 

Inocência primeva, estado

de harmonia com que a

alma saiu das mãos de Deus

 

1. Inocência: um conceito que não é meramente negativo

É corrente dizer que a consciência limpa traz a felicidade, e é certo. Mas é preciso ir além, e descrever a inocência primeva.

Que é a inocência? Um privilégio infantil? Um estado vedado aos adultos? É simplesmente não pecar, por falta de idade ou de condições? Um estado meramente negativo, que consiste apenas em não fazer algo?

Nocente é aquilo ou aquele que causa dano, que pratica o mal. Então se pergunta: inocente seria apenas o não-nocente, assim como incolor significa apenas não ter cor?

É claro que a mera acepção etimológica é essa. Mas há uma inocência plena, que vai além do meramente não-nocente, vai além de não praticar o mal.

 

2. Inocência é a harmonia de todas as potências da alma entre si

A criança ignora as leis da transmissão da vida, e por isso na linguagem corrente se diz que ela é inocente. O adulto que é acusado de um crime que não praticou, aquele que não cometeu pecado é inocente. Entretanto, pode-se tomar a expressão inocência primeva num sentido específico, que vai além da acepção usual, e que se aplica a todas as idades.

Inocente é o homem de todas as idades que adere àquele estado de espírito primevo de equilíbrio e de temperança com que o homem foi criado, e por isso conserva-se aberto a todas as formas de retidão, de maravilhoso.

‘A inocência é a harmonia de todas as coisas ou de todas as potências da alma entre si. E por causa dessa harmonia, ela tem a noção fácil e imediata das coisas como elas devem ser e, portanto, do modelo ideal de todas as coisas’.[1]

Esse conceito de inocência, portanto, vai muito além da acepção corrente da palavra. Não se trata apenas de não praticar o mal, mas sobretudo de aderir fortemente à harmonia do Verdadeiro, do Bom e do Belo. Inocente é quem não pecou contra aquele estado de espírito primevo de equilíbrio e harmonia, e por isso conserva-se aberto a todas as formas de maravilhoso, e apetente delas.

A posição de alma do inocente é como a de alguém que, por assim dizer, acabasse de sair das mãos de Deus. Às vezes tem-se a impressão de que certos aspectos da natureza são assim. Quando se chega, por exemplo, num lugar onde nunca, ou quase que nunca, esteve o homem, tem-se a sensação de que aquilo está como que saindo das mãos de Deus. Aquela inocência é quase a inocência da mão de Deus. Há aí um estado, um teor de relações da alma com Deus, que precisaria ser especialmente estudado no terreno filosófico e depois no terreno teológico’.[2]

Como existe a tendência para considerar a inocência primeva como algo que diz respeito principalmente à infância, será útil analisar a expressão nas diversas fases da vida.

 

3. A inocência nas diversas etapas da vida

A marcha da inocência durante a vida comporta várias etapas. Há uma fase do brinquedo; depois se desperta para os charmes (e os riscos) da sociabilidade; atinge-se depois a idade adulta e vêm, por fim, o ocaso e a morte. Assim sendo, podemos adotar ‘uma designação mnemônica: a etapa do brinquedo; do meu amigo; da carreira; e do além’.[3]

Primeira etapa: ‘A criança, até uma certa idade, presta muito mais atenção nos objetos que a circundam do que nas pessoas que a cercam’.

Segunda etapa: ‘Em determinado momento, surgem em seu horizonte os outros, sua psicologia, sua alma. «Outro», no caso, é o menino ou a menina com quem brinca, e não o pai nem a mãe.

‘Nasce para a criança a necessidade de conhecer as outras pessoas, de estabelecer comparações e diferenças consigo mesma.

‘Em determinado momento, o companheiro diz muito mais do que o brinquedo. O brinquedo passa a ser os outros meninos e rapazes, muito mais do que a coisa com que brincam. O instinto de sociabilidade explode’.

Terceira etapa: ‘Nessa fase, o que domina o indivíduo é a idéia de fazer algo nesta Terra. A pessoa começa a pensar em sua biografia, no que quer, no que vai dar, no que vai ser. É um horizonte novo que lhe dá uma idéia arquitetônica de si e do tempo que vai correr diante dele, mas que tende a dissociá-lo dos pássaros e das borboletas primeiras.

‘Por outro lado, também a inocência pode culminar em algo. Seria como a flecha da Igreja de Notre-Dame, apontando para cima’. [4]

Quarta etapa: ‘Toda a existência é uma modelagem que Deus vai fazendo, com resistências ou aceitações de cada um, para que Lhe fique parecido. No último momento, Deus concede à pessoa uma última possibilidade de Lhe ser semelhante.

‘Se aceitar, vai para o Céu e é acolhida para toda a eternidade. Se recusar, é rejeitada por Deus para sempre.

‘Toda a biografia da pessoa é a modelagem a partir desta primeira imagem recebida na infância, e desenvolvida ao longo da existência, até chegar à imagem final. Entre uma imagem e outra, transcorre a vida de todas as pessoas’.[5]

Apresentada esta visão de conjunto, passamos a considerar as venturas e aventuras da inocência, em cada uma das etapas acima enumeradas.


Fontes de referência:

[1]  Sem data. [2]  5-6-1974. [3]  19-12-1979. [4]  19-12-1979. [5]  16-5-1976.