Quanta celeuma em torno do famoso caso da
inviolabilidade das urnas! No entanto, se procurarmos investigar as verdadeiras
causas de tanta paixão, encontraremos apenas, de uma parte e de outra, o ardor
partidário, alimentado por ódios facciosos e interesses subalternos a que são
inteiramente alheios os altos e verdadeiros interesses do país.
Enquanto se discute a inviolabilidade das urnas, e
a segurança real ou ilusória das famosas fechaduras Yale,
que o Major Levy tornou célebres, os
verdadeiros problemas nacionais continuam votados ao abandono.
Queremos falar hoje especialmente do problema
comunista.
Não achamos que ele não exista. Ele é real, mas
existe apenas na medida estrita em que a polícia sonolenta de nossa sociedade
burguesa o tolerar.
Como perigo remoto, o comunismo só pode ser evitado
pela recristianização da sociedade, especialmente no
que diz respeito à família e às relações entre o capital e o trabalho. A
inobservância dos preceitos católicos, neste terreno, vai produzindo um mal
estar social crescente que, em futuro menos próximo, gerará graves comoções
sociais.
Neste sentido, o perigo comunista é real, tremendo,
indiscutível e só um tolo pretenderá resolvê-lo, na imensa complexidade dos
seus aspectos, a tiro ou a pata de cavalos.
Isto posto, podemos afirmar também, e desassombradamente, que a preservação da ordem social
contra a fermentação comunista de encomenda, que ora fervilha em São Paulo, é
única e exclusivamente uma questão de polícia e pata de cavalo.
Para o perigo comunista remoto a
que acima me referi, o remédio único deve ter apenas os dois ingredientes
cristãos da justiça e da caridade.
Para a fermentação comunista de efeitos imediatos,
varia o receituário, que passará a se compor de dois outros ingredientes,
também cristãos: habilidade e energia.
Tomo nos jornais a notícia de um crime qualquer;
por exemplo o de uma casa assaltada por um ladrão no caminho de Santo Amaro. Foram roubados aos proprietários, pobres
portugueses, o brinco dourado em forma de argola, da mulher e, do marido, o
relógio de ouro duvidoso, adquirido por ocasião do casamento.
Como se trata de atentado à
propriedade particular, a polícia se põe em campo, procura o ladrão em todos os
Estados vizinhos, e acaba por descobri-lo no Triângulo mineiro. É um
[indivíduo] que vem a São Paulo escoltado como se fosse uma fera ou um réptil.
Começam os interrogatórios. E, dentro em pouco, se sabe exatamente onde comprou
as ferramentas com que violou o lar alheio, de onde lhe veio o dinheiro para
tal compra, etc., etc., até o mínimo detalhe, inclusive a hora exata em que
parou na venda para, cometido o roubo, sorver um trago de pinga.
Outra página do mesmo [jornal]: mata-se no Largo da Sé, conspira-se contra a propriedade
privada - e não mais contra um par de brincos de “ouro” sem quilate - contra
toda a ordem social e a família - e a polícia não sabe de onde vêm as armas, de
onde vem o dinheiro, de onde os conspiradores estrangeiros que conduzem a
sinistra farândola dos conspiradores pelas ruas.
Não julgamos grave a situação senão pela curteza de vistas da polícia que nos deveria garantir.
É necessário que a atenção do público e das
autoridades se retire enfim das ranhuras das urnas, para as ranhuras muito mais
importantes dos cofres em que guardam nossas tradições religiosas, morais e
familiares. Aí estão os arrombadores de Moscou, que tentam roubar-nos tais
tesouros, enquanto a polícia... dorme.