Plinio Corrêa de Oliveira

 

 

Encantos da raça negra

 

 

 

Catolicismo, N° 582, julho de 1999 (*)

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Poder-se-ia fazer poeticamente a seguinte pergunta: no conjunto das flores que Deus criou, pode-se conceber uma flor preta? E que relação ela teria com as harmonias do universo?

A raça negra certamente foi beneficiada pelo fato de missionários católicos exercerem na África seu apostolado e terem convertido à verdadeira Fé muitas pessoas. Além do que, o deslumbramento produzido pela civilização ocidental levou número considerável de africanos a abandonar hábitos milenares censuráveis e adotar estilo de vida menos distante de uma conversão. 

 

Santa Josefina Bakhita (1869-1947)

Alguns pequenos fatos ocorridos em minha vida, mas com significado simbólico, ilustram o encanto que se pode discernir na cor preta e na raça negra.

Certa vez, passeando de automóvel, em Paris – creio que ia a caminho do aeroporto –, atravessando alguns bairros periféricos, encontrei numa loja, exposto numa vitrine, um vaso com tulipas. O bonito e o pitoresco do vaso – com aquela nota picante que só os franceses sabem dar – continha uma tulipa preta. Em torno dela, tulipas de um vermelho cor de sangue, amarelo dado a dourado e brancas, formavam uma policromia em que a cor preta era a nota firme, que dava encanto a todo o resto. Isso fez-me lembrar da raça negra... 

 

Tulipa preta, “rainha da noite”

Não posso me esquecer também de certa noite que tive de passar no continente africano, em Dakar, capital do Senegal, numa de minhas viagens à Europa, devido à escala do avião. Minha grande recompensa foi ver os negros.

Dakar é uma grande cidade. Sob influência da França, modelou-se muito, sem deixar de ser uma grande cidade negra.

Fui visitar um parque, juntamente com companheiros de viagem. De repente, notei um certo movimento e percebi que era uma celebridade que estava chegando. Realmente, cercada de um grupo de outros negros, seus conterrâneos, vinha uma mocinha, de uns 18 a 20 anos, na flor de sua juventude portanto, preta como ébano. Podia ser filha ou sobrinha do Bem-aventurado Pierre Toussaint...

Estava vestida de tal modo que, creio, nunca me esquecerei em minha vida... Um cor-de-rosa muito mimoso, muito leve, com panejamentos abundantes e um turbante da mesma cor. Portava também miçangas com vidros coloridos que ela sacudia, modo indireto de chamar a atenção. Era um livro africano com encadernação francesa...

A moça tinha aprendido mantien [atitude ereta do tronco e da cabeça]. Seus modos não eram altivos, mas dignos e distintos, com desembaraço. Seu modo de sorrir afável, mas mantendo distância, pareceu-me bem moralizado. Em torno de si, mantinha uma atmosfera de gracejo leve e inocente, como uma brisa vinda do mar.

Prestei atenção nos outros negros que estavam andando por ali. Eram altos, bem constituídos e com fisionomia séria, portando um fez: um chapeuzinho em forma de cone truncado, de um vermelho escuro, alguns deles ostentando no alto um pompom preto.

Os senegaleses usavam duas peças de roupa: as túnicas, que iam do alto do pescoço até as plantas dos pés, de cores diferentes, mas muito discretas; e, por cima delas, uma cobertura para o corpo, sem mangas, uma espécie de colete, de aberturas bem grandes para deixar passar os braços, e não fechada na frente.

Toda essa indumentária comunicava-lhes uma atitude que evocava um tanto a de um professor catedrático de uma grande Universidade, quanto um pouco a de janízaros.(**)

* * *

Isto posto, o que concluir sobre a raça negra? Ela manifesta, em certas circunstâncias e ocasiões, uma capacidade de expressão, que não é tanto a da palavra, mas sim do porte, do movimento, do gesto, do riso e da compenetração, que lhe dá um poder que é de causar inveja – não querendo ofender ninguém – a muitos povos brancos. Eu seria tentado a dizer que a todos. Excetuo, entretanto, todo mundo que queira se excetuar...

Note:

(*) Excertos da conferência proferida pelo Prof. Plinio Corrêa de Oliveira para sócios e cooperadores da TFP em 31 de maio de 1991. Sem revisão do autor.

(**) Corpos de infantaria regular do exército turco, que constituíam a guarda dos sultões, criados pelo Vizir Halil Pacha durante o reinado do Sultão otomano Murat (13l9-1389).


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