Esta é uma das mais antigas ordens
especialmente fundadas para propagar a devoção a Nossa Senhora. É muito
bonito o título de servitas de Maria, quer dizer, o título de servos de
Maria, ou seja de escravos de Maria. Como é evidente, esse título
prenuncia a devoção de São Luís Maria Grignion de Monfort, que [é] a
devoção da escravidão a Nossa Senhora; mas escravidão, no sentido
próprio da palavra, quer dizer, de um despojamento completo de todos os
bens, passados, presentes e futuros, que são postos nas mãos de Nossa
Senhora; inclusive os bens espirituais, que são os méritos de nossas boas
obras.
Esse título é muito bom porque
serve também para marcar a diferença entre a boa piedade católica e a
Revolução. Os senhores saberão, provavelmente, que há um certo número
de teólogos contemporâneos que consideram o título dado por São Luís
Grignion de Montfort no seu ato de consagração, e a expressão que ele usa
ao longo do seu Tratado, a respeito da escravidão a Nossa Senhora, uma
coisa indigna do homem do século XX. Era uma coisa que podia ser utilizada
no passado, mas em nossa época, em que a escravidão foi abolida e em que
não há mais servos, ninguém mais é servo, nem sequer de Nossa Senhora.
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Santuário de
Montesenario, berço da Orden dos Servos de Santa María |
Então, em relação a Nossa Senhora,
poderemos chamar-nos filhos, mas não escravos, porque a dignidade humana
não comporta o título de escravidão nem em relação a Nossa Senhora.
Esta afirmação, evidentemente,
é uma afirmação igualitária e de caráter revolucionário e não há de
ser aqui que eu hei de demonstrar uma coisa destas. Em relação a Nossa
Senhora, que é a Rainha do Céu e da Terra, e é a rainha absoluta do céu e
da terra, todo mundo é servo e é uma honra ser servo dEla. De maneira
que em relação a Ela o que nós aspiramos, e propriamente o desejo nosso em
nossa vida, é sermos verdadeiros escravos dEla. E sendo escravos somos
verdadeiramente filhos, e filhos somos verdadeiramente escravos, porque
nós a amamos como filhos e queremos servi-La como escravos e como servos,
queremos obedecer a Ela como servos e escravos verdadeiros.
E esses sete santos que fundaram
essa Ordem religiosa quiseram dar à Ordem o título de Ordem dos Servitas,
quer dizer, dos servos, a Ordem dos escravos. A Igreja canonizou estes
sete santos, instituiu a Ordem fundada por eles, aprovou, promulgou as
regras dessa Ordem, com o nome de servos. Portanto, o próprio
magistério da Igreja, por várias formas, indica que em relação à Nossa
Senhora devemos ser servos.
Os senhores vêem aqui o
espírito demoníaco da Revolução, que não querendo nenhuma espécie
de superioridade, não se agüenta em sacudir a hierarquia na terra --
quer a hierarquia eclesiástica, quer a hierarquia temporal -- mas quer
ao mesmo tempo sacudir até as desigualdades na ordem sobrenatural, e
não quer que haja a desigualdade imensa que Nosso Senhor pôs entre a Mãe
dEle, ― como
rainha de todos os anjos, de todos os santos, de todo o universo
―, e todas as outras
criaturas que estão a um abismo de Nossa Senhora.
Tive outro dia ocasião de lembrar
isto, quando Nossa Senhora pede sozinha uma coisa, ainda que seja sem o
concurso de nenhum santo, Ela obtém. Se todos os anjos e santos do céu
pedissem algo sozinhos, sem o concurso dEla, não obteriam. De tal maneira
o reinado dEla é um reinado completo e absoluto. E não há maior disparate
do querer pôr isto, sequer de longe, em dúvida. Pois bem, este é o
espírito da Revolução, este é o espírito do igualitarismo e esta é a raiz
do ateísmo. A raiz do ateísmo é ter ódio de que exista esse senhor
no céu, que domine em nós sobre nós, porque não pode haver em
nenhum lugar, nenhuma espécie de senhor.
Karl Marx disse isto muito bem,
ele chamava isto de alienação no sentido da palavra alienum.
Alienação era o ato pelo qual o homem cede uma parte de si mesmo, quer
dizer, cede o domínio sobre si mesmo, a um outro homem. Então, é alienação
que um patrão mande no emprego; é alienação que um pai mande no filho; é
alienação que o esposo mande na esposa; é alienação que o nobre mande no
plebeu; é alienação que o professor mande no aluno. Toda forma de
autoridade é uma alienação.
E ele dizia que uma das piores
alienações era a alienação que o homem praticava para com Deus. Que
Deus não existia, era um mito que o homem inventava para alienar-se. Mas
um mito ruim, porque o homem assim imaginava que estava alienado. E o que
deve haver não é a alienação, mas cada homem por si, ou melhor, cada homem
possuir-se a si próprio, ser inteiramente independente e não obedecer a
ninguém. Este é o ideal do marxismo, é o ideal da Revolução.
O que devemos pedir aos santos
servitas? Se esses santos servitas do século XIII ressuscitassem hoje e
presenciassem essas abominações, e as vissem proferidas por lábios
católicos e amadas por corações católicos, o que eles diriam? Que
indignação teriam? Que censuras fariam, que réplicas? Devemos pedir a eles
que intervenham aqui na terra e que ajudem a acender uma verdadeira
devoção a Nossa Senhora entre os homens e com a devoção a Nossa Senhora, o
senso da hierarquia e o senso da Contra-Revolução. Deve ser esta nossa
intenção no dia de amanhã, que será o dia dos santos servitas.