Hotel
Renaissance, São Paulo, 14 de Dezembro de 2008 –
Encerramento das comemorações pelo centenário de nascimento de Plinio Corrêa de
Oliveira
Discurso
do Prof. Roberto de Mattei
Excelência Rev.ma, Altezas, Autoridades, caros
amigos,
Cem anos passados desde o dia de seu
nascimento, treze anos decorridos após a sua morte, um véu de mistério ainda
cobre a figura de Plínio Corrêa de Oliveira.
Podemos aproximar-nos desse mistério através
da definição que o Cardeal Giuseppe Pizzardo – então Prefeito da Sagrada Congregação para os
Seminários – deu, em
Na carta que figura como prefácio desse estudo
importante, o Cardeal Pizzardo o define como «um eco fidelíssimo do supremo magistério da
Igreja».
Mas Plínio Corrêa de Oliveira não foi só um
eco do magistério supremo e perene da Igreja apenas nas suas obras, mas também,
e principalmente, em sua vida. Encarnou, por assim dizer, esse magistério, dele
fazendo um ensinamento não apenas transmitido, mas sobretudo vivido à imagem de
Nosso Senhor, o qual disse sobre Si mesmo: «Eu
sou o Caminho, a Verdade e a Vida». E o Caminho, a Verdade e a Vida de
Nosso Senhor são os de seu Corpo Místico, a Igreja por Ele fundada no Calvário.
Plínio
Corrêa de Oliveira conheceu e amou a história da Igreja desde as suas origens,
desde o momento em que o Corpo Místico veio à luz, jorrando, com o sangue e a
água, através do lado trespassado de Cristo.
Se tivesse vivido nos primeiros séculos da
Igreja, ter-se-ia apresentado de
cabeça erguida perante os tribunais romanos, confessando firmemente a sua fé, e
teria enfrentado, com coragem indômita, as feras nas arenas do circo.
Se Plínio Corrêa de Oliveira tivesse vivido na
época de Constantino – na altura em que a Igreja, ao sair das catacumbas, teve
de combater contra os inimigos internos, mais perigosos que os externos –, ele
teria ocupado um lugar de destaque no combate pela pureza da fé. Teria seguido
Santo Atanásio quando este, perseguido pelos arianos,
teve de partir para o exílio; ter-se-ia
erguido publicamente contra Nestório para defender a
honra de Nossa Senhora, como fez Eusébio de Dorilea, um simples leigo; teria apoiado os grandes papas
como São Leão e São Gregório, os quais proclamaram a primazia de Roma nos
séculos de obscuridade que antecederam a aurora luminosa da Idade Média.
O seu coração teria exultado de alegria na noite
de Natal do ano 800, ocasião
Na solene cerimônia em que o papa Leão III
cingiu com a coroa imperial a cabeça do rei dos Francos, ele teria vislumbrado
todo o esplendor da cristandade nascente. Plínio Corrêa de Oliveira, que proclamou
a Cruzada do século XX, teria sido um dos primeiros a responder ao apelo do
Beato Urbano II e a levar a cruz.
Teria chorado de alegria ao se aproximar, de
pés descalços e a espada em punho, dos muros sagrados de Jerusalém. Teria
erguido a espada não para impor a fé, mas para defender a civilização cristã,
ao lado de Simão de Montfort, contra os cátaros, no coração da França, e ao lado dos cavaleiros
teutônicos, contra as tribos pagãs nos países bálticos.
Na perda do espírito de cruzada ele leu o
início da decadência da Idade Média, substituído pelo espírito hedonista do
Humanismo, que abriu caminho à primeira grande revolução: o protestantismo, que
pôs em causa a unidade do ecumenismo cristão.
Plínio Corrêa de Oliveira teria saudado com
entusiasmo a entrada em campo de batalha de uma ordem religiosa, a Companhia de
Jesus de Santo Inácio de Loiola.
Não teria tido nenhuma compaixão pelos
revoltosos do espírito, teria participado nas controvérsias ao lado de São
Francisco de Sales e São Roberto Belarmino; teria
combatido contra os protestantes, na esteira de Alexandre Farnese,
nas terras de Flandres, e de Wallerstein,
nos territórios da Boêmia; teria lutado contra os calvinistas
holandeses, ao lado do Conde de Sanfelice, na Bahia.
O
espírito de cruzada não se identifica com o amor pela violência, mas sim com o
desejo de oferecer a própria vida em nome de Deus. Dentro desse espírito,
Plínio Corrêa de Oliveira teria derramado seu sangue no tumultuoso mar de
Lepanto ou nos espaldões da Viena assediada pelos
turcos.
Ninguém estudou ou conheceu, como ele, a
história da Revolução Francesa, a segunda grande revolução, matriz de todos os
erros de nosso tempo. Tê-la-ia
enfrentado a peito aberto, a fim de decepá-la na origem.
Teria querido ser um príncipe de sangue
francês, não para emigrar, mas para liderar a insurreição antijacobina
na Vandéia; teria acorrido à Calábria, para junto do
Cardeal Ruffo, e ao Tirol,
para se colocar ao lado de Andreas Hofer.
Quis a Providência que ele não fosse nada
disto, mas que fosse, mais até em sua pessoa que em suas obras, o eco
fidelíssimo de todas estas posições no século XX. Um eco não só do magistério
perene da Igreja, mas também da vida palpitante da Esposa de Cristo, de suas
lutas, dores e triunfos.
Morreu a 3 de outubro de 1995, que, no
calendário antigo, é o dia da festa de Santa Teresinha
do Menino Jesus. A mesma Santa Teresinha que, na História de uma alma, escreve estas
palavras tocantes: «Sinto vocação de
guerreiro, de sacerdote, de apóstolo, de doutor, de mártir; numa palavra, sinto
a necessidade, o desejo de realizar por Ti, Jesus, as obras mais heróicas.
Sinto no fundo da alma a coragem de um cruzado, de um zuavo pontifício: gostaria
de morrer num campo de batalha, em defesa da Igreja».
Foram deste mesmo tipo o espírito e a vocação
de Plínio Corrêa de Oliveira.
Santa Teresinha
morreu aos 24 anos de idade realizando, no sacrifício supremo de seu breve
período de vida, a aspiração a essa vocação universal.
Plínio Corrêa de Oliveira viveu muito mais
tempo realizando, com sua obra e seu exemplo pessoal, a mesma aspiração de
Santa Teresinha. Tal como Teresa de Lisieux, também ele sentia a vocação de guerreiro e
sacerdote, de apóstolo, doutor e mártir. Tal como Teresa de Lisieux,
também ele poderia ter escrito: «Gostaria
de morrer num campo de batalha, em defesa da Igreja».
O
seu campo de batalha foi a longa noite do século XX; com espírito de cruzado
atravessou aquele que talvez tenha sido o século mais negro da história,
enfrentando e combatendo até à morte o comunismo, a terceira grande revolução
da história, assim como todas as formas de totalitarismo e de progressismo,
laico ou católico, às quais opôs sempre o perene Magistério da Igreja.
Plínio Corrêa de Oliveira foi um eco
fidelíssimo da Igreja, uma vez que não se limitou a amar ou odiar, à luz da
Igreja, tudo aquilo com que se foi confrontando ao longo de sua vida.
Amou tudo o que a Igreja havia amado, definido
e promovido no decurso de dois mil anos de existência; detestou tudo o que a
Igreja havia refutado, combatido, anatematizado no decorrer desses dois mil
anos.
Em relação à figura de Plínio Corrêa de
Oliveira, hoje devemos amar e homenagear não um homem, mas a própria Igreja,
una, santa, católica, apostólica e romana; as palavras vir catholicus, apostolicus,
plene romanus, que hoje
lemos na lápide de seu túmulo
Nas palavras e nos ensinamentos de Plínio
Corrêa de Oliveira devemos escutar o eco de uma voz límpida e consternada, de
uma voz que vem de longe e que não se extingue com o passar dos séculos; em sua
vida, em seu exemplo devemos detectar uma luz que se refrata século após
século, até o final dos tempos; na sua figura devemos divisar uma bandeira,
tantas vezes caída, mas sempre erguida de novo.
É esta mesma bandeira que hoje voltamos a
erguer do chão, com este encontro e com o nosso trabalho de todo dia. Roma,
Itália e a Europa retomam a herança de Plínio Corrêa de Oliveira e renovam
hoje, através das minhas palavras, o empenho de fazer de sua vida e de sua obra
o nosso futuro.