Hotel Renaissance, São Paulo, 14 de Dezembro de 2008 – Encerramento das comemorações pelo centenário de nascimento de Plinio Corrêa de Oliveira

 

Discurso do Prof. Roberto de Mattei

 

 

Excelência Rev.ma, Altezas, Autoridades, caros amigos,

 

Cem anos passados desde o dia de seu nascimento, treze anos decorridos após a sua morte, um véu de mistério ainda cobre a figura de Plínio Corrêa de Oliveira.

Podemos aproximar-nos desse mistério através da definição que o Cardeal Giuseppe Pizzardo – então Prefeito da Sagrada Congregação para os Seminários – deu, em 1963, a respeito de uma das suas obras, A liberdade da Igreja no estado comunista.

Na carta que figura como prefácio desse estudo importante, o Cardeal Pizzardo o define como «um eco fidelíssimo do supremo magistério da Igreja».

Mas Plínio Corrêa de Oliveira não foi só um eco do magistério supremo e perene da Igreja apenas nas suas obras, mas também, e principalmente, em sua vida. Encarnou, por assim dizer, esse magistério, dele fazendo um ensinamento não apenas transmitido, mas sobretudo vivido à imagem de Nosso Senhor, o qual disse sobre Si mesmo: «Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida». E o Caminho, a Verdade e a Vida de Nosso Senhor são os de seu Corpo Místico, a Igreja por Ele fundada no Calvário.

Plínio Corrêa de Oliveira conheceu e amou a história da Igreja desde as suas origens, desde o momento em que o Corpo Místico veio à luz, jorrando, com o sangue e a água, através do lado trespassado de Cristo.

Se tivesse vivido nos primeiros séculos da Igreja, ter-se-ia apresentado de cabeça erguida perante os tribunais romanos, confessando firmemente a sua fé, e teria enfrentado, com coragem indômita, as feras nas arenas do circo.

Se Plínio Corrêa de Oliveira tivesse vivido na época de Constantino – na altura em que a Igreja, ao sair das catacumbas, teve de combater contra os inimigos internos, mais perigosos que os externos –, ele teria ocupado um lugar de destaque no combate pela pureza da fé. Teria seguido Santo Atanásio quando este, perseguido pelos arianos, teve de partir para o exílio; ter-se-ia erguido publicamente contra Nestório para defender a honra de Nossa Senhora, como fez Eusébio de Dorilea, um simples leigo; teria apoiado os grandes papas como São Leão e São Gregório, os quais proclamaram a primazia de Roma nos séculos de obscuridade que antecederam a aurora luminosa da Idade Média.

O seu coração teria exultado de alegria na noite de Natal do ano 800, ocasião em que Carlos Magno foi coroado em Roma, dando origem ao Sacro Império Romano.

Na solene cerimônia em que o papa Leão III cingiu com a coroa imperial a cabeça do rei dos Francos, ele teria vislumbrado todo o esplendor da cristandade nascente. Plínio Corrêa de Oliveira, que proclamou a Cruzada do século XX, teria sido um dos primeiros a responder ao apelo do Beato Urbano II e a levar a cruz.

Teria chorado de alegria ao se aproximar, de pés descalços e a espada em punho, dos muros sagrados de Jerusalém. Teria erguido a espada não para impor a fé, mas para defender a civilização cristã, ao lado de Simão de Montfort, contra os cátaros, no coração da França, e ao lado dos cavaleiros teutônicos, contra as tribos pagãs nos países bálticos.

Na perda do espírito de cruzada ele leu o início da decadência da Idade Média, substituído pelo espírito hedonista do Humanismo, que abriu caminho à primeira grande revolução: o protestantismo, que pôs em causa a unidade do ecumenismo cristão.

Plínio Corrêa de Oliveira teria saudado com entusiasmo a entrada em campo de batalha de uma ordem religiosa, a Companhia de Jesus de Santo Inácio de Loiola.

Não teria tido nenhuma compaixão pelos revoltosos do espírito, teria participado nas controvérsias ao lado de São Francisco de Sales e São Roberto Belarmino; teria combatido contra os protestantes, na esteira de Alexandre Farnese, nas terras de Flandres, e de Wallerstein, nos territórios da Boêmia; teria lutado contra os calvinistas holandeses, ao lado do Conde de Sanfelice, na Bahia.

O espírito de cruzada não se identifica com o amor pela violência, mas sim com o desejo de oferecer a própria vida em nome de Deus. Dentro desse espírito, Plínio Corrêa de Oliveira teria derramado seu sangue no tumultuoso mar de Lepanto ou nos espaldões da Viena assediada pelos turcos.

Ninguém estudou ou conheceu, como ele, a história da Revolução Francesa, a segunda grande revolução, matriz de todos os erros de nosso tempo. Tê-la-ia enfrentado a peito aberto, a fim de decepá-la na origem.

Teria querido ser um príncipe de sangue francês, não para emigrar, mas para liderar a insurreição antijacobina na Vandéia; teria acorrido à Calábria, para junto do Cardeal Ruffo, e ao Tirol, para se colocar ao lado de Andreas Hofer.

Quis a Providência que ele não fosse nada disto, mas que fosse, mais até em sua pessoa que em suas obras, o eco fidelíssimo de todas estas posições no século XX. Um eco não só do magistério perene da Igreja, mas também da vida palpitante da Esposa de Cristo, de suas lutas, dores e triunfos.

Morreu a 3 de outubro de 1995, que, no calendário antigo, é o dia da festa de Santa Teresinha do Menino Jesus. A mesma Santa Teresinha que, na História de uma alma, escreve estas palavras tocantes: «Sinto vocação de guerreiro, de sacerdote, de apóstolo, de doutor, de mártir; numa palavra, sinto a necessidade, o desejo de realizar por Ti, Jesus, as obras mais heróicas. Sinto no fundo da alma a coragem de um cruzado, de um zuavo pontifício: gostaria de morrer num campo de batalha, em defesa da Igreja».

Foram deste mesmo tipo o espírito e a vocação de Plínio Corrêa de Oliveira.

Santa Teresinha morreu aos 24 anos de idade realizando, no sacrifício supremo de seu breve período de vida, a aspiração a essa vocação universal.

Plínio Corrêa de Oliveira viveu muito mais tempo realizando, com sua obra e seu exemplo pessoal, a mesma aspiração de Santa Teresinha. Tal como Teresa de Lisieux, também ele sentia a vocação de guerreiro e sacerdote, de apóstolo, doutor e mártir. Tal como Teresa de Lisieux, também ele poderia ter escrito: «Gostaria de morrer num campo de batalha, em defesa da Igreja».

O seu campo de batalha foi a longa noite do século XX; com espírito de cruzado atravessou aquele que talvez tenha sido o século mais negro da história, enfrentando e combatendo até à morte o comunismo, a terceira grande revolução da história, assim como todas as formas de totalitarismo e de progressismo, laico ou católico, às quais opôs sempre o perene Magistério da Igreja.

Plínio Corrêa de Oliveira foi um eco fidelíssimo da Igreja, uma vez que não se limitou a amar ou odiar, à luz da Igreja, tudo aquilo com que se foi confrontando ao longo de sua vida.

Amou tudo o que a Igreja havia amado, definido e promovido no decurso de dois mil anos de existência; detestou tudo o que a Igreja havia refutado, combatido, anatematizado no decorrer desses dois mil anos.

Em relação à figura de Plínio Corrêa de Oliveira, hoje devemos amar e homenagear não um homem, mas a própria Igreja, una, santa, católica, apostólica e romana; as palavras vir catholicus, apostolicus, plene romanus, que hoje lemos na lápide de seu túmulo em São Paulo, resumem a sua vocação.

Nas palavras e nos ensinamentos de Plínio Corrêa de Oliveira devemos escutar o eco de uma voz límpida e consternada, de uma voz que vem de longe e que não se extingue com o passar dos séculos; em sua vida, em seu exemplo devemos detectar uma luz que se refrata século após século, até o final dos tempos; na sua figura devemos divisar uma bandeira, tantas vezes caída, mas sempre erguida de novo.

É esta mesma bandeira que hoje voltamos a erguer do chão, com este encontro e com o nosso trabalho de todo dia. Roma, Itália e a Europa retomam a herança de Plínio Corrêa de Oliveira e renovam hoje, através das minhas palavras, o empenho de fazer de sua vida e de sua obra o nosso futuro.